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VI
PRENSAS DE AZEITE |
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PRENSA DE VARA
É este o tipo de prensa que
maior atenção merece da nossa parte, dado o seu elevado interesse
linguístico e etnográfico. A sua acelerada tendência para desaparecer(4)
impõe-se ao nosso espírito como motivo importante para lhe dedicarmos o
máximo de atenção. Eis a grande razão pela qual iremos procurar
estudá-lo o mais minuciosamente possível nas páginas seguintes, ainda
que com prejuízo dos restantes tipos, que terão de ser relegados para
segundo plano.
A importância da vara é de
tal ordem e está tão vincada no subconsciente dos sujeitos falantes, que
o seu nome se estendeu a todo o edifício, passando este a ser conhecido
pela expressão lagar de vara. Este tipo de prensa assumiu,
portanto, um papel marcadamente individualizador, permitindo distinguir
o lagar onde existe de todos os restantes.
Intimamente ligada com a expressão
lagar de vara
está a noção de antiguidade, de tal modo que, quando se afirma que este
ou aquele lagar é de vara, automaticamente se pressupõe a ideia de
antiquado e ultrapassado. Só assim se compreende ouvirmos tantas vezes
da boca dos informadores afirmações como esta: «Esse lagar não tem
interesse, ainda é de vara. O senhor tem um mais moderno em tal parte.
Esse já é muito velho. Já nem trabalha.»
Antes de entrarmos na descrição deste tipo de prensa, sem dúvida do que
de mais antigo se conhece(5),
convirá saber os nomes por que é conhecido, não apenas em Portugal, mas
ainda no país vizinho e em Itália.
Em Espanha, esta prensa é conhecida pelas expressões
prensa de libra
e prensa de romana e ainda pelos termos prensa, trujal e
viga(6); em Itália, é conhecida por turcio, trabocco
e trappito(7), termos que variam de região para região.
Em Portugal, além da expressão
prensa de vara
ou simplesmente vara, designações muito difundidas por todo o
País, é conhecida ainda por feixe, termo pouco representado, e
por trabe, este último com larga área e bastante documentado. O
vocábulo feixe foi por nós registado apenas no distrito do Porto,
P. 51, 52 e 54a; trabe, que não é mais do que uma variante
fonética de trave, surge-nos com frequência nos distritos de Braga, P.
29, 31, Porto, 57, 60, e Vila Real, P. 73, 76a, 78.
Por
vara
entendemos um tipo de prensa que se compõe essencialmente de duas
partes: um enorme tronco de madeira, cujo comprimento oscila entre seis
e catorze metros e com uma função de alavanca de tipo inter-resistente
ou de segunda espécie; um sistema de accionamento, formado por um grosso
parafuso ou fuso de madeira – muito raramente de ferro – e uma espécie
de porca que atravessa a vara. Na extremidade inferior do parafuso, um
bloco cilíndrico, tronco-cónico ou esférico, feito de pedra ou cimento,
serve de peso, aumentando a pressão exercida pela prensa.
A análise dos elementos de que dispomos(8),
a que se juntam os excelentes trabalhos, há pouco citados, de Tomás
Buesa e Albert Klemm, relativamente a Espanha, e de Scheuermeier e
Domenico Priori(9), em relação à Itália, permitem-nos
distinguir dois tipos diferentes de vara: a peninsular, idêntica nos
dois países vizinhos; a italiana, com substanciais diferenças em relação
à primeira.
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(4) – Alguns lagares visitados, durante o ano de 1969, deram lugar,
pouco tempo depois, a modernos edifícios com a mais recente maquinaria;
outros extinguiram-se definitivamente. Dos que se conservavam nos
começos da década de 1970, grande número tinha já os seus dias
praticamente contados. Actualmente, a grande maioria desapareceu
definitivamente, não tendo deixado sequer vestígios para as gerações
futuras poderem saber como se fabricava outrora o azeite pelos sistemas
tradicionais. |
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(5) – A prensa de vara era já usada na Antiguidade, como o atesta a
imagem gravada num sarcófago romano de época muito remota, possuindo uma
constituição semelhante à actual. Sobre o fabrico do azeite na
Antiguidade, veja-se o que nos diz a Enciclopedia universal ilustrada
europeo-americana, Barcelona, tomo II, págs. 34-36. Desta obra, que
reproduz a imagem do sarcófago na página 36, transcrevemos o seguinte
excerto: «(...) um sarcófago de remota época presenta en el centro
del cuadro un genio alado, reunindo en un cesto las olivas caídas del
árbol; á la diestra, otro genio hace rodar un molino; á la izquierda
está la prensa; un cofre admite las olivas ya pasadas por el trapetum;
un geniecito las pisa con los pies para mejor acondicionarlas; en la
parte posterior, el praelum ('nome latino da prensa de vara'), que debe
deshacerlas; cuatro vasos con los bordes á flor de tierra están á punto
de recibir el líquido así que salga de la prensa. (...)» (página 35,
2ª col., linhas 7 a 25). |
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(6) – Dados recolhidos em TOMÁS BUESA OLIVER, Terminología del olivo y
del aceite en el alto aragones de Ayerbe, in: "Miscelánea Filológica
dedicada a Mons. A. Griera", Barcelona, 1955, tomo I, pág. 91. |
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(7) – Veja-se PAUL SCHEUERMEIER, Bauernwerk in Italien der
italienischen und rätoromanischen Schweiz, 1943, pág. 188. |
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(8) – Efectuámos durante todo o processo de investigação 35 inquéritos
em lagares de vara, dos quais os quatro últimos não figuram no mapa 1,
por terem sido visitados posteriormente à sua elaboração. Situados no
distrito de Coimbra, esses lagares visitados e dos quais possuímos
documentação em registos magnéticos (gravações efectuadas mediante
utilização de um gravador de cassetes) e fotografias, são,
respectivamente: o da Quinta do Rol (4 varas), freg. de Ançã, conc. de
Cantanhede; o da Ponte da Mata (4 varas), freg. de Sazes, conc. de
Penacova; o lagar da Ribeira (3 vares), freg. de S. Paio, conc. de
Penacova; e o de Varrelas (2 varas), freg. de Carvalho, conc. de
Penacova. |
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(9) – DOMENICO PRIORI, Coglitura e molitura delle olive in Torino di
Sangro, in: "Folklore", Outubro 1947-Março 1948, ano II, fasc.
III-IV, págs. 79-82. |
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