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Navegando
no espaço virtual |
Um (ciber)zero
"A
geração NET acabou de chegar (...) O que torna essa
geração tão diferente das anteriores é o facto de
ser a primeira a crescer rodeada dos media digitais.
Nalguns países e em diversos estratos sociais, os
computadores estão em casa, na escola, na fábrica e no
escritório (...) São miúdos submergidos em bits, que
os julgam parte integrante do ambiente em que vivem. Em
suma, algo tão natural como a própria vida".
Executive
Digest DIGITAL, Dez 1997, p.19
Não invento
nada. Limito-me a trazer para aqui o que os autores, que
refiro na bibliografia, disseram acerca dos
benefícios/riscos do "ciberprogresso". Nada
mais. Por isso, irei deixar falar os autores,
partilhando com eles algumas interrogações e algumas
“suspeitas”.
Mais em jeito
de informação, segue, no final, um conjunto
bibliográfico para despertar e satisfazer alguma
curiosidade. Pelo menos, fica o registo dos “porta-vozes”
do “ciberespaço”.
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Uma
entrada |
A geração NET
é filha da era digital. A revolução das
comunicações está a "lançar" uma nova
geração, um novo mundo, uma nova mentalidade, novas
solidariedades e novas afectividades. Criou-se um novo
espaço, o “espaço do saber” onde os intelectos
colectivos “reconstituem um plano de imanência do
significado onde os seres, os signos e as coisas
reencontram uma relação dinâmica de participação
mútua, escapando tanto às separações do Território
como aos espectaculares circuitos do Mercado” (Lévy,
1997:209). Este “espaço do saber” assume-se como o
cenário da tomada da palavra contínua e efectiva,
marcando o regresso do real à esfera da significação
pela implicação de seres vivos.
Num tempo em
que o prefixo "ciber" invade as diferentes
áreas da actividade humana (cibercultura,
ciberpolítica, ciberespaço...), num tempo em que a
magia dos "mundos virtuais" acolhe e seduz um
público cada vez mais diverso e plural, cada vez mais
numeroso e apaixonado, é oportuna uma ligeira passagem
por este universo que, definitivamente,
"programa" a nossa agenda quotidiana (pessoal,
social, existencial). Para Pierre Lévy, estamos a
assistir à emergência de uma outra "inteligência
colectiva", de que as novas tecnologias da
informação constituem o instrumento privilegiado. Esta
“inteligência colectiva” são “comunidades
humanas que comunicam no seu seio, que se pensam a si
próprias, partilhando e negociando permanentemente as
suas relações e os seus contextos de significações
partilhadas” (ibid.:242).
As novas
tecnologias da informação ilustram o lugar central
ocupado pela informação e pela comunicação na
sociedade contemporânea, já que, a partir de novos
serviços informáticos, das telecomunicações e da
televisão, se anunciou o nascimento de uma nova
sociedade.
Em menos de 20
anos este tema da sociedade da informação impôs-se
com um sucesso considerável, legitimado pela
perspectiva, pelas indústrias da comunicação, pelas
tecnocracias, pelos media. A tal ponto que nos é
permitido falar de uma "ideologia técnica"
com alguma originalidade. Entendida, aqui, a ideologia
como um conjunto de ideias, de crenças, de doutrinas
próprias de uma época, de uma sociedade ou de uma
classe. A sua configuração, porém, é vinculada a um
contexto histórico. E não se confunde com uma
ideologia científica, tal como foi publicitada no séc.
XIX.
A ideologia
técnica tem um impacto social considerável,
precisamente porque é modesta e instrumental. É
verdade que, como toda a ideologia, ela pretende
transformar o mundo, mas fá-lo a partir de realidades
compreensíveis por toda a gente. Por outras palavras: a
sua modéstia aparente é uma garantia do seu sucesso,
associada à sua dimensão instrumental. É que a
técnica permite a comunicação em todas as direcções
e azimutes, enquanto a ciência não abre essa
possibilidade. A emergência de uma sociedade da
comunicação, sonhada e desejada, em consequência
disto, "desculpabiliza" as
"prisões" associadas à "sedução"
da técnica. Um exemplo disto poderá ser a Internet,
rede que, hoje, fascina e seduz, deslumbra e
disponibiliza espaços lúdicos e de prazer.
Há mais de 20
anos que se fala da "sociedade da informação e da
comunicação". As primeiras referências datam dos
anos 70. Mas são os anos 90 que "popularizam"
esta realidade, ao ponto de se transformar num dos
assuntos centrais do espaço público e dos media. O
nosso tempo assiste, todos os dias, à "sacralização"
dos méritos e das promessas das "auto-estradas da
informação", das virtudes da interactividade e
dos prodígios da internet. É como se, de repente,
passássemos do arcaísmo às "utopias
informacionais", depois aos mercados florescentes,
enfim às mutações sociais e culturais, revolucionando
tudo em simultâneo: o trabalho, a educação, os
lazeres, os serviços.
A NET aí
está. Para nosso consumo. Qual a fonte de tal sucesso?
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Uma
ciberdigressão |
Embora
minoritárias, demograficamente, as novas tecnologias
invadiram todo o espaço humano e social: nos media, nas
conversas, nas referências.
É, porém, a
significação cultural que se impõe e que nos
interessa. É preciso compreender as razões do sucesso
das novas tecnologias. O computador transformou-se num
"objecto-farol", tal como o automóvel nos
anos 50/60. As motivações de tal salto são,
essencialmente, de ordem cultural.
Cinco razões,
complementares, explicam este movimento actual (Wolton,
1997:246-254): :
Ruptura com os
"mass-media"
Aventura duma
geração
Símbolo da
modernidade
Resposta a uma
certa angústia antropológica
Sonho dum
"curto-circuito" para o desenvolvimento dos
países pobres
a) - ruptura com os "mass-media"
Por três
razões fundamentais:
primeiro, a
televisão faz parte do presente indefinido, enquanto a
NET está do lado do futuro;
segundo, o
utilizador tem o sentimento de se tornar activo, não se
limitando a um mero receptor de imagens, mas
assumindo-se como um actor/criador, como um decifrador e
intérprete das mensagens que circulam. É certo que a
televisão temática deixa a impressão de que a escolha
existe, mas é de uma lógica da recepção que se
trata. Com o computador, mergulha-se num outro espaço:
existe o teclado, não imagens;
terceiro, nesta
relação, o utilizador tem o sentimento de agir
individualmente, até mesmo de dialogar com um outro,
interioriza um espaço de interactividade. A
interacção proporcionada pelo teclado deixa a
sensação de responsabilidade e de acção. É que as
novas tecnologias respondem à necessidade de uma
comunicação imediata. "A internet é o inverso da
televisão; o intercâmbio tem a primazia sobre a
imagem" (ibid.:246). Não importa o conteúdo, mas
a própria mensagem que deixa o sentimento de um espaço
interactivo e, mesmo, público (onde a distância
"se esconde"). O sentimento de igualdade
sobressai num percurso onde os "internautas"
são timoneiros/parceiros da comunicação. Não há
hierarquias na navegação virtual. Há companheiros de
viagem. Estamos num espaço onde cada um toma a palavra
e se serve dela ao estilo "faça você mesmo".
Sujeito/actor do "ciberacontecimento
comunicacional".
b) - aventura cultural duma geração
O sucesso das
novas tecnologias da informação são o sinal duma
geração. Uma geração que nasceu com a televisão,
viu os seus pais consagrar-lhe uma parte considerável
do seu tempo, e que, de repente, tem a sensação de
criar o seu próprio território de aventuras, de poder
inventar alguma coisa, e, assim, distinguir-se das
gerações anteriores. Esta "nova geração"
esboça e constrói uma autêntica subcultura para se
afirmar na diferença. É um novo espaço, um novo
território, palco de novas aventuras e de novas
sensações/emoções, de novas conquistas e de novas
descobertas. Um espaço de actividades que têm um
futuro, onde se podem criar outras solidariedades e
outras formas de sociabilidade, onde há lugar para a
invenção de uma nova arte de viver, onde as “alfândegas”
dão lugar a “zonas francas” sem “polícias de
fronteira”. Geram-se “novos sistemas de proximidade”,
pois os seres humanos “não habitam apenas o espaço
físico ou geométrico, vivem também e simultaneamente
em espaços afectivos, estéticos, sociais, históricos”
(Lévy, 1997:180). Ou, como afirma Cardoso (1998:25),
“os utilizadores da Internet e do ciberespaço não se
limitam a ser processadores solitários da informação,
são também seres sociais. Não procuram apenas
informação, também buscam pertença, apoio e
afirmação, são também actores sociais”. Estas
dimensões sócio-culturais exteriores às
características propriamente técnicas são
importantes.
A cultura da
velocidade e o fim das distâncias são notas salientes
desta "cibercultura", tal como o
deslumbramento e a sedução das novas tecnologias. De
facto, poder comunicar com não importa quem, a
qualquer hora, em qualquer lugar, sobre não importa o
quê, tem algo de fascinante. Há sempre alguém com
quem se pode entrar em relação, dispensando-se
qualquer elemento de identificação. O importante é
ser actor num novo mundo.
A
significação cultural da internet parece mais
importante do que a batalha económica e industrial,
porque estas redes condensam todas as aspirações da
sociedade individualista de massa: o indivíduo, o nome,
a liberdade, a igualdade, a rapidez, a ausência de
constrangimentos. É a procura de um outro espaço e de
um outro tempo.
A desregulamentação
é outro momento desta "ciberaventura".
"A liberdade, o imaginário, o «fora de lei» mais
do que o «sem lei», com uma mistura de
transparência e de novo, dominam neste Far West da
comunicação" (ibid.:248). Querem-se
"liberdades", deseja-se a "desregulamentação";
é preciso que tudo circule. A regulamentação da
"cibernavegação" surge como um poderoso
obstáculo à livre circulação da
"mercadoria"; as censuras ao "livre
trânsito" são entendidas como limitações à
liberdade.
Esta geração
alimenta a esperança de criar uma outra cultura, uma
outra sociedade, baseada na "solidariedade
tecnológica"; um universo sem fronteiras.
c) - símbolo da modernidade
As tecnologias
da comunicação não ameaçam a natureza como o
nuclear; trata-se de objecto imaterial, convivial,
directo, instantâneo, criando uma realidade virtual que
não tem necessidade de se justificar por relação a
uma tradição. As redes, na sua disponibilidade
lúdica, favorecem a iniciativa individual e o
conhecimento. A magia das novas tecnologias da
comunicação e da modernidade que elas simbolizam,
reside no facto de estarmos em presença de instrumentos
que não reclamam qualquer esforço, libertando o homem
de toda a preocupação e lançando-o num universo
silencioso como o ciberespaço. Esta "ciberdigressão"
estabelece a ligação ecologia-comunicação,
preocupação em destaque na modernidade. É que a (ciber)sociedade
não degrada a (real)sociedade, mas respeita-a.
Por outro lado,
a Internet gera conhecimentos, talvez um dos símbolos
maiores do séc. XX.
Esta aventura
simboliza o sonho dum mundo fraternal, sem fronteiras,
sem hierarquias sociais ou culturais. Todos os
indivíduos podem entrar na rede. É a emergência duma
"sociedade da omnipresença". O ecrã torna-se
o lugar das representações da modernidade com o que
ela tem de melhor: o ideal da transparência e da
imediatidade.
A NET anuncia,
simultaneamente, as promessas de um trabalho mais livre
e descentralizado, anuncia uma nova cultura do trabalho
onde as hierarquias inúteis se dispensam. O mesmo
acontece com a educação.
Alcino Cartaxo
Nota: Este mesmo
artigo, com maior desenvolvimento e abrangendo vários
aspectos, encontra-se na página deste colaborador do
espaço «Aveiro e Cultura»:
..\..\HJCO\hjco\index.htm
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