Homenagem
ao C.E.T.A.
(Círculo Experimental de Teatro de Aveiro)
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Corria
o ano de 1959 quando o C.E.T.A. nasceu, em tempo de apertado
controlo ideológico, de obscurantismo e de repressão.
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Nasceu
no «berço da liberdade», em Aveiro, cidade que viveu o confronto de
ideias, a tolerância e onde tiveram lugar acontecimentos marcantes do
combate à ditadura: os dois congressos republicanos (Outubro de 1957 e
Maio de 1969) e o Congresso da Oposição Democrática (Abril de 1973).
Por aqui passou também a campanha de Humberto Delgado (1958). De modo que
se pode arrogar de ser
herdeiro destes anseios de liberdade, o C. E. T. A..
Nasceu
no seio do «VAE VICTIS», o suplemento juvenil do semanário “O
Litoral”, em cujas páginas se anunciou a criação de um grupo de
teatro em Aveiro -
a primeira reunião preparatória realizou-se na redacção do jornal, em
28 de Fev. de 1959, tendo a ideia germinado em 14 de Fevereiro, ligado à
então nascente Livraria Borges. Algumas das reuniões do C. E. T. A.
realizaram-se no Centro da Mocidade Portuguesa, embora date de 25 de
Janeiro de 1964 a primeira acta escrita.
Anunciando-se
como «instituição de interesse público», o C. E. T. A. liga-se não só
ao teatro, mas também à literatura, às artes plásticas, à música, ao
cinema (o Cineclube de Aveiro, liderado por Vasco Branco, funcionaria no C. E. T. A.
durante alguns anos).
Bandeirante
do teatro na nossa cidade, o gosto pelo teatro terá sido aguçado em
alguns dos mentores do grupo pela tradição das récitas que, no final do
ano lectivo, se realizavam no Liceu de Aveiro, por impulso do reitor José
Pereira Tavares. Bartolomeu Conde foi o primeiro presidente do C. E. T. A.
e no grupo fundador inscrevem-se outros nomes como Jaime Borges, Gaspar
Albino, Rui Lebre, primeiro encenador e sócio número um, Jeremias
Bandarra, Artur Fino, José Júlio Fino, Samy A., Carbat (Carlos Coelho),
Armindo Pereira da Silva, Pinto da Costa e, mais tarde, Vasco Branco. O
Arlindo, que todos conhecem, está no C. E. T. A. desde 1965.
Em
3 de Julho de 1959, o grupo tinha o seu primeiro espectáculo pronto e
este foi proibido; o texto de apresentação, de Mário Sacramento, foi
substituído por outro do director de “O Litoral”, David Christo.
Assim, o C. E. T. A. subiu ao palco do Teatro Aveirense em 31 daquele mês
com as peças «O Dia Seguinte» de Luiz Francisco Rebello (que assistiu
ao espectáculo com a esposa, a actriz Mariana Vilar), «O Urso» de
Tchekov, e um entreacto de poesia, de Carlos Morais.
1966
foi o ano da aprovação dos estatutos do C. E. T. A. pelo Governo Civil
de Aveiro; o grupo foi expurgado da designação «Experimental», que
readquiriu após o 25 de Abril, em 21 de Janeiro de 1981, consoante consta
de registo assente no Cartório Notarial de Ílhavo.
Sem
dúvida que os anos 60 foram a época de ouro do C. E. T. A., que recebeu
alguns prémios e menções honrosas do S.N.I. («A Ópera de Godot», «Auto
da Compadecida», etc.). Parece ser uma história de contradições a do C. E. T. A.
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acusado de fazer serviço ao fascismo, premiado pelo S.N.I., recebia
dinheiro do Estado para pagar a renda, mas levava à cena peças que
condenavam os aspectos mais sombrios do regime e viu trabalhos seus
proibidos pela censura (caso de «Ramos Partidos» de Jaime Gralheiro) jogando muitas vezes com subterfúgios para lhe escapar.
A
par do teatro, várias outras actividades têm pautado a vida do C. E. T. A.:
cursos de iniciação teatral (1975, 1987, 1988, 1990, 1992, 2000, 2001);
colóquios, sessões culturais -
«As Sextas do C. E. T. A.», 1987 -,
onde estiveram presentes, p. ex., Carlos Porto (1975), Romeu Correia
(1981); exposições (Artes Plásticas, 1980, iconobibliografia, 1989);
publicação de um Boletim de Informação aos Sócios, que atingiu os
setecentos exemplares, um caderno de poesia que chegou aos jovens do país
inteiro.
Em
1967 (de 17 a 31 de Dezembro), publicaram-se os Cadernos do C. E. T. A.,
e, só para darmos um exemplo, num deles se encontram variados artigos de
Samy A. («Da Estereofonia»), Júlio Henriques («Música Experimental»),
José Júlio Fino («Jaime Gralheiro e Ramos Partidos»), Idalécio Cação
(«António Nobre, o Poeta da Saudade»), Mário Rocha («O Teatro nas
Origens»), Bartolomeu Conde («Do Actor em Relação ao Autor e ao
Encenador»), Artur Fino («Da Cenografia»), Carlos Coelho, Carbat («Aspectos
da Orgânica do Teatro Não Profissional»), Jeremias Bandarra («O
Happening»).
Na
lista dos autores representados pelo C. E. T. A., inscrevem-se alguns dos
mais festejados nas dramaturgias nacionais e estrangeiras, alguns
censurados pelo Estado Novo: Luís Francisco Rebello (1959, «O Dia
Seguinte»), Alexandre O’Neill (1963, «Longa Marcha para a Noite»),
Raul Brandão (1969, «O Gebo e a Sombra», peça encenada para a comemoração
dos 40 anos do S.N.I. e premiada apesar das fortes críticas ao sistema
prisional), Bernardo Santareno (1967, «O Lugre», também premiada), Idalécio
Cação (1968, espectáculo de poesia), Padre António Vieira (1980, «colagem
de textos seus com outros de
Arrabal, montada por Rui Lebre), Jaime Gralheiro (1989, «A Longa Marcha
para o Esquecimento», peça escrita a pedido do grupo).
Dos
autores estrangeiros, podemos mencionar, a título meramente
exemplificativo, Tchekov (1959, 1965, 1968), Ariano Suassuna (1964),
Samuel Becket (1962, 1973), Garcia Lorca (1967), Jean Cocteau (1968),
Gogol (1969), WedeKind (1975), Molière (1986), Pirandello (1991), Bertolt
Brecht (1971, «Se Outros Fossem os Deuses»; 1975, «A Cruz Branca» -
3º acto de «Terror e Miséria no III Reich»; 1980, «As Espingardas da
Mãe Carrar»).
É,
portanto, uma instituição indelével na paisagem cultural aveirense que
aqui festejamos nos seus 42 anos de existência.
Parabéns
ao C. E. T. A.! Longa vida ao C. E. T. A.!
Alice
Pinho Silva
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