Henrique J. C. de Oliveira, Relatório do Inquérito Linguístico realizado na Gafanha do Carmo, Aveiro, 1967.

O ENGENHO

Fig. 13 - O engenho para tirar água. Clicar para acesso às legendas

Ainda que com tendências para desaparecer e ceder o seu lugar aos progressos da técnica − com efeito, o uso do motor é já bastante frequente − ainda nos é dado observar, de quando em quando, o curioso espectáculo de um ou dois animais andando pachorrentamente, em círculos, à volta do engenho. A pouco e pouco, o precioso líquido vai subindo das negruras abissais do poço, puxado pelos alcatruzes, e escorrendo para um largo tabuleiro metálico, donde segue para as «caneijas», espalhando-se depois pelos múltiplos carreirinhos cavados no terreno, quais grossas veias da terra-mãe.

Como nem podia deixar de ser, também o meu informador possuía o seu engenho. Somente porque «agora a senhora cambra aqui butou a luz», ele trocou-o por um «muntor inletru» que, segundo ele, «é p'ra deitar a auga pró tanque e daí regar até à borda», isto é, até aos extremos do campo. Embora usando agora um motor eléctrico, tal facto não impediu que a minha atenção incidisse sobre o engenho, situado a uns escassos dez metros de casa. Sabendo-o um profundo conhecedor de todas as coisas da terra e dos nomes de todas as pecinhas dos instrumentos de uso agrícola, procurei informar-me detalhadamente sobre tão curioso aparelho, de origens tão remotas e em vias de desaparecer.

Puxado habitualmente por uma junta de bois (figuras 13 e 14), atrelados ao cambão (1), o movimento circular transmitido à «roda do boi» (3), segura por meio de três espias (2), faz mover a «roda dos alcatruzes» (4). Estes são pequenos baldes cilíndricos (5), com um pequeno orifício no fundo para deixar entrar a água, e encadeados entre si numa longa fila, que mergulha no fundo do poço, de lá trazendo o líquido. À medida que vão descrevendo a curva por sobre a roda, a água é deitada num tabuleiro metálico (6). Em seguida, «a auga cai na caneija (7) e vai desovar num tanque, que daí vai p'ràs caneijas de irrigação». O conjunto da «roda do boi» e da «roda dos alcatruzes» assenta em duas grossas «trabas» ('traves') de ferro (8).

Fig. 14 - O engenho para tirar água. Clicar para acesso às legendas
 

 

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