COMENTANDO-O aqui, e
relacionando-o com outros
conhecimentos históricos, vai adiante publicado um documento sobre uma
das marinhas da Ria de Aveiro, a − «Marinha da Passagem» − situada ao
poente do
Canal das Pirâmides, junto a esta cidade. Vem ele recordar-nos os nomes
e as condições sociais em que viveram e se encontraram algumas das
individualidades que, hoje figuras apagadas e esquecidas da memória dos
homens, fizeram progredir e brilhar com os seus haveres e com a sua
nobreza a antiga vila de Aveiro, em pleno século XVIII.
Se a execução dos Duques de Aveiro não contribuiu pouco para que a vila
subisse à categoria de cidade em 1759, não deixaria também de ser levado
em conta, para isso, o valor da povoação que, ao tempo, não seria uma
povoação frívola, quer fosse encarada sob o ponto de vista do seu
esplendor e actividade comercial e industrial, quer sob os títulos
nobiliárquicos com que muitos dos seus habitantes a honravam e
enobreciam. Naquele século XVIII, bem como nos séculos precedentes,
houve em Aveiro homens de letras e homens com riqueza, todos
laboriosos, activos, filhos de alguém que com os seus solares brasonados
ou com os seus pergaminhos recônditos em velhas arcas, fizeram florescer
a nobre e notável vila, marcando no meio das famÍlias nobres um lugar de primoroso destaque.
Isto mesmo nos é revelado por tantos e tantos documentos esparsos nas
bibliotecas e arquivos públicos, bem como nos arquivos particulares,
entre os quais se conta o nosso, no qual existe o presente e outros
documentos, inéditos uns, ou já publicados outros na 2.ª edição da Monografia da Gafanha
e no Arquivo do Distrito de Aveiro. Nesses
documentos, desde o século XVI até ao século XVIII, Aveiro está bem
representada com um contingente muito farto e brilhante de famílias
nobres.
/
234 /
Como, porém, no mundo tudo é efémero, as pessoas
passam como os povos e as civilizações, descendo das alturas do seu fastígio e das grandezas a que tinham chegado,
para as contingências e vicissitudes que a Providência lhes marcava.
À opulência e às grandezas sucede
quase sempre a decadência.
É o que nos revela este documento agora em tese, e outros ainda
inéditos ou já publicados. Compulsada a vasta
documentação em nosso poder, confirma-se a grande verdade do declínio das personagens que figuram no presente
documento e que tinham sido grandes em Aveiro. Ali viveram e tiveram avantajada preponderância; no fim, caíram
quase abruptamente do seu fastígio para uma situação de vulgaridade,
perdendo-se os seus pergaminhos de morgadio,
ou dispersando-se os bens das suas Casas ilustres.
É incontestável que Aveiro esteve bem representada no
século XVIII com homens de aprimorada estirpe, de ascendência muito
ilustre.
Luís da Gama Ribeiro Rangel de Quadros e Maia, João Ferreira da Cruz, Fernando José Camelo de Miranda Pinto Pereira da Silva, D. Maria
Eufrásia Soares de Albergaria, Francisco António Camelo Falcão Pereira
da Silva, D. Luísa Caetano Camelo Falcão, D. Francisca Luísa Teresa,
pertenceram todos à primeira nobreza de Aveiro naquele século, e
em breve tempo se perderam as suas Casas e esqueceram os seus títulos de
nobreza.
O presente documento apresenta-nos Luís da Gama já
em apressada decadência. Os outros nomes que acima
indicamos em vantajosa e justificada situação sobre o primeiro, em breve
o seguiram na derrocada.
Quem eram essas personalidades aveirenses portadoras
de nomes tão ilustres, sendo algumas delas, hoje, completamente
desconhecidas?
Luís da Gama Ribeiro Rangel de Quadros e Maia foi
senhor de um Morgadio, Cavaleiro Fidalgo da Ordem de
Cristo, Capitão-mor, Juiz da Alfândega de Aveiro e Governador da Barra.
Descendia de uma família nobre de Esgueira
− os Maias −,
cujo tronco foi António Maia. Este teve por sucessor seu
filho, outro António Maia, casado com D. Maria Dias de
Araújo camareira-mor de D. Beatriz de Lara que foi fundadora do convento do Carmo, de
Aveiro.
Este casal veio depois fixar-se em
Aveiro.
O seu filho, António da Maia de Araújo, tendo casado
em Leiria com D. Maria de Andrade da Gama, ajuntou este sobrenome de −
Gama ao antigo apelido de − Maias, com o qual esta ilustre família já
era designada.
/
235 /
Sucedeu-lhe seu filho João da Maia da Gama que, por se ter distinguido
na guerra da Aclamação, recebeu o título de Cavaleiro da Ordem de Cristo
com a tença de 110$000 réis
e a promessa de tença de dote de 200$000 reis.
Também este foi juiz da Alfândega de
Aveiro. Creio que foi o primeiro
desta família que desempenhou este cargo.
Segue-se-lhe, por falta de herdeiro directo, sua irmã
D. Luísa da
Gama de Andrade que casou com Pedro Ribeiro de Oliveira Barreto,
familiar do Santo Ofício.
Sucedeu-lhe depois Carlos Ribeiro da Maia da Gama, também familiar do
Santo Ofício, capitão de infantaria e juiz da Alfândega de Aveiro.
A este sucedeu, finalmente, seu filho Luís da Gama Ribeiro Rangel de
Quadros e Maia de quem especialmente
nos queremos ocupar e a quem nos referimos no princípio deste esboço
genealógico (Vide Arquivo do Distrito de Aveiro, voI. VI, pág. 47).
Depois deste, pode dizer-se, desapareceu a sua Casa e a
sua família.
A decadência transparece no documento que a seguir vai ser publicado, em
outro já publicado na Monografia da Gafanha (2.ª edição, pág. 329) e em
outros mais documentos inéditos, entre os quais o das «Contas do
Vínculo» de Fernando Camelo correspondentes ao período que vai de
1736-1744.
Se esta Casa e esta família brilharam, decaíram e desapareceram, não
foram mais afortunados os representantes de outra Casa importante que o
presente documento e outros, ou já publicados ou inéditos, nos
apresentam a competir vantajosamente com o falido Luís da Gama.
Este documento e outros, indicam-nos igualmente muitas
outras personalidades que se notabilizaram em Aveiro. Falemos por agora
das que constam do presente documento.
João Ferreira da Cruz, figura inicial do processo jurídico de que trata
o documento, entra nele como credor do Capitão-mor Luís da Gama Ribeiro
Rangel de Quadros e Maia, outro fidalgo de Aveiro e do qual atrás nos
ocupamos.
Falar de J. Ferreira da Cruz, Cavaleiro Fidalgo da Casa Real, Professo
do Hábito de S. Tiago, Almoxarife dos direitos do sal de Aveiro, homem
de preponderância na antiga vila de Aveiro, recordar o seu nome já
esquecido, apontar apenas alguns traços da sua incompleta biografia, é
concorrer de algum modo para ampliar a história de Aveiro e até mesmo,
em muitos passos, a história do Distrito.
'Os documentos existentes
sobre a sua actuação, dentro e fora destas
redondezas, dariam material que bastaria para amplitudes históricas de
grande repercussão.
/
236 /
João Ferreira da Cruz, filho de Manuel Fernandes e de D.
Isabel
Ferreira, era natural de Maçãs de D. Maria, vindo fixar-se em Aveiro, e
casando com D. Francisca Luísa Teresa em datas que desconhecemos.
Não deveria ter sido muito abastada a sua família. No
inventário orfanológico corrido no Julgado do Chão do Couce em 1692,
por morte de sua mãe, coube a cada um dos nove irmãos o valor de 317$497 réis. Ainda que bastante valorizada a moeda daquela época,
surpreende-nos sobremaneira que ele, com tão limitada herança por parte
de sua mãe, conseguisse fundar uma Casa das mais opulentas e importantes
da região aveirense.
Duas filhas professaram no convento da Madre de Deus, em Sá de
Aveiro,
tendo ele dotado cada uma com a tença
vitalícia de dez mil réis anuais, depois de feita a composição das suas
legitimas com o mesmo convento. As outras duas casaram.
D. Micaela Luísa de Aguiar Franco casou com António José Saraiva de
Castelo Branco e a D. Luísa Teresa Caetano de Lemos com Francisco
António Camelo Falcão Pereira da Silva. Esta senhora também usou o nome
de D. Luísa Caetano Camelo Falcão, simplesmente.
Uma e outra foram dotadas pelos pais para haverem de casar com os seus
maridos. Além dos dotes, foram instituídos, por aqueles, dois vínculos
de Morgado: um a favor da primeira filha, e outro a favor do neto da
segunda. Acerca do primeiro diz o respectivo documento o seguinte:
«Para hauerem de casar a senhora D. Micaela Luiza de Aguiar
Franco com
o senhor Jozeph Saraiua Castelo Branco fizerão os Pais da dita
Senhora escreptura do dote com que a dotauão e nella entre outras couzas
se diz o seguinte:
Dotaua à dita sua filha D. Micaela Luiza em primeiro lugar a sua benção
e dipoes della para os emcargos do Matrimonio que delles decenderem por
Conceruação e aumento de Seo nome e família davão e dotauão a dita Sua
filha trinta mil cruzados em vinculo de Morgado a fauor de sua filha e
de Seos descendentes, de que lhes fará entrega do dotte logo que
recebidos forem, com tal pacto e Condição que os ditos 30 mil cruzados
Sempre andarão permanentes, e seguros em vinculo de Morgado na dita sua
filha e Seos descendentes para sempre the ao fim do mundo em Sua Só
pesoa, sem Se alhearem, diuidirem ou por outro modo descambarem, e a
suceção será Regular na forma da Ordem nos descendentes delles
dotadores, e no cazo que do dito matrimonio não haja filhos, ou pello
tempo ao diante falte a descendencia segura porque Só esta querem que
haja de suceder neste Morgado, Sucederá nelle a pesoa ou pesoas, que
elles dotadores nomearẽ em o seu testamento, porque faltando, a
descendencia segura dos dotados, ou falecendo a dita sua filha Sem
descendentes se lhe restituhirá
o dito dote para que delle se cumpra o que em Seo testamento ordenarem
e serão obrigados asim os dotados como os mais Sucesores in perpetuum
mandar dizer em cada, etc −
Sintra 5 (sem dizer o mês e ano)
/
236 /
segue:
E a este fim de que o dito vinculo se não extinga e diminua ou
dezemcaminhe ao que elles dotadores entregarem em dinheiro ou
escripturas de
Juro lhe dará o dotado seguransa em bens de Rais equivalentes, e de tal
qualidade que fique o dito dote em sua firmeza e com a perpetuidade que
aSima expoem, o qual dote elles dotadores por com elles dispendido com mão larga Sobre o Seo pouco merecimento pertendião inda
aumentar em muito... Sobre o que e as mais condisois que acrecentacem
Se estaria sempre pello que dispozerem em Seos testamentos, etc. Dotou ce tãobem o dotado com os bens que tinha e aceitou o dotte e obrigou a
entrega delle na falta de suceção, os mesmos bens.
Teve efeito o matrimonio e Selebrado elle levou a dita Senhora
varias
pessas de ouro e prata e Roupas e depois se lhe deo o que foi nesessario,
etc
Tambem continuou o Pai da dotada a dar varios dinheiros e trastes e
milho e outras mais couzas, e a fazer-lhe obras de grande valor nas
casas
e fazendas dos dotados de que o dito Senhor Antonio Jozeph. Era Senhor,
no qual se tem gasto concideravel dinheiro e sempre tudo foi gasto
pello Pai da dotada com o Intento de ser por conta do dito dote, o qual
tem continuado em varios c.
Dice o Pai da dotada ao dito Seo genro que lhe queria entregar o dote
que tratace de lhe fazer seguransa com bens liures na forma da
escreptura: o que não fes lhe aprezenteem que Se continua em
dizer-ce-Ihe o mesmo, e
tanto que se lhe mandou Rol das propriedades que lhe dão para o dito dotte,
o qual Se quis sempre entregar.»
Segue o documento numa série de considerações e consultas feitas por
João Ferreira da Cruz a um jurisconsulto sobre o vínculo, dote,
dinheiros e outras dádivas a favor de António José Saraiva e D. Micaela.
Transparece logo pela forma como são redigidas essas consultas que
eles
não teriam aceitado o vínculo nas condições propostas, referentes ao
dote, dinheiro e outros benefícios.
Para que António José Saraiva e D. Micaela tiveram um só filho, José
Pedro, de quem João Ferreira da Cruz fala no
seu testamento, mas não de harmonia nem nas condições a que se alude na
instituição do vínculo de Morgado supra, em favor de seus pais.
Diz-se nesse testamento que José Pedro seria investido no outro vínculo
de Morgado instituído em favor de Fernando Camelo, se os pais deste não
cumprissem certas formalidades do mesmo testamento (Monografia da
Gafanha, 2.ª edição, págs. 263 e 269). As formalidades foram cumpridas
e Fernando Camelo entrou no Morgadio. A forma da redacção das
consultas; a projectada investidura condicionada de José Pedra no
Morgadio de Fernando Camelo, se os pais deste não cumprissem certas
condições impostas pelo instituidor à hora da morte, e o silêncio
absoluto notado em tantos documentos existentes no arquivo da família,
levam-nos
/
238 /
à conclusão de que aquele Morgadio não chegou a existir e que os seus
representantes vieram a falecer sem sucessão.
É, porém, incontestável que João Ferreira da Cruz possuia haveres que
bastavam para a fundação de dois vínculos de Morgado.
Foi mais importante o outro vínculo que
ele instituiu em 1736 a favor de
seu neto Fernando José Camelo na capela de Nossa Senhora de Monsarrate
da quinta das Ribas do Castelo da Vila da Feira. O documento vem
publicado na página 269 da já mencionada Monografia da Gafanha.
Fernando José Camelo, filho de Francisco António Camelo Falcão Pereira
da Silva e de D. Luísa Caetano Camelo Falcão, era menor ao tempo da
instituição, ficando por isso o vínculo a ser administrado pela sua avó
até que ele atingisse a idade de 25 anos ou até que casasse.
Como se prova pelas «Contas do Vínculo» e por outros documentos, ainda
ela era administradora em 1750, e em um documento de 1759 são os pais de
Fernando José que figuram na administração de seus bens e vinculo.
Este continuou a crescer com novos bens de raiz largamente adicionados por compras, ou pela herança recebida da Casa dos pais
do instituído.
Decorre o breve tempo áureo desse Morgadio infortunado, até que em 1792 com o testamento e morte de Fernando José Camelo de Miranda Pinto Pereira da Silva, Cavaleiro do Hábito
de S. Tiago, Moço Fidalgo da Casa Real, sobrevém o esfacelamento daquela
ilustre e abastada
Casa.
Ainda que opulenta esta Casa, veio a desaparecer
quase completamente, por Fernando Camelo não determinar herdeiro certo
na sua disposição testamentária.
Além de outras coisas diz assim o testamento: (. . .) «por
não termos Sucessão (...) no rresto dos meus bens Instituo por meu
univerçal herdeiro aquelle, ou aquelles dos meus parentes que Se acharem
mais proximos ao tempo da minha
morte, e que forem da parte de minha may» (...)
Ficava incerto o herdeiro de Fernando Camelo, e daí proveio todo o
cortejo de irritantes incidentes e acontecimentos, as tentativas
indecorosas de suborno, etc. ... para
afastar da herança João Lopes Ferreira, legitimo herdeiro
(Ob. cit., pág. 79).
Os tribunais, porém, confirmaram a habilitação
deste, declarando-o
herdeiro e administrador do vínculo contra a pretensão de D. Francisca Josefa Ferreira, também parente, de Figueiró-dos-Vinhos.
Fernando Camelo tinha falecido em 1792. João Lopes
Ferreira, sem dinheiro para despesas supervenientes e desajudado
/
239 / de influências para fazer valer os seus direitos, só tarde, em
Novembro de 1797 é auxiliado, por meio de contrato, por António da Costa Soares, consegue sentença declaratória de herdeiro aos bens e
administração do vínculo.
Um mês antes, já a sua parente opositora tinha entrado abusivamente,
por aforamento, na posse da Gafanha. Só muito tarde, em 1836, João
Lopes Ferreira anula com novo aforamento o aforamento da intrusa. Em
1797 já esta estava ilegitimamente de posse do Morgadio de concerto com
os seus três filhos: o capitão João António Leitão e dois irmãos
sacerdotes (ob. cit., pág. 79 e outros docs.).
Durante o interregno de 1792 a 1797 era muito limitado o número dos que
tinham conhecimento de quem era o legítimo herdeiro de Fernando José
Camelo.
Não obstante ser declarada pelo tribunal a legitimidade de João Lopes
Ferreira, os ocupantes das propriedades e de
tudo o que constituía a abastada Casa do antigo Morgado, continuaram a
usufruí-las tacitamente e de má-fé, passando de arrendatários a
pseudo-donos, ou pseudo-proprietários dessas propriedades. E assim
ficaram.
Já era tarde quando João Lopes Ferreira, legalizada a
sua legitimidade ao vínculo, se pôs em acção para fazer valer
judicialmente os seus direitos de hereditariedade contra os usurpadores.
Sendo natural, como os seus antepassados, de Casais, termo de Maçãs de
D. Maria, ali residiu até 1807,
vindo fixar-se nesta data na quinta do Vale-de-Ílhavo pertencente ao Morgadio. Dali deu princípio a demandas
ou questões
judiciais contra intrusos e ocupantes, mas como fosse de minguados
recursos para os desalojar, carecia de gastar rios de dinheiro que a sua
magra bolsa não podia comportar.
Os poderosos ocupantes venciam as questões, os processos eram
arquivados, ficando muitos litígios sem solução judicial, como aconteceu
com a questão dos prazos da Coutada de Ílhavo, que ainda recentemente
Francisco António Camelo havia comprado ao Capitão-mor Luís da Gama Rangel
de Quadros.
O mesmo acontecia com outros litígios da Vila da Feira, das diversas
casas da Rua das Flores no Porto, etc....
A casa de J. Lopes Ferreira ficou por esta maneira parcelada pelas mãos
dos ocupantes e intrusos que, por vezes, eram as juntas das freguesias,
como aconteceu com a junta
da freguesia de Sôza.
Pouco mais se salvou do que uma pequena parte do Morgadio que ficava
circunscrita às redondezas do Vale de Ílhavo que João Lopes Ferreira
legou aos seus sucessores. A parte mais importante e a substância da
Casa tinha ficado dispersa por longe, podendo dizer-se que tudo se
perdeu.
/ 240 /
Acentuemos, porém, que João Ferreira da Cruz lutou
denodadamente para fundar e engrandecee a sua Casa.
Por se ter extraviado e destruído a maior parte dos
documentos pertencentes ao seu arquivo, ficam ignorados
muitos passos que desejaríamos relatar aqui. Não obstante o desbarato do tempo e dos homens, o confronto da parte
que se salvou ainda nos atesta quão fecundos e prodigiosos
foram os labores desse homem activo e incansável.
Ao acaso, vejamos uma pequena amostra:
Em 1700 fica com o contrato da pesca do sável do Riba-Tejo pertencente à Casa de Bragança, obtendo
esse contrato
por trespasse do Doutor Manuel Rodrigues Correia.
Em 1703 tinha feito contrato dos frutos e rendas do Almoxarifado de Eixo, pertencentes à mesma Casa de Bragança.
Em 1712, de sociedade com o capitão-mor Francisco Correia de Sá, de Sanfins, Vila da Feira, faz o contrato
sobre o novo imposto dos vinhos
verdes da Comarca de Esgueira. Em 1715, cede os seus direitos ao capitão-mor, em troca de uma escritura de dívida de 800$000 reis,
assinada na sua casa das Ribas do Castelo, e em 1717 o mesmo capitão-mor
faz-lhe outra escritura de 300$000 reis assinada no Paço do Castelo.
Tendo falecido João Ferreira da Cruz, o seu genro Francisco António
Camelo cita e demanda em 1741, pelas duas escrituras, o capitão-mor que
então estava preso na cadeia
de Vila da Feira.
Em 1724 e 1730, por contratos feitos há mais tempo, já estava de posse
e recebia os frutos e rendas dos celeiros, respectivamente, de
Verdemilho e de Famalicão pertencentes a Francisco de Almada, donatário
de Carvalhais e ÍIhavo.
Comprava várias propriedades e casas em Aveiro (1728),
Ovar (1732), Angeja (1731), Aradas (1730 e 1733), etc....
Comprou também marinhas (1721, etc...), propriedades, e as azenhas da Torre e da Quinta do Barreto no Vale de ílhavo(1729),
etc.
Em 10 de Março de 1736, data do falecimento de João Ferreira da Cruz,
ocorrida na rua de S. Paulo de Aveiro, os rendimentos das propriedades,
foros e dinheiro emprestado eram muito avultados, como consta da «Conta
do Vínculo» administrado por D. Francisca Luísa Teresa desde 1736 a
1744.
Mas à Casa vinculada na pessoa de seu neto veio
juntar-se a casa
também abastada do pai deste, Francisco António Camelo, que fez crescer
os bens do vínculo com novos
bens próprios ou comprados.
Assim:
Em 1746 e 1752 comprou umas propriedades e os prazos
da Coutada ao Capitão-mor Luís da Gama R. de Quadros.
/ 241 /
Em 1750 comprou ao mesmo a azenha da Barroca de
Ílhavo, uns foros e propriedades de Verdemilho e Vale de Ílhavo.
Em 1753 comprou casas nos Moitinhos.
Em 1757 fez apegação dos grandes prazos de Cancela,
termo de Sanfins, de Lamego.
Tendo a sua residência em Aveiro, fez várias compras
em 1759 quando residia na sua quinta de Travanca de Sanfins.
Pois esta Casa que assim cresceu e brilhou em Aveiro nestas
datas,
também desapareceu rapidamente (pode fixar-se a data) em 1792 com a
morte de Fernando Camelo.
E foi tão opulenta quando absorvia a de Luís da Gama!! E quase num
momento, se perdeu também com os seus representantes!!... Assim
desapareceram os dois Morgadios de Aveiro.
Eis o que quisemos expor aos leitores do documento
sobre a «Marinha da Passagem».
Eis mais a árvore genealógica da família Ferreira da
Cruz:
1.ª ÁRVORE GENEALÓGICA
D. Isabel Ferreira − casada com
− Manuel Fernandes
Destes:
João Ferreira da Cruz − casado com
− D. Francisca
Luísa Teresa
Destes:
D. Luísa Caetano Camelo Falcão
− casada com
Francisco António CameIo Falcão Pereira da Silva
Destes:
Fernando José Camelo de Miranda Pinto Pereira da Silva
− casado com − D.
Maria Eufrásia Soares de Albergaria
Destes:
Não houve sucessão, passando a Casa para os representantes da
2.ª ARVORE GENEALÓGICA
D. Isabel Ferreira − casada com
− Manuel Fernandes;
Destes:
Manuel Fernandes de Lemos (irmão de João F. Cruz)
− casado com - ?
/
242 /
Destes:
D. Teresa de Jesus Teixeira
− casada com − António
Lopes
Destes:
João Lopes Ferreira − casado com
− D. Teodora Maria da Rosa
Destes:
D. Josefa Maria da Rosa − casada com
− António
Fernandes Teixeira
Destes:
José Fernandes Teixeira − casado com
− Luísa Vieira Resende
Destes:
Josefa, Ana e Maria (Resende).
MORGADOS DESTA CASA:
1.º Morgado: − Fernando José Camelo de Miranda Pinto
Pereira da Silva (segue para seu 2.~º primo
2.º Morgado: − oão Lopes Ferreira
3.º Morgado: − D. Josefa Maria da Rosa
4.º Morgado: − José Fernandes Teixeira.
Com o falecimento deste em 1893, ficou extinto o Vínculo que foi uma
ligeira aparência do que tinha sido no tempo do 1.º Morgado.
P.e JOÃO VIEIRA
RESENDE
Continua na pág.
295 − ►►► |