Perdidas
há séculos nas florestas tropicais e matas da América
Central, algumas dezenas de cidades mortas ilustram um dos
mais misteriosos episódios da História. "Nos
seus templos imponentes, erguidos no cume de pirâmides que
atingiam por vezes uma altura de cinquenta metros, eram
realizadas cerimónias rituais, inclusive as iniciáticas,
cujos indícios nos transmitiram alguns enigmáticos
baixos-relevos. As estruturas arquitectónicas dessas cidades
esquecidas, as estejas e os altares de pedra magnificamente
esculpidos, as cerâmicas policromadas, os misteriosos sinais
hieroglíficos gravados nos monumentos são as testemunhas do
mais alto grau de civilização de seus autores" (P.
Ivanoff).
Essas
cidades que, no momento de sua glória, constituíram
certamente as capitais de Estados independentes governados por
algumas autoridades religiosas, foram outrora ocupadas pelos
representantes de um fundo cultural comum, que tinha nascido
provavelmente na floresta do Peten e regiões vizinhas, e que os historiadores e arqueólogos designam pelo nome de Civilização
Maia.
Os Maias tinham como base não a
dezena, mas a vintena e as potências de vinte. A razão, como
se sabe, é devida ao hábito que os seus ancestrais tinham de
contar não apenas com os dez dedos, mas também com os seus pés.
A numeração do povo Maia fundou-se
no princípio da adição. Devia associar um círculo ou um
ponto à unidade (sinal comum a todos os povos da América
Central, originado do grão de cacau, então empregado como
"moeda de troca").
A numeração dos Maias dificilmente deveria prestar-se à prática das operações
aritméticas e o sistema devia servir apenas para consignar os
resultados de cálculos já efectuados. Este povo deveria
fazer os seus cálculos através de um instrumento operatório
análogo aos ábacos do Velho Mundo.
A numeração Maia escrita não
foi concebida para responder às necessidades do cálculo
corrente, que dizia a respeito apenas aos comerciantes e ao
uso comum dos mortais. Foi elaborada, ao contrário, apenas
para satisfazer as necessidades do cômputo do tempo e das
observações, em razão da ligação estreita que existia,
nessa civilização, entre o fluir do tempo e o mundo divino.
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A "ciência Maia" foi cultivada no alto dos santuários. Os sacerdotes, via
de regra, tornavam-se astrónomos. Se os Maias tinham conseguido conceber um dos melhores calendários da
história e realizar verdadeiras proezas em astronomia,
tinham, por outro lado, sido escravos do seu misticismo e da
sua religião. E, tal como os outros povos da Meso América pré-colombiana,
"sentiram-se
imensamente fascinados pelos mistérios do Cosmos: o retorno cíclico
e previsível dos fenómenos celestes; o ritmo incessante das
estações e a influência destas últimas nas diversas fases
da cultura do milho; o próprio ciclo da vida e da morte, do
dia e da noite em sua alternância inexorável, mas necessária,
etc." (P. Gendrop).
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Para os Maias,
explica C. Galienkamp, "o
tempo jamais foi um meio puramente abstracto de ordenar os
acontecimentos numa sucessão metódica: aparecia-lhes logo
como um fenómeno sobrenatural portador de forças todas
poderosas de criação e de destruição, e cujos aspectos
eram directamente influenciados pelos deuses aos quais eram
atribuídas, segundo o caso, intenções benéficas ou malévolas.
Essas divindades eram associadas a números determinados e
tomavam formas que permitiam representá-las em hieróglifos.
Cada divisão do calendário Maia
- dias, meses, anos ou períodos mais longos - era concebida
como "fardos"', que eram transportados sobre as
costas desses divinos guardiães do templo. No fim de cada
ciclo, o tempo vindouro era assumido pelo deus ao qual o
calendário atribuía o número seguinte. Se o fardo de um
ciclo estava sob a responsabilidade de uma divindade maléfica,
podia-se esperar as mais graves consequências, até que o
nume fosse substituído por um carregador benevolente. Tal mês
ou tal ano fazia, portanto, esperar ou temer felicidade ou
desgraça, segundo o temperamento dos deuses que os
transportavam. Era uma crença curiosa, e explica, em parte, o
poder extremo do clero sobre um povo imbuído pela ideia de
que era impossível sobreviver sem sábios mediadores capazes
de interpretar as tendências irascíveis dos deuses.
Somente
os sacerdotes astrónomos podiam interpor-se entre o curso
normal da vida e as catástrofes provocadas por um desprezo
pelos sentimentos dos deuses. Após ter reconhecido os
atributos dos deuses e traçado suas corridas incessantes
sobre as rotas do tempo e do espaço, somente eles podiam
identificar os períodos carregados por deuses favoráveis
(... ), ou, como era mais frequente, aqueles em que o número
de divindades benevolentes excedia o das divindades contrárias.
Essa obsessão resgatava-os da sorte ou da malevolência,
posto que tinham esperança e que, uma vez advertidos das
perspectivas do futuro, pudessem dar aos acontecimentos um
curso propício."
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