E até agora o que se lhes fez senão hostilizá-los
(são uns malandros que trabalham poucas horas, têm muitas férias, faltam
muito, têm uma formação contínua incipiente, têm falsas doenças...)?!
Para os contrariar regulamentou-se a dimensão não lectiva do seu
horário, pressupondo que eles na escola apenas davam aulas e não
realizavam outras actividades, como se fosse possível, assim, as escolas
funcionarem, e obrigando-os a passar mais horas na escola sem que para
tal em nada se melhorassem as condições e o ambiente de trabalho. O
certo é que os professores passam mais horas nas escolas, estão mais
desmotivados e acusam maior desgaste, embora os benefícios daí
resultantes quer para os alunos quer para a escola sejam relativos e
discutíveis!
Não
seria, porventura, mais benéfico para todos que as direcções das várias
escolas gerissem autonomamente e de acordo com as suas necessidades
essas horas dos horários dos professores? Não seria preferível que as
escolas pudessem determinar que, dentro do horário lectivo, os alunos
teriam simplesmente que permanecer no seu interior, em vez de lhes impor
o castigo de certas "aulas de substituição"? Terão os alunos excesso de
tempo para uso pessoal?
Como
tentativa de justificar que trabalhavam pouco alargou-se-lhes o horário
lectivo semanal em duas horas e adiou-se-Ihes a idade de reforma, como
se o desgaste provocado pela sua profissão fosse menor na actualidade do
que em tempos idos, em que apenas as elites chegavam à escola, e os
professores viam reconhecida a sua dignidade e autoridade.
Mas
a obra ministerial não se ficou por aqui. A acrescentar a esta má imagem
geral dos professores criaram-se divisões no seu seio, enfraquecendo-os
e humilhando-os ainda mais.
Sim,
porque, afinal, o que se pretende como o chamado "concurso para
professor titular"?
Acrescentou-se alguma capacidade ou competência aos professores que eles
não possuíssem?!
Criaram-se novas tarefas ou funções que eles já antes não exercessem?! O
que mudou nas escolas com este concurso?
Quem
identificou as causas para os males que se pretende curar? Serão os
professores mal preparados na sua formação de base? Será que a sua
formação contínua é deficiente? Não sabemos. O que, sim, sabemos é que a
senhora ministra cancelou a formação contínua dos professores e até ao
momento substituiu-a por nada!
Mas
se era má, pergunta-se: quem a creditava?!
Com
o dito concurso fez-se tábua rasa dos critérios de avaliação dos
professores que vigoraram, pelo menos até Agosto de 2005, e estes são
submetidos agora a critérios ad hoc alguns deles que nada têm a
ver com os vigentes no período de tempo que se pretende avaliar. Então,
realizam-se tarefas e funções de acordo com certas regras estabelecidas
e as pessoas são avaliadas, não de acordo com estas regras, mas por
critérios que à data das ocorrências eram desconhecidas ou não existiam.
Será razoável ou ético tal procedimento? Serão honestos os pressupostos
e os princípios em que assenta este concurso? Será legítimo um contrato
desta natureza? Qual a intencionalidade dos procedimentos?
Não
haverá educação para além do orçamento? Será ainda de educação que
estamos a tratar?! De facto, os grandes problemas a nível do dito
concurso não serão tanto a nível técnico (totalmente informatizado) mas
a nível dos princípios e valores que desrespeita. Porquê avaliar
especificamente os anos de 1999/2000 a 2005/2006? Porquê avaliar anos de
trabalho que já haviam sido objecto de avaliação anterior? Porquê
avaliar funções desconhecendo qual foi o seu desempenho? Porquê integrar
no mesmo nível professores que se encontravam em graus diferentes de
progressão na carreira (8.º e 9.º escalão), anulando a uns o tempo
relativo a um escalão, enquanto a outros lhes é dado queimar essa etapa?
Onde a igualdade?! Onde está a justiça social do governo socialista?!
Diz-se criar, com este concurso, um quadro de professores altamente
qualificados. Será com concursos desta natureza que se melhora o
ambiente de trabalho nas escolas? Que os professores se qualificam? Ou
será que alguns professores já eram altamente qualificados? Se já o
eram, poderiam continuar a sê-lo e a desempenhar as funções que até aqui
sabiam realizar, sendo eleitos livremente pelos seus pares ou propostos
pelos conselhos executivos das escolas em função das necessidades
destas? Não teriam uns e outros capacidade e conhecimento no terreno do
que as suas escolas precisam e das capacidades e competências dos
colegas? Será que a generalidade dos professores até agora eram
competentes para o exercício de certas funções e que agora, pelo facto
de não terem vaga para professor titular, deixam de o ser?
Não
será uma injustiça, um insulto e uma humilhação para tantos professores
passar-lhe um “atestado” de inapto, com um concurso desta natureza? Será
que durante vinte e seis anos um professor foi competente e com um
concurso deixa de o ser? Será que foi prevista a situação de as vagas
serem preenchidas neste concurso e existirem departamentos em que, nos
próximos quinze a vinte anos aproximadamente, não voltará a haver vagas?
Com
que motivação irão trabalhar professores que, estando à beira de passar
para o 10.º escalão à data do congelamento da progressão, se vêem
ultrapassados por outros que se encontravam no 8.º e, até ao fim da sua
carreira, não vislumbram mais a possibilidade da abertura de vagas a que
possam concorrer?
Aprendemos e ensinamos também pelo exemplo. Que valores e modelos são
estes que se apresentam para a educação e que vemos configurados nos
próprios diplomas legais? A
senhora ministra deu-nos o exemplo do que não deve ser feito em educação.
António Rodrigues
Agosto de 2007 |