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N.º 20

Maio 2007

Fez História / Fará História


A Cultura do Apetite
Vítor Marquez - 9º A

No âmbito de promover a culinária e a Oficina de Sabores e Saberes da nossa escola, convidámos,  o Sr. Hélio Loureiro, prestigiado gastrónomo e cozinheiro da Selecção Portuguesa de Futebol.

Apetite é uma palavra vinda do étimo latino “appetitu” chegou até nós por via erudita, sofrendo os fenómenos de epêntese e nasalação; significa, no ver de um gastrónomo, a vontade de comer, desejo de satisfazer um gosto.

Por sua vez, comer é um verbo que, segundo Hélio Loureiro, é muito interessante, porque não deve ser conjugado no singular pois devemos sempre comer em grupo e nunca sós.

Após esta breve apresentação, iniciou-se o tema “A gastronomia ao longo da história”.

Começámos por falar no povo judeu. Este considera a carne de porco, suja, por isso não faz parte da sua dieta.

Hélio Loureiro com alunos do Clube de Saberes e Sabores e a Coordenadora Salete Fernandes.

Tinham também outros alimentos proibidos como a lampreia, porque é um peixe sem espinha e é comida com sangue e sem escamas. Não devem também misturar a carne com o leite. Achei particularmente interessante o facto de não ingerirem favas ou a sua farinha (as favas vieram do Afeganistão) por elas terem a forma de feto e de provocarem flatulências, encaravam-nas como espíritos que andavam às voltas.

Também sobre as favas, disse-nos em tom cómico que as favas fazem “tilintar” os genitais e que a expressão “ favas contadas” é de origem romana e que significa contagem de votos.

O povo cristão sempre foi muito ligado à gastronomia. Na Bíblia, são apresentados vários banquetes, por exemplo as Bodas de Caná, a Última Ceia e também a cultura gastronómica como o uso do vinho, do peixe e do pão.

No meio da palestra falou-nos das duas festas religiosas mais importantes: O Natal e a Páscoa. No Natal, deixamos sempre a mesa posta com os doces típicos pois pensava-se que as almas vinham à terra para comer as migalhas. Quanto à Páscoa, na tradição judaica, é costume comer cabrito pois Deus disse para comermos cabrito com menos de um ano.

Sobre a história da gastronomia em Portugal, referiu que ela foi evoluindo ao longo dos tempos mas o seu apogeu foi durante a época dos descobrimentos devido às especiarias.

Foram várias as personagens que fizeram a história da gastronomia: S. Bento (ano 470) fez grandes banquetes, através da Ordem Beneditina fundou o hospital S. Tiago e deu quarto, pão e água aos pobres. Também foi importante a Ordem Franciscana, S. Benedito (do qual o Sr. Hélio Loureiro mais gostou por ser gordinho), S. Lourenço, o santo dos cozinheiros que morreu grelhado dizendo: “virem-me para o outro lado que estou mal passado”.

As épocas mais importantes para a gastronomia portuguesa foram o Renascimento, com Catarina de Médicis que levou para França e Florença o centro de cultura e cozinha e os Descobrimentos, pois Portugal entrou na rota mundial das especiarias, passando o agridoce e as especiarias a serem introduzidas nas comidas.

Foram também escritos importantes livros como o “Códice” do séc. XV da Infanta Ana Maria, a “Arte da Cozinha” de Domingues Rodrigues, em 1683 com muitas receitas medievais e com grandes novidades como por exemplo a mistura de frutos exóticos com pratos salgados. Também mostrou como se deveria pôr uma mesa com 4 pratos: sopas, peixes, carnes de caça e açougue e doces.

Só no séc. XIX se projectaram as primeiras salas de jantar uma vez que nos séculos anteriores se punha a mesa onde fosse possível.

Em 1807 nasce Lucas Huguet, chefe de D. João VI que mais tarde escreve um livro sobre gastronomia, contestando o livro publicado por Domingos Rodrigues.

Também falámos de alguns alimentos novos introduzidos em Portugal na época tal como o tomate, que foi introduzido pelos italianos (inicialmente os portugueses acreditavam que este fruto fosse venenoso). O nabo que passou a ser utilizado para substituir a batata.

Curioso foi saber que os papagaios faziam parte da ementa no princípio do séc. XIX e que D. João II andava sempre com frangos no bolso tendo morrido à mesa envenenado pelo cozinheiro.

O nosso convidado deu também importância à doçaria conventual, referindo que esta era vendida no exterior dos mosteiros e conventos e à qual o povo dava nomes cómicos.

Houve influência estrangeira na nossa cultura gastronómica. Pessoas como Ramalho Ortigão, Eça de Queirós e Camilo Castelo Branco sempre elogiaram a cozinha francesa, sobretudo a parisiense, o que beneficiou a gastronomia portuguesa.

Tempos depois Maria de Lurdes Modesto, através dos seus programas de televisão cativou as pessoas para a gastronomia.

Infelizmente, nos tempos de hoje, a falta de tempo leva as pessoas a cometerem pecados gastronómicos, nomeadamente o consumo excessivo de fastfood.

Para finalizar a palestra, nada melhor falar do amor na gastronomia. Entre o estômago e o coração existe uma afectividade profunda. São exemplos disso os cozinhados das avós preparados com muito carinho e amor.

Numa conversa particular com o cozinheiro da Federação Portuguesa de Futebol, soubemos que foi em casa que começou a cozinhar. Tinha dez anos. Quando acabou o liceu foi tirar o curso na Escola de Hotelaria do Porto, comemorando este ano as bodas de prata na profissão. Para além de trabalhar na FPF é cozinheiro no Porto Palácio Hotel e escreve algumas crónicas para as revistas, sendo apresentador de um programa de televisão.

Foi curioso saber que o nosso convidado, juntamente com os seus ajudantes, têm muito cuidado com os jogadores, dão relevância à parte nutricional da alimentação dos jogadores, essencialmente, o fornecimento de proteínas e vitaminas. Como a parte emocional é muito importante, é necessário dar-lhes alguns “miminhos gastronómicos”.

Numa abordagem final, perguntámos qual era o seu prato preferido, ao que nos respondeu: ”um bom gastrónomo come de tudo… excepto nabos!!!”. n

«Nada melhor do que falar do amor na gastronomia. Entre o estômago e o coração existe uma afectividade profunda. São exemplos disso os cozinhados das avós preparados com muito carinho e amor.»


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