NOMES PARA AZEITONA MIÚDA E OUTROS VOCÁBULOS
Dissemos, algumas linhas atrás, que a azeitona miúda se escapava do
sem-fim caindo no chão. O nome por que essa azeitona é conhecida varia
muito de região para região, sendo inúmeros os vocábulos usados. Assim,
quer em inquéritos directos, quer através do I.L.B. e do I.L.C.,
encontrámos um total de 29 designações, embora algumas não sejam mais do
que variantes das mesmas palavras. Na listagem seguinte indicamos o
número de vezes que foram registados.
|
arredolho – 1
azambújia – 1
azambujeiro – 2
azambujo – 1
azebinhada – 1
azebim – 1
azeitoninho – 1
azevim – 1
azevinho – 3
azinha – 1
bafordo – 5
bafurro – 1
esminhão – 1
fedolha – 1
jambuja – 1
jambujeira – 1
jambujeiro – 5
|
|
jambujo – 3
jamujeiro – 3
lentrisca – 1
mertunço – 1
mertunho – 2
morrinha – 1
mortunho – 1
rebolo – 3
rebolho – 1
redolho – 3
zambuja – 4
zambuje – 3
zambujeira – 1
zambujeiro – 8
zambujo – 7
zambulha – 1
zimbro – 1 |
|
Arredolho
(Santarém, P. 33),
rebolo
(Leiria, P. 359, 361, 362), rebolho (Leiria, P. 360a) e
redolho (Aveiro, P. 154, 155; Leiria, P. 363) são palavras cognatas
cuja origem é incerta. Segundo Corominas(17),
derivam provavelmente do latim PULLUS 'rebento de qualquer árvore' e,
seguramente, do latim vulgar *REPULLUS.
A evolução sofrida pelos vocábulos terá sido:
*REPULLU ─ > rebôlo > rebôlho > redôlho
A forma arredolho é o resultado de um fenómeno de prótese, isto
é, de acrescentamento de um fonema no começo da palavra.
Da mesma família são os vocábulos
azambújia
(Vila Real, P. 70), azambujeiro (Coimbra, P. 291a; Leiria, P.
361), azambujo (Leiria, P. 339), jambuja (Viseu, P. 178),
jambujeira (Aveiro, P. 159), jambujeiro (Coimbra, P. 262,
294; Leiria, P. 360a, 365; Viseu, P. 188), jambujo (Aveiro, P.
121; Coimbra, P. 277, 294), jamujeiro (Aveiro, P. 156; Castelo
Branco, P. 320; Coimbra, P. 299a), zambuja (Aveiro, P. 130;
Leiria, P. 338, 346; Vila Real, P. 76a), zambuje (Leiria, P. 344;
Santarém, P. 333; Vila Real, P. 68), zambujeira (Coimbra, P.
258), zambujeiro (Coimbra, P. 249, 261, 266, 274, 278, 286;
Leiria, P. 359, 363), zambujo (Coimbra, P. 245a, 250, 258, 266,
274, 281; Leiria, P. 340) e zambulha (Vila Real, P. 65). Todas
estas palavras assentam no árabe zanbûz(18).
Azambujeiro
ou
zambujeiro
surgem-nos no dicionário de Bluteau(19)
com a seguinte definição: «Oliveira brava. Dá uma azeitona comprida e
delgada, cujo azeite é bom para muitas mezinhas, e se come também, como
as azeitonas, botado em calda. O pau desta árvore é muito rijo; dele se
fazem as entrosgas e varandas dos lagares e moinhos. É a
única árvore em que se enxertam oliveiras (...)».
O vocábulo azambujeiro, segundo Bluteau, refere-se a uma oliveira
brava e não ao fruto. Em inquéritos directos e por correspondência, os
vocábulos azambujeiro, azambujo, jambujeiro, jamujeiro,
zambuja e outros surgem-nos ora aplicados às árvores, ora ao fruto.
Não é raro o mesmo inquérito apresentar um destes vocábulos
nas duas
acepções.
J. Almeida Costa e A. Sampaio e Melo(20)
apresentam o vocábulo zambujeiro, que definem como «oliveira
brava, espontânea nos sítios incultos do centro e sul de Portugal, e
também conhecida por azambujeira, azambujeiro, azambuja, azambujo,
oleastro e oliveira brava (do ár. ocidental za (n) buj,».
De uma maneira geral, os dicionários apresentam estes termos como
referindo-se unicamente às árvores, Esquecem quase sempre o facto de
que, na linguagem corrente, o povo os emprega aplicando-os quer às
árvores, quer ao fruto.
Além dos vocábulos apontados, o citado dicionário de Almeida e Costa e
Sampaio e Melo regista ainda, na página 1582, o vocábulo
zambulheira,
definido da seguinte maneira: «(prov.) Diz-se de uma variedade de
azeitona pequena proveniente de uma oliveira cultivada em Portugal
(de
zambujo)».
Em edições posteriores, o mesmo dicionário(21)
apresenta outros vocábulos, tais como zambujal e zambujo,
que define respectivamente como «mata de zambujeiros» e «o
mesmo que zambujeiro», introduzindo uma ligeira alteração no texto
relativamente à origem da palavra zambujeiro: «...(do árabe berbere
zabbuj, «id.»)».
Esquematicamente, estes vocábulos apresentam a seguinte distribuição:
Azebinhada (Aveiro, P. 165),
azebim/azevim (Coimbra, P. 303; Leiria, P. 338), azevinho
(Coimbra, P. 303; Leiria, P. 344, 345b) e azinha (Leiria, P. 340)
são formas provenientes de azevo, do latim vulgar ACIFOLIU-,
palavra que se compõe de FOLIUM 'folha' e o radical AC- de ACUERE 'ser
agudo'(22).
Azevinho
é um tipo de arbusto ou árvore pequena, da família das aquifoliáceas,
espontâneo e também cultivado. É conhecido por outros nomes, como
pica-folha
e visqueira, provavelmente da mesma família de outro arbusto
muito parecido com este, a que no norte dão o nome de gibardeira.
É muito utilizado na quadra do Natal como elemento decorativo. As
pequenas bagas vermelhas que apresenta, contrastando com o verde das
folhas, conferem-lhe certa beleza(23).
Curiosamente, o povo passou a empregar o termo azevinho e seus derivados
para indicar a azeitona miudinha, certamente pela forma arredondada
muito semelhante à das bagas do arbusto.
Aparece-nos ainda o verbo
azevinhar
(Aveiro, P. 165; Leiria, P. 338, 345b) para indicar que a oliveira não
deu fruto ou que este não se desenvolveu.
O vocábulo
azevim
foi também registado por Tavares da Silva(24)
com o sentido de azeitona miúda.
Segundo um informador, o azevinho é a azeitona que a oliveira dá
no ano seguinte àquele em que produziu as gradas: «a azeitona
pequenina é azevinho. Um ano a oliveira dá as gradas, outro ano
dá-las miúdas, qu'é a azevinho» (Coimbra, P. 303).
Azeitoninho como diminutivo
de azeitona surgiu no distrito de Leiria, P. 346. Para evitar qualquer
dúvida que o termo pudesse suscitar, o informador foi acrescentando: «azeitoninho
da oliveira brava».
Bafordo
aparece registado no dicionário de Frei Domingos Vieira(25)
como termo de cavalaria do século XV. O dicionário de Morais(26),
10ª ed., regista-o com o mesmo sentido e ainda como termo próprio da
Botânica, no sentido de 'azeitona atrofiada, que atinge o tamanho dum
confeito'. Este mesmo sentido, apresentado no dicionário de Morais e por
nós registado, encontra-se também no Grande Dicionário da Língua
Portuguesa(27).
O citado dicionário de Sampaio e Melo(28),
na sua 6ª edição, apresenta também o vocábulo bafordo com o sentido de
'sapal; terreno alagadiço'.
Ao lado de
bafordo,
encontramos o verbo embafordar (Leiria, P. 345b, 351a) com o
sentido de 'oliveira que não produz fruto ou cuja azeitona não se
desenvolve'.
Esminhão
foi indicado, ao lado de
morrinha,
numa resposta ao I.L.C. proveniente do distrito de Aveiro, P. 166. No
mesmo distrito apareceu a forma fedolha.
Lentrisca
e
lenterisca
(Leiria, P. 365) são duas variantes fonéticas de lentisca,
vocábulo registado no dicionário já citado de Almeida Costa e Sampaio e
Melo, com o sentido de 'variedade de oliveira', ao lado de durázia
e salgueiro, com o mesmo sentido.
Mertunço, mertunho
e
mortunho
surgem no distrito de Coimbra, respectivamente P. 247; 242 e 294; 249.
Segundo um informador, em inquérito directo, «a oliveira dá uma
azeitona pequenina, redondinha, que é imprópria para azeite. Essa
azeitona chama-se mertunho e é tão pequena que nem se servem
dela, ficando no chão» (Vendas de Galizes, P. 242).
Morrinha,
vocábulo indicado num exemplar do I.L.C. proveniente de Aveiro, P. 166,
surge no dicionário de Frei Domingos Vieira, op. cit., vol. IV, pág.
321, com o sentido de «doença
apizoótica e muito destrutiva do gado»
e, figuradamente, como «enfermidade pouco incómoda e perigosa que
ataca as pessoas».
Zimbro (Leiria, P. 349) é apresentado pelos dicionários com o sentido de
'arbusto cujo fruto é semelhante a bagas de hera'. Bluteau(29)
dá uma extensa definição do termo, de que transcrevemos parte, dado o
seu interesse e curiosidade:
«Arbusto
cujo tronco é delgado e coberto de uma casca áspera. O pau é duro e tira
a vermelho, principalmente quando está seco, e dá bom cheiro, quando o
põem sobre o fogo. Deita muito ramo, vestido de folhas estreitas,
agudas, duras, picantes e sempre verdes. O fruto é a modo de bagas de
hera, redondas, verdes no princípio e negras depois de maduras(30);
tem dentro uma matéria tirante a vermelho, viscosa, oleosa, aromática,
de sabor resinoso e acre, mas algum tanto doce, e juntamente três ou
quatro sementes triangulares. As bagas do zimbro são cefálicas,
incisivas, aperitivas, solutivas; corroboram os nervos, o estômago, o
coração, ajudam a digestão, provocam a urina. Há pessoas que sempre
trazem alguns destes bagos na algibeira e mascam três ou quatro deles
pela manhã, para preservativos do ar mau e para deixar bom cheiro na
boca (...)».
O termo passou a aplicar-se à azeitona miúda, certamente pelo seu
formato, tamanho e cor, muito parecida com o fruto do arbusto. As
qualidades médico-terapêuticas são também muito semelhantes: o chamado
azeite zimbro
apresenta, segundo as diversas abonações recolhidas, aplicações um tanto
ou quanto idênticas às bagas do arbusto.
DISTRIBUIÇÃO GEOGRÁFICA DE OUTROS TERMOS
Local ou máquina onde é lavada a azeitona, antes de ser moída:
lavadeira
(Coimbra, P. 238); lavadoiro (Coimbra, P. 236); lavador
(Guarda, P. 209; Leiria, P. 338); lavadouro (Coimbra, P. 236,
237; Leiria, P. 351b); lavaria (Porto, P. 53; Vila Real, P. 81).
Fazer àzeitona,
no sentido de 'moê-la'
– Guarda, P. 206.
Sem-fim,
'aparelho de elevar a azeitona'
– Bragança, P. 98; Coimbra, P. 257,
280b, 288; Leiria, P. 344, 362. |