Carmen Vale
 

 INFANTE
 
 

Deus quer, o homem sonha, a obra nasce. 
Deus quis que a terra tosse toda uma, 
Que o mar unisse, já não separasse. 
Sagrou-te, e foste desvendando a espuma, 

E a orla branca foi de ilha em continente, 
Clareou, correndo, até ao fim do mundo, 
E viu-se a terra inteira, de repente, 
Surgir, redonda, do azul profundo. 

Quem te sagrou criou-te português. 
Do mar e nós em ti nos deu sinal. 
Cumpriu-se o Mar, e o Império se desfez. 
Senhor, falta cumprir-se Portugal! 

Fernando Pessoa, Mensagem, 2ª parte de
Mar Português.

 


GRÃO VASCO E O MAR

Grão Vasco, no seu tempo, conheceu todos os mares. 
Provavelmente nunca andou embarcado, jamais navegou em naus e caravelas, que viu decerto chegar e partir do Cais da Ribeira, em Lisboa, em ocasiões em que ali se deslocou. E viu então marinheiros despedir-se, saudosos, da família. Viu outros chegar, e estes cortavam, com olhos de espanto, a grande extensão dos mares, que atravessavam o recorte das novas terras, onde conheceram outros seres, bem diferentes, até na cor do rosto, dos homens já conhecidos.
Viu descarregar estranhos frutos vindos do Oriente, ouro e marfim chegados do Sul, artefactos e tecidos preciosos vindos do Norte; e essa grande surpresa de um «rei índio», de cor vermelha num rosto pacífico, que desembarcava vindo de Ocidente.
E Grão Vasco ouviu infindáveis histórias.
E em breve conhecia todos os mares que rodeavam toda a terra redonda, em volta da qual os homens navegavam.
Ele era apenas pintor. Não era marinheiro. 
Mas as histórias que ele pintou nos seus quadros falam destes mares.
Pedro, pescador, caminha assustado sobre uma linha de água. Homens das terras de Santa Cruz, que depois se chamou Brasil, tornaram-se familiares. As mesas das Ceias e outras que pintou mostram objectos trazidos por mar, coisas do quotidiano, peças de prestígio. As figuras dos apóstolos, dos Santos, das virgens que pintou vestem roupagens e adornam-se com jóias, que os mercadores compravam à saída das naus e trariam a Viseu. 
E os nossos olhos hoje vêem através da pintura de Grão Vasco, até além do mar, navegam por todos os mares  desconhecidos desde há quinhentos anos, os mesmos mares que ainda conhecemos hoje.

Alberto Correia
Director do Museu Grão Vasco
 

Anterior

Página principal

Seguinte


Principal | Album da exposição | Quem foi Grão Vasco? | "Adoração dos Magos"
A arte uma janela | Grão Vasco e o mar | Auto retrato | Desenhos das crianças | Olhar através da arte