Sugestão de
trabalho 17 (Parte I)
Transcrevem-se a seguir alguns
exemplos de
textos descritivos. Leia-os
atentamente e procure realizar as actividades que lhe são indicadas a seguir a
cada um. Para um maior rendimento do seu trabalho, procure responder por
escrito às questões.
texto 1:
Esta
nossa cidade
─ seja dito para
aquelas pessoas, que porventura a conhecem menos
─ divide-se
naturalmente em três regiões, distintas por fisionomias particulares.
A
região oriental, a central e a ocidental.
O
bairro central é o portuense propriamente dito; o oriental, o brasileiro; o
ocidental, o inglês.
No
primeiro predominam a loja, o balcão, o escritório, a casa de muitas janelas e
de extensas varandas, as crueldades arquitectónicas, a que se sujeitam velhos
casarões com o intento de os modernizar; o saguão, a viela independente das
posturas municipais e à absoluta disposição dos moradores das vizinhanças; a
rua estreita, muito vigiada de polícias; as ruas, em cujas esquinas estacionam
galegos armados de pau e corda e os cadeirinhas com o capote clássico; as ruas
ameaçadas de procissões, e as mais propensas a lama; aquelas onde mais se
compra e vende; onde mais se trabalha de dia, onde mais se dorme de noite. Há
ainda neste bairro muitos ares do velho burgo do Bispo, não obstante as
aparências modernas que revestiu.
O
bairro oriental é principalmente brasileiro, por mais procurado pelos
capitalistas, que recolhem da América. Predominam neste umas enormes moles
graníticas, a que chamam palacetes; o portal largo, as paredes de azulejo
─ azul, verde ou
amarelo, liso ou de relevo; o telhado de beiral azul; as varandas azuis e
douradas; os jardins, cuja planta se descreve com termos geométricos e se mede
a compasso e escala, adornados de estatuetas de louça, representando as quatro
estações; portões de ferro, com o nome do proprietário e a era da edificação em
letras também douradas; abunda a casa com janelas góticas e portas
rectangulares, e a de janelas rectangulares e portas góticas, algumas com
ameias, e o mirante chinês. As ruas são mais sujeitas à poeira. Pelas janelas
quase sempre algum capitalista ocioso.
O
bairro ocidental é o inglês, por ser especialmente aí o habitat destes nossos
hóspedes. Predomina a casa pintada de verde-escuro, de roxo-terra,
de cor de café, de cinzento, de preto... até de preto!
─
Arquitectura
despretensiosa, mas elegante; janelas rectangulares; o peitoril mais usado do
que a sacada.
─
Já uma
manifestação de um viver mais recolhido, mais íntimo, porque o peitoril tem
muito menos de indiscreto do que a varanda. Algumas casas ao fundo dos jardins;
jardins assombrados de acácias, tílias e magnólias e cortados de avenidas
tortuosas; as portas da rua sempre fechadas. Chaminés fumegando quase
constantemente. Persianas e transparentes de fazerem desesperar
curiosidades. Ninguém pelas janelas. Nas ruas encontram-se com frequência
uma inglesa de cachos e um bando de crianças de cabelos loiros e de babeiros
brancos.
Tais
são nos seus principais caracteres as três regiões do Porto, sendo
desnecessário acrescentar que nesta, como em qualquer outra classificação, nada
há de absoluto. Desenhando o tipo específico, nem estabelecemos demarcações bem
definidas, nem recusamos admitir algumas, e até numerosas excepções, hoje mais
numerosas ainda do que então, em 1855.
JÚLIO DINIS,
Uma família
inglesa, cap. IV.
1 - Leia atentamente o texto
acima transcrito e dê-lhe um título significativo.
2 - A descrição é feita segundo uma
estrutura bem definida. Procure reconstituí-la, tendo em conta a
divisão nas três partes fundamentais (introdução, desenvolvimento e conclusão)
e nas respectivas subdivisões em momentos.
3 -
Preste atenção ao parágrafo «No primeiro predominam... até
...modernas que revestiu»;
3.1 -
Efectue o levantamento dos elementos enumerados referentes ao bairro central;
3.2 - Há
neste mesmo parágrafo referência a 4 ou 5 tipos de ruas, que constituem
elementos distintos dentro dos vários enumerados. Identifique-os;
3.3 -
Efectue o levantamento das seguintes categorias gramaticais: verbos, nomes e
adjectivos, presentes nas seis primeiras linhas (desde «No primeiro predominam ... ...com
o capote clássico;»);
3.4 -
Quais as duas classes gramaticais predominantes?
4 - Numa
descrição, tal como foi dito nas páginas teóricas anteriores, pelo sentido da
visão apreendemos as formas e as cores. Efectue o levantamento das cores
presentes nos parágrafos referentes ao bairro oriental e ao bairro ocidental,
bem como dos elementos referentes às formas, às dimensões e aos estilos dos
objectos enumerados.
Texto 2:
A
RIA DE AVEIRO
... A chuva em poeira cai sobre os
campos verdes da Gafanha. A paisagem molhada escorre água e a ria lisa como um
espelho reflecte o céu baço. Mulheres vestidas de escuro, com grandes molhos de
erva à cabeça, saem dos agueiros como rãs, e uma cachopa atravessa a ria com as
saias pelas coxas, a pingar. Os longes esfumados perdem-se na bruma. A
bem dizer, não chove: o céu derrete-se. Silêncio. As terras baixas,
atravessadas de regos e de valas onde a água repousa e apodrece, embebem-se
ainda mais desta água peneirada que não cessa de cair. Ria cinzenta, céu
cinzento, campos alagadiços e uma luz molhada que atravessa as nuvens pegajosas
e envolve os seres e as coisas no mesmo tom casto e uniforme. As tintas
desvanecem-se. Silêncio húmido neste paraíso da erva, coberta de um pó
fino que goteja. Largamos. Canais, poças, água imóvel. Passo ao cabeço da
Capela, passo ao Forte Velho
─ antiga barra. A
água escorregadia fecha-se logo sob o barco. Olho para os fundos, mas no
fundo emborralhado só distingo até Arnelas névoas sobrepostas, de onde irrompe
um único fio indistinto
─ a Vagueira. Ao
pé de mim, ao pé da chapa polida da água um moinho bate as asas e passa... Logo
um canal estreito entre terras estacadas para não esboroarem, a Carreira. Outro
charco mais largo, cor de estanho, e sempre o mesmo lodo cultivado, o mesmo tom
baço, a mesma cinza caindo pingue-que-pingue sobre a larga paisagem
empapada e cheia de humidade: o lago da Labrega, quieto e solitário, num céu
que se derrete em água morna. Um peixe faísca e toda a superfície se arrepia
para voltar à imobilidade. Um cabeço com ervas emerge à flor das águas. Às
vezes o barco faz marola, encosta à terra, pega-se no fundo, e os homens
de perna nua empurram-no à vara. Na antiga barra encalha, e para o
levarmos temos de nos meter todos à água. Vagueira
─ dois riscos
esbranquiçados muito ao longe
─ , os faróis. A
ria alarga.
Com a manhã, que se adianta, as
gotas de chuva embebem-se de outra luz esbranquiçada. Ganham os tons
baços transparência e uma claridade difusa bóia no céu. Baba-se. A
amplidão da água reflecte já outras tintas. A neblina a todo o momento desmaia
e a vasta planície vaporizada ilumina-se de uma luz cor de pérola que
hesita em pousar; os verdes são mais claros, as árvores suspensas no ar e as
casas construídas na água. Além à esquerda mostram-me os palheiros da
Costa Nova
─ mas tudo ainda
adormecido na terra, no silêncio e na água. Uma tainha salta...
Depois desta série de canais e de
charcos estagnados e polidos, na planície baixinha feita com lodo extraído da
ria, e com areais do outro lado, onde os sarraus e os borrelhos piam, sob um
céu empastado e baixo - encontro-me diante de uma amplidão
indefinida, onde a terra e a ria se confundem. É um sonho que se dissolve? Onde
acaba a água e começa a terra? Aquelas velas vêm da barra ou do mistério?... Ao
pé de mim, dois homens arrastam uma chincha num barco estranho. Há-os com
o costado por pintar, há-os todos negros, com o grande pescoço esguio de
cisne, no momento em que volta a cabeça para trás, e com um toque de vermelho
no leme... gente de Murtosa que habita esta bateira. De dia, em geral, dormem,
à noite pescam. A ria dá enguia, pimpão, tainha, solha e robalito. Levam ali
dentro uma panela para a caldeirada, um cesto com batatas, uma esteira para
dormir no toldo que armam à proa e um saco de malha metido na água, para a
enguia e a tainha se conservarem vivas. Mais distante, um velho e um rapaz
armaram um saltadoiro, com a manhosa estendida ao lume de água e segura com
espeques. Por largo lançam outra rede, o cerco, e o rapaz bate com uma vara no
costado do barco. O peixe assusta-se, foge, depara com a sombra, forma o
salto, faísca como um pingo de estanho e cai dentro do curral, onde se emalha.
Coloquem estas figuras num fundo
discreto, numa luz delicada, num ambiente indefinido... Aqui o drama é o da humidade... As névoas têm na ria uma vida extraordinária:
cada gota possui uma lama distinta e irisa-se como uma bola de sabão. De
forma que não só as figuras se harmonizam com os fundos, mas a todo o momento e
à minha vista a paisagem húmida se transforma e muda de aspecto: afasta-se,
prolonga-se, não tem fim nem realidade. Ao longe, árvores violetas nascem
na água, o horizonte ainda cinzento teima em fixar-se, mas espumas azuis
já estremecem junto a reflexos verdes. Bois pastam na água, um barco navega no
interior das terras... A ria é mágica e possui uma luz própria que a veste. Vem
acolá uma vela vermelha que é uma nota inédita neste sonho diluído em água... É
este o momento em que começa a aparecer o azul e que convém anotar. Dissolvem-se
as névoas, mas deixam o ar carregado de humidade, deixam a luz reflectindo-se
em milhares de gotas invisíveis, deixam a atmosfera impregnada de frescura e de
vida. Esta passagem para o azul faz-se lentamente até o azul dominar de
todo. Atenuam-se as neblinas e ficam ainda farrapos suspensos, derretidos
nos agueiros, agarrados à terra e embrulhados nas ervas. Um grande lanço de
água vem até mim em pequenas ondulações azuis e por camadas sucessivas, como
estas manchas que os pintores acumulam nos quadros com a ajuda da espátula. Junto
ao barco, a água reflecte um azul vivo e fresco como nunca vi. Longe, azul
desmaiado; perto, azul como tinta. Vejo diante de mim a amplidão azul, num
assombro. E todo este azul se põe a estremecer nos milhões de gotas extáticas
de que se compõe a atmosfera e que se impregnam agora e ao mesmo tempo da mesma
cor... Azul, azul, azul...
RAUL BRANDÃO,
Os pescadores
1 - Após
uma leitura atenta do texto "A Ria de Aveiro", consulte o quadro da
figura 17.
1.1 -
Tendo em conta os elementos aí referidos, classifique o tipo de descrição
quanto ao modo de descrever e quanto à natureza do objecto descrito.
1.2 -
Justifique a sua classificação.
2 -
Segundo G. Genette, a descrição implica a imobilidade do objecto pormenorizado,
«fora de qualquer acontecimento e mesmo de qualquer dimensão temporal». No
texto de Raul Brandão existe dinamismo e avanço do tempo, o que, à primeira
vista, parece em contradição com a definição de Genette. Esta contradição
deixará de existir se considerarmos que o texto é constituído por uma sequência
de micro-descrições, em que o Autor, à medida que avança, no espaço e no
tempo, nos apresenta instantâneos registados pela sua objectiva individual
─ os seus
olhos.
2.1 -
Demonstre a afirmação anterior.
3 -
Retire do texto exemplos de elementos relacionados com:
3.1 - os diferentes sentidos: visão, audição e tacto;
3.2 - fusão de sentidos diferentes (sinestesia).
Texto 3:
Ao fim de um ano, durante o qual
Carlos viera frequentemente a Lisboa colaborar nos trabalhos, «dar os seus
retoques estéticos»
─ do antigo
Ramalhete só restava a fachada tristonha, que Afonso não quisera alterada por
constituir a fisionomia da casa. E Vilaça não duvidou declarar que Jones Bule
(como ele chamava ao inglês) sem despender despropositadamente, aproveitando
até as antigualhas de Benfica, fizera do Ramalhete «um museu».
O que surpreendia logo era o pátio,
outrora tão lôbrego, nu, lajeado de pedregulhos
─ agora
resplandecente, com um pavimento quadrilhado de mármores brancos e vermelhos,
plantas decorativas, vasos de Quimper, e dois longos bancos feudais que Carlos
trouxera de Espanha, trabalhados em talha, solenes como coros de catedral. Em
cima, na antecâmara, revestida como uma tenda de estofos do Oriente, todo o
rumor de passos morria: e ornavam-na divãs cobertos de tapetes persas,
largos pratos mouriscos com reflexos metálicos de cobre, uma harmonia de tons
severos, onde destacava, na brancura imaculada do mármore, uma figura de
rapariga friorenta, arrepiando-se, rindo, ao meter o pezinho na água. Daí
partia um amplo corredor, ornado com as peças ricas de Benfica, arcas góticas,
jarrões da Índia, e antigos quadros devotos. As melhores salas do Ramalhete
abriam para essa galeria. No salão nobre, raramente usado, todo em brocados de
veludo cor de musgo de Outono, havia uma bela tela de Constable, o retrato da
sogra de Afonso, a condessa de Runa, de tricorne de plumas e vestido escarlate
de caçadora inglesa, sobre um fundo de paisagem enevoada. Uma sala mais
pequena, ao lado, onde se fazia música, tinha um ar de século XVIII com os seus
móveis enramalhetados de ouro, as suas sedas de ramagens brilhantes: duas
tapeçarias de Gobelins, desmaiadas, em tons cinzentos, cobriam as paredes de
pastores e de arvoredos.
Defronte era o bilhar, forrado de um
couro moderno trazido por Jones Bule, onde, por entre a desordem das ramagens
verde-garrafa, esvoaçavam cegonhas prateadas. E, ao lado, achava-se
o fumoir, a sala mais cómoda do Ramalhete: as otomanas tinham a fofa vastidão
de leitos; e o conchego quente e um pouco sombrio dos estofos escarlates e
pretos era alegrado pelas cores cantantes de velhas faianças holandesas.
Ao fundo do corredor ficava o
escritório de Afonso, revestido de damascos vermelhos como uma velha câmara de
prelado. A maciça mesa de pau-preto, as estantes baixas de carvalho
lavrado, o solene luxo das encadernações, tudo tinha ali uma feição austera de
paz estudiosa
─ realçada ainda
por um quadro atribuído a Rubens, antiga relíquia da casa, um Cristo na cruz,
destacando a sua nudez de atleta sobre um céu de poente revolto e rubro. Ao
lado do fogão, Carlos arranjara um canto para o avô com um biombo japonês
bordado a ouro, uma pele de urso branco, e uma venerável cadeira de braços,
cuja tapeçaria mostrava ainda as armas dos Maias no desmaio da trama de seda.
No corredor do segundo andar,
guarnecido com retratos de família, estavam os quartos de Afonso. Carlos
dispusera os seus, num ângulo da casa, com uma entrada particular, e janelas
sobre o jardim: eram três gabinetes a seguir, sem portas,
unidos pelo mesmo tapete: e os recostos acolchoados, a seda que forrava
as paredes, faziam dizer ao Vilaça que aquilo não eram
aposentos de médico
─ mas de
dançarina!
EÇA DE QUEIRÓS,
Os Maias, cap. I.
1 - Após
a leitura atenta do texto, separe a parte descritiva da narrativa e dê um
título sugestivo ao texto.
2 - Na
parte teórica, foi afirmado que a descrição deve seguir uma sequência lógica e
bem definida, do geral para o particular ou do particular para o geral, da
esquerda para a direita ou da direita para a esquerda, de baixo para cima ou de
cima para baixo, de fora para dentro ou de dentro para fora, em suma, uma
sequência que permita uma descrição metódica e coerente.
2.1 -
Determine o tipo de sequência utilizado por Eça de Queirós;
3 -
Introduza dentro de um rectângulo, a lápis, os diferentes elementos referidos
na descrição;
4 -
Destaque, sublinhando, as palavras ou locuções que permitem definir com
precisão a localização espacial e temporal;
4.1 -
Classifique-as morfologicamente;
4.2 -
Considera a sua função importante para a descrição? Justifique.
5 -
Elabore um diagrama que ponha em destaque a estrutura do texto: elementos
referidos, sequência seguida e aspectos focados pelo Autor, com respectivas
características.
6 -
Elabore um pequeno comentário ao texto a seguir transcrito: «Eça de Queirós, ao
descrever os elementos importantes para a narração, sejam eles edifícios,
espaços urbanos ou rurais, ambientes, sejam ser animados, humanos ou animais,
caracteriza-se pelo grande rigor e precisão. Por exemplo, quando descreve
o Ramalhete, a sua minúcia é de tal natureza que quase se poderia elaborar a
planta do edifício.»
Texto 4:
Era por uma manhã de Abril de 1852.
O campo vestia-se de seus mais
opulentos e matizados trajos.
O Minho estava fascinador.
Por toda a parte eram já espessuras
frondosas e impenetráveis; sombras discretas; vales misteriosos e encantadores,
graças ao claro-escuro, com que a vegetação renascente os coloria;
colinas adornadas e festivas, como um trono de altar em capela rústica;
enfloradíssimos silvados, veigas a exuberarem de vida; e, por entre tudo isto,
casas de brancura ofuscante; e acima de tudo um céu sem nuvens, um céu azul,
daquele azul dos céus napolitanos, a meu ver, tão culpados na existência dos lazzaroni.
As torrentes estavam nas suas horas
de bom humor; não bramiam, murmuravam apenas; não se precipitavam impetuosas do
alto dos outeiros, deixavam-se escorregar pelas anfractuosidades das
quebradas.
Os ventos, como
que arrependidos, pretendiam com afagos fazer esquecer aos arbustos mais
tenros as violências passadas.
A luz salutar da Primavera convertia-se,
por mágica metamorfose, em perfumes que embalsamavam os ares, em flores que
esmaltavam os prados, em harmonias vagas que as brisas transportavam de selva
em selva, que as aves escutavam atentas e os ecos repercutiam sonoros.
Nestes dias assim sente-se
palpitar de vida a natureza inteira.
Por toda a parte se realiza um
génesis. No solo é o grão que germina; nos troncos as novas folhas que brotam;
nos ramos as flores que desabrocham; nas águas, nas florestas, nos vergéis, nos
ares, uma jovem e inquieta geração de aves e de insectos que surge, animando
tudo com seus magníficos concertos, com suas valsas incessantes e rápidas,
iluminadas por um sol vivificador.
É contagiosa esta alegria da
natureza.
O coração recebe o influxo dela.
A vida tem então também a sua
inflorescência. Nesta quadra as ilusões, as esperanças, as mais puras e ideais
concepções de fantasias exaltadas pululam, como as boninas na relva; a alegria,
os risos e os prazeres reflectem-se nos semblantes, como a luz do arrebol
nos cimos dos outeiros; ama-se melhor, perdoa-se melhor, e a poesia
e os cânticos saem tão espontâneos como o trinado dos pássaros de entre a
folhagem dos pomares.
A fisionomia das cidades perde
também então um pouco da sua habitual gravidade. O vento que lhes vem dos
arrabaldes inocula-lhes este fermento de folgazão regozijo. A Primavera
desinquieta-os, sedu-los, atrai-os, a esses soturnos
cidadãos, e a população urbana trasborda nas aldeias circunvizinhas.
JÚLIO DINIS, Justiça de
Sua Majestade, in:
Serões da
Província.
1 - Leia
atentamente o texto acima transcrito, excerto de uma descrição mais ampla,
extraído de um interessantíssimo conto de Júlio Dinis.
2 - O
texto apresenta uma estrutura bem definida, ao longo da qual o Autor mostra os
diferentes aspectos de uma manhã de Primavera e os seus efeitos:
2.1 -
Delimite a introdução e refira os aspectos nela focados;
2.2 -
Após a caracterização do Minho
─ fascinador
─ , o Autor vai
comprovar a sua afirmação:
2.2.1 - Indique quais os
parágrafos em que isso se verifica;
2.2.2 - A cada parágrafo vai corresponder
essencialmente um tipo de sensação, embora possa coexistir mais do que um. Demonstre-o;
2.3 -
Após a apresentação das diferentes características que tornam o Minho fascinador, o Autor vai mostrar a influência de dias como esses:
2.3.1 -
Delimite a parte do texto onde isso é feito;
2.3.2 -
Por sua vez, esta parte divide-se em três momentos, nos quais o Autor
mostra a influência em vários aspectos. Delimite os momentos em que a
influência se verifica:
2.3.2.1 - por
toda a parte, na natureza e nos seres;
2.3.2.2 - nas
pessoas;
2.3.2.3 - nas
cidades.
3 -
Centre a sua atenção no quarto parágrafo («Por toda a
parte... ...dos lazzaroni »):
3.1 -
Registe de acordo com a ordem do texto os diferentes elementos da enumeração;
3.2 -
Poder-se-á afirmar que o Autor passa de um plano elevado (no céu)
para um plano terreno (na terra)? Justifique.
3.3 - Registe,
a três colunas, os verbos, os nomes e os adjectivos (ou expressões com o valor
de adjectivo) presentes neste parágrafo;
3.4 -
Indique, por ordem decrescente, a frequência de cada uma dessas classes. Se,
eventualmente, verificar a predominância dos adjectivos e dos nomes, justifique
esse facto.
4 -
Centre a sua atenção no sétimo parágrafo («A luz
salutar da Primavera... ...sonoros.»). Demonstre
que, embora predominando o sentido do olfacto, aí se encontram associados outros sentidos.
5 -
Centre a sua atenção no penúltimo parágrafo do texto («A
vida tem então... ...dos pomares.»). Demonstre
que a segunda frase é constituída por segmentos sintácticos de estrutura
paralela, tendo por base a enumeração e a comparação.
6 -
Elabore um comentário pessoal ao texto, tendo em conta os aspectos estilístico
e estético.
Texto 5:
Era uma agradável vivenda,
circundada por um viçoso quintal todo orlado de limoeiros, e onde florejavam as
mais formosas japoneiras e magnólias de algumas léguas
em redor. Penduravam-se
pelos muros festões virentes de jasmins e balsaminas, em volta dos quais zumbia
incessante um buliçoso enxame de abelhas, atraídas pelos aromas suaves que se
exalavam em torno. Na
extensão destes muros abriam-se sobre o caminho duas janelas de grades,
através das quais se descobria a abundante verdura daquele perfumado recinto, e
de fora se escutava já o murmúrio contínuo e monótono de uma cascata, que
derramava a frescura e a vida por toda aquela vegetação interior. Respirava-se
ali uma tranquilidade que deliciava o coração. O horizonte, que rodeava esta
pitoresca residência, era extremamente aprazível. Para qualquer lado que as
vistas se dirigissem repousavam sempre agradavelmente sobre um ameno fundo de
folhagem e verdores, onde se demoravam irresistivelmente, seduzidas pela
alegria e festa que se reflectia por toda a parte. No meio do repouso e
silêncio que reinava em torno dessa habitação campestre, como que se adivinhava
a vida latente da natureza que desperta no raiar da Primavera, e o azulado e
tenuíssimo véu de nuvens da manhã, que o sol não dissipara ainda de todo, era como a graça transparente
que, longe de disfarçar, realça a formosura de certos rostos e o fulgor de
certos olhos. Através daquele sendal vaporoso pressentia-se sorrir a natureza,
mais fascinadora ainda nos seus trajos simples da manhã que nas ostentosas
galas do meio-dia. As ervas dos silvados, ainda húmidas do orvalho,
dispersavam em cambiantes íris os raios de luz, fulgindo como brilhantes nas
suas mudanças contínuas, ou imitando o fulgor do rubi, a amenidade da safira, a
limpidez da esmeralda e do topázio; só a Primavera tem destes encantos.
JÚLIO DINIS,
Justiça de Sua
Majestade, In op. cit.
1 - Após
a leitura atenta do texto em cima transcrito, procure:
1.1 -
Determinar a sequência seguida pelo Autor na descrição;
1.2 -
Determinar quais os sentidos utilizados.
2 -
Classifique o tipo de descrição, tendo em conta os parâmetros do quadro da
figura 17 (página 135), quer quanto ao modo de descrever, quer quanto à
natureza do objecto descrito.
|