1
Fui Rei!
Queimei o meu Reino,
Parti o meu Ceptro,
Perdi o meu Trono!
Meu Palácio abandonado
É só abandono!
E tive tudo o que queria:
Senhor d’Aquém-d’Além Céu,
— Tudo o que a vista abrangia
Era Meu.
Fui Rei!
Fui Dono e Senhor
De quanta riqueza havia:
— Do Reino que possuia,
Do Palácio de abandono.
Do Ceptro, que me era escudo,
E do meu Trono.
E eu, que fui dono de tudo,
Eu, que fui Rei! — nem já de mim sou dono!
Meti Palácio abandonado
É só abandono!
2
Fui belo!
Porque fui belo.., fui querido.
Fui desejado,
Desejado e repelido,
Ai, tantas vezes preferido
E tantas atraiçoado,
Mas sempre de novo erguido
Às honras de bem-amado!
Sim, fui belo!
Que o exprima
(Se serve para exprimir),
Não digo já meu cabelo!
Não minha boca a dizê-lo!
Não meu olhar a sorrir!
................................
Mas o artifício da rima
Que há-de vir,
Se a porta do andar de cima,
Em vez de fechar, — se abrir.
3
Fui Menino,
Esse Menino que sou!
— Triste Menino franzino
De nervos de violino
Que a vida me não matou
Atirei
Todos meus sonhos à rua...
Fiz,
Desfiz barcos de papel
Que, lírico e sedutor,
Perdi nas águas do Mar...
Peguei na Lua,
Mas sem lhe poder pegar!...
Ai, mundos que descobri.
Que possuí
A sonhar!...
Fui Menino,
Menino que ainda sou...,
Porque sou Menino ainda
No caminho que não finda
E já findou!...
Ai, nervos de violino
Chorando dor!
Ai! meu Menino franzino,
— Meu Menino sonhador!...
«Que negro destino.
Te fez ser Menino,
Te fez ser Poeta,
Te fez ser Cantor?!
Quem deu ao Menino
Uma alma tão preta,
De tão negra cor?!»
Menino triste e franzino,
— Fui Menino sonhador!
Lancei estrelas ao ar,
— Meus papagaios de cor!
E fiquei, Menino, a olhar
A dor de vê-los rasgar
Na minha Dor!
«Que negro destino
Te fez ser Menino,
Te fez ser Poeta,
Te fez ser Cantor?!»
4
Rei, Bem-Amado, Menino,
— Que mais serei eu agora?
Que insondável desatino
De Menino ou Não-Menino
Se deplora?
— Quis devorar o Destino,
Mas Ele é quem me devora!!
Pedro Zargo
1950-1959 |