Intróito, vagueamento ou outra coisa,
estas palavras mais não pretenderam do que comprovar a, aliás, sua
teoria: o teatro é um espelho do tempo — porque é um espelho do Homem, e
o tempo é o sopro fraco ou vigoroso duma Humanidade fraca ou vigorosa.
Abreviando: o Teatro de Luís Francisco
Rebello pretende ser, claramente, o retrato expressivo desta época
conturbada em que «as perguntas correm atrás das respostas, sem nunca as
encontrarem...». Numa simbiose de poesia e realidade, de desânimo e de
esperança, sobretudo de fé no Homem, a sua obra cumprirá a pretendida
missão — a de ser espelho deste tempo em que, em todas as portas, de
todas as ruas, de todas as cidades, se ouve a mesma palavra: «CRISE».
Mas há um facto que me leva a suspeitar
duma maior largueza das suas ambições como autor teatral. E a verdade é
que a referida simbiose, servida por um estilo quase sempre igual,
denuncia claramente uma ligação entre todas as peças, como que a
agarrá-las para a eternidade — porque todo o espelho expressivo da
Humanidade, caído no mundo da Arte, tem direito à vida eterna.
Posto isto, aí vai a pergunta-base desta
carta, dirigida por um «carola», quase ignorante neste belo mas complexo
mundo, a um dos mais representativos, sem favor, autores de Teatro em
Portugal:
— Será que Luís Francisco Rebello
pretende fazer da sua Obra uma só peça, dividida nos muitos actos que
vão surgindo esporadicomente?
Talvez a lógica da pergunta não
acompanhe a lógica evidente da pretensão.
Enfim, estará o Luís Francisco Rebello
disposto a aclarar, para mim e demais leitores de “Companha”, este
desejo — raiz de todas as Obras verdadeiras?
Muito grato se confessa o sincero
admirador
PEREIRA DA SILVA
poema de
alberto pimenta
A noite de testa
suada,
e cada dia seguinte — um grande dia.
Cada dia seguinte
cheio de deveres e de intenções
e de um pesado adiamento.
As horas largas,
enroladas, enroladas,
enroladas e atravessadas de dor —
e cada bafo de gesto
sumido no pântano das faltas
e cada desespero de agarrar ervas sem raiz
a pedir um canto ainda mais lúgubre.
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Por vezes os sentidos são tão pequenos...
por vezes as famílias se desencontram...
por vezes até a estrada é esmagada
como asa de insecto casual.
As cascas de tudo
o que é sujo
agarram-se à pele da alma,
e depois são as unhas negras do hábito
os pés de certa gente por cima das mesas
o céu que teima em ser inutilmente igual e impassível —
e aquele desejo podre de esperar.
— Dá vontade de morrer a cada instante.
Entretanto, as
horas são largas
e tudo teima em prolongar-se. |
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