c) - Noutros lagares
Foi dito, no capítulo II, a propósito do lagar da Quinta da Portela, P.
285b, que a
azeitona era trazida directamente do olival para o lagar por meio de um
tipo especial de carro, puxado por animais, apresentado na figura 9. Há
que acrescentar que essa azeitona é só a do dono do lagar, uma vez que a
de outros proprietários é trazida em camionetas ou em sacas dentro de
carros de bois.
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Figura 62: Aspecto do chamado carrocel do amor, a meio
caminho do moinho (Quinta da Portela, freg. de Santo António dos
Olivais, Coimbra). |
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O trabalho de descarga do tipo especial de carro é feito pelo carreiro e
por um rapazito, encarregado de levar a azeitona para o moinho.
Em tempos idos, a azeitona era retirada da tulha para dentro de poceiros
com uma pá vulgar de ferro e cabo de madeira. Poceiros às costas,
levavam-na para o moinho, fazendo o trajecto deste às tulhas uma boa
série de vezes ao dia. Actualmente, graças ao invento do feitor da
quinta, a azeitona é transportada por meio do
carrocel,
mais rigorosamente, o carrocel do amor, espécie de caixote
quadrado com rodas. Com um esforço mínimo, dois homens conseguem levar
um carro de azeitona até ao moinho.
Interessados em obter mais pormenores sobre o dito
carrocel do amor,
vamos conversar com o seu construtor:
«– Actualmente, graças ao invento do senhor, a moenda faz-se com menos
trabalho...
– Sim, foi uma invenção que eu tive de transportá-la com este
carrocel, carrocel, isto é, que os operários puseram-lhe o carrocel
do amor.
– Mas porquê?
– Porque acharam graça ò carrocel, e carrocel, carrocel isto,
carrocel aquilo, puseram-lhe o nome de carrocel do amor
e.
– E a azeitona vai no carrocel...
– Esse carrocel, qu i eu antes d'iniciar o percurso
qu'ele havia de fazer, fiz-lhe umas tavelas com os pesos também. Si por
acaso eu estou muito embaraçado com trabalho, não posso pesar àzeitona,
tenho uma tabela no caixote. Diz-me a quantidade de quilos mais ou
menos. Pois bem, no caixote qu i o senhor vê, puxa-se
com este guinchozinho [observem-se as figuras 9 e 62] vai lá p'ra
cima (...)».
Com 60 centímetros de comprimento, 56 de largura e 44 centímetros de
altura, o carrocel apresenta a configuração de um caixote de fundo quase
quadrado, assente sobre quatro rodas. Interiormente, possui uma tabela,
que indica aproximadamente os quilos de azeitona.
Puxado por um guincho, vai por umas calhas de madeira até junto do
moinho. O rapaz sobe a um escadote tosco de madeira, com quatro degraus,
levanta uma portinhola de correr e a azeitona sai pela bica lateral,
caindo dentro da
base,
onde é moída pelas galgas. A última azeitona, que fica amontoada aos
cantos, é empurrada para a saída com o auxílio de uma pá meia comida
pelo uso, com a extremidade, outrora pontiaguda, reduzida a uma linha
recta.
O nome de carrocel não deixa de ter uma certa razão de ser. Provém-lhe
do facto de fazer lembrar certos carros dos parques de diversões, que se
deslocam sobre carris.
A azeitona sofre a trituração durante cerca de trinta minutos,
continuamente empurrada pelas
raspadeiras,
que a obrigam a deslocar-se para o caminho das galgas, até que esteja
totalmente reduzida a pasta.
Nos lagares cooperativos de Valpaços (distrito de Vila Real, P. 80) e
Ervedal (distrito de Coimbra, P. 236), a azeitona é transportada das
tulhas por meio de um carro deslizante sobre carris, conhecido pelos
termos carreta (Vila Real, P. 80), vagona (Coimbra, P.
236; Guarda, P. 196; Santarém, P. 332) e vagoneta (Coimbra, P.
236), o qual apresenta o aspecto documentado na
◄
figura 63. Este
carrinho, no lagar de Ervedal, pode percorrer toda a enorme sala das
tulhas. Uma vez carregado, vira a meio do percurso numa placa rotativa,
e vai a uma balança onde é feita a pesagem da azeitona. Segue daí para o
chamado funil, recipiente com o formato de um tronco de pirâmide
invertido, e inclina-se sobre um dos lados, efectuando a descarga.
Do funil a azeitona entra num lavadouro e é içada por um
parafuso sem-fim para a sala de moagem, caindo num funil circular que a
distribui pelo chamado lastro das galgas ou rasto do moinho.
Três pesadas galgas tronco-cónicas reduzem o fruto a uma pasta, que vai
sendo sucessivamente arrastada pelo movimento das pedras para um sulco a
toda a volta do moinho, pelo qual passa uma raspadeira metálica,
que expulsa a massa por uma abertura para a batedeira.
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Figura 64: Aspecto das duas clamígolas do lagar
cooperativo de Valpaços, P. 80, dist. Vila Real. |
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No lagar de Valpaços, a azeitona sobe também por um
sem-fim,
que a leva para a sala de moagem. Cai num transportador horizontal e é
distribuída pelas duas clamígolas(16)
grandes, de que se mostra um aspecto na figura 64.
Em Valbom dos Figos (Bragança, P.
98), dão ao funil onde é deitada a azeitona o nome de tremóia,
termo que apresenta normalmente uma acepção diferente, como veremos em
breve.
No lagar de Condeixa-a-Nova (Coimbra, P. 277), a azeitona é lavada por
meio de um jacto de água à medida que vai subindo pelo
sem-fim
para o moinho. Somente a azeitona grada consegue ser elevada. O chamado
jambujo, azeitona muito miudinha, que também produz azeite,
embora em menor quantidade, consegue escapar-se ao parafuso, caindo no
chão. Segundo o informador, «no fim de s'acartar o moinho do
freguês, bai-se c'uma pá e bota-se no sem-fim para ir por aqui fora,
porque o sem-fim não agarra, cai (...)».
Em Cerejais (Bragança, P. 30), Assafarge (Coimbra, P. 284) e outros
lagares, existe sobre o bordo do pio uma caixa de madeira de fundo
inclinado, tapada por uma portinhola de correr. É a chamada
espera da base
(Coimbra, P. 284), funil (Braga, P. 34; Coimbra, P. 257),
tramóia (Bragança, P. 90), tremóia (Bragança,
P. 98, 100) ou
tremónia (Viseu, P. 173).
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Figura 65:
Moinho do lagar de Assafarge. Sobre o bordo da base, a espera da
base. À direita, no 1º plano, as bacias da massa; ao fundo, os
poceiros e o escadote da espera da base (P. 284, Coimbra). |
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A azeitona é transportada, no lagar de Assafarge, nos chamados
poceiros, que se vêem empilhados, uns dentro dos outros, do lado
direito da figura 65. Um dos encarregados sobe a um pequeno escadote,
encosta o cesto à chamada espera da base e despeja o conteúdo.
Quando necessitam de encher a base, baixam uma alavanca de
madeira de tipo inter-fixo, que eleva a portinhola, deixando passar a
azeitona. A esta alavanca dão o nome, em Cerejais, P. 90, de monzeira.
O termo, formado do substantivo mão pela adjunção do sufixo (mão+zeira
> mãozeira > monzeira) provém do facto da haste de madeira terminar por
uma pega própria para a mão.
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