|
Uma Ria à Janela
Sempre abri a janela para o mar.
A ria levava-me e trazia-me a casa
ao anoitecer. A cidade passeava
pela avenida onde ondulavam saias
e línguas viperinas: rias de lodo
onde desaguavam os esgotos da cidade.
Eu fazia-me subterrânea como o moliço
para não ser apanhada. Quando subia
à superfície o meu reflexo nas águas
era só o lugar onde não estava.
As salinas eram a cidade branca
com casinhotas e trilhos no meio de nada.
Eram a cidade que eu queria ser
quando queria ser barco e amarelo pintado,
petisco de fogareiro, nome na madeira
a caminho da barra. Vivi perto de mim
nas avenidas do mar. Fui espuma
de uma onda que rebentou em letras
e remo contra e a favor do vento.
Ainda hoje abro a janela do mar.
Ainda me escondo no fundo do fundo,
mas o marulhar das águas
traz à tona palavras que sobem sem mim,
e eu sou só uma mão ao leme
à procura do norte para me perder
nos cristais salgados das palavras.
Rosa Alice
Branco
Poetisa, Ensaísta, Tradutora, Professora |
|
|
|
|
Tela
A calçada azul e branca
que pisamos diariamente,
O moliceiro percorrendo as águas calmas da ria,
A Biblioteca embevecida de antigos e recentes, mas
preciosos saberes,
Os encontros amigáveis no Fórum,
As palmeiras enfeitando os agitados ares do Rossio,
O “Beira-Mar” que recebe os convidados para mais uma
partida,
As muitas gaivotas sobrevoando os telhados das
casas,
A correria matinal e sonolenta dos estudantes,
Os ovos moles servidos nas diversas pastelarias,
As salinas ilustrando uma veia que é nossa!,
A mão inteligente de José Estêvão reclamando
sabedoria,
Os quietos bancos do jardim onde vagueiam as gentes,
O calor da Feira de Março que traz alegria aos mais
novos,
A Universidade formando mais e mais talentos,
As gravuras inscritas nos azulejos das ruas,
A avenida repleta de gente apressada, sorrindo ou
barafustando.
Recebeu-me,
Acarinhou-me,
Perfilhou-me.
Esta é a minha cidade! Esta é Aveiro!
15/05/2008
Ana Castro
Elemento do Grupo de Trabalho,
12º H |
|