SITUAÇÃO DO MOINHO
Antes de fazermos uma classificação tipológica dos moinhos, importa ver
em que zona se situa este elemento do lagar. Para tal, desenvolveremos o
assunto de acordo com a classificação apresentada no capítulo I. Só
assim se torna possível fazer uma análise metódica e sistemática de toda
a matéria.
Vejamos, em primeiro lugar, os moinhos puxados por animais. Como a
classificação estabelecida permite concluir, este primitivo e moroso
sistema de accionamento pode ser encontrado, quer nos antigos lagares de
vara, quer nos que apresentam já uma prensa de parafuso. A sua situação
está dependente da estrutura do lagar. Quando este é formado por uma
única sala, o moinho fica, em regra, do lado oposto à zona de
enseiramento e prensagem, logo à entrada do portão de acesso, para que
as sacas descarregadas dos carros possam ser imediatamente despejadas no
pio ou base.
Nos casos em que o lagar apresenta um plano bipartido, isto é, com duas
salas independentes, uma para a moagem, outra para a prensagem, o moinho
ocupa uma posição central, aproximadamente o ponto de encontro das
diagonais da sala. Não é difícil encontrar explicação para o facto.
Basta que nos lembremos de que os animais necessitam de espaço
suficiente para andarem à volta, em movimento circular, atrelados ao
cambão ou almanjarra do moinho. Como exemplo, observe-se o
moinho A da
figura 1, apresentado na página 5. Neste caso, o plano do
lagar apresenta três salas: uma para o moinho, as duas restantes
respectivamente para a prensa de parafusos e cincho.
Em alguns lagares visitados, como é o caso da azenha de Cadeado, P. 54a,
no distrito do Porto, os cantos da sala do engenho são aproveitados para
servirem de manjedoura, tal como se mostra na
figura 17 (pág. 45). Esta
é constituída por um arco de pedra encostado ao canto da parede, no qual
colocam as canas de milho, que servem de alimento aos animais. Para que
estes não fujam, prendem-nos com uma correia de couro a uma argola
cravada na parede.
Os moinhos accionados a água apresentam elevada vantagem sobre os
puxados por animais. Além de maior rendimento de trabalho, o espaço por
eles ocupado é substancialmente inferior. A sua localização depende do
tipo de lagar em que se encontram.
Nos lagares antigos, o moinho ocupa um canto do lagar, na metade oposta
àquela onde se efectua o enseiramento e prensagem. No caso dos lagares
de roda, o moinho é frequentemente térreo, isto é, ocupa uma cavidade
feita no chão e forrada com aduelas de madeira, ou apresenta uma base de
pedra com altura relativamente pequena, raramente excedendo um metro.
A
figura 2,
reproduzida na página 7(aqui à dtª.) e que representa a planta de um
antigo lagar de vara accionado por meio de roda hidráulica, documenta
bem a posição ocupada pelo moinho. Com uma base de pedra aproximadamente
com 60 centímetros de altura e um pio em forma de prato, com bordos
ligeiramente inclinados, ficava praticamente encostado a um canto da
parede e ligado à
roda de fora
por meio de um sistema de transmissão, constituído pela dobadoira
– roda horizontal dentada – e roda de entrosga.
Caso raro e talvez até único é o que podemos encontrar no lagar da Mata,
P. 297, no concelho de Góis, distrito de Coimbra. De todos os lagares de
vara visitados, é sem dúvida o que maior singularidade apresenta. A
juntar a isto, o facto de ter-nos proporcionado a oportunidade de
apreciar e registar, numa sequência fotográfica de quinze imagens, as
fases principais do fabrico do azeite.
Sobre o lagar da Mata já alguma coisa dissemos no capítulo I. Importa,
todavia, fazer uma análise mais profunda da sua estrutura, pelo que
chamamos desde já a atenção do leitor para a
figura 5, que nos mostra o
seu aspecto exterior, e para a figura 18, que representa o plano do
edifício. Neste não foi assinalada a divisão anexa a um dos lados, uma
vez que é totalmente independente do lagar. Segundo nos disseram, serve
apenas para guardar alfaias agrícolas.
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Figura 18: Planta do lagar da Mata, P. 297, conc. de Góis, dist.
Coimbra.
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O edifício original (ver figura 18) deveria ser formado unicamente pela
sala F. Disso é prova evidente o próprio telhado que, como poderemos
verificar pela figura 5, é coberto com telha portuguesa. Mais tarde, por
necessidade de guardar os sacos de azeitona, foi construída a sala E,
coberta não já com telha igual à primitiva, mas sim de tipo francês. É
nesta sala que existe o chamado
assentador
(G), de que já falámos quando tratámos do transporte e conservação da
azeitona.
Com um chão de terra batida, apresenta na sala F, na metade esquerda,
uma secção formada por um piso de cimento a uma altura superior do resto
do lagar de cerca de um metro. O acesso a esse piso faz-se por três
lanços de escadas do mesmo material, dois nas extremidades, entre as
tarefas e as paredes, e o terceiro ao centro, entre uma tarefa e a
caldeira D. É esta secção que, nos lagares normais, corresponde à
chamada zona de enseiramento, e que se opõe àquela onde é feita a
moagem.
As paredes da casa primitiva são constituídas por delgadas placas de
pedra sobrepostas e de tamanhos variáveis, apresentando a que separa a
zona E da F largura maior que as restantes, a fim de poder suportar não
só as
agulheiras,
mas também a enorme força que a extremidade da vara, embutida na parede,
tende a exercer de baixo para cima. Em contrapartida, as paredes da sala
E são de espessura muito pequena, em virtude de serem construídas com
tijolos. Há, pois, no que respeita ao sistema de construção e materiais
usados, um enorme contraste entre as duas secções do lagar actualmente
existentes.
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Figura 19:
Aspecto do moinho, situado na zona de enseiramento entre as duas
prensas de vara (Mata, P. 297), Vila Nova do Ceira, Góis, Coimbra. |
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Ao contrário do que é habitual, o moinho A fica situado entre as duas
varas B, no piso de cimento J, comunicando com o compartimento E pelo
chamado botadoiro, pequena construção de madeira (H) através da
qual é despejada a azeitona no pio. Bastante elucidativa é a figura 19.
Além de nos dar um aspecto geral do moinho, permite-nos fazer uma série
de observações, que completam e confirmam o que se disse. Em primeiro
lugar, constatamos que o moinho está efectivamente entre as duas varas,
pois podem-se ainda ver as pedras salientes – as chamadas agulheiras
– onde elas encaixam. Em segundo lugar, vemos entre as duas galgas de
eixos assimétricos o botadoiro por onde é deitada a azeitona no
pio. Finalmente, podemos apreciar a considerável altura que vai do chão
ao bordo, sobre o qual uma candeia com dois bicos acesos ilumina o
interior da vasa.
Nos moinhos de rodízio que tivemos a oportunidade de visitar, o aparelho
de moer apresenta, geralmente, situação idêntica à dos moinhos de roda.
Exceptuam-se os lagares de Chacim, P. 29, e Garceira, P. 32, ambos no
distrito de Braga. O primeiro apresenta o moinho a um canto da sala, ao
lado da caldeira e da vara; o segundo, no lado oposto à zona de
enseiramento e num piso de cimento a cerca de um metro do chão, no qual
está embutido o vaso ou pio onde gira a galga.
Nos
lagares modernos, o moinho accionado por água ocupa a mesma zona da
prensa, numa plataforma ampla de cimento, acima do nível do solo. Como
nos lagares antigos, fica quase sempre junto à parede, para encurtar a
distância do veio, que transmite o movimento da roda da água ao eixo
vertical, que faz andar as galgas. Observe-se a situação do moinho A, na
figura 3.
Relativamente aos moinhos accionados por motor, torna-se difícil indicar
as zonas em que se situam. A sua posição é muito variável. Ao contrário
dos movidos por força animal, ocupam habitualmente o mesmo plano da
restante maquinaria, a um canto da sala e a pequena distância das
prensas. O facto da transmissão do movimento ser feita por meio de
correame,
que permite a um só motor pôr toda a maquinaria em movimento, o espaço
tomado pelo moinho torna-se bastante reduzido, contribuindo para que
alguns lagares ocupem uma área muito pequena.
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