Acesso à hierarquia superior.

Henrique J. C. de Oliveira, Gramática da Comunicação, Col. Textos ISCIA, Aveiro, FEDRAVE, Vol. I, 1993, 311 pp., Vol. II, 1995, 328 pp.


VIII

A Língua Portuguesa
Diferentes Aspectos de Análise do Discurso

 

A narração: conceito; acção; tempo; espaço. Entidades da narrativa: o narrador; o narratário; a personagem; a participação e ciência do narrador. A acção e a sequência narrativa. Relação actancial e estrutura das acções. Trabalhos práticos sobre a narração. O diálogo. O monólogo, o solilóquio e a efusão lírica.

 
 

RELAÇÃO ACTANCIAL  E  ESTRUTURA DAS ACÇÕES

No domínio da narratologia é importante referir, ainda que de maneira simplificada e bastante sintética, os conceitos teóricos e operatórios introduzidos em 1966 por A. J. Greimas, relativamente ao conceito de actantes (a estrutura actancial ou relação actancial) e as funções ou classes de unidades funcionais, segundo Roland Barthes (a estrutura das acções).

Comecemos por referir a estrutura ou relação actancial tal como foi estabelecida por Greimas. Do mesmo modo que, ao nível das frases, cada constituinte desempenha uma determinada função, também ao nível da narrativa, no domínio da acção, encontramos actantes, isto é, agentes que desempenham diversas funções. Vejamos, de maneira prática, como entender estes conceitos. Transponhamos para uma frase uma determinada situação. Imaginemos que, num dado estabelecimento de ensino, o director pedagógico deu uma ordem a um professor. A frase correspondente a essa situação seria:

«Ontem à tarde, por ordem do Director Pedagógico, o novo professor transmitiu aos alunos do primeiro ano, no novo auditório do Instituto, conceitos básicos de narratologia

Se efectuarmos uma análise sintáctica da frase, verificaremos que nela existem vários constituintes que desempenham diferentes funções. A acção presente na frase é indicada pela forma verbal TRANSMITIU. Mas para que a acção de transmitir se processe, tem de existir alguém que actue nesse sentido, que cumpra a função de transmitir. Quem pratica a acção de transmitir é «o novo professor». É ele o sujeito da oração, aquele que funciona como agente praticante da acção. Com essa acção, ele quer transmitir «conceitos básicos de narratologia». Estes constituem o complemento de objecto directo, o objecto que o sujeito procura alcançar ou, neste caso concreto, dar a alcançar. E a quem é que o sujeito quer destinar ou transmitir os «conceitos básicos de narratologia»? «Aos alunos do primeiro ano». São estes o complemento indirecto, aqueles a quem os conceitos básicos são transmitidos ou destinados. Temos, portanto, numa primeira análise e centrando-nos apenas nos elementos destacados em letra negrita:

 

 

Transpondo estas estruturas sintácticas para o domínio da narrativa, a nível da acção, utilizando a terminologia greimasiana, «o novo professor», será o sujeito ou agente da transmissão, os «conceitos básicos de narratologia» o objecto da transmissão e «aos alunos do primeiro ano» o destinatário. Deste modo, poderemos verificar que entre o nível sintáctico e o nível da estrutura actancial se verifica a seguinte correspondência:

Nível sintáctico

SUJEITO

 

COMPL. DIRECTO

 

COMPL. INDIRECTO

 

|

 

|

 

|

Nível actancial

SUJEITO

 

OBJECTO

 

DESTINATÁRIO

Mas a análise da frase inicialmente apresentada está incompleta. Estão ainda por analisar os elementos não destacados na frase: «Ontem à tarde»; «por ordem do Director Pedagógico»; «no novo auditório do Instituto». Estes três elementos desempenham também funções importantes na frase. «Ontem à tarde» é um elemento importante, que nos permite localizar no tempo a acção realizada. Apresenta-nos um referente temporal que corresponde, sintacticamente, ao complemento circunstancial de tempo, e que nos fornece a resposta a uma pergunta fundamental: «quando?». «No novo auditório do Instituto» constitui um referente situacional também importante, um informante de igual importância ao anterior, que responde à pergunta fundamental «onde?» e que corresponde, sintacticamente, ao complemento circunstancial de lugar. Estes dois elementos desempenham, portanto, funções importantes: são os informantes que nos permitem situar a acção no espaço e no tempo. A nível do esquema da comunicação, fornecem-nos elementos acerca dos referentes situacionais. A frase contém todos os elementos necessários para respondermos às questões «Quem?», «Como?», «Quando?», «Onde?», «Porquê?».

Falta-nos, neste momento, o elemento «por ordem do Director Pedagógico». Este elemento traz-nos um aspecto importante: mostra-nos que quem esteve na origem de toda a acção não foi o «novo professor», mas sim o «Director Pedagógico». «O novo professor» não foi mais do que um instrumento, não foi mais do que um agente do director pedagógico, por ele encarregado de desempenhar uma missão. Assim sendo, verificamos que o «Director Pedagógico» desempenhou o papel de destinador. Foi por influência dele que toda a acção se concretizou. Transpondo tudo isto para um esquema de acordo com o modelo actancial de Greimas, obteremos o seguinte:
 

DESTINADOR

---------

OBJECTO

---------

DESTINATÁRIO

Dir. pedag.

 

conceitos básicos...

 

alunos do 1º ano

 

 

|

 

 

ADJUVANTE

------->

SUJEITO

<-------

OPONENTE

 

 

o novo prof.

 

 

Na frase não se encontram elementos para fazermos corresponder aos dois actantes: adjuvante e oponente. Num contexto mais amplo, poderemos considerar que terão funcionado como adjuvantes todos os elementos que, directa ou indirectamente, terão colaborado com o novo professor, fornecendo-lhe os meios para ele poder transmitir os conceitos ao alunos do primeiro ano. Como oponente, poderíamos referir o Destino, que fez com que a máquina fotocopiadora se tivesse avariado na altura em que o professor pretendia tirar fotocópias de textos de apoio, criando-lhe assim um obstáculo e obrigando-o a recorrer a outros meios para fornecer o material de apoio aos alunos.

Encontrámos, ao longo destas breves linhas, diferentes conceitos, tais como destinador e destinatário, sujeito e objecto, adjuvante e oponente. Vejamos, agora, como definir cada um deles.


Os
actantes são as entidades a quem cabe um determinado papel durante ou para o desenrolar da acção. Podem ser seres humanos, animais, objectos ou até mesmo conceitos ou valores morais. Um actante pode desempenhar um só papel ou acumular simultaneamente mais do que um, podendo ser, por exemplo, sujeito e destinatário. Numa sequência narrativa, é possível e até frequente diversas funções serem assumidas por um mesmo actante. Um sujeito pode também ser ao mesmo tempo o destinatário e até oponente em relação ao destinador. Noutra sequência pode o destinador assumir a função de oponente relativamente ao destinatário. As funções e as sequências narrativas não se processam de maneira rígida e uniforme, sendo por isso possível gerar-se numa narrativa uma situação de "suspense", de expectativa e haver um desfecho imprevisto.

Os diferentes actantes podem ser representados de maneira esquemática num modelo, o modelo actancial de Greimas, que nos permite ver as relações estabelecidas entre as diferentes entidades na dinâmica da narrativa:

DESTINADOR

--------

OBJECTO

--------

DESTINATÁRIO

 

 

Ý

 

 

ADJUVANTE

------>

SUJEITO

<------

OPONENTE

Greimas agrupa os actantes em três categorias, constituindo três eixos correspondentes à fórmula «saber-querer-poder»:

1ª - Destinador versus Destinatário - eixo do saber

2ª - Sujeito versus Objecto - eixo do querer

3ª - Adjuvante versus Oponente - eixo do poder

O destinador é o actante que faz agir o sujeito. É ele «a instância que comunica ao destinatário/sujeito um objecto de natureza cognitiva o conhecimento do acto a cumprir e um objecto de natureza modal - o querer que o institui como sujeito virtualmente performador[1]».

O destinatário constitui o pólo oposto ao destinador, sendo a entidade em benefício ou em prejuízo da qual o sujeito vai realizar a sua missão.

O sujeito é o actante que se encontra no pólo oposto ao objecto, situando-se um e outro no eixo do querer, na medida em que o sujeito é o actante que tem por objectivo a realização de uma determinada missão, sendo como tal investido semanticamente por uma relação de desejo. O sujeito é aquele que pretende, que quer alcançar o objecto, devendo realizar para tal uma acção ou uma sequência de acções conducentes a esse mesmo objecto.

Em contrapartida, o objecto constitui aquilo que o sujeito pretende realizar, aquilo que ele quer alcançar, quer esse "querer" seja para seu benefício, quer para outrem. No caso do exemplo da frase inicialmente apresentada, o sujeito, como vimos, é «o novo professor», o objecto «os conceitos básicos de narratologia» e o destinatário «os alunos do primeiro ano».

O adjuvante e o oponente são dois actantes cujo papel é oposto. Os adjuvantes são entidades que dão ao sujeito os meios para «poder» realizar a sua missão. Estes adjuvantes podem ser entidades ou personagens que colaboram ou actuam a favor do herói ou personagem principal, ou seja, do sujeito, mas podem também ser forças mágicas ou atributos inerentes ao sujeito, que lhe conferem capacidades para «poder fazer», para realizar a sua missão, tais como, por exemplo, a coragem, a força, a astúcia, a inteligência, etc. Os oponentes, situados no pólo oposto, são as entidades que procuram, por qualquer meio, impedir que o sujeito possa alcançar os seus objectivos o objecto. Na medida em que adjuvantes e oponentes procuram conferir ou retirar ao sujeito o poder de alcançar o objecto é que estes dois actantes se situam no eixo do poder.

 

Embora o termo função, introduzido por Propp no domínio da análise narrativa, tenha sido retomado por vários investigadores, inclusivamente por Greimas, vamo-nos limitar aos conceitos fornecidos por Roland Barthes, apresentando de maneira muito sucinta o essencial.

Em qualquer narrativa, os acontecimentos sucedem-se constituindo unidades narrativas, segmentos da história que desempenham um papel significativo na construção de todo o enredo, de todo o universo espacial e temporal em que a história se desenrola. Esses diferentes segmentos, que se inter-relacionam, constituem unidades funcionais da narrativa, desempenhando um papel importante na construção da diegese. Segundo Barthes, o desenrolar dos acontecimentos pode ser agrupado em torno de dois conjuntos ou classes de unidades funcionais:

                        · unidades ou funções distribucionais;

                        · unidades ou funções integrativas.

Dentro das funções distribucionais, R. Barthes distingue os núcleos ou funções cardinais das catálises.

As funções cardinais ou núcleos constituem as unidades importantes da narrativa, uma vez que representam o desenrolar dos acontecimentos, isto é, o desenrolar de toda a história. Estes momentos encontram-se ligados lógica e cronologicamente, pelo que às funções cardinais corresponde um avanço ou progressão na acção. As funções cardinais

 constituem unidades sintagmaticamente organizadas, isto é, a uma função cardinal sucede-se sempre outra função cardinal. As funções cardinais podem constituir blocos relativamente autónomos, a que se dá o nome de sequências. Estas, como já anteriormente vimos, podem ter diversas configurações, algumas bastante complexas, sendo as configurações típicas o encadeamento, a alternância e o encaixe[2].

As catálises correspondem a momentos de retardamento da acção e constituem unidades de natureza completiva. Embora o seu papel para o desenrolar da história não seja fulcral, a ponto de, se suprimidas, em nada a alterarem, desempenham, no entanto, um certo papel, na medida em que podem apresentar uma notação de carácter expletivo, uma função ornamental ou uma função de relançamento da história, permitindo ainda resumir ou antecipar acontecimentos. Se recordarmos o pequeno texto narrativo de Camilo, apresentado neste capítulo, pp. 183-185, em que se fala da morte do lobo, poderemos verificar que as partes por nós sublinhadas constituem elementos que,  eliminando-se, em nada alteram o desenrolar do episódio, constituindo afirmações irrelevantes do narrador.

As unidades ou funções integrativas são constituídas por dois tipos de unidades: os indícios e os informantes.

Os indícios constituem unidades que pré-anunciam, que permitem sugerir ao leitor um ambiente, um sentimento, uma maneira de ser, uma filosofia, permitindo-lhe por vezes adivinhar um determinado desenrolar dos acontecimentos ou, até mesmo, prever um desfecho da acção. Estes indícios são-nos transmitidos através do emprego de certas expressões ou de certas palavras carregadas de valor conotativo. Por exemplo, a utilização intencional de um diminutivo pode denunciar, conforme o contexto, uma intenção crítica, uma intenção de ridicularizar, mas pode também revelar um sentimento de ternura ou dar-nos a conhecer um temperamento sentimental de tipo efeminado.

Os informantes são unidades narrativas importantes. Permitem fornecer indicações referentes ao espaço e ao tempo em que se desenrola a acção. São, portanto, «operadores realistas», na medida em que permitem «enraizar a ficção no real», transmitindo à narrativa um elevado grau de verosimilhança. Embora constituam um momento de pausa no avanço da acção, são fundamentais para a elaboração da história. Correspondendo aos momentos de descrição, permitem ao leitor tomar conhecimento e recriar pela imaginação os diferentes tipos de espaço onde decorre a acção, mas também ficar a conhecer e visualizar as características físicas e psicológicas, de maneira directa, das diferentes personagens. Mas os informantes não se limitam às descrições dos espaços, dos ambientes e das personagens e dos seres. Permitem também fornecer marcos temporais para situação da acção no tempo. Estas balizas temporais podem corresponder à indicação das horas, mas também dos dias, anos e épocas em que se situa a acção. Na frase inicialmente apresentada, os elementos «ontem à tarde» e «no novo auditório do Instituto» desempenham justamente o papel de informantes. Completam a informação presente na frase, fornecendo ao leitor, ou ao ouvinte no caso de uma situação de comunicação real, elementos relativos ao tempo e ao espaço ou local onde decorreu a acção. Embora sem eles a frase continuasse a ter sentido, a verdade é que ficaria sensivelmente empobrecida no seu conteúdo informativo.

Vimos de maneira teórica de que modo a personagem pode ser considerada, tendo em conta os três aspectos indicados: a caracterização, a concepção e formulação e o papel por ela desempenhado. Convirá agora referir que, perante a necessidade de criar um texto narrativo, há todo um conjunto de aspectos essenciais que contribuem para a valorização da narração. Estes aspectos têm a ver com a escolha do vocabulário adequado em função do momento e daquilo que pretendemos transmitir.        

A narração é um modo de expressão que se caracteriza essencialmente pelo facto de ser dinâmica, o que implica o fluxo do tempo e o suceder dos acontecimentos. No entanto, há momentos em que se torna necessário efectuar pausas no avanço da acção, quer para efectuar a apresentação das personagens, quer para descrever as condições ambientais em que decorre a acção: o espaço e o tempo. Significa isto que a descrição é um modo de expressão importante e fundamental para a narração, pelo que podemos afirmar que se torna quase impossível encontrar uma narração que não contenha momentos descritivos. Por outro lado, a narração pode e deve ser enriquecida com os outros modos de expressão o diálogo, o monólogo e a efusão lírica , o que faz com que tenhamos de dominar as várias técnicas relacionadas com os diferentes modos de expressão, estudados neste e noutros capítulos.

Vejamos de modo concreto alguns processos de valorização da narração.

Se se torna necessário apresentar as personagens, convirá lembrarmo-nos de que cada uma deverá ser descrita tendo em conta a suas características físicas e psicológicas. Mas as características das personagens também podem ser observadas através dos seus comportamentos, pelo que as suas acções deverão estar de acordo com as suas características. Embora não se pretenda fazer aqui uma classificação tipológica do ser humano, convirá lembrar que há temperamentos e caracteres variáveis de pessoa para pessoa, tendo cada uma reacções específicas perante os acontecimentos.

 

 
 

Figura 71: Quadro síntese dos modelos estruturais: relação actancial (Greimas) e estrutura das acções (R. Barthes).

 

Um apático caracterizar-se-á pela ausência de ideias próprias, pela falta de vontade própria, não sentindo nem simpatia nem antipatia por ninguém e mostrando-se indiferente perante os factos. No lado oposto, um activo só se sentirá bem em acção permanente, procurando meter-se em tudo e tudo experimentar, metendo-se, por vezes, em situações complicadas donde só conseguirá sair à custa de bastantes trabalhos.

Um indivíduo intelectual procurará colocar as ideias acima dos sentimentos. Predomina nele o pensamento e a reflexão. Tudo observa com atenção, procurando colher informações e experiência. Reage fria e sensatamente às situações, pondera cuidadosamente os seus actos e procura emitir muitas vezes juízos de valor, criticando ou elogiando os que os rodeiam. No lado oposto ao intelectual, poderemos situar o afectivo. Neste tudo é sentimento e sensibilidade. São estes os aspectos que comandam as suas acções. Claro que teremos que distinguir dois tipos de afectivo: o optimista, alegre e cheio de ilusões, que vê em tudo beleza, encanto e emoção; o pessimista, macambúzio e tristonho, que vive mergulhado no acabrunhamento e na melancolia, perpassada por vezes de uma desilusão e azedume.

E o voluntarioso? É um tipo também activo, mas, quando em grupo, será ele quem terá de mandar, de tomar as iniciativas e de liderar. É autoritário, sabe claramente aquilo que quer e, se obstinado e persistente, procura alcançar o que pretende custe o que custar.

Finalmente, e certamente outros tipos humanos ainda ficarão por referir, temos o caso do indivíduo equilibrado. Possuindo qualidades inerentes aos outros tipos apontados, o equilibrado procura pela inteligência e sensatez o ponto de equilíbrio. Sabe ser rigoroso, mas simultaneamente tolerante, não se deixando levar pelo entusiasmo. Tem, em suma, um conjunto de características comuns aos restantes tipos, mas de maneira harmoniosa.

A partir dos traços tipológicos apresentados, será fácil concluir que a acção deverá desenrolar-se tendo em conta estes temperamentos. Se se trata de apresentar uma acção caracterizada pela vivacidade e dinamismo, os verbos, sobretudo, e as restantes palavras deverão transmitir essas características. A impressão de rapidez ou de lentidão pode também ser transmitida através da extensão das frases. Frases curtas, independentes, permitem transmitir uma ideia de rapidez, de vivacidade e emoção. Frases longas reflectem uma maior lentidão da acção.

Trata-se de apresentar uma discussão acesa entre vários intervenientes? Neste caso impor-se-á o recurso ao diálogo, com frases curtas, com pausas e frases por vezes incompletas, cortadas pelos outros interlocutores, tal como ficariam registadas se efectuássemos um registo magnético de uma discussão acesa e espontânea numa situação real. 

 

Sugestão de trabalho 21

Procure realizar as quatro actividades que lhe são propostas, tendo em conta os aspectos focados em cada uma. 

Actividade 1:

Numa determinada rua da sua localidade ocorreu um incêndio que, embora sem graves consequências, pelas situações imprevistas que se geraram mereceu um texto para publicar no jornal local. Narre esse acontecimento tendo em conta, caso lhe agrade, o esquema de trabalho proposto:

 

I - INTRODUÇÃO

a) - Situação:

Situar o acontecimento que vai narrar: Onde? Quando? Que faziam entretanto as pessoas intervenientes?

 

II - DESENVOLVIMENTO

1º momento

A detecção do incêndio: Quem?

- Que factos permitiram a detecção? Quais as primeiras reacções?

2º momento 

O desenvolvimento do incêndio:

- descrição do incêndio (fumo; chamas; ruído de objectos a partirem-se; etc);

- as reacções das pessoas (a emoção; a agitação; as opiniões desencontradas);

3º momento

A intervenção de determinada pessoa: Quem?  Como?

A chegada dos bombeiros; etc.

4º momento 

O desfecho

 

III - CONCLUSÃO (eventual)

Um balanço final do acontecimento; algumas reflexões pessoais.

 

Actividade 2:

Leia o texto seguinte um conto da tradição oral apresentado por Trindade Coelho e procure analisá-lo tendo em conta os aspectos que lhe são apresentados.

O CONTO DAS TRÊS MAÇÃZINHAS DE OIRO

            Era uma vez um pai que tinha sete filhos. Como não tinha com que os manter, nem trabalho para lhes dar, lembrou-se de os despedir todos por esse mundo fora, para que fossem procurar vida. Chamou-os então, e disse-lhes assim:

            Filhos, eu não tenho que vos dar, e nem sequer trabalho; e por isso é preciso que cada um de vós vá tratar da vida, e ganhe para o seu sustento, porque eu já estou muito velho e não posso mais.

            Os rapazes ficaram todos muito pensativos, mas nenhum deles disse palavra. Quando chegou a hora da partida, o pai chamou o mais velho e disse-lhe assim:

            Vê lá, filho, qual queres mais: a minha bênção, ou um bocado de pão para o caminho?

            Mais quero o pão respondeu o filho mais velho.

            O pai partiu uma fatia de pão e deu-a ao filho, que logo em seguida se foi embora.

            Chamou depois o seguinte em idade, e fez-lhe a mesma pergunta; e esse respondeu também que mais queria o pão, e responderam o mesmo os outros todos até ao sexto.

            Veio depois o mais novinho, que tinha só sete anos, e disse-lhe o pai as mesmas palavras:

            Vê lá, filho, qual queres mais: se o meu pão se a minha bênção.

            O pequeno pôs-se a chorar, e respondeu que mais queria a bênção; e o pai deitou a bênção ao filho mais novo, que se foi embora sempre a chorar.

            Saíram os rapazes; e cada um tomou por caminho diferente, à procura de trabalho, ou de algum amo para se apreitar ['ajustar criado'].           

            O mais pequeno, esse a bem dizer nem sabia aonde ia, porque nem idade tinha para se governar, e às vezes sentava-se debaixo de uma árvore, e punha-se a chorar já muito cansado. Até que à boca da noite encontrou uma mulher muito bonita, que se voltou para ele e disse-lhe assim:

            Menino, tu onde vais?

            A ganhar a vida respondeu o pequeno. A ver se encontro um amo para me apreitar.

            Tão pequenino?!...

            Ele então contou-lhe o que se tinha passado com o pai mais com os outros irmãos, e a aparecida disse-lhe assim:

            Queres tu ajustar-te comigo?...

            Sim senhora, quero. Quem me dera! respondeu logo o rapazinho.

            E então quanto queres ganhar?

            Eu, o que me der!

            Bem, então estamos justos! Mas olha lá que tens de me servir sete anos, e no fim dou-te três maçãzinhas de oiro, que é a soldada. Queres?

            Quero, sim senhora.

            E o pequeno foi algum tempo detrás da ama. Mas vai senão quando, os dois desapareceram no ar, assim como uma nuvem de fogo! O pequeno nem tinha desconfiado, mas a ama era Nossa Senhora.

            Por lá andou o pequeno sete anos, que lhe parecera, a ele, só sete dias; e no fim a ama mandou-o embora, e deu-lhe as maçãzinhas do ajuste, que eram três.

            Toma! Dá-as a teu pai, e diz-lhe que é para te sustentar com elas, mais aos teus irmãos. Toma. Mas não as dês senão ao teu pai, ouviste?

            O pequeno foi-se logo embora muito contente, morto por dar ao pai as três maçãzinhas, que haviam de chegar para ele e para os outros irmãos; e quando já ia perto de casa, encontrou dois que já tinham voltado, mas por sinal ambos muito pobres.

            Os três puseram-se então a conversar; e o mais novo contou aos irmãos a boa ama que tinha encontrado, e mostrou-lhes as três maçãzinhas.

            Os irmãos ficaram cegos com o brilho do oiro; e logo ali rogaram muito ao mais pequeno que lhes desse a cada um sua maçãzinha. Mas ele respondeu que só as dava ao pai, e o pai que as repartisse por todos como quisesse.

            À vista disto, e como o irmão não queria dar as maçãs, à boamente, logo ali resolveram matá-lo e tirar-lhas depois, e se bem o pensaram melhor o fizeram; mas qual não foi o espanto deles, quando viram que nem mesmo depois de morto arrancavam as maçãzinhas da mão do irmão?!

            Os dois resolveram então enterrar o pequeno, e foram-se para casa depois de o enterrar, e muito crentes que o seu crime se não saberia, porque ninguém o tinha presenciado. Mas daí a mês pouco mais, um pastor passa por ali, e vê uma cana muito viçosa e muito bonita, que nascia onde o pequeno estava enterrado! Cortou-a e fez uma flauta. Mas vai senão quando, o pastor põe-na à boca, e a flauta impeça a dizer:

 

                        Toca, toca, ó pastor,

                        Que meus irmãos me mataram,

                        P'r amor de três maçãzinhas,

                        E ao cabo não nas levaram.

 

            O pastor ficou muito aterrado com o sucedido, e foi-se dali e a um carvoeiro, que andava no monte a fazer carvão, e contou-lhe o caso. O carvoeiro, inda mais espantado, pega na flauta e põe-se a soprar, e a flauta que entra logo a dizer:

 

                        Toca, toca, carvoeiro,

                        Que meus irmãos me mataram,

                        P'r amor de três maçãzinhas,

                        E ao cabo não nas levaram.

 

            Ficou o carvoeiro que nem sabia donde era! E como estava de caminho para ir para a aldeia, e a flauta tinha a virtude de falar, pediu ao pastor que lha emprestasse, a ver se lá plo povo adivinhavam aquilo.         

Levou a flauta o carvoeiro, e a primeira casa onde entrou foi a do ferreiro; e logo ali contou o que tinha acontecido e mostrou-lhe a flauta. Mal o ferreiro a pôs à boca, a flauta começou logo:

 

                        Toca, toca, ó ferreiro,

                        Que meus irmãos me mataram,

                        P'r amor de três maçãzinhas,

                        E ao cabo não nas levaram.

 

            A este tempo entrava na forja o pai do morto, que ficou também muito admirado quando lhe contaram o que dizia a flauta! Pega também nela o pobre do velho e põe-se a soprar, e a flauta diz logo assim:

 

                        Toca, toca, ó meu pai,

                        Que meus irmãos me mataram,

                       Por três maçãzinhas d'oiro

                        E ao cabo não nas levaram.

 

            O velho pôs-se muito branco, e acudiu-lhe logo que as palavras da flauta diziam respeito à sua família. Nessa ocasião entrava na frágua um dos filhos do velho, que era um dos dois que já tinham voltado, e que trazia carvão para aguçar umas ferramentas. O pai parece que o coração lhe adivinhou, porque, mal o rapaz entra na forja, dá-lhe a flauta para que tocasse:

            Toma! Toca essa flauta!

            Leva o rapaz a flauta à boca, na boa fé, e ela começa logo:

 

                        Toca, toca, meu irmão,

                        Que tu mesmo me mataste,

                        P'r amor de três maçãzinhas,

                        Que ao cabo não nas levaste!

 

            O rapaz ficou muito aterrado, e viu-se-lhe logo na cara o sinal do crime. Mas como os filhos do velho eram sete e só dois é que tinham voltado, precisavam saber qual era o morto. Foram-se então dali onde ao pastor, que os levou onde tinha cortado a cana; e cava-que-cava mesmo no sítio, não tardou que aparecesse o corpo do pequeno, e numa das mãos as três maçãzinhas!

            Por mais que alguns fizeram, não foram capazes de lhe tirar as maçãs; mas mal que o pai lhe tocou, abriu a mão e largou-as logo. Viu-se então que se tratava de um grande milagre; e, levados à presença do cadáver, os dois irmãos confessaram o que se tinha passado e logo ali apareceu a Virgem Santíssima e arrebatou para o céu o corpo do pequeno, no meio de uma nuvem de fogo!

            Logo em seguida a terra abriu-se e engoliu os dois irmãos!

 

Agora, que acabou de ler o conto, procure analisá-lo tendo em conta as seguintes questões:

 

1 - Analise as personagens seguindo as alíneas:

            1.1 - Sua identificação;

            1.2 - Sua classificação quanto:

            1.2.1 - ao tipo de caracterização;

            1.2.2 - à concepção;

            1.2.3 - ao papel desempenhado na acção.

 

2 - Analise as seguintes categorias da narrativa:

            2.1 - o espaço;

            2.2 - o tempo;

2.3 - o narrador, tendo em conta a sua presença e a sua ciência ou ponto de vista.

 

3 - Identifique os diferentes momentos no desenvolvimento da acção.

 

4 - Analise a acção tendo em conta os aspectos referidos no quadro da figura 22, na página 189. (Elabore um esquema no qual seja posto em destaque a estrutura do conto, mostrando os diferentes momentos da acção Note que o esquema da figura 23, pág. 190, poderá também dar alguma ajuda.)

 

5 - Procure efectuar uma análise do conto, utilizando os elementos do quadro da figura 71.

Actividade 3:

Possivelmente, na região onde vive, terá já ouvido contar alguma lenda ou alguma história carregada de maravilhoso, à semelhança do que encontrou no texto da actividade anterior. Conte-a de acordo com o que ouviu ou o que conhece seguindo um plano bem definido e tendo o cuidado de apresentar o ambiente, as personagens e os acontecimentos de maneira ordenada. Procure conferir vida à sua narração, recorrendo às técnicas estudadas: descrição, diálogo, etc.

 

Actividade 4:

Narre um acontecimento, um episódio humorístico ou uma experiência por si vivida que lhe pareça digna de registo. Não se lembra de nada? Passe em revista as suas férias: não lhe terá acontecido nada digno de referência? Não observou ou presenciou nada que tivesse prendido a sua atenção ou despertado a sua curiosidade? O que quer que vá apresentar, não o faça sem ter previamente elaborado um plano de desenvolvimento com todos os elementos importantes: estrutura, personagens, situação no espaço e no tempo, etc.


[1] - Vd. Carlos Reis e Ana Cristina M. Lopes, Dicionário de Narratologia, Coimbra, Livraria Almedina, 1987, pág. 94. Para uma abordagem acessível dos conceitos aqui referidos, aconselha-se a consulta nesta obra das diferentes entradas: actante; actor; adjuvante/oponente; destinador/destinatário; etc.

[2] - Recorde-se o que se disse anteriormente, neste mesmo capítulo, acerca da sequência narrativa, pp. 189 a 192, e cujos modelos típicos se encontram representados nas figuras 23, 24 e 25.

 


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