"O
homem, na sua casa não habita a escada, mas serve-se dela
para subir e penetrar em toda a parte; assim, o espírito
humano não mora nos números, mas chega por eles à ciência
e a todas as artes."
Rivarol
Os algarismos, longe de serem os símbolos secos e áridos que
muitos denunciam como as armas e os vectores da nossa
sociedade técnica, foram em todos os tempos os suportes do
sonho, de fantasmas, da especulação metafísica, materiais da
literatura, sondas do futuro incerto ou ao menos do desejo de
predizer. Os algarismos são uma substância
poética. Tanto quanto as palavras, ou quase, foram, a
um só tempo, as ferramentas do poeta e os instrumentos do
contador e do homem de ciência. Assim, por
universalidade que transparece através da multiplicidade das
soluções propostas para o problema da numeração, por sua
história que converge, lenta mas seguramente na direcção
dessa fórmula que prevaleceu por toda a parte hoje em dia, os
algarismos levam o testemunho, melhoram e mais do que a Babel
das línguas, da unidade profunda da cultura humana. Os
algarismos não são toda a história do homem, mas religam-na.
Os algarismos são feitos de humanidade. E
são talvez as crianças que o sentem melhor, quando aprendem a
descobri-los. Para nós, que conhecemos o desembocar
dessa apaixonante aventura do espírito humano, eis aí uma
história caótica e turbulenta, cheia de transpassos
fulgurantes e recaídas em que a marcha tacteante, marcada de
ensaios e de erros, de impasses, esquecimentos e abandonos da
espécie humana, parece, por assim dizer, o passo titubeante
de um ébrio.
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