O Estufado

Estufa-se um alimento, mantendo-o, durante um período relativamente longo, em lume brando (ou forno, embora menos usual) numa atmosfera saturada de vapor de água (a 100°C).

Este vapor provém de:

- água que propositadamente se deitou no recipiente ou outro líquido (caldo, vinho, etc.);

- água constituinte do alimento («suor»).

 

1. MATERIAL

Utiliza-se uma caçarola não muito funda, pesada, de paredes espessas (e grande massa inerte), metálica, de barro ou de «pirex». Deve ter uma tampa pesada, que vede hermeticamente o recipiente, de forma interior convexa, que obrigue o vapor condensado a escorrer ao longo das paredes da caçarola para o fundo. Este, por sua vez, deve ser um pouco abaulado ou então perfeitamente plano e com base ao diâmetro dos modernos fogões vitrocerâmicos ou similares. A grande massa da caçarola permite a obtenção de um calor uniforme e regular, impedindo grandes variações de temperatura.

 

2. EFEITO QUE SE OBTÉM COM O ESTUFADO

O alimento é cozido na atmosfera húmida de vapor sobreaquecido, sem ser banhado pela água que se condensa na tampa, o que, a acontecer, prejudicaria o sabor da peça cozinhada. Praticamente, há duas fases distintas, durante o estufado:

 

Na primeira, o alimento é salteado, na gordura aquecida constituinte do «fundo» do estufado. Então, as proteínas coagulam na superfície e os açúcares caramelizam-se.

As cebolas e cenouras que normalmente entram na constituição do «fundo», ricas em açúcar, sofrem idêntica transformação, dando uma maior cor e sabor à preparação.

É frequente, também, deitar um pouco de farinha, a qual confere ao cozinhado uma bela cor dourada, devida à dextrinização do seu amido.

O alimento, contudo, deve cozer em profundidade sem se carbonizar à superfície.

 

Na segunda fase (a que exige uma maior duração – cerca de duas horas), completa-se a cozedura.

O alimento apenas deve ter uma pequena parte mergulhada no líquido que entra na constituição do «fundo» do estufado. Este pode ser:

- água simples (temperada);
- água com uma pequena porção de vinagre;
- caldo de legumes;
- vinho do Porto, Madeira (secos) branco ou tinto a que se junta um ramo de cheiros e especiarias.

 

3. O QUE SE PODE ESTUFAR

a) - Carne

            - Vaca (acém redondo, ganço redondo, pombinho, alcatra, chã de fora, chambão, língua, etc.).

            - Vitela (pá desossada, costeletas (inteiras) acém comprido, rabadilha, língua, etc.).

            - Carneiro (pá desossada e enrolada ou recheada, sela, jarrete, etc.).

- Porco (costeletas, lombo, língua, etc.).

b) - Aves

- Galinha, pato, ganço, pombo, etc.

c) - Peixe

            - Atum (fresco), congro, pargo, lampreia, garoupa, etc.

d) - Legumes frescos

- Cenouras, beringelas, abóbora, tomates, ervilhas, feijão-verde, couve (lombarda, de Bruxelas, etc.), endívias, nabos, fundos de alcachofra, etc.

No texto referimos com mais frequência a carne, por ser, de facto, o tipo de alimento que mais vulgarmente se estufa; contudo, nessa referência, salvaguardadas as necessárias adaptações, abrangeremos também os restantes tipos.

 

4. «FUNDO» DO ESTUFADO

É constituído por diversos elementos com que se cobre o fundo da caçarola (courato gordo, tiras ou pedaços de toucinho, rodelas de cebola e cenoura, ramos de cheiro, o líquido desejado, etc.).

De uma maneira geral, as cebolas e cenouras são postas em cru. No caso das carnes negras, todavia, elas são previamente alouradas numa pequena porção de gordura.

Para fazer o «fundo», procede-se do seguinte modo:

1º - Corta-se o courato em pedaços de 3 a 4 dedos de largura. Se este não for muito fresco, para o amaciar é costume mergulhá-lo em água a ferver, durante um minuto.

2º - Colocam-se os pedaços de courato no fundo da caçarola com o lado gordo para baixo (desta forma, impede-se que os legumes se peguem).

3º - Sobre a camada de courato, põem-se as rodelas de cebola e cenoura e sobre esta os pedaços ou tiras de toucinho. As rodelas devem ter cerca de 1/2 cm de espessura. No centro, coloca-se o ramo de cheiros.

4º - Sobre isto tudo, coloca-se a peça que se quer estufar.

 

5. PROCEDIMENTO GERAL

1ª - fase

O alimento e os legumes são salteados com a gordura do «fundo». Depois, tempera-se com o líquido que a receita indicar, tapa-se a caçarola e leva-se ao lume.

2ª - fase

Logo que começa a ferver, regula-se o lume de forma a que a fervura seja apenas um leve «arripiar». A meio da cozedura vira-se (ou mexe-se) a preparação. Na altura própria, juntam-se os legumes (indicados na receita).

A regularidade da lenta ebulição é condição essencial para a obtenção de um bom estufado.

Se a ebulição é muito viva de princípio, não só o líquido se reduz demasiadamente e a carne seca, como também o interior é atingido bruscamente, não sofrendo a progressiva e lenta transformação que constitui, afinal, o verdadeiro estufado.

A ebulição lenta deve manter-se sem interrupções ou variações, desde o início até ao fim da cozedura. Pode assim afirmar-se que a conduta de um estufado reside principalmente na constante vigilância do lume. Aumentar a temperatura, para reduzir o tempo de confecção, pode inutilizar a preparação.

Um golpe violento de ebulição num estufado corresponde a um golpe de fogo num assado: a carne endurece sem remissão, chegando a alterar-se o paladar da peça e do «fundo». Verificando-se uma redução muito acentuada no líquido do «fundo» (em especial para o fim da cozedura), é conveniente deitar algumas colheres de água quente a fim de restabelecer o equilíbrio.

Deve procurar-se que a carne fique bem dourada em toda a volta, nunca a picando para que não perca os elementos sápidos e aromáticos.

A tampa da caçarola só deve ser levantada, quando tal for estritamente necessário (a meio da cozedura, por exemplo, para voltar ou mexer).

Nunca se deve deixar cair a água da tampa sobre o alimento, mas sim escorrer ao longo das paredes laterais.

Para se verificar se a peça está bem cozida, espeta-se uma agulha grande na parte mais espessa, atravessando-a de um lado ao outro. Se a agulha não se retirar com facilidade, tal significa que a cozedura é insuficiente.

Quando a carne está cozida, deve ser manuseada com muito cuidado, a fim de se não desmanchar.

 

6. TEMPOS DE COZEDURA

Carne:

Vaca: 2 a 3 horas por quilo (às vezes mais).
Vitela: 2 horas por quilo.
Porco: 2,5 horas por quilo.
Aves: 1 hora por quilo. 

Legumes:

30 a 90 minutos, conforme o legume escolhido.

 

7. «GLAÇAGE»

A finalidade da «glaçage» é dar um melhor aspecto ao estufado, recobrindo-o de uma ligeira camada brilhante que o faz parecer como que envernizado.

Para fazer a «glaçage», coloca-se a peça num prato ou tabuleiro de ir ao forno, depois de lhe retirar todo e qualquer vestígio de legumes.

Com o molho (depois de passado e desengordurado) rega-se a peça e leva-se esta, seguidamente, a forno médio. Repete-se duas a três vezes a operação no espaço de 10 minutos.

Pela acção do calor, o molho carameliza-se, conferindo à peça o aspecto brilhante desejado.

 

8. O MOLHO

Embora o termo de molho não seja o que propriamente deve ser aplicado ao líquido resultante da cozedura de um estufado, é o que empregamos para não dificultar a compreensão deste assunto.

Quanto mais reduzido for o molho, mais suculento será, constituindo um extracto de todos os princípios, carne, legumes, líquido, temperos, etc., que contribuíram para a cozedura.

A sua consistência e aspecto devem assemelhar-se às de um xarope brando e límpido, sem que a gordura se distinga.

 

9. COMO SE SERVE

Coloca-se a peça na travessa (retirando o fio de atar se for caso disso), dispõem-se os legumes de guarnição à volta. Passa-se o molho, rectificam-se os temperos, se necessário, e serve-se numa molheira.


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