LANGÓBRIGA ou
Langóbrica é
nome gaulês, de Lango,
antropónimo, e briga «fortaleza, cidade fortificada».
Diz D' ARBOIS DE JUBAINVILLE, ilustre professor de língua
e literatura céltica: «...nom de lieu gaulois est Langoratum, probablement «forteresse de
Langos». Langos est un
nom d'homme gaulois écrit Lagge au vocatif dans une inscription
de Narbonne CC.I.L., XII, 9438). Dans Lango-ratum on peut
reconnaître un synonyme de Langobriga, nom d'une station romaine d'Espagne sur la route de Lisbonne à Braga (ltinéraire
d'Antonin, 521,7) écrit Lango-brica par le Géographe de
Ravenne (307,3), On trouve le premier terme, lango, dans
Laggobritai, nom d'un peuple d'Espagne mentionné par PLUTARQUE, «Vie de Sertorius, § 13».
Revue Celtique, tome XVI,
Paris, 1895».
Acerca do elemento briga, v. I. C. ZEUSS
− H. EBEL, Grammatica Celtica e Monumentis Vetustis, pág. 86. Berolini MDCCCLXXI;
A. HOLDER, Alt-Celt. Sprachschatz, paI. briga. Leipzig 1911.
Da etimologia de Langóbriga trataram RODRIGO MENDEZ SILVA, Población General de España..., pág. 156, Madrid 1645. HENRIQUE
FLOREZ, España Sagrada, voI. XIV, pág. 220. Madrid, Año
de M.DCCLXXXVI., P.e JOAQUIM R. ESPANCA, As Lacobrigas da Lusitania, in
Revista Archeologica, voI. II, págs. 173-177, Lisboa 1888;
A. STRECHT DE VASCONCELOS, Velharias do Distrito de Aveiro − Talabriga, in
"Correio do Vouga", ano de 1934 (de 3 de Março
a 26 de Maio), pág. 8-9, etc.
D'ARBOIS DE JUBAINVILLE fala-nos de outra cidade, de origem
céltica, Laccóbriga: «Ptolémée donne aux Celtici qui habitaient
entre le Guadiana et le Tage treize villes, parmi lesquelles quatre
portent des noms celtiques, Laccobriga, Mirobriga, Arcobriga,
/ 130 /
Meribriga. De ces quatre villes, la première était située sur l'Océan, à peu de distance à l'est du cap Saint-Vincent, qui est l'angle
sudouest de la péninsule ibérique en Portugal: Laccobriga ou Lacobriga est aujourd'hui Lagos, province d'Algarve.
Revue Celtique, tome XIV, pág. 392-393.
De PTOLOMEU, apenas encontrei a forma
Lancóbriga, cidade
que vem situada, não, onde hoje é Lagos, mas entre o Tagus
(Tejo) e o Calipus (Sado), não muito distante do Oceano.
PTOLOMEU começa por referir-se aos Turdetanos:
Turdetani occupant:
ln quibus vrbes in Lusitanioe Mediterraneoe
hoe:
«Os Turdetanos possuem na Lusitânia as seguintes cidades»:
Pax lulia e Iulia Myrtilis
Fala depois dos Celtas:
lnteriora his habitant Celtici.
ln quibus vrbes in Lusitania hoe:
«Mais para o interior destes (= Turdetanos) habitam os
Celtas que têm as cidades de:
Lancobriga, Piana, Bretoloeum, Mirobriga e Arcobriga.»
Refere-se em seguida aos Lusitanos:
Quoe supra hoec sunt tenent Lusitani in quibus vrbes Mediterraneoe hoe:
«Os Lusitanos habitam a região superior, e as suas cidades são:
Aeminium, Chretina, Arabriga, Scalabiscus, Toecubis, Concordia, Talabriga, Rusticana, Mendeculia, Caurium, Turmogum,
Burdua, Colarnum, Sallecus e Ammoea.»
(CLAUDIUS PTOLEMAEUS, Geographiae Vniversal...
Tabula Secunda Europae. «Liber
Secundus. Ioan. Antonio M. Patavino. Anno 1608»).
No Theatrvm Geographiae Veteris,
«edente Petro Bertio
Bevero. Amstelodami Anno 1618» − vem escrito Cepiana e
não Piana, Mendiculeia, em vez de Mendeculia, Tacubis e não
Toecubis, lsalaecus em lugar de Scalabiscus. Lancóbriga vem
situada junto do Tagus, ficando-lhe ao norte, Arabriga; a leste,
Concordia (ao norte do Tagus) e Mendeculeia (ao sul do
Tagus); ao sul, Bretoleum e Arcobriga; ao ocidente
Cepiana. Talábriga
/
131 /
está ao sul do Monda (Mondego). Entre o Dorias (Douro) e o
Vacus
(Vouga), vêm situadas Aritium e Lauara, em território que foi da Terra
de Santa Maria. O P.e JOÃO BAPTISTA DE CASTRO localiza Aritium, entre o
concelho da Feira e o de Arouca, Mappa de Portugal Antigo e Moderno,
Tomo I, pág. 8. Arezo, Arez, Ariz, são vozes que podem representar
actualmente o étimo latino Aritium. Não conheço nenhum topónimo assim
designado no concelho da Feira. O que mais se aparenta com Aritium é
Arilhe, povoação da freguesia do Vale. Terá sido Aritium o nome
primitivo da «cividade» da Portela, da freguesia de Romariz? Adiante
voltaremos a falar deste topónimo.
De Lavara (o mesmo que
Lauara) ou Labara diz RODRIGO MENDEZ SILVA: «Sobre la fundación (de Aveiro) ay dos opiniones: Vnos dizen ser de
Griegos Lacones, y Celtas, anos 365. antes de nuestra Redempcion, los
mismos q. a Lamego, en su
Capitulo referidos, nombrandola Talabriga, como a Talauera, y Tauira.
Pero Florian quiere la cimentassen Turdulos, y Celtas, sessenta anos
despues, a que me inclino, con apellido Labara, corruto en Aueyro.»,
Poblacion General de España, pág. 177. Madrid 1645.
MANUEL FARIA E SOUSA escreve: «De
Lavara, ciudad notable por differentes
memorias; mas falta la deI sitio que occupava: el nombre permanece en
una Aldea que junto a la marina dista dos leguas de la ciudad deI
Porto.» Evropa Portuguesa. Tomo I, pág. 95. Lisboa 1675.
O P.e JOÃO BAPTISTA DE CASTRO é da mesma opinião de FARIA E SOUSA. Para
ele Labara era «um logar pequeno sobre o mar no termo do Porto.», Mappa de Portugal Antigo e Moderno. Tomo I, pág. 27. Lisboa, MDCC.LX
III.
Também a respeito de Lavara
informa o P.e FRANCISCO DO
NASCIMENTO SILVEIRA: «PTOLOMEO na II Taboa da Europa, põe esta Povoação
em 41 graus entre as Cidades dos Lusitanos; e BRITO diz que Lavãos ainda
lhe conserva a memoria, que é um Lugar nas vizinhanças de Buarcos, o
que padece dúvida, por estarem os Povos Labaros, segundo FLORIÃO, perto
de Aveiro.», Mappa Breve da Lusitanía Antiga. Tom. I. p. 232. Lisboa. M. DCCCIV.
PLÍNIO refere-se a um povo com o etnónimo de
Lacobrícenses: «sicut in
Vaccaeorum XVIII civitatibus, lntercatienses, Pallantini,
Lacobrícenses, Caucenses.» Hístoría Naturalis. Liber III.
cap. IV. Estes
Lacobrícenses habitavam na região da cidade de Lacóbríca, situada ao sul
dos montes Cantábricos e ao norte das cidades de lntercatia, Pallantia
e Cauca. Em outro sítio, escreve: «Durio
/
132 /
Lusitania incipit: Turduli veteres, Paesuri: flumen Vacca. Oppidum
Talabrica.» Liber IV, cap. XXXV. Tradução:« No Douro
começa a Lusitãnia: os Turdulos antigos, os Pesuros, o rio Vouga, a
cidade de Talábriga». Estranhamos que não se refira à cidade de
Langóbriga, ao norte de Talábriga, citando os Turduli veteres, seus
antigos habitantes. Nomeia os Paesuri, povo da região do Ur (hoje
UI).
Parece considerar o Antuã como início do Vouga e cita Talábriga ao sul,
com relação ao Antuã.
PLÍNIO faz outra referência ao actual concelho da Feira no seguinte
passo: «Durius amnis ex maximis Hispaniae, ortus in Pelendonibus, et
juxta Numantiam lapsus dein per Arevacos Vaccaeosque, disterminatis ab
Asturia Vettonibus, a Lusitania GalIaecis, ibi quoque Turdulos a
Bracaris arcens. Omnisque dicta regio a Pyrenaeo metalIis referta auri,
argenti, ferri, plumbi
nigri albique.» Liber IV, cap. XXXIV. «O rio Douro, dos maiores rios da
Espanha, nasce no país dos Pelendões, passa perto de Numância, atravessa
a região dos Arevacos e Vaceus, separa os Vetões, da Astúria, os Galecos,
da Lusitânia e os Túrdulos dos Brácaros. Toda esta região, a partir dos
Pirenéus, está cheia de minas de ouro, de prata, de ferro, de chumbo
negro e branco.»
POMPÓNIO MELA refere-se apenas a
Lacóbriga, do AIgarve (hoje Lagos): «ln
Cuneo sunt Myrtili, Balsa, Ossonoba: in Sacro Lacobriga, et portus
Annibalis. De situ orbis, in «ColIection des Auteurs Latins publiés
sous la direction de M. Nisard», Lib. IlI, cap. I., Paris, 1854.
PLUTARCO descreve um feito militar de Sertório, cujo teatro de operações
foi a cidade de Langóbriga, de entre o Douro e o Vouga, segundo a
opinião de alguns historiadores, em território que pertence,
actualmente, ao concelho da Feira:
«Cum vero animadvertisset MetelIus Lacobritas, qui non parvam opem
Sertorio afferebant, siti faciliter expugnare posse (unum enim duntaxat
puteum intra urbem habebant) suburbanas vero et circummoenianas obsessor
aquas poterat auferre aggrediebat urbem ea spe, ut duorum spatio dierum
ablatis a aquis ea potiturus esset. ltaque militibus edixerat ut quinque
dierum cibaria secum deferrent. At Sertorius celeriter cognita re
auxiliatus, duo millia utrium impleri aqua jubet, polIicitusque pro
quoque utre certa argenti pondera. Multis ex lberis, multis etiam ex
Maurusiis negocium suscipientibus, delectis viris robustis acuelo cibus
mandat, ut cum aquam inferant, tum inutilem belIo turbam, ut diutius
potus sufficiat reliquis educant. Quod cum intelIexisset MetelIus, et
jam deerant cibaria, Aquilium
cum sex millibus militum frumentatum mittit. Huic vero redeunti
Sertorius insidias tendit in eumque redeuntem tria milIia militum
/
133 /
a tergo ex quadam valle excitat ipse a fronte obviam factus
vertit Aquilium profligatque. Ex militibus qui cum Aquilio erant
partim capti sunt, partim necati. Aquilius amisso equo armisque
solus effugit. Quo facto confestim obsidionem relinquere Metellus ac
turpiter nimium a Sertorianis, de risus abire coactus est.»
PLVTARCHI CHERONEI Graecorvm Romanorvmque, illustrium vitae, e Graeco in
Latinum versae. Lvgdvni, 1548.
Tradução: «Metelo sabendo que os Lacobritas prestavam
grandes auxílios a Sertório, e, parecendo-lhe empresa fácil
vencê-los pela sede, pois não havia senão um poço na cidade,
que eles habitavam, e os ribeiros e as fontes dos subúrbios e
arredores ficariam em poder daqueles que a sitiassem, resolveu fazer-lhe
um cerco, com a esperança, de que, no espaço de dois dias, faltando-lhe
a água, se apoderaria dela. Mandou preparar às suas tropas víveres para
cinco dias e pôs-se a caminho da cidade. Mas Sertório pensou logo na
maneira de a socorrer. Ordenou que se enchesse de água dois mil odres e
prometeu, por cada um, determinada quantia de dinheiro. Apresentaram-se
para executar a empresa muitos Iberos e Maurúsios. Sertório
escolheu os mais robustos e ágeis e enviou-os pelo monte, onde estava
situada a cidade, com ordem de distribuir os odres pelos
habitantes e de obrigar a sair todos os homens inúteis, afim de não
faltar água aqueles que haviam de defendê-la.
Metelo ficou muito arreliado com
este estratagema, pois as provisões,
que tinha mandado arranjar, começavam a escassear. Enviou Aquino com
seis mil homens buscar mais mantimentos.
Sertório soube disso, e, logo que Aquino passou, armou-lhe uma cilada:
quando ele regressava com um comboio de víveres,
mandou sair de um vale espesso três mil homens que aí tinha escondido,
que o atacaram pela retaguarda. Sertório surgiu pela frente com outras
tropas. Corre para Aquino. Parte dos seus soldados foi aniquilada, parte
ficou prisioneira. Aquino perdeu na refrega o cavalo e as armas, e
salvou-se correndo para o
campo de Metelo, que, com esta derrota, foi obrigado a levantar
vergonhosamente o cerco, pesando-lhe muito ver-se apupado
pelos soldados de Sertório.»
Fr. BERNARDO DE BRITO procura localizar em Lagos o feito
de Sertório, Monarchia Lvsytana, tomo I, p. 266-278. Lisboa. Anno Dñi I
609.
Fr. HENRIQUE FLOREZ diz: «En PLUTARCO sobre Sertorio
(aI medio) leemos à los Laggobrítas que parecen ser los vecinos
de Langobriga, pueblo que dice no tenia dentro de los muros
mas agua que la de un pozo: y aunque esto pudo convenir à
los vecinos deI Sacro Promontorio (que segun Strabon carecia
de agua) me inclino mas aI Langobriga de Antonino.», España
Sagrada, voL. XIV, p. 220.
/
134 /
o P.e FRANCISCO DO NASCIMENTO SILVEIRA escreve: «Lacobriga.
Povoação das mais antigas desta Costa, (do Algarve), teve a sua primeira
situação no distrito do Paul, ou Lagoa, distante pouco mais de uma
milha de onde hoje vemos a Cidade de
Lagos... Crê-se fundação de Brigo, quando outros lhe dão por
Fundadores aos Lacoós: mas nada disto podemos verificar, senão que já
nos tempos de Sertório se distinguiu belicosa. Este grande General lhe
meteu de socorro «dous mil odres de água, estando ela cercada por
Metelo.», Mappa Breve da Lusitania Antiga. Tomo I. p. 295.
AEMILIUS HUBNER, fazendo referência aos
Laggobritai, de
PLUTARCO, é com incerteza que os localiza na Lusitânia. Monvmenta
Lingvae Ibericae. Berolini MDCCCLXXXXIII.
Diz o professor LEITE DE VASCONCELOS: «Acrescenta PLUTARCO
que Sertório mandara aos Langobritas socorros de água que
foram levados em odres por gente robusta e ágil através da região
montanhosa: do que poderá concluir-se que a cidade estava situada em uma
montanha». Religiões da Lusitânia, vol. III, p. 139. E a seguir: «A
palavra Langobritas lembra
Langobriga e Laccóbriga; mas Langóbriga ficava ao N. do Tejo,
e por isso longe do campo de operações de Metelo; Laccóbriga
ficava no território dos Cuneos onde Metelo andava, e conviria com o
texto não tomando muito à letra a expressão «região
montanhosa.» Religiões da Lusitânia, vol. III, p. 139, nota I.
GABRIEL PEREIRA na sua Vida de Sertório, menciona as notas
de uma versão de Talbot da Vita Sertorii. Vemos por elas que
Talbot situa Langóbriga, próximo do rio Douro.
O feito de Sertório parece não poder localizar-se na Lacóbriga, de POMPÓNIO
MELA, no Algarve ou na Lancóbriga, de CLÁUDIO
PTOLOMEU, de entre o Tejo e o Sado, a mesma, incontestavelmente, de
POMPÓNIO, pois o território, sendo de planície, não pode convir com o
texto, que se refere a uma «região montanhosa». A topografia do local
que parece ter sido o leito da Langóbriga do Itinerário, de ANTONINO: o
Monte-Redondo ou de Santa Maria, na freguesia de Fiães, do concelho da Feira,
coaduna-se, perfeitamente, com a descrição de PLUTARCO: uma
colina elevada, em alguns pontos de acesso um pouco difícil.
Defronte ergue-se o outeiro das
Pedreiras. Entre as duas elevações,
corre o rio Às Avessas, afluente do Uíma. A leste, desdobra-se uma
extensa planície, abundante de água e muito fértil.
/ 135 /
II
O Itinerário de ANTONINO é o mais valioso trabalho geográfico que o
mundo antigo nos transmitiu. Nele se faz referência às vias romanas,
compreendidas, entre o Minho e o Guadiana.
Interessa-nos, neste momento, apenas a via de Lisboa a
Braga, por junto dela ficar a cidade de Langóbriga.
Servimo-nos da edição de Parthey et Pinder, Berlim 1848,
p. 97-98.
O anónimo RAVENATE cita Langóbrica: «Item super fretum
septem sunt civitates id est Bepsioon, Merifabion, Caditana,
Portum, Asta, Serpa, Pace Julia, Mirtilin, Besurín, Balsa, Statio
Sacra, Ossonoba, Arani, Salatia, Ebora, Malabista, Celiana, Cetobricca,
Abona, Olisipona, Terebrica, Langobrica, Ceno opido, Calo, Augusta
Bracaria». RAVENNATIS ANONYMI, Cosmographia et Guidonis Geographica,
ed. de M. Pinder et G. Parthey, p. 305-307. Berolini 1860.
RAVENATE escreve Terebrica, em vez de
Talabriga e Langobrica por
Langobriga e coloca entre esta cidade e Calem, que ele escreve
Calo, uma nova cidade Ceno opido, não referida por
ANTONINO. Pode ser que Ceno opido ficasse situada no monte
do Murado, ou de N. Senhora da Saúde, no lugar dos Carvalhos, da
freguesia de Pedroso, a oito quilómetros de Gaia, onde foram encontrados
alguns objectos do neolítico e da época romana.
AEMILIUS HUBNER é de opinião
que a estação Ceno opido ficava onde hoje é
Vila Nova de Gaia, na margem esquerda do Douro, e Calem, do outro lado
do rio, Noticias Archeologicas de Portugal, ed. da Academia das Ciências
de Lisboa, pág. 67. Lisboa 1871.
/ 136 /
Para o estudo das vias militares romanas, consulte-se, ainda: GASPAR
BARREIROS, chorographia de alguns Lugares «que stam em hum caminho, que
fez GASPAR DE BARREIROS ó anno de M. D. XXXXVJ. começãdo na cidade de
Badajoz em Castella, te á de Milam em Italia, cõ algũas outras obras...; LUClUS ANDREA RESENDlUS,
Libri Quatuor de Antiquitatibvs Lusitaniae,
foI. 146 e segs. Eborae anno 1593; IACOBI MENOETH VASCONCELLI,
Scholia, «in quatuor libros Resendii», foI. 251 e segs.; GASPAR
ESTAÇO,
Varias Antiguidades de Portugal. Lisboa 1625, in «Colleçam das
Antiguidades de Evora», pág. 305 e segs. Lisboa Anno M.DCC.LXXXV;
ltenerarivm Antonini, in «Theatrum Geographiae Veteris», edente PETRO
B. BEVERO; JERONYMO CONTADOR DE ARGOTE, Memorias para a Historia Ecclesiastica
do Arcebispado de Braga. Tomo lI, págs. 521-644 e 707-753. Lisboa
M.DCC.XXXIV, e De Antiquitatibus Conventus Bracaraugustani. «Liber
quinque», pág. 182-184. Ulyssipone... M.DCC.XXXVIII; P.e JOÃO BAUTISTA
DE CASTRO, Mappa de Portugal Antigo e Moderno. Tomo III, no
«Roteiro Terrestre de Portugal», pág. II, § IV. Lisboa, MDCC.LXIII; Fr.
HENRIQUE FLOREZ, España Sagrada, voI. XIV, pág. 220; Fr. JOAQUIM DE
SANTA ROSA VITERBO, Elucidario... s. v. «Estrada». Lisboa. M.DCC.XCVIII;
P.e FRANCISCO DO NASCIMENTO SILVEIRA, Mappa Breve da Lusitania Antiga.
Tomo I, págs. 107-128.
Lisboa. M.DCCClV; HIERONYMUS SUARESIUS BARBOSA, Epitome Lusitanae
Historiae, pág. 279. Conimbricae. An. C???????; BORGES DE FIGUEIREDO,
Oppida Restituta, in «Boletim da Sociedade de Geografia», 5.ª série,
pág. 67 e segs. Lisboa 1885; CHRlSTOVAM AYRES DE MAGALHãES SEPULVEdA,
Historia Organica da Exercito Portuguez, voI. lI, cap. VIII, pág.
148-238. Lisboa 1886; AEMILlUS HUBNER, lnscriptionvm Hispaniae Latinarvm,
Supplementum. Berolini MDCCCXCII, com um mapa da parte ocidenta da península
ibérica; «Archeologo Portugues», voI. XII, pág. 129-158; Annaes
do Municipio de Oliveira de Azemeis, pág. 11. Porto − 1909; VERGÍLIO
CORREIA, O Domínio Romano, in «História de Portugal», Portucalense
Editora Lda Barcelos; ARMANDO DE MATOS, As Estradas Romanas no Concelho
de Gaia...; JOÃO DOMINGUES AREDE, Estradas Romanas no Distrito, in «Arquivo do Distrito de Aveiro», voI. IV. Aveiro 1938.
III
O leito da antiga cidade de
Langóbriga parece ter sido, como dissemos,
falando da acção de Sertório a favor dos Lacobritas, no outeiro,
conhecido por Monte-Redondo ou de Santa Maria, da freguesia de Fiães. Em
dois factos importantes nos
baseamos: nas distâncias indicadas por ANTONINO de Calem a Langóbriga e
deste opido a Talábriga, e no despojo arqueológico
/ 137 / encontrado, inventariado, com muita atenção e carinho,
pelo sábio Professor Dr. MENDES CORREIA.
O Itinerário marca de Langóbriga a Calem,
XIlI mp. (= 13.000 passos) e
de Talábriga a Langóbriga, XVIII mp. O valor do passo, unidade das
medidas itinerárias e geográficas, empregadas pelos Romanos, igual a cinco pés, é de
1,48 m.
Vid. DAREMBERG ET SAGLIO, Dictionnaire des Antiquités Grecques et
Romanes, voI. XI, «Met. − Part.», paI. «Milliarium», p. 1897 e voI.
XII, «Par. Quo», paI. «Passus», pág. 339. Paris 1903.
A distância de Langóbriga a
Calem era, pois, de 19235 metros. E de 20
quilómetros, aproximadamente, a distância do Monte-Redondo ou de Santa
Maria a Calem (Gaia). A situação muito
provável de Talábriga, na freguesia da Branca, do concelho de
Albergaria-a-Velha, vem assegurar a jazida de Langóbriga, na freguesia
de Fiães, pois a distância de uma estação a outra é, aproximadamente, a
indicada no Itinerário, 26640 metros.
Relação dos despojos arqueológicos encontrados no Monte-Redondo ou de Santa Maria, da freguesia de Fiães
− antiga Langóbriga?
«Objectos de pedra − mós manuais, afiadores, uma pequena «estela»,
com base trapezoidal alta e a extremidade superior
perfurada no centro, arredondada e separada da base por um
estrangulamento e por duas paralelas sinuosas, gravadas, havendo
também linhas gravadas em torno do orifício;
«Objectos de cerâmica
− «Tegulae», «imbrices», «lateres»,
«pondera», uma placa furada, asas, fundos, bordos, gargalos, dois
fragmentos de «dolia», etc., havendo cerâmica micácia, cerâmica
fumigada, louça de pasta amarela fina, «terra sigilata»,
louça pintada (branco em fundo vermelho), e louça esmaltada fina;
«Objectos de vidro − de tons avermelhado, esverdeado e
azulado;
«Objectos de metal − uma fíbula de bronze, argolas de
ferro e de bronze, algumas centenas de moedas (entre as quais muitas de
imperadores do séc. IV), enxós, «govas», estoques, pregos e outros
objectos de ferro e de bronze.
«Mais tarde apareceram mais objectos. Em alguns fragmentos de louça «arretina» encontraram-se gravados filetes
paralelos, dispostos em torno dos vasos e, limitando de um lado
ou de ambos, feixes de numerosas linhas, paralelas transversais,
rectilíneas ou curvas enviezadas.
«A louça pintada fornece exemplares com ornatos espirais, outros com
linhas onduladas entre paralelas, etc.
/ 138 /
«Na cerâmica com ornatos gravados aparecem ainda: pequenos traços
oblíquos incisos dispostos em séries; traços entre cruzando-se de modo a
formarem uma rede de malhas romboidais; ornatos incisos de aspecto
peninervado ou ramiforme; círculos concêntricos rodados por um circuito de pequenas incisões oblíquas; ornatos pontuados em séries regulares,
marginando filetes contínuos; uma linha fechada e sinuosa, de
aspecto estrelado, regular, formando seis lobos, tendo uma circunferência inscrita, etc.
«Apareceram nos fundos das casas, conchas numerosas...
.............................................................................................................................................
«Por quase todo o alto do monte surgem vestígios de
antiga ocupação humana: restos de muros e paredes, alguns
fragmentos cerâmicos, etc.
«Na topografia havia as condições naturais para um velho castro. O
acesso em alguns pontos não era fácil, e na base do monte, entre este e
o monte da Pedreira, serpeia um riacho, designado pelo povo com o nome
de Rio «Às Avessas», por se dirigir, não para O., para o lado do mar,
mas para S. E., desaguando no rio Ima, afluente do Douro.
«A extensa planura a leste do monte é alagadiça e fértil, e nela
brotam a cerca de 300 metros, a E. N. E. da referida colina, águas
sulfurosas. O aspecto do local e a sonoridade do solo ao choque,
permitem suspeitar de qualquer velha construção relacionada com a nascente...», Dr. MENDES CORREIA,
Nótulas Archeológicas, in Revista de Estudos Históricos, 2.º
Ano − N.º
2, 1925.
*
O problema da localização do antigo ópido de Langóbriga
tem interessado muito os nossos arqueólogos, desde o século XVI
até aos nossos dias.
DIOGO MENDES DE VASCONCELOS:
Este autor localiza Langóbriga, na Feira, Scholia... foI. 254.
Fr. BERNARDO DE BRITO:
Cita este historiador uma inscrição encontrada no vale de Ossela, nas margens do rio de Cambra, a três léguas de Arouca, que faz
referência à cidade de Langóbriga: «se em Roma se fizeram custosas
cerimónias em seu enterramento (do Imperador Octaviano Augusto), não
foram em sua proporção menores as que em Portugal lhe celebrou a gente
de guerra, como consta de uma pedra que está no vale de Ossela três
léguas de Arouca, trazida para tapar um campo com outras muitas, de
umas grandes ruínas de povoação, que ainda hoje parecem, em um
/
139 /
sitio alto sobre o rio de Cambra, que corre pelo mesmo vale, da qual (ainda
que mal distintas) se coligem algumas antiguidades dignas de ponderação, diz
pois a pedra deste modo.
|
«Sua significação contem o seguinte: As Capitanias da Legião décima,
chamada Fretense, que estavam de presídio em Vouga, em OsseIa, na Feira,
no Porto, e em Águeda, por voto particular celebraram espectáculos, e jogos de Gladiadores à
divindade (falando como gentios) do Imperador César Augusto, contado já
no número dos Deuses, e as cidades de Lusitânia acima nomeadas fizeram
os gastos destas festas, e celebraram Hecatombes com grande
liberalidade.», Monarchia Lusytana. Livro Quinto, pág. 4.
Fala a seguir da situação da cidade de
Vacca ou Vouga, de OsseIa e de
Langóbriga «que alguns dizem que foi a Feira, ou outra povoação mui
junto a ela, ainda que vistas algumas conjecturas, me parece que esteve no
alto de um monte que fica entre os lugares de Albergaria, e Bemposta,
em fronte de outro chamado Pinheiro, no cume do qual se vêem ainda
claramente os sinais de muros antigos, que cercam grande parte da coroa do
monte, e perguntando eu o nome que tinha no tempo de agora, me disseram
se chamava o castelo de S. Gião...», ob. cit., pág. 4.
MANUEL FARIA E SOUSA transcreve a inscrição lapidar de
Brito do vale de OsseIa(1) de que faz a seguinte leitura: «Las Cohortes,
o Compañias de la Legion decima, llamada Fretense,
que alojavan, o presidian en Vouga, Oscela, Lanco, Cale, y
Águeda,
offrecieron Espectaculos, y juegos de Gladiatores aI Emperador Cesar,
Divo Augusto, ya relatado en el numero de los Dioses: y estas ciudades
de Lusitania hizieron el dispendio', y dedicaron Hecatombes.», Europa
Portuguesa, tomo I, págs. 250-251.
Langóbriga é localizada na Vila da Feira: «Lancobrica, que a la parte
deI Austro dista poco de la ciudad deI Porto, y de que oy se ven ruinas
en la extremidad de un monte, a que sucedió la Villa de Feyra notorio
Titulo de Condado posseido de la ilustre Familia de Pereyras.», ob.
cit., pág. 251.
/ 140 /
P.e JOÃO BAPTISTA DE CASTRO:
«Lacobriga. Em tempo dos Romanos foy Cidade muy
famosa, e lembra-se della Baptista Mantuano, «Dicitur Ardiburí
posuisse Lacobriga septem, victori toties statuas, totiesque, totiesque
per illum, Eruta Wandalicis bello in surgente procellis»,
in Agelaric. ... Das suas ruinas se edificou a Cidade de Lagos
no AIgarve, e neste sitio vemos collocada a sua arrumação no Mappa de Ortelio e de Pomponio MeIa, com quem se conforma Vasconcelos,
donde parece receber engano Vasco Moutinho de Quevedo, equivocando Lagos
com Lamego, e a mesma equivocação encontro em Gabriel Pereira, porque
une os povos da Serra da Estrella com os de Lacobriga, que sendo Lagos,
erão Províncias muy distantes. Talvez que tudo proceda de se equivocarem
com outra povoação(2) que ficava junto de Lamego,
porém mais encostada para o mar, a que Ortelio chama Lancobriga, que Vasconcellos tem pella Villa da Feira,
Mappa de
Portugal, tomo I, pág. 21-22.»
Fr. HENRIQUE FLOREZ:
«...Talabrica y Lancobrica, expresadas en el Itillerario
alegado, las quales tienen reducidos los Autores à Aveiro y
Feira...», España Sagrada. Tomo XIV, pág. 73. E adiante:
«Pero acerca deI que algunas ediciones de PTOLOMEO nombran en los
Celticos Laccobriga, advierto, que en el texto griego es
Langobriga, y asi la nombra Antonino junto à Cale, a la banda
meridional deI Duero...» ob. cit., pág. 220.
Na «Memoria II sôbre o estado civil da Lusitania, no tempo em que
esteve sujeita aos Romanos, Memorias de Litteratura Portugueza,
publicadas pela Academia Real das Sciencias de
Lisboa». Tomo lI, pág. 313-353. Lisboa Anno M.DCC.XCII − há
/ 141 /
referência aos Lacobrigensibus e Talabrigensibus. O autor envia-nos
para GRUTE'R, lnscriptionvm Romanarvm Corpus Absolvtissimum. A obra é muito extensa e de difícil consulta. Não encontramos
quaisquer inscrições com respeito aos povos designados, habitantes,
respectivamente, de Lacobriga e Talabriga, mas é natural que apareçam.
Fr. JOAQUIM DE SANTA ROSA DE VITERBO :
«Nos Doc. de Grijó se faz larga menção de propriedades,
e fazendas, humas que ficavão da parte de cima, e outras da parte
debaixo da Estrada Mourisca. No de 1148 Tructesindo Mendes doou a Grijó
o que tinha em Brantães, e em S. Feliz: «Subter illam Stratam Mauriscam,
discurrente rivulo Cerzedo.»
Chamou-se Estrada Mourisca, porque os Mouros a rompêrão, deixando,
talvez já por invadeavel naquele tempo a Estrada Romana, ou Via Militar,
que sahindo de Condeixa, a Velha,
atravessava o Mondego entre Pereira, e Coimbra; e sem passar o Eminio,
ou Rio Agueda, cortava o Vouga não longe de Talabriga, (sobre cujas
ruinas, ou perto dellas, se levantou Aveiro) e daqui por entre
Lancobriga, e o mar se dirigia a Cale...», Elucidario, pal. Estrada,
págs. 417-418.
P.e FRANCISCO DO NASCIMENTO SILVEIRA:
«Lancobriga. Crê o P. BRITO, que esta antiga Cidade esteve
situada entre os Lugares de Albergaria, e Bemposta, fronteira ao que
chamam Pinheiro, no qual ele subindo a um outeiro a fim de examinar o
terreno, achou claros sinais de muros, que coroavam o cabeço, a que os
Aldeãos chamam Castelo de S. Gião.. », Mappa Breve da Lusitania
Antiga, págs. 230-231.
JERÓNIMO SOARES BARBOSA:
«Inde enim prisca multa oppidorum nomina ut Cetobrica, (Setuval),
Lancobriga (a Feira), Talabrica, (Aveiro)... », Epitome Lusitanae Historiae, pág. 178.
AUGUSTO DE PINHO LEAL:
«Pelos annos 390 antes de Jesus Christo, uma colonia de
gallos-celtas fundou esta povoação, (Vila-da-Feira), a que deu
o nome de Lancobriga.»(3).
«Querem alguns que o chefe d'esta colonia se chamasse
/ 142 /
Lanco, e que d'elle tomou o nome a povoação, Na verdade, em celta,
Lancobriga significa povoação (ou cidade de Lanco).»
«Foi cidade de muita importancia no dominio romano e por aqui proximo
passava a via militar que de Merida (então capital da Lusitania) vinha a
Conimbrica (Condeixa a Velha), Talabrica (Aveiro), Lancobrica e Cale
(Gaia) onde terminava.», Portugal Antigo e Moderno..., vol. III, pág,
154, Pal. Feira. Lisboa 1874. Cfr. com ESTEVES PEREIRA e GUILHERME RODRIGUES,
Portugal vol. III, − D − K, paI. Feira pág. 328. Lisboa 1907;
e MAXIMIANO LEMOS, Encyclopedia Portuguesa..., vol. IV, Di − Fa, paI.
Feira, pág. 691. Porto.
BORGES DE FIGUEIREDO:
Falando do «Iter ab Olisipone Bracaram Augustam» diz o
autor das Oppida Restituta: «Destas oito cidades intermediárias apenas
duas foram de longe data sem contestação identificadas com povoações
modernas. São elas: Scalabin: a que corresponde Santarém; e Conimbriga, localizada em Condeixa-a-Velha.
Quanto às outras, ou têm divergido as opiniões acerca do seu local, como
lerabriga e Selium; ou todos lhes têm assinado uma
posição presuntiva, como Langobriga e Talabriga», «Boletim
da Sociedade de Geografia de Lisboa, 5.ª série, pág. 67 e segs.
A pág. 71, localiza Langóbriga na Feira.
O P.e JOAQUIM R. ESPANCA considera três as povoações notáveis com o nome de Lacóbriga, Lancóbriga ou Langóbriga:
uma no Algarve, no território dos Cúneos, outra no Alentejo
(a Lancóbriga a que se refere PTOLOMEU), e outra na margem
esquerda do rio Douro, entre Talábriga e Calem, onde habitaram os
Túrdulos Velhos.
«Temos pois três Lacobrigas, distintas em número e diferentes na
situação geográfica e na gente que as povoava: a 1.ª junto do Promontório
Sacro ou no AIgarve, habitada por Cúneos; a 2.ª no interior do Alentejo
ou entre Tejo e Guadiana, habitada por Celticos; e a 3.ª no Douro,
povoada por Turdulos Velhos. Sendo pois diversas em lugares e pessoas,
não pode uma confundir-se com a outra...», As Lacobrigas da Lusitania,
in Revista Archeologica, vol. lI, pág. 177.
É uma tentativa infrutífera para EMÍLIO HUBNER procurar
localizar as cidades de Langóbriga e Talábriga quando ainda então se
desconhecia onde era o leito de Aeminium, «...da Beira, isto é, do
espaço compreendido entre, Coimbra e Porto, pouco
há que dizer. Desta região só conheço a inscrição de uma
lápide sepulcral de Tentúgal. É portanto empenho inútil querer
determinar a situação das estações do Itinerário, denominadas Talábriga
e Langóbriga, de acordo com as distâncias, quando nem sequer a estação
de Aeminium se pode fixar definitivamente...»,
/
143 / Noticias Archeologicas de Portugal, ed. da Academia das
Ciências de Lisboa, pág. 67.
Professor Dr. LEITE DE VASCONCELOS:
«Langobriga, segundo o Itinerário de ANTONINO ficava entre
o Aeminium e Cale, localização a que não se opõe o Ravenate, que a situa
entre Olisipo e Cale. Nenhuma destas localizações implica que
Langobriga
estivesse numa linha recta tirada de Olisipo ou de Aeminium para Cale,
pois também o Itinerário cita, por ex., Serpa entre Ebora e Pax Iulia,
etc. Ora, numa região arqueologicamente bem definida, entre Marialva e
Freixo-de-Numão, onde se tem encontrado lápides romanas (vid. Corp. lnscr.
I at., II, 428-462), fica, no concelho da Meda, uma aldeia
chamada hoje Langroiva, em doc. medievais Longobria (séc.
X: Port. Mon.
Hist., Dipl. et Ch., n.º LXXXI) e Longrovia (séc. XII:
VITERBO, Elucidario, S. V. «Bemquerença », voI. I, 1.ª ed., pág. 188).
Foneticamente, Langrovia pode vir de Langobriga (isto está de acordo com
as leis da língua portuguesa). A geografia antiga não contradiz que
Langroiva esteja no território de Langobriga, pois essa aldeia ocupa o
vértice de um triângulo cujos outros vértices são − indo de Pax lulia
para o Norte −, Aeminium
e Cale.» Religiões da Lusitânia, voI. lI, pág. 34, nota 3(4).
PEDRO A. DE AZEVEDO: Notícia-extracto arqueológico das
Memorias Paroquiais, de 1758, publicada no «Archeologo
Portugues», voI. VI, pág. 67-68:
«No lugar de Laçoens (Oliveira de Azeméis) foi a decantada Cidade de
Lancobriga, de que ficou o nome corrupto ao Lugar na caducidade dos
annos: o que se comprova das vias Militares, de que faz menção o
Itinerario do Emperador Antonino
que, aqui perfeitamente se ajustão, não na Villa da Feira, ou na da
Bemposta, distantes Legoa desta freguezia, como quizerão, adivinhando
sem outro melhor fundamento, alguns Authores, como Brito no tom. I da
Monarq. Lusit., etc. (Tomo XXVI, fl. 193)». FÉLIX ALVES PEREIRA,
referindo-se a esta Memória, é de opinião que, em Lações, existiu um
castro e não uma cidade.
FÉLIX ALVES PEREIRA:
«Eu não me ocupo especialmente de Langobriga do Itinerário, mas é fácil ver que idênticos raciocínios lhe são aplicáveis e em
consequência, a situação deste ópido deveria ser na faixa de terreno
vagamente indicada pela curva LL, um pouco ao norte
/
144 /
da Feira..., Archeologo Portugues, voI. XII, págs. 142-143, nota 1.
A curva LL, indicada no mapa, que acompanha o seu estudo,
sobre a situação conjectural de Talábriga, passa por Esmoriz
(onde foi situado o castro de Ovil), Fiães, e um pouco ao sul de Mozelos
(onde fica o monte Murado).
«Dr. AGUIAR CARDOSO:
«Lancobriga ou Langobriga, de fundação céltica, engrandecida pelos romanos que lhe chamaram
Lancobriga, e depois
arrasada pelos bárbaros do norte; Civitas Sanctae Mariae, de fundação
gótica, depois assolada pelos mouros, e mais tarde reconstituída pelos
neo-godos; por fim Vila da Feira.»
«Não se discute que o leito das três povoações seja precisamente o
mesmo; mas a sucessão, quanto à hegemonia ou predomínio na região, é insofismáveI.»
«Bem se concebe que, se entre Talabriga, perto do Vouga, e Cale, junto
ao Douro, ficava Lancobriga, esta povoação predominava nesta região de
entre Douro e Vouga; tal como depois ficou predominando a Civitas
Sanctae Mariae, autêntica sucessora, por isso mesmo de Lancobriga.»
E transcrevendo a nota: «Talvez que o leito de Lancobriga fõsse junto a Fiães, 8 a 10 quilómetros a nordeste da
Vila da Feira, no monte chamado também de Santa Maria, onde ultimamente
têm aparecido ruínas de construções soterradas, moedas romanas, tégulas,
lucernas, fíbulas, etc. De resto este local foi previsto pelo Sr. Félix
Alves Pereira, no Arqueólogo Português, como sendo possivelmente o leito
de Lancobriga.» Terra de Santa Maria..., pág. 22. Coimbra, 1929.
Tenente-Coronel A. STRECHT DE VASCONCELOS:
Ver Velharias do Distrito de Aveiro - - Talabriga, no Correio
do Vouga, ano de 1934 (de 3 de Março a 26 de Maio), págs. 8-9.
JOÃO DOMINGUES AREDE:
«Há os que argumentam com o texto de PLÍNIO: A Durio Lusitania incipit
Turduli Veteres, Paesuri: Flumen Vacca. Oppidum Talabriga» para
localizarem esta cidade na margem esquerda do Vouga.»
«Sedutora hipótese que encaixava à maravilha Talábriga na estação
arqueológica do Cabeço do Vouga, a «civitas Marnelae» do Portug. M.
Hist.
perto da antiga estrada e velhíssima ponte, para cuja fábrica ou
reconstrução contribuiu D. Sancho Pires, Bispo do Porto, como já fica
referido, e Langóbriga, arrastada por Talábriga, desceria para o «castelo» ou crasto de Lações, sonho obsidiante do velho abade de
Oliveira de Azeméis − Dr. Oliveira Ferreira.»
« Mas de Lações (paróquia de Azeméis) a Caia vai o dobro
da distância, que no Itinerário separa Langóbriga de Cale, e do
/ 145 /
[Vol. VIII - N.º 30 -
1942]
MarneI a Coimbra deve apurar-se menos 10 milhas que as contadas por
ANTONINO entre Emínio e Talábriga.»
«E com os números, que têm a inflexível rigidez das matemáticas, não se
brinca...», Estradas Romanas no Distrito in Arqvivo do Distrito de
Aveiro, voI. IV, págs. 30-31.
Para DOMINGUES AREDE Langóbriga tem de se buscar ao norte da
Vila da Feira, entre São João de Ver e Lourosa, ob. cit.
IV
Langóbriga não teve a grandeza histórica de Talabriga(5), sua vizinha.
PLÍNIO, POMPÓNlO, PTOLOMEU, nada dizem a seu respeito. APlANO também não lhe faz referência e narra um episódio muito curioso
acerca das frequentes revoltas de Talabriga, contra o
domínio romano:
LXXllI. «Inter alia Talabriga oppidum fuit, quae, saepius rebellarat. Eo
veniens Brutus, supplicantes oppidanos, et sese
ejus arbítrio permittentes, primum transfugas Romanorum et captivos
armaque omnia, adhaec obsides, tradere jussit: deinde,
ut cum uxoribus ac liberis urbe migrarent, imperavit. Quod et
ipsum ubi facere sustinuerunt, circumfusis copiis eos includens
orationem habuit, qua quoties defecissent, quoties quanto conatu bellum
renovassent, edisseruit. Ita metu illis injecto, atque opinione, quasi
gravius in eos animadversurus esset, tamen intra objurgationes istas
iram terminavit. Equis et commeatu
et pecuniis publicis, cum reliquo publico apparatu, ademtis, oppidum
illis praeter spem, habitandum reddidit.», APPIANI
ALEXANDRINI Romanarum Historiarum quac supersunt graece et latine cum indicibus, De Rebus Hispaniensibus. Liv. VI. Editore Ambrosio Firmin
Didot. Parisiis MDCCCXL.
«Entre outras, foi a cidade de Tálabriga a que mais vezes se revoltara.
Bruto marchou contra ela, e, tendo os seus habitantes implorado clemência e oferecido submissão, impôs a
entrega dos trânsfugas, dos cativos, de todas as armas, e exigiu
reféns. Ordenou, em seguida, que os Talabrigenses abandonassem a cidade
com as mulheres e os filhos. Quando todos
se preparavam para obedecer, Bruto cercou-os de tropas e lembrou-lhes que todas as vezes que se revoltassem viria submetê-los duramente. Tendo-lhes insuflado, deste modo, o temor,
dando-lhes a perceber que outra rebelião levá-lo-ia a recorrer
/
146 /
à violência, restringiu a sua ira a estas objurgatórias. Apoderou-se dos cavalos, dos mantimentos, dos dinheiros públicos e
outros valores, mas permitiu, finalmente, que os Talabrigenses
continuassem a viver na sua cidade. »(6)
V
EUTRÓPIO pôde dizer acerca
da grande acção militar de
Décimo Júnio Bruto, desde o Tejo à Galiza: «Decimus Junius
Brutus de Gallaecis et Lusitanis triumphavit magna gloria»,
Breviarium Historiae Romanae. L. V, cap. XIX. «Décimo Júnio
Bruto cobriu-se de glória na conquista da Galiza e da Lusitânia».
E SEXTO FLORO: «Rebellantes Lusitanos in Hispania per Decimum
Brutum obtinuimus», Breviarium de Victoriis et Provinciis Populi
Romani, cap. V. «Submetemos, por intermédio de Décimo Bruto,
os Lusitanos que se tinham revoltado». Roma recebeu em
grande triunfo o valoroso capitão. Mas passados vinte e oito
anos a luta prossegue. E EUTRÓPIO que nos informa: «a Servilio
Caepione in Hispania Lusitani victi sunt», Breviarium Historiae
Romanae, «liber» IV, cap. XXVII. «Os Lusitanos foram vencidos
na Espanha por Servílio Cepião». São passados vinte e oito anos, depois
da partida de Décimo Bruto para Roma.
Em SEXTO RUFO vem: «Postea ad Hispanos tumultuantes
Decius Junius Silanus cum exercitu missus eos vicit...» «Depois
(de Décimo Bruto), Décio Júnio Silano foi enviado com um
exército contra os Espanhóis que se tinham sublevado, e venceu-os...»,
Breviarium de Victoriis et Provinciis Populi Romani, cap. V. E a seguir: «Celtiberi in Hispania saepe rebellavere»
«os Celtiberos revoltavam-se muitas vezes na Espanha.»,
«idem» capo V.
Durante os oito anos dos consulados de P. Rutílio e Cn.
Manílio, e de C. Mário e Q. Lutácio (anos de 105 a 98) são
notáveis, pela sua violência, as guerrilhas dos Lusitanos, JULIUS
OBSEQUENS, De Prodigiis,. cap. CII: «A Lusitanis exercitus romanus caesus», «O exército romano foi derrotado pelos Lusitanos»;
cap. CIV: «Lusitanis devictis», «Os Lusitanos foram vencidos»;
/ 147 /
cap. CVI: «Lusitani rebellantes subacti», «Os Lusitanos, que se
tinham revoltado, foram submetidos».
A empresa de Bruto foi apenas o prelúdio da grande vitória de Roma.
*
Soou a hora fatal da ruína da maior parte das cidades lusitanas, mesmo
daquelas de que Júlio César foi obrigado a confessar quão difícil se
tornava a sua conquista, pelos seus privilégios de defesa natural...: «oppidorum
magna pars ejus provinciae (=provinciae ulterioris) montibus fere
munita, et natura excellentibus locis est constituta, ut simul aditus
adscensusque habeat difficiles. Ita ab oppugnationibus natura loci
distinentur, ut civitates Hispaniae non facile ab hoste capiantur», De Bello Hispaniensi Comentarii,
cap. VIlI. E em César o furor e o delírio
do saque vencia todas as fraquezas:... «et Lusitanorum quaedam oppida,
quamquam nec imperata detrectarent,
et advenienti portas patefacerent, diripuit hostiliter, SUETONlUS
TRANQUILLIUS», Duodecim Caesares, Caesar, cap. LIV. «César
saqueou várias cidades da Lusitânia apesar de não terem oferecido
resistência e de terem aberto as portas à sua chegada».
Surgia um obstáculo? Surgiam logo os meios de os anular... Era fértil a
imaginação romana. O engenho militar suplanta a criação poética do
direito. V. FLAVIUS VEGETlUS, Institutiones Militares. Lib. IV,
cap. XIII e segs., sobre o emprego das testudines, arietes, falces, vineas, plutei,
rnusculi, turres, ballistae, onagri, scorpiones, etc.
*
L. ANNAEUS FLORUS escreveu: «Plus est provinciam retinēre
quam facere, «mais fácil é conquistar uma província, do que
conservá-la». História Romana, cap. VII. OS Romanos, desde
que iniciaram a conquista da Península (195 a. c.), viram-se
obrigados a vingar com crueldade os frequentes assomos de independência:
«Gracchus, pater ille Gracchorum, eosdem centum et quinquaginta urbium
eversione multavit;» «idem», História Romana, cap. VII. «Graco, pai
dos Gracos castigou os mesmos povos (= povos da península ibérica) pela
destruição
de 150 das suas cidades»... E a seguir: «Tum illis ad populationem
agrorum, his ad urbium excidia conversis», «Uns inclinam-se a devastar os campos; outros a destruir as cidades».
Povos insubmissos aos Romanos fatigavam com incursões
frequentes os povos submetidos: «Sub Occasu pacata fere omnis
Hispania, nisi quam Pyrenaei desinentis scopulis inhaerentem citerior
alluebat Oceanus. Hic duae validissimae gentes, Cantabri et Astures
immunes imperii agitabant. Cantabrorum et pejor et altior et magis
pertinax in rebellando animus fuit: qui non
contenti libertatem suam defendere, proximis etiam imperitare
/
148 /
tentabant, Vaccaeosque, et Curgionios et Autrigonas crebis incursionibus fatigabant», L. A. FLORUS,
História Romana, L. IV, cap. XII.
«Ao Ocidente quase toda a Espanha estava pacificada: faltava apenas
submeter a parte que toca o extremo dos Pirenéus que banha o Oceano
citerior. Ali viviam dois povos poderosos, independentes do império
romano: os Cantabros e os Astures. Os Cantabros foram os mais temíveis,
altivos e teimosos na sua insubordinação. Não satisfeitos em defender a
sua liberdade, tentavam ainda sujeitar os seus vizinhos, e fatigavam,
com frequentes incursões, os Vaceus, Curgiões e Autrigonas».
E ESTRABÃO, referindo-se apenas à destruição de grande parte das cidades
lusitanas, escreve: «o país era muito abundante de frutos, gado e
metais preciosos, mas a maior parte destes povos (para ESTRABÃO, 36
povos diferentes; para PLÍNlO, 46) deixou de aproveitar as riquezas
naturais afim de se entregarem
ao latrocínio. Viviam quase sempre em guerra uns com os
outros, ou com os povos de além do Tejo, seus vizinhos. Tinham nos altos
dos montes cidades fortificadas, mas os Romanos, vencendo estes povos, «maIo isti finem imposuerunt, in planum
delatis plerisque, eorum urbibus et in pagos mutatis nonnullis etiam
melius conditis», puseram termo a este estado de coisas, obrigando os
montanheses a descer à planície, e transformando grande parte das suas
cidades em aldeias, edificando, todavia, melhor outras».
Desenvolve-se, intensamente, a agricultura, pode dizer-se, desde o
alvorecer das conquistas romanas. Denota este facto, diz LEITE DE
VASCONCELOS, «os benefícios da pacificação», Religiões da Lusitânia...,
voI. I, pág. 171.
No começo do grande império romano, diz ANTÓNIO CAETANO DO AMARAL: «nada
acharam os seus Fundadores mais próprio para lhe assegurar a liberdade,
e estender os domínios, que
mandar como os sobejos dos Cidadãos, que fossem reproduzir a sua Cidade
pelo terreno, que iam conquistando. Com esta providencia ao mesmo passo
que limpavam a Cidade da mais vil escória, e tiravam o fomento ás
sedições, iam refrear ao longe os Povos novamente sujeitos, ou reprimir
os que o não estavam ainda, ou premiar com estabelecimento pacifico os
Soldados veteranos; e em todo o caso propagavam a geração Romana. Ora
estes como pedaços que se despegava da Cidade, forçosamente haviam de
levar consigo alguma parte dos direitos de que nela gozavam: porém
estes direitos só por si serviram depois aos Romanos para com uma
doação de nome adquirirem Colónias novas», Memoria II «sobre o estado
civil da Lusitania»... in Memorias de Litteratura Portugueza, Tomo lI,
pág. 32I. Lisboa Anno M.DCC.XCII. Ver ainda, AULUS GELIUS, Noctes
Atticae, L. XVI, cap. XIII; A. APPIANNUS, De Bello Civile L.
I; VARRO,
De Lingua Latina, L. IV.
/
149 /
VI
Começa o desmantelamento do grande império romano. Hordas de bárbaros,
incultos, arrogantes, formigueiro infernal, invadem a Península (409).
Chegam até aos lugares mais afastados e escusos. De espírito nómada,
habituados a diferentes climas, sóbrios na alimentação e vestuário,
contentam-se em viver ao ar livre e com os recursos da natureza não
trabalhada. Vivem
principalmente da caça. A primeira grande fase da decadência
das povoações romanas e romanizadas.
A Península esteve trezentos anos sob o seu domínio: período muito longo
que deu tempo suficiente para que esses
povos rudes fossem fundindo a sua raça com a ibero-romana.
Dos Alanos (409-41I) quase nada sabemos da sua passagem pelo nosso território, mas os Suevos (412-585) e os Visigodos (586-711),
assimilando com fanatismo o que Roma produziu
de melhor, transmitiram-nos características profundas da sua
civilização.
A alma destes bárbaros, simples, humilde, incendeia-se de
amor cristão. As pregações de S. Martinho de Dume, prendendo pelo seu fulgor e emoção, operam o milagre de levar os
Suevos ao Cristianismo. Data desta época a fundação de muitos mosteiros,
entre os quais o de Dúmio, Tibães e Lorvão.
Em 586, Leovigildo venceu os Suevos e
incorporou-os no
reino visigótico. Recaredo, seu filho e sucessor, declarou religião oficial o catolicismo.
Segue-se o domínio árabe:
Em 711, Tarique invade a Espanha, seguindo-o Muça com
novo exército, em 712. A marcha foi rápida até às montanhas das
Astúrias. Só aqui Pelágio conseguiu alcançar a primeira
batalha cristã, de Cangas de Onis (entre os anos de 721 a 725). Diz
ALEXANDRE HERCULANO, Hist. de Portugal, t. I. pág. 132:
«A batalha de Cangas de Onis, em que os infiéis ficaram
desbaratados, foi o primeiro anel de uma cadeia contínua de combates que
nos fins do XV século veio soldar-se na campa dos derradeiros defensores
de Granada, quando Fernando e
Isabel, os Católicos, conquistaram a capital do último reino
mourisco da Península».
Afonso I (737-757), genro do grande herói asturiano, avança
vitorioso até além de Viseu, apoderando-se, de Braga, Porto e Viseu. Diz
o Chronicon Albeldense (séc. XI) que o Rei «campos
usque ad flumen dorium eremavit», «tornou desertos os campos até ao Douro». Vid., também,
España Sagrada. Tomo XIII,
pág. 451, e História da Administração Pública, voI. II. pág. 2,
de GAMA BARROS.
Quando Afonso I morreu, em 757, deixou todo o noroeste
e parte do centro da Península livre de muçulmanos.
/ 150 /
No reinado de Afonso II (− 847) reacende-se furiosamente
a luta. Afonso III (860-910) reconquistou, entre outras cidades,
Coimbra, Lamego e Viseu e repovoou muitas terras entre o
Douro e o Mondego.
Todo o reinado de Ordonho II (914-924) se passou em lutas. Durante o governo de Fruela Il, de Afonso IV, e parte
do reinado de Ramiro II, não houve incursões muçulmanas.
Em 997, iniciou Almançor urna violenta campanha, por
terra e por mar, contra Compostela que foi conquistada e destruída. O furioso árabe avança a seguir contra Leão que teve
a mesma sorte, devastando tudo que encontrou no seu caminho. Escreve
HERCULANO:
«O terrível hadjeb parecia ter jurado apagar o nome cristão na Península... ermou Castela, tornando e derribando as
povoações mais notáveis, e o mesmo fez à Galiza, cujas fronteiras, provavelmente, desde a invasão de Ordonho III, na antiga
Lusitânia, se estendiam até o Mondego. Coimbra (a Medina
Colimria dos árabes) caiu, em 987, em poder d'EI-Mansur, que
a destruiu, repovoando-a de sarracenos, passados sete anos,
durante os quais esteve deserta», História de Portugal, Tomo I,
pág. 153. Lisboa MDCCCXLVI.
E referindo-se ao seu avanço sobre Compostela «Reunidas
aí (na foz do Douro) todas as forças do hadjeb, ele atravessou
aquela parte da antiga Galiza, chamada hoje província de Entre
Douro e Minho, e, vencendo os obstáculos, que lhe opunham
os homens e a natureza naquelas regiões montanhosas, chegou
aos muros de Compostela. Estava desamparada a cidade de seus habitantes:
entraram sem resistência os sarracenos: derribaram os muros, o castelo, e a igreja de Santiago, a que pela
sua celebridade os escritores árabes chamavam a «Kaaba» dos
nazarenos...», História de Portugal, vol. I. pág. 154.
Escrevendo acerca da cidade do Porto, saqueada e destruída
por Muça e Almançor, diz D. RODRIGO DA CUNHA:
«No anno de Christo de 716 entraram nesta cidade do
Porto e a roubaram, e saquearam, deixãdo a em miseravel estado, quasi
dospouoada, e erma, ao q se ajuntou a entrada q depoes fez neIla
Almançor, grande capitam de Cordoua, que acabou de aruinar tudo o q
ficara de pé...», Catalogo e Historia dos Bispos
do Porto. No Porto. Anno 1623.
Esta arrogância de extermínio ficou célebre na história, mas
marca o paroxismo da dominação árabe. Começa a reconquista
cristã. Bermudo III (1028-1038?) ganha na vila de Cesari, na terra do Castelo de Santa Maria uma importante batalha contra
os Mouros, o «Rex domnus Vermudo habuit victoriano de mauris, pugnauit cum eis, et cepit ibi regem eorum Cemia in uilla
Cesari in territorio castelli S. Marie». Chronica Gothorum,
pág. 9. Na Brevis Historia Gothorum, « Rex D. Vermudus
vicit mauros, cepitque Regem eorum Cuner in territorio Castelli
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S. Marie in villa Cesari». Fernando Magno (1038-1065) pôde levar, a
seguir, os seus exércitos vitoriosos até ao Mondego e assistir,
comovido, à reconstrução das cidades e povoações importantes, destruídas
pelo furor dos sarracenos.
Surge uma era de paz e de progresso. A Terra de Santa
Maria, integrada no Condado de Coimbra, que Fernando Magno fundou e
ofereceu a Sesnando, em recompensa dos grandes serviços: «ego consul
sisnandus accepi ab illo potestatem colimbrie et omnium ciuitatum siue
castellorum que sunt in omni circuitu eius scilicet ex lameco usque ad mare per aquam fluminis durii
usque ad omnes terminos quos christiani ad austrum possident» ano de
1088, Dip. et Ch., doc. n.º 699 − vive dos benefícios da vitória
definitiva da Cruz contra o Crescente. E o
entusiasmo e o fervor católicos continua a encher de igrejas, de ermidas
e de mosteiros, o cerro dos montes e a concavidade dos vales. A
agricultura, decadente, desde as invasões germânicas, prospera com afã,
servindo, em grande parte, de estímulo,
a necessidade de sustentar os monges dos numerosos conventos: de S João
de Ver, de Prozelha (que deu o nome à freguesia de Mosteirô), de S.
Julião (que deu o nome à povoação de
S. Gião, da freguesia do Souto), de Canedo, de... (que deu o nome ao
lugar de Mosteirô, da freguesia de Canedo), de Azevedo (freguesia de S.
Jorge), de S. Cristóvão (freguesia de Sanguedo), de Grijó, de Pedroso,
de que abundam os mais
preciosos documentos medievais, de Crestuma, de Vila-Cova
(freguesia de Canedo ou de Sandim?), de S. Martinho (freguesia de Anta).
VII
Indicamos como primeira grande fase do declínio das edificações romanas
as incursões bárbaras. Outro grande motivo dessa decadência foi
proveniente da invasão dos Árabes.
Muça e Almançor consideram que a vitória só é completa, destruindo todos
os valores materiais e espirituais do inimigo. Deles pode dizer-se o
que SÍLIO ITÁLICO disse a respeito do general Asdrúbal:
«Tristia corda ducis, simul immedicabilis ira,
Et fructus regni feritas
erat: asper amore
Sanguinis, et metui demens credebat honorem; »
(Bella Punica, Liber I. )
Por onde os seus exércitos passaram não ficou pedra sobre pedra: as
povoações em ruínas, os templos incendiados, os campos desertos.
Temos no concelho da Feira (e a acção dos Muçulmanos foi muito reduzida
na região das Terras de Santa Maria) algumas
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tradições do seu furor implacável, que serão publicadas nos meus
Subsídios para o Estudo da Etnografia do Concelho da Feira.
As populações dispersam-se, à procura de lugares seguros,
onde a sua vida não corra perigo e os seus haveres estejam
menos sujeitos às pilhagens. A Touça-do-Cuco, entre Lever e
Sandim, num vale escavado, onde corre o ribeiro de Mourães,
ficou célebre como esconderijo dos gados das povoações dos
arredores, em tempo dos Mouros, e, no século passado, pela
ocasião da segunda invasão dos Franceses.
Acaba de vez o domínio dos castros: fortalezas inúteis, que,
passando, frequentemente, das mãos dos vencidos para os vencedores e destes para aqueles deixam de convir a uns e outros.
As que ainda resistiram ao ódio violento dos filhos de Agar,
não escaparam às várias lutas fratricidas, de cristãos contra
cristãos. Outras vezes os próprios reis visigodos, para proteger
o seu território das hordas sarracenas, criavam, à sua volta,
faixas de desertos, transportando para terrenos mais seguros
grande parte da população ameaçada. Assim procedeu Afonso I,
que «ermou todos os campos até ao Douro». Em HERCULANO:
«Passando à espada os muçulmanos, que não puderam evitar com a fuga o
cair-lhe nas mãos, o rei asturiano (Afonso I) fez
recolher aos territórios, onde a independência visigótica se havia
salvado, a população cristã dessas devastadas províncias...», História de Portugal, voI.
III, págs. 159-199.
Egas Erotis, nobre e rico Senhor da Terra de Santa Maria,
refugiou-se em terras do Minho, pela ocasião da invasão de
Almançor: «auitabit egas erotez in terram portugalensis cum
gens sua in logo predicto inter doiro e uauga per plures annos
et consurrexerunt filii ismaelidarum super christianos et exiuit
domnus egas de sua terra ante ipsius gens ismaelitarum».
Em documentos medievais encontramos algumas referências
a indivíduos que, obrigados a emigrar, perderam na ausência
os seus bens, por outros se terem apoderado doles. Talvez por este
motivo, para ficar assegurada a posse das terras aos
que voltavam, mais tarde, do exílio, é que começa a aparecer,
desta época em diante, grande número de topónimos, provenientes de antropónimos, na maior parte do genitivo, subentendido o nome da propriedade:
villa, hereditas, quinta, etc. No
concelho da Feira: Adoufe, Aldriz, Argoncilhe, Ariihe (?),
Beire (alótropo de Valerii) que deu, além de Beire, Ver),
Ermilhe, Escapães, Estoze, Fagilde, Fiães, Framil, Goim, Gondufe,
Gualtar, Gueifar, Guilhadães, Gulfar, Manhoce, Moalde,
Ordonhe, Prime, Ramil, Romariz, Sagufe, Sales, Silvalde, Tarei, Teobalde,
Togilde; outros do acusativo: Aldão, Aldeiro, Balteiro,
Espargo, Fafião, Merelo, Roligo, Sameiro, Sisto; do nominativo:
Pigeiros; do locativo: Lever.
ARLINDO DE SOUSA
Continua na página 206 −
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