Imagens de paz, envoltas em cânticos celestiais, 
        emolduram o meu conceito de Natal. Belos anjos, de asas farfalhudas, 
        esvoaçam pelo meu imaginário piscando o olho, às crianças e aos adultos 
        de coração rico.
        Os cânticos que ecoam e emolduram as ruas da 
        cidade levam-me para o silêncio das belas catedrais, onde as teclas de 
        órgãos polifónicos nos transfiguram em meros pontos, aconchegados no mar 
        da infinitude.
        É o imaginário, é o sonho... este Natal! É a 
        inocência a querer brotar nas ranhuras do tempo.
        Hoje já não tenho Natal!
        
          
            
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             Como todos os outros, percorro agitadamente as 
            novas catedrais do consumo e procuro a novidade mais sofisticada, de 
            preferência ao preço «da China»! 
            Neste frenesim, compro, compro, caminhando 
            para o niilismo dos objectos. Milhares de pessoas, neste mundo 
            globalizado, repetem exactamente os mesmos gestos, e, também eles 
            como eu, acabam por não saber onde começa o Natal e onde acaba o 
            objecto. 
            
            De tanto objecto escolhido, 
            desejado, posto de lado, resta o convívio da troca do objecto e o 
            riso inocente de uma criança que vibra com a desocultação do 
            objecto, que lhe pisca o olho ao abrigo da árvore de Natal!  | 
          
        
        Atenta ao Natal de todos os Portugueses, constato 
        com angústia:
        ● Os alunos portugueses 
        continuam nos últimos lugares ao nível dos conhecimentos matemáticos;
        ● Os portugueses 
        inquiridos sobre corrupção identificam a classe política como a classe 
        mais corrupta, seguida do sistema fiscal e justiça (“Público” de 
        10/12/2004, — Conclusões do “Barómetro de Corrupção 2004”);
        ● O desemprego atinge 
        índices nunca antes imaginados (relembre-se o caso dos professores e o 
        seu mirabolante concurso);
        ● Os portugueses passam
        fome...
        
        Pergunto-me:
        — Que fazer para alterar 
        estes cenários?
        — Como ajudar na 
        transformação do mundo se somos meros grãos de areia ao sabor do vento 
        das multinacionais, das leis da oferta e da procura?
        — Como fazer entender ao 
        mundo que a terra é “a nossa casa” e que a exploração desenfreada dos 
        recursos minerais, o efeito de estufa e o degelo dos pólos, arrastarão 
        consigo os alicerces desta “casa-terra” de que tanto necessitamos?
        — Como fazer entender aos 
        homens que a religião só tem sentido com a paz e a solidariedade e nunca 
        como fonte de guerras fratricidas?
        — Como fazer passar a 
        mensagem de que o ser humano tem uma dignidade inalienável e que nunca 
        deve ser usado como um meio para atingir um fim?
        Respostas? Não tenho. Só perguntas!
        E uma grande angústia neste Natal de 2004. 
        
        Isabel Magalhães