Tinham também outros alimentos proibidos como a lampreia, porque é um
peixe sem espinha e é comida com sangue e sem escamas. Não devem também
misturar a carne com o leite. Achei particularmente interessante o facto
de não ingerirem favas ou a sua farinha (as favas vieram do Afeganistão)
por elas terem a forma de feto e de provocarem flatulências,
encaravam-nas como espíritos que andavam às voltas.
Também sobre as favas, disse-nos em tom cómico que as favas fazem
“tilintar” os genitais e que a expressão “ favas contadas” é de origem
romana e que significa contagem de votos.
O povo cristão sempre foi muito ligado à gastronomia. Na Bíblia, são
apresentados vários banquetes, por exemplo as Bodas de Caná, a Última
Ceia e também a cultura gastronómica como o uso do vinho, do peixe e do
pão.
No meio da palestra falou-nos das duas festas religiosas mais
importantes: O Natal e a Páscoa. No Natal, deixamos sempre a mesa posta
com os doces típicos pois pensava-se que as almas vinham à terra para
comer as migalhas. Quanto à Páscoa, na tradição judaica, é costume comer
cabrito pois Deus disse para comermos cabrito com menos de um ano.
Sobre a história da gastronomia em Portugal, referiu que ela foi
evoluindo ao longo dos tempos mas o seu apogeu foi durante a época dos
descobrimentos devido às especiarias.
Foram várias as personagens que fizeram a história da gastronomia: S.
Bento (ano 470) fez grandes banquetes, através da Ordem Beneditina
fundou o hospital S. Tiago e deu quarto, pão e água aos pobres. Também
foi importante a Ordem Franciscana, S. Benedito (do qual o Sr. Hélio
Loureiro mais gostou por ser gordinho), S. Lourenço, o santo dos
cozinheiros que morreu grelhado dizendo: “virem-me para o outro lado que
estou mal passado”.
As épocas mais importantes para a gastronomia portuguesa foram o
Renascimento, com Catarina de Médicis que levou para França e Florença o
centro de cultura e cozinha e os Descobrimentos, pois Portugal entrou na
rota mundial das especiarias, passando o agridoce e as especiarias a
serem introduzidas nas comidas.
Foram também escritos importantes livros como o “Códice” do séc. XV da
Infanta Ana Maria, a “Arte da Cozinha” de Domingues Rodrigues, em 1683
com muitas receitas medievais e com grandes novidades como por exemplo a
mistura de frutos exóticos com pratos salgados. Também mostrou como se
deveria pôr uma mesa com 4 pratos: sopas, peixes, carnes de caça e
açougue e doces.
Só no séc. XIX se projectaram as primeiras salas de jantar uma vez que
nos séculos anteriores se punha a mesa onde fosse possível.
Em 1807 nasce Lucas Huguet, chefe de D. João VI que mais tarde escreve
um livro sobre gastronomia, contestando o livro publicado por Domingos
Rodrigues.
Também falámos de alguns alimentos novos introduzidos em Portugal na
época tal como o tomate, que foi introduzido pelos italianos
(inicialmente os portugueses acreditavam que este fruto fosse venenoso).
O nabo que passou a ser utilizado para substituir a batata.
Curioso foi saber que os papagaios faziam parte da ementa no princípio
do séc. XIX e que D. João II andava sempre com frangos no bolso tendo
morrido à mesa envenenado pelo cozinheiro.
O nosso convidado deu também importância à doçaria conventual, referindo
que esta era vendida no exterior dos mosteiros e conventos e à qual o
povo dava nomes cómicos.
Houve influência estrangeira na nossa cultura gastronómica. Pessoas como
Ramalho Ortigão, Eça de Queirós e Camilo Castelo Branco sempre elogiaram
a cozinha francesa, sobretudo a parisiense, o que beneficiou a
gastronomia portuguesa.
Tempos depois Maria de Lurdes Modesto, através dos seus programas de
televisão cativou as pessoas para a gastronomia.
Infelizmente, nos tempos de hoje, a falta de tempo leva as pessoas a
cometerem pecados gastronómicos, nomeadamente o consumo excessivo de
fastfood.
Para finalizar a palestra, nada melhor falar do amor na gastronomia.
Entre o estômago e o coração existe uma afectividade profunda. São
exemplos disso os cozinhados das avós preparados com muito carinho e
amor.
Numa conversa particular com o cozinheiro da Federação Portuguesa de
Futebol, soubemos que foi em casa que começou a cozinhar. Tinha dez
anos. Quando acabou o liceu foi tirar o curso na Escola de Hotelaria do
Porto, comemorando este ano as bodas de prata na profissão. Para além de
trabalhar na FPF é cozinheiro no Porto Palácio Hotel e escreve algumas
crónicas para as revistas, sendo apresentador de um programa de
televisão.
Foi curioso saber que o nosso convidado, juntamente com os seus
ajudantes, têm muito cuidado com os jogadores, dão relevância à parte
nutricional da alimentação dos jogadores, essencialmente, o fornecimento
de proteínas e vitaminas. Como a parte emocional é muito importante, é
necessário dar-lhes alguns “miminhos gastronómicos”.
Numa abordagem final, perguntámos qual era o seu prato preferido, ao que
nos respondeu: ”um bom gastrónomo come de tudo… excepto nabos!!!”.
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