1. Os itinerários limianos
Quem vai na frente é o Santo, filósofo a seu modo, como os que são, e
homem de acção por excelência, por isso que a sua acção ê toda no
sentido do bem.
*
Antero de Quental
(1)
JAIME
de Magalhães Lima foi daquelas personagens de multímoda mundividência
que, pela extrema e variada riqueza interior, escapa a qualquer
tentativa de arrumação em cacifo ideológico padronizado. Tocado por uma
miríade de influências, cujas raízes mergulham no cristianismo do
Poverello de Assis e num certo tolstoísmo, passando
pelo movimento Arts and Crafts de William Morris e John Ruskin
(2) e pela comunhão
/ 16 /
de ideais com alguns dos grandes vultos das nossas gerações
oitocentistas, não deixou por isso de construir o seu próprio caminho,
calcetando-o com um apurado sentido crítico e, sobretudo, com muita
lucidez e tolerância, milímodas cumplicidades e um incomensurável
respeito pelo Outro.
Filho de Sebastião de Carvalho Lima e de D. Leocádia
Rodrigues de Magalhães, nasceu a 15 de Outubro de 1859, no palacete que
seu pai mandara construir sobre as ruínas do Convento do Carmo,
adquiridas em 1856 a Manuel José Mendes Leite, o fiel e eterno
companheiro de José Estêvão e autor da iniciativa legislativa
que terminou com a pena de morte para os crimes
políticos (1852), gesto pioneiro a nível europeu(3).
Nesse mesmo ano, o seu irmão Sebastião de Magalhães Lima, cujo percurso
intelectual e político seria bem diferente, saía de Aveiro para
frequentar o colégio alemão Roeder.
/
17 /
Nasceu em Aveiro, terra de fortes tradições e
envolvimentos liberais(4),
pouco antes de seu pai, recém-chegado da emigração brasileira, se ter
filiado no Partido Histórico chefiado pelo duque de Loulé, facção
política do liberalismo português surgida no início da Regeneração,
resultante da cisão verificada nos primitivos progressistas, oriundos de
um estranho amálgama de setembristas, ordeiros e cartistas reformistas,
unidos pela oposição ao cabralismo. Iniciado o movimento regenerador, o
grupo progressista cindiu-se em duas organizações políticas, uma
moderada, o Partido Regenerador, e outra de esquerda, o Partido
Histórico. Este grupo progressista, que agora se
cinde, não deve ser confundida com o Partido Progressista de 1876,
resultante do Pacto da Granja e da fusão dos partidos Histórico e
Reformista(5).
A infância terá decorrido no ambiente familiar em que as
questões políticas estariam quase sempre presentes, pois seu pai, para
além de deputado, foi presidente da Câmara de
/ 18 /
Aveiro e da Junta Geral do Distrito. A preparação para o ingresso nos
estudos superiores levou-o para o Colégio de Lousada, tendo iniciado o
curso de Direito, na Universidade de Coimbra, no ano em que sua mãe
falecia na residência da Rua do Carmo. Tinha dezasseis anos.
Frequentando a Universidade entre 1875 e 1880, acabou por
ser influenciado pelo pensamento de Karl Krause, filósofo do Direito e
discípulo de Schelling e de Fichte, o que, como adiante veremos, se
reflectirá nos seus escritos. O krausismo, cujos prosélitos
conimbricenses foram sobretudo Costa Lobo, Rodrigues de Brito e Emídio
Garcia, estará por detrás da concepção organicista da realidade,
comungada por Jaime Lima e presente no seu modelo de representação. As
ideias de Krause encontraram campo propício entre os críticos do
individualismo liberal, homens também eles liberais, mas que viam com
mágoa e inquietação a facilidade com que se destruíam os equilíbrios da
sociedade tradicional e os seus esteios axiológicos,
como acontecia com Costa Lobo que, já em 1864, na sua tese de
doutoramento(6),
avançava para soluções corporativistas, apresentando a sociedade «como
verdadeiro organismo [...com] seus membros reciprocamente dependentes»
(Catroga, 1981: 355-356). Ao longo da segunda metade de
/ 19 /
Oitocentos o krausismo influenciará
ainda muitos dos alunos da Faculdade de Direito de Coimbra, mercê dos
magistérios de Rodrigues de Brito(7)
e Emídio Garcia(8).
A profunda amizade que une Jaime de Magalhães
Lima a Luís de Magalhães, filho de José Estêvão(9),
seu condiscípulo em Coimbra e futuro cunhado, relaciona-o com
importantes nomes da Geração de 70 e com outras personalidades do meio
cultural nortenho. Luís de Magalhães residia na quinta do Mosteiro,
em Moreira da Maia, numa época em que Oliveira Martins
se fixara no Porto(10),
às Águas Férreas. Não muito longe, em Vila do Conde,
demorava Antero de Quental. Nas tertúlias do Porto, em Santo Ovídio(11),
na casa de Oliveira
/ 20 /
Martins, na Quinta do Mosteiro, que Eça de Queirós, que casara no Porto,
visita, aquando das suas passagens por Portugal e que lhe teria servido
de cenário para a quinta de Refaldes da
Correspondência de Fradique(12),
ou na tebaida de Vila do Conde, juntavam-se com frequência Luís de
Magalhães, Jaime Lima, Antero de Quental, Oliveira Martins, Guerra
Junqueiro, Ramalho Ortigão, Alberto Sampaio, António Feijó e tantos
outros, residentes no Norte do país ou simplesmente por ali passando de
visita (Sampaio, 1993: 481-522, passim). Ao contrário do que
afirma Francisco Ferreira da Maia, Jaime Lima (1859-1936) não pode ter
conhecido Oliveira Martins (18451894), Antero de Quental (1842-1891) e
Ramalho Ortigão (1836-1915) quando frequentava a Universidade: o
primeiro, porque nunca a frequentou; o segundo, porque terminou o curso
em 1864 e abandonou Coimbra no ano seguinte; o último, porque se
matriculou em 1851 e abandonou a cidade do Mondego muito antes de Antero
ali ter chegado (Maia, 1957: 10).
Jaime Lima ficará indelevelmente ligado a muitos destes
homens, com destaque para Antero, cujo idealismo e afinidades
intelectuais propiciaram uma maior aproximação, por
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demais evidente na correspondência trocada(13)
e no tratamento familiar que adoptaram entre si, deixando «as
excelências para aqueles com quem não temos outra
comunhão senão a de pertencermos à mesma sociedade em geral – muito
geral.»(14) Em
Coimbra, o convívio e as leituras trazem-lhe as primeiras hesitações
religiosas, que igualmente tocarão o seu amigo Luís de Magalhães
(Magalhães, 1959: 170-171). Isso mesmo parece transparecer do poema
publicado aos 64 anos, assomo de prestação de contas e prenunciação de
uma partida que o destino marcou para cerca de treze anos depois:
[...]
Os anos de inocência e os da paixão;
os de orgulho sombrio e os da humildade; os da fé;
e também esses, funestos, tenebrosos, da Descrença e da
Dúvida;
[...] (Lima. 1923a: 19)
O teor de uma carta de Antero de Quental, datada de
finais de 1886, dá-nos conta da superação desta crise, correspondendo,
/ 22 /
talvez, às primeiras aproximações de Magalhães Lima a S. Francisco de
Assis e a Tolstoi:
«Tudo isto, meu caro Magalhães Lima, veio, não sei bem
como, para lhe dizer uma causa muito simples, e é o que mais me alegrou
na sua carta foi o dizer-me que começava a sentir, nestes últimos
tempos, um renascimento dos antigos sentimentos religiosos, embora
transformados, e uma invencível necessidade de idealismo.» (Quental,
1993: XXIII; Ramos, 1976a: 13-14)
Um ano antes, em 1885, tinha sido publicada a tradução
francesa da Religião de Leão Tolstoi que, como o próprio Jaime Lima
confessa ao autor, apenas leu depois da visita que lhe fez, mas a
influência tolstoiana já se fazia sentir através da leitura de outras
das suas obras:
«Li a sua «Religião» e voltarei a ler brevemente todas as
suas obras traduzidas em francês. Ela (a «Religião») causou-me uma
impressão tão profunda que resolvi dedicar-lhe um estudo que deverá ser
publicado no próximo verão. [...] Não estamos de acordo em muitos
pontos, mas devo confessar-lhe que, há já bastante tempo, muitas vezes
com a ajuda dos seus livros, me sinto voltar à religião e à humildade. É
possível que as vicissitudes da minha vida tenham contribuído muito para
isso; sempre estou convencido de que a vida não tem outra finalidade
senão a virtude, e cada dia sinto mais sincero e profundo arrependimento
das minhas faltas e dou a maior parte dos meus
pensamentos ao amor de Deus.»(15)
/ 23 /
Por esta época, quando dobrava o quarto de século e a Europa
estrebuchava de nacionalismos e imperialismos, com a Conferência
Internacional de Berlim (1884) a traçar os primeiros contornos do novo
domínio europeu em África, Jaime Lima inicia uma prolixa e profícua
produção literária, através da qual procura intervir
na sociedade portuguesa, ou simplesmente exercer um magistério
democrático de divulgação das ideias que, colhidas no velho continente e
na América(16),
lhe parecem merecedoras de partilha. Esta ânsia de
comunicar exprime-se em cerca de novecentos títulos, distribuídos por
dezenas de jornais e revistas, trinta livros, quatro
traduções-adaptações(17)
e vinte opúsculos de outras tantas conferências.(18)
Uma parte importante da sua colaboração em publicações
periódicas
/ 24 /
terá o destino da produção literária de John Ruskin: a compilação
posterior em pequenos volumes, porque,
«para serem companheiros do coração, os livros hão-de
ocultar-se, como tudo o que é amado do coração; irão connosco, unidos ao
corpo, sem que olhares profanos os insultem com escárnio ou indiferença.
[...] Por isso, eu quero aos livros bons e pequeninos,
como às violetas do meu jardim.» (Lima, 1902: 73).
A “Província”(19),
órgão do Partido Progressista(20)
fundado no Porto por Oliveira Martins, será o primeiro jornal a acolher
colaboração continuada de Jaime Lima, que se estenderá por alguns anos.
São artigos literários, sobre autores nacionais e estrangeiros, peças
versando temas agrícolas, mas também aparecem os assuntos de cariz
económico e social ou de política nacional e internacional, muitos deles
a propósito de obras publicadas em diferentes países da Europa.
Em 1888, quase a completar os 29 anos, durante os meses
de Setembro e Outubro, faz uma grande viagem pela
Europa, regressando pelo norte de África e sul de Espanha. Nesta longa
peregrinação, cujo diário(21)
vai publicando no periódico de Oliveira Martins, visita, como atrás
dissemos, Leão
/ 25 /
Tolstoi na sua residência de Iasnaia Poliana,
fortalecendo os vínculos que, desde há algum tempo, o
prendiam ao pensamento do grande escritor russo(22).
No regresso escreve a Tolstoi (Ramos, 1976b: 173-174) e carteia-se com
Antero, comentando com o amigo as impressões recolhidas nas entrevistas
que manteve com o autor de Guerra e Paz. Antero exprime, com a
sua costumada clarividência, a incapacidade da família de Tolstoi
compreender o intenso drama interior do seu patriarca,
problemática que o autor dos Sonetos(23)
sintetiza na fórmula «Helenismo coroado por um Budismo», significando
que a vida natural só terá sentido quando impregnada de vida espiritual,
de compreensão transcendente. Mas «a vida espiritual é
só dada aos homens espirituais. Ora a maioria dos homens é e será sempre
natural.»(24)
O cristianismo democrático e filantrópico de Tolstoi
ajustava-se às preocupações sociais das elites intelectuais da
/ 26 /
época, justificando o impacto deste «santo laico» em toda a Europa e
particularmente em França, onde a influência do escritor russo foi
ateada, quer pela visita que fez a Paris, quer pela sua adesão às
doutrinas de Proudhon. Jaime Lima contactará a obra de Tolstoi
precisamente a partir da França, através das leituras
do livro Le roman russe, de Eugene-Melchior de
Vogüé(25), e das
traduções francesas que se multiplicam no último quartel de Oitocentos(26).
Esta longa deambulação pela Europa e a visita a Tolstoi
parecem culminar uma fase importante da sua vida, à procura de um
caminho e de decisões para o futuro. Regressado a Portugal anuncia a
Antero de Quental o seu futuro casamento, que terá lugar em Condeixa, a
23 de Julho de 1889, com D. Maria do Cardal de Lemos Pereira de Lacerda,
filha de
/ 27 /
Francisco de Lemos Ramalho de Azeredo Coutinho, morgado da Casa de
Condeixa, e irmã de D. Maria da Conceição de Lemos Pereira de Lacerda,
casada desde Fevereiro de 1884 com Luís Coelho de Magalhães (Ramos,
1976b: 175, n.º 2; 177). Um pouco antes, em carta datada de 28 de Maio,
Antero manifesta o seu regozijo:
«Já me tardava vê-lo casado - e posso dizer-lhe agora que
mais de uma vez tinha pensado nisso, e sentido até a tentação de lhe dar
esse conselho; mas achava a matéria tão delicada, tão absolutamente do
foro íntimo, que nunca me atrevi. Veja pois com que prazer recebi a
notícia, que me dá! O dia do seu casamento será para mim um de
verdadeira alegria. Não lhe citarei o famoso «não é bom que o homem
esteja só" da Bíblia, ainda que há uma grande verdade nesse conceito;
mas, tomando a coisa por outro lado, dir-lhe-ei que só é verdadeiramente
livre aquele que sabe limitar voluntariamente a sua liberdade [...]
Entrou, meu caro amigo, num caminho em que todos os dias irá sentir o
chão mais firme debaixo dos pés, mais lúcido o pensamento, mais serena a
consciência. Vivendo cada vez mais para os outros, sentindo morrer em
cada dia dentro de si mais uma parcela do eu egoísta que tanto nos
ilude, tanto nos faz sofrer e errar, irá entrando gradualmente naquela
região da impersonalidade que é a verdadeira beatitude.» (Quental, 1993:
XXVIII-XXIX; Ramos, 1976a: 20-21).
Os acontecimentos de 1890, e a forma como Portugal
respondeu ao Ultimato inglês, desencadearam, um pouco por todo o país,
um coro de lamentos e atoardas, quando não ferozes manifestações de
nacionalismo ofendido. Republicanos e
/ 28 /
socialistas zurziram a instituição monárquica, enquanto a agressividade
da imprensa, que nem a nova «lei da rolha» conseguia calar, e a denúncia
da dependência económica e política de Portugal face à Inglaterra
despertavam sentimentos anti-ingleses e faziam cair governo atrás de
governo. Jaime de Magalhães Lima acabará por entrar na política activa,
já depois da recusa ao grito desesperado de Antero, que o pretendia no
Porto como secretário-geral da Liga Patriótica do Norte a que presidia:
«O Jaime é o homem, é o único. Há-de vir. O que se vai
passar em Portugal é seriíssimo. Faça cada um o seu sacrifício no altar
da Pátria. Eu sacrifico a minha saúde, que naufragará de todo no meio
disto, e muito provavelmente o meu nome, que antes de 6 meses estará
manchado. [...] O Jaime fará também à Pátria e ao Bem
o seu sacrifício. Venha.»(27)
A Liga Patriótica do Norte, excogitada por diversas
individualidades nortenhas, entre as quais pontificava Luís de
Magalhães, fora entregue, a expensas da influência do filho de José
Estêvão, à direcção de Antero de Quental. Dirigia-se contra os
britânicos, como a francesa Liga dos Patriotas, fundada oito anos antes,
se virava contra a Alemanha. A primeira nascia com o mapa cor-de-rosa e
a gula desenfreada pelo domínio do
/ 29 /
continente africano, a segunda com a memória da derrota na guerra
franco-prussiana e a perda da Alsácia-Lorena. Uma e outra deram em nada!
Quanto à portuguesa, Eça de Queirós traça-lhe o epitáfio, em linhas
vigorosas e irónicas:
«E a Liga, que ainda mal nascera, já findava, decomposta.
Tão decomposta que dentro dela não restava outro movimento senão o
fervilhar dos vermes partidários, Regeneradores e Históricos. Quando se
acabaram de elaborar os Estatutos, que eram o programa muito complexo da
Nova Vida, a Liga já não existia, dispersa, sumida, toda fugida para os
hábitos da Vida Velha. Os políticos tinham recolhido aos seus centros: –
A Mocidade que fora arrancar Antero à Metafísica, regressara, cansada
desse esforço, às banquetas e aos bocks dos cafés da Praça-Nova.
Na sessão em que se leram os consideráveis Estatutos só havia, na
vastidão dos bancos, quinze membros que bocejavam. E numa outra final,
como ventava e chovia, só apareceram dois membros da Liga, o presidente
que era Antero de Quental, e o secretário que era o conde de Resende.
Ambos se olharam pensativamente, deram duas voltas à chave da casa para
sempre inútil, e vieram, sob o vento e sob a chuva, acabar a sua noite
em Santo Ovídio.» (ln Sampaio, 1993: 515).
O malogro da iniciativa, que tentava uma ampla frente, supra-partidária,
capaz de salvar a Pátria da decadência e da crise permanente em que
vivia, aplicando um vasto programa que recuava ao diagnóstico da
«Geração Nova» e das Conferências democráticas do Casino Lisbonense,
terá contribuído para o desânimo de Antero e para o agravamento da
misantropia que o conduziria ao suicídio, em 11 de Setembro de 1891.
/ 30 /
Jaime Lima, apesar de ter recusado o cargo de secretário-geral da Liga,
lugar que, como vimos, foi preenchido pelo Conde de Resende,
aderiu ao projecto e disso deu público testemunho na
primeira página d'”A Província”(28).
Recém-casado, o escritor aveirense remete-se à vida
familiar e ao estudo da obra de Tolstoi, reduzindo drasticamente, ao
longo de alguns anos, a sua colaboração na imprensa. No entanto, é
durante este período que o futuro «eremita» da quinta de S. Francisco se
lança na política activa, começando por integrar, com Luís de Magalhães
e Alberto Sampaio, o grupo dos chamados «governamentais», apoiantes do
projecto «Vida Nova» corporalizado no pensamento e na pessoa de Oliveira
Martins. O desiderato apontava para a salvação de Portugal e para a
aplicação de um conjunto de medidas capazes de ultrapassar a bancarrota
do Estado e a crise financeira, e estancar as falências que se sucediam
em catadupa. Oliveira Martins conseguirá inverter esta tendência,
durante os quatro meses em que sobraçou a pasta da Fazenda, mas o êxito
não evitará a sua saída do governo e a consequente solidariedade dos
amigos, que deixam de apoiar o Ministério de José Dias Ferreira.
A traição a Oliveira Martins custou a Dias Ferreira a
chefia do governo, vingança cozinhada por alguns dos «governamentais»
/ 31 /
e consumada no regresso de um governo partidário regenerador, com Hintze
Ribeiro na presidência e João Franco na pasta do Reino. Mas o Partido
Regenerador não fugia à profunda desordem que campeava nos velhos
partidos monárquicos, ele próprio com várias facções a digladiarem-se e
com uma direcção bicéfala, em que pontificavam Hintze Ribeiro e João
Franco, nem aos vícios arranjistas alimentados pelas benesses
distribuídas em função dos acordos de caciques e chefes políticos.
Em 1892 Jaime Lima é eleito presidente da Câmara de
Aveiro e, no ano seguinte, deputado pelo Partido Regenerador,
continuando, coerentemente, a defender as ideias de Oliveira Martins. Em
1894 perde mais este amigo e, dois anos depois, morre-lhe o pai.
Novamente deputado por Aveiro, eleito em 1897, colabora na imprensa
local e noutras publicações ligadas ao Partido Regenerador, apoiando,
com Luís de Magalhães e Alberto Sampaio, as reformas franquistas da lei
eleitoral, identificadas com os princípios do krausismo e da
«representação orgânica» de Oliveira Martins, que ele próprio defendia
desde há doze anos (Lima: 1888; 1890). Mas todas estas reformas foram
caindo depois de 1896 e, no ano imediato, poucos meses depois da
conquista do poder pelos progressistas de José Luciano de Castro,
completava-se o desmantelamento de toda a estrutura eleitoral
franquista. Luciano de Castro, que viria a marcar toda a vida política
portuguesa nos vinte anos que antecederam a República, nasceu em
Oliveirinha, concelho
/ 32 /
de Aveiro. Aos 17 anos, com Manuel Firmino de Almeida Maia, fundou “O
Campeão do Vouga”, o primeiro jornal aveirense, que começou a
publicar-se em 14 de Fevereiro de 1852 e que, em 12 de Novembro de 1859,
passou a intitular-se “Campeão das Províncias”. Foi
seu primeiro redactor principal José Maria de Almeida Teixeira de
Queirós, pai de Eça de Queirós(29).
Voltando a Jaime de Magalhães Lima, encontramo-lo, em
1901, ao lado de João Franco, na cisão do Partido Regenerador, passando
a dirigir a estrutura aveirense do novo Partido Regenerador-Liberal.
Contudo, por esta época, a organização local dos partidos continuava a
ser quase inexistente, circunscrita a uma ou outra figura de projecção
regional, o que lhe permitiu ler e escrever intensamente, apostando na
divulgação de Ruskin, Channing, Wordsworth, Michelet ou S. Francisco de
Assis, e multiplicando os artigos sobre o que foi uma das suas grandes
paixões, a silvicultura teórica e experimental dos eucaliptos.
Com a queda do Franquismo, em 1908, afasta-se
definitivamente da política e instala-se na Quinta do Vale do Suão,
/ 33 /
em Eixo, nos arredores de Aveiro, rebaptizada de Quinta de S. Francisco.
Nesta opção pelo contacto permanente com a natureza, levada ao extremo
de não permitir cortinados nas janelas do seu gabinete de trabalho, para
poder ver as árvores e as aves, seguia duas das suas referências
intelectuais mais queridas: Alexandre Herculano, afastado de Lisboa e
recolhido em Vale de Lobos, e John Ruskin retirado na pequena quinta de
Brantwood, perto de Coniston Lake.
Afastado da ribalta tumultuosa da vida política e
usufruindo avidamente a mãe Natureza, iniciava aqui o último período da
sua vida, sempre atento ao mundo exterior, ao qual descia vezes sem
conta por exigência dos que queriam ouvir a sua voz
respeitada.(30)
O refúgio de Eixo produz de imediato o seu primeiro S.
Francisco de Assis(31),
leitura heterodoxa do catolicismo oficial que
mereceria alguns reparos de D. João Evangelista de Lima Vidal(32),
seu primo e bispo de Aveiro. O livro é acusado de interpretar a vida do
Poverello à luz do protestantismo do hagiógrafo
Paul Sabatier(33)
o que levará Jaime
/ 34 /
Lima a escrever um outro, publicado já depois da sua morte, em 1956.
Seguem-se duas traduções de Tolstoi(34)
e um estudo sobre Alexandre Herculano (Lima, 1910a), acompanhados por
uma pertinaz colaboração na imprensa, por onde perpassam os problemas de
Portugal, da Europa e do Mundo. Devorador de livros e jornais, aprendeu
o inglês como autodidacta, o que lhe permitiu o contacto com o mundo
anglo-saxónico, recorrendo a um vasto leque de
periódicos britânicos, fossem eles londrinos ou da imprensa regional(35),
mas também a um variado número de obras publicados em Inglaterra, que
encomendava e recebia no eremitério de Eixo.
Acompanhando com especial atenção a vida política da
Alemanha, e atento ao crescendo do nacionalismo prussiano, quase
adivinhou o eclodir da 1.ª Guerra Mundial. Crítico aceso
/ 35 /
do imperialismo alemão, acabará por rejeitar liminarmente o cesarismo
bismarckiano e a política de alianças com a social democracia marxista,
responsabilizados pela instabilidade política do velho continente:
«Levou tempo a fazer e deu muito trabalho essa nova
Alemanha. Para isso foi necessário arrasar, como alegremente se arrasou,
até aos alicerces, aquela outra Alemanha gloriosa, dos tempos em que
militarmente era vencida, a Alemanha de Kant, de Lessing, de Goethe e de
Beethoven, do tempo em que, toda impregnada de idealismo, de sabedoria,
arte, ingenuidade, simplicidade e anseios de liberdade, tinha menos
ciência de laboratório e mais ciência do coração, e não sabia mentir,
intrigar, corromper e oprimir.» (Lima, 1915a: 11)
Nos seus escritos sobre a guerra sobressai a admiração pela Grã-Bretanha
e pelo seu papel civilizador, apresentados em contraponto da barbárie
germânica e como paradigma das sociedades democráticas:
«Se vemos um estupendo império, como o da Grã-Bretanha,
englobando sob a mesma bandeira, irmãmente querida e amada, as raças
mais diversas e as mais diversas aspirações, é porque para esse milagre
político, sem precedente na história, se criou um povo em cujo génio,
por uma arte que é maravilha de espontânea perfeição, se conciliam
praticamente as maiores e desusadas liberdades com a coincidência em uma
unidade, para a qual provavelmente só se encontrará justificação na
comunidade de amor à própria liberdade e no propósito íntimo de a manter
e defender.» (Lima, 1915a: 20)
/ 36 /
Denunciada a guerra e equacionados os problemas da Europa, Jaime Lima
entrega-se de novo às grandes questões nacionais, procurando intervir na
sociedade portuguesa com vista à sua transformação, à redescoberta dos
seus valores e tradições... da sua alma. Perdidos os velhos amigos da
Geração de 70, encontrará novas cumplicidades, sem no entanto chegar à
íntima comunhão experimentada com Antero ou Oliveira Martins. Portugal
estava mudado, o que era por demais visível no crescimento de Lisboa e
de outros centros urbanos, na transformação da paisagem, com a
proliferação das chaminés de fumo a romperem aqui e ali, bem como no
aumento de uma classe média de funcionários e profissões liberais. Os
tempos eram outros e os homens também. Os intelectuais portugueses do
primeiro terço do século XX procuravam, em desespero de causa pela
pequenez do meio, o arrimo das capelinhas, mais interessados em dar
visibilidade a cada um dos «grupinhos literários», como lhes chamava
Jaime Cortesão, que em produzir obra de fundo. As revistas literárias,
que se multiplicavam em Lisboa e no Porto, duravam o tempo da sua
agressividade e das polémicas que sustentavam o mercado.
As ideias que germinavam em França, nas vésperas do
primeiro conflito mundial, ameaçavam invadir Portugal, cujas elites
intelectuais eram, desde há muito, francófilas. E fizeram-no, com
António Sardinha e outros corifeus do Integralismo Lusitano. Aquilino
Ribeiro, desde Paris, bem podia clamar, nas
/ 37 /
páginas d'”A Capital”, contra o perigo da importação do bergsonismo e do
ideário da Action Française, e para a necessidade de descobrirmos
um caminho português para a democracia portuguesa. O tradicionalismo
acabará por constituir um elo de ligação entre pensamentos e movimentos
diferenciados que, a partir de determinada altura, apostam no
rejuvenescimento da alma nacional e na afirmação da individualidade
portuguesa. Aqui se encontrarão os últimos românticos, os integralistas,
os saudosistas, lusitanistas e criacionistas da Renascença Portuguesa,
os modernistas da revista Orpheu, os seareiros, os sebastianistas e
tantas outras seitas da cultura lusa dos inícios do século, «ismos» que,
alimentados por dissidências e trânsfugas, cresciam de
costas voltadas para o pensamento político dominante e para a
Universidade(36).
/
38 /
Jaime de Magalhães Lima, espírito sempre aberto e tolerante, não recusou
a entrada nesta procela babilónica, preso que estava à vocação e missão
proféticas de defesa dos valores, tradições, língua e arte portuguesas,
cujos objectivos se prendiam, mais além, com a felicidade e a harmonia
para a Pátria portuguesa:
«Pudessem os deuses ouvir as minhas obstinadas e roucas
orações e pelos seus eleitos mandassem aos homens, senão a felicidade e
a paz que não são muito de esperar entre os clamores da psicologia e da
história, ao menos uma transitória remissão das inquietações, uma pausa
no sofrimento pela qual debalde vamos suspirando entre o copioso saber,
forças inauditas e vastíssimas riquezas que a nossa era ostenta e a
nossa jactância apregoa!... Tivesse eu a felicidade de pressentir, de
longe que fosse, as bênçãos de um novo reino!... Isso em consciência me
absolveria da impertinência dos zumbidos com que procuro atormentar os
ouvidos estranhos.» (Lima, 1986: 16)
Concorre com os seus escritos, nalguns casos
esporadicamente, para revistas de diferentes
tendências, sejam elas a “Atlântida”(37),
“A Águia”, “Lusitânia”(38)
, “A Ilustração Moderna”, “Portucale”,
/ 39 /
“Ilustração” ou a “Seara Nova”. Em 1918 é um dos
cofundadores da LAN – Liga de Acção Nacional
(39), colaborando
no respectivo órgão, a revista “Pela Grei” cujo subtítulo, “Revista para
o Ressurgimento Nacional pela Formação e Intervenção de
uma Opinião Pública Consciente”, exprimia claramente os objectivos
da associação(40).
Em 1923 integra o grupo de 40 fundadores da Revista
dos Homens Livres(41),
dinamizado pelos seareiros António Sérgio, Raul Proença e
Jaime Cortesão, movidos pelo propósito de trazerem à sua causa(42)
intelectuais que não se revissem no projecto da Seara Nova. António
Sardinha, que havia atacado a experiência de 1918, alcunhando-a de
/ 40 /
«anglo-saxonismo de importação», numa alusão às ideias de Reis Santos,
adere agora a este grupo, com Pequito Rebelo, seu correligionário do
Integralismo que o havia seguido na evolução anti-monárquica. A
heterogeneidade do grupo estender-se-á igualmente a anarquistas,
ex-franquistas, monárquicos conservadores e sebastianistas (Ramos, 1994:
548 e 552), mostrando quão forte era o mal-estar da intelectualidade
portuguesa perante as realidades sociais e políticas do país. Jaime Lima
desde há muito defendia esta unidade de acção, escrevendo. em 1905:
«Que um punhado de crentes devotados guarde a tradição do
povo e sua glória, – seu amor do trabalho, sua honradez, bondade
resignada e paciência, desprendimento, austeridade, – e Portugal
ressurgirá do aviltamento, como renascem a Irlanda, a Hungria, a Polónia
e tantos outros povos oprimidos, ou pelos próprios erros e loucuras ou
pela ambição cruel dos poderosos.
Nunca uma só batalha se perdeu, quando foi combatida por
justiça e nobreza.» (Lima. 1905: 172-173)
Quase panteísta, atrever-nos-íamos a dizer «panteísta-cristão», no
êxtase que experimenta na adoração da natureza, calcorreia montes e
vales, preferindo sentir a aspereza dos caminhos a percorrê-los sobre
quatro rodas, ele que possui um dos primeiros automóveis de Aveiro:
/ 41 /
«Já não há caminhos, há transportes, qualquer coisa que
se move na estrada mas parece desconhecê-la. Pelo menos, não deixa que
os sentidos a conheçam. Viajar, nesta sujeição, não é calcar a terra, é
repudiá-la.» (Lima, 1986: 17-18)
Estes gritos de amor à terra, plasma em que
mergulha todo o seu pensamento e vida interior, são brados de
cabouqueiro ecológico(43),
de quem acredita
«na terra, no seu poder de transposição paradisíaca, na
felicidade e bem-aventurança que ela concede a quem a ama e serve,
fielmente, em louvor e culto e humildade.» (Lima, 1906: VII)
A religião é, em Jaime de Magalhães Lima, o culminar de
todo o seu viver, a síntese que encerra, superiormente, o Criador e a
Criatura, englobando, nesta, toda a humanidade, todos os seres vivos,
todas as areias, fragas, campos e serras. De fora parece quedar-se a
cidade moderna, antro de vaidades e riquezas, artefacto industrial
gerador de misérias morais e sociais, lugar onde «todos nos
desconhecemos, evitamos e isolamos, quando não nos atropelamos» (Lima,
1933a: 56).
Sem se afastar de Deus, antes procurando-o, a religião
limiana aproxima-se assim do pampsiquismo anteriano, tão
/ 42 /
bem descrito pelo poeta filósofo ao seu assumido
discípulo(44), e
não se alimenta de
«certos bolores das sacristias, superstições carunchosas
e hipocrisias parasitárias, I...nem da] boçalidade de sacerdotes muito
mais dedicados à sordidez e à impostura do que a Cristo.» (Lima, 1933:
6)
Esta religião, cantada em tantos livros de Jaime Lima,
mas sobretudo nas Rogações de Eremita (1910b) ou nos Salmos do
Prisioneiro (1915b), bem mais belos que os de David, é uma religião
de amor,
«que por amor dá o exemplo e do exemplo vai à compaixão,
e ao perdão e à redenção dos ignorantes e transviados. (Lima, 1957: 63)
[...]
A religião é só isto; ténue e invisível fio prendendo-nos à vida
espiritual imperecível. Que importa encontrá-la no amor da árvore, da
flor, do velho, da criança, do mísero, do mar ou da montanha? Viver é
senti-lo.» (Lima, 1902: 202-203)
Tudo o resto gira em torno deste sentir religioso, e todo
o seu pensamento, incida ele sobre a democracia, o liberalismo ou a
ideia de nação, inscreve-se nesta matriz idealista, de abnegação
/ 43 /
e de renúncia no Outro. Como dizia numa carta a António Sérgio.
«Entre o Santo e o filósofo, e, por maioria de razão,
entre o Santo e o regedor, ainda que o regedor se chame Péric1es ou
Napoleão, ficarei com o Santo. Porque o Santo é o mais fiel intérprete
de Deus, e a ordem do Mundo, como a ordem da alma, só
em Deus encontrará filiação assaz consistente para a manter.»(45)
_______________________________
*
Actualizámos a grafia de todas as citações.
(1)
– QUENTAL, Antero de – Carta a Jaime de Magalhães Lima, de Vila do
Conde, datada de 14 de Novembro de 1886 (Sampaio, 1993: XXIII).
(2)
– O Movimento das Artes e Ofícios – Arts and Crafts Movement –,
fundado em 1888 na Inglaterra, defendia a produção manual, valorizando a
prática artesanal da Idade Média e rejeitando a produção em série da
época industrial. William Morris (1834-1896) e John Ruskin (1819-1900)
foram dois dos seus principais mentores. Ruskin, «um violento tory da
velha escola», como ele próprio se definia na primeira página de
Praeterita, a sua autobiografia, ou o «inovador retrógrado» na boca
dos seus adversários, nem por isso deixou de inspirar os fundadores do
Partido Trabalhista inglês (1906), com a mensagem política de duas das
suas obras, Unto this Last e Sesame and Lilies, ou de
contribuir para a formação do líder nacional indiano Mohandas Karamchand
Gandhi. As características do reformismo social inglês, em que se
integravam homens como Morris ou Ruskin, vestia capa evangélica e
pretendia reconciliar-se com a lição social do cristianismo primitivo,
aproximando-se, por isso, do franciscanismo. Ver Compagnon (1987).
(3)
– A proposta de Mendes Leite, para terminar com a pena de morte em
Portugal, por crimes políticos, exprimiu-se na redacção do Artigo 16 do
Acta Adicional de 1852 que, muito sinteticamente, estabelecia: «É
abolida a pena de morte nos crimes políticos, os quais serão declarados
por uma Lei. § único – fica deste modo ampliado o § 18.º do Art. 145 da
Carta Constitucional.»
(4)
– Bastará lembrar os acontecimentos de 1828 e o papel
desempenhado por homens como o conselheiro Joaquim José Queirós (avô de
Eça de Queirós), José Estêvão Coelho de Magalhães, Manuel José Mendes
Leite e José Luciano de Castro.
(5)
– Esta arrumação dos moderados e da esquerda liberal terá sido mais
institucional que real, já que encontramos, entre os primeiros,
Setembristas como José Estêvão, com o coração nos Históricos e a
estratégia nos Regeneradores como, por mais de uma vez, é afirmado pelo
grande tribuno nas suas intervenções parlamentares (Cr. – Discurso sobre
o contrato do tabaco, in ESTÊVÃO, José – Discursos Parlamentares.
Aveiro: Câmara Municipal, 1983. p. 171-172 e passim).
(6)
– LOBO, António de Sousa Silva Costa – O Estado e a Liberdade de
Associação: Dissertação inaugural para o acto de conclusões magnas.
Coimbra: Imprensa da Universidade, 1864.
(7)
– Joaquim Maria Rodrigues de Brito (1822-1873). Em 1869 publicava a
Filosofia do Direito, obra que parece ter sido traduzida em alemão, e a
Resposta às breves reflexões do ex.mo sr. dr. Vicente Ferrer sobre a «Filosofia
do Direito», no âmbito de uma polémica com bastante impacto na
época. Ver Catroga (1981: 356).
(8)
– Manuel Emídio Garcia (1838-1904), defensor de um organicismo biossociológico, regeu a cadeira de Direito Administrativo entre 1871 e
1881, abarcando, por isso, a passagem de Jaime de Magalhães Lima por
Coimbra.
(9)
– Luís Coelho de Magalhães, o "Buono Luigi, para Antero, era filho de
José Estêvão. Foi governador civil de Aveiro em 1892, a pedido de
Oliveira Martins, e ministro dos Estrangeiros no governo de João Franco.
Monárquico convicto, envolvido em 1919 na Monarquia do Norte, nem por
isso deixou de dar protecção e guarida a muitos dos republicanos
perseguidos na sequência dos acontecimentos de 1891. Ver Magalhães
(1959: 171) e Rosa (1942).
(10)
– Oliveira Martins viveu no Porto de 1874 a 1888, numa época
em que foi funcionário e depois administrador da Companhia de
Caminho-de-Ferro do Porto à Póvoa do Varzim.
(11)
– Palácio e quinta do conde de Resende, no Campo de Santo Ovídio, depois
chamado Campo da Regeneração. Ver Sampaio (1993: 515, nota do editor).
(12)
– Ver CERQUEIRA. Eduardo – José Estêvão apreciado por seu filho: Dois
discursos do Dr. Luís de Magalhães. “Arquivo do Distrito de Aveiro”.
Aveiro, voI. 28, n.º 112 (1962), p. 259.
(13)
– Ver QUENTAL, Antero de – Cartas a Jaime de Magalhães Lima (ln
Sampaio, 1993: XXI-XXIX). Ver também Ramos (1976a).
Jaime Lima dedicou a Antero o seu livro As Doutrinas
de Conde Leão Tolstoi, publicado no Porto em 1892 pela Livraria
Internacional de Ernesto Chardron, com as seguintes palavras de
homenagem: «À memória do meu querido Mestre Antero de Quental».
(14)
– Carta de Antero de Quental para Jaime de Magalhães Lima, datada de 13
de Outubro de 1886. (In Ramos, 1976a: 7).
(15)
– Esta carta, datada de 15 de Março de 1889, encontra-se no Museu de Tolstoi, em Moscovo. Está publicada in Ramos (1976b: 173-174).
(16)
– Por exemplo William Ellery Channing (1780-1842). reformador social e
dirigente da Igreja Unitária norte-americana, cuja obra Magalhães Lima
descobriu em 1900 ou início de 1901 através duma tradução francesa. Ver
Lima (1902: 269); ver também: LIMA, Jaime de Magalhães – Leituras de
Channing: Como a solidão se afugenta. Vitalidade. Aveiro (13 Jan.
1901) 1.
(17)
– Jaime de Magalhães Lima pretende ir além de uma mera tradução, já que,
para ele, «não há traduções possíveis; as línguas são intraduzíveis,
todas; as do cafre como as do grego. Será tão fácil a transposição de
língua para língua como a tradução de Beethoven em Chopin, ou de Wagner
em Verdi. Haverá, quanto muito, interpretações; e, se são bem feitas,
não será coisa pouca a inspiração de quem as fez.» (Lima, 1923b: 52).
(18)
– Devemos o conhecimento da obra de Jaime Lima, na sua quase totalidade,
ao trabalho de AZEVEDO, B. d' Almeida – Esboço bibliográfico de Jaime
de Magalhães Lima, Costa do VaIado [Aveiro], 1986, 149 p. Obra
inédita, dactilografada.
(19)
–
O primeiro número deste jornal foi publicado em 25 de Maio de 1885.
(20)
– Partido resultante do Pacto da Granja e da fusão dos
partidos Histórico e Reformista: ver supra, nota 5.
(21)
– Estes artigos serão depois reunidos no livro Cidades e Paisagens,
Porto: Tip. de A. J. da Silva Teixeira, 1889.
(22)
– Sobre as relações de Jaime Lima com Tolstoi e a «recepção de temas
tolstoianos na obra do escritor aveirense» veja-se Abreu (1988).
(23)
– Jaime Lima dá a conhecer Antero de Quental ao grande
escritor russo e envia-lhe, conforme diz na carta que lhe remete em 15
de Março de 1889, a tradução alemã dos Sonetos. (Ramos, 1976b: 173)
O título da tradução alemã era o seguinte: Anthero de
Quental – A us gewêihlte Sonette.
Verdeutscht von Wilhelm Storck. Paderbom und Münster: Verlag von
Ferdinand Schõningh,
1887.,A
informação consta de uma carta de Antero para Jaime de Magalhães Lima,
datada de Vila do Conde, de 2 de Fevereiro de 1889 (Ramos, 1976a: 20).
(24)
– Carta de Antero para Jaime Lima, datada de Vila do Conde, 2
de Fevereiro de 1889 (Ramos, 1976a: 20; separata: p. 22).
(25)
– Vd. Ramos (1976b: 162 e 172-173). Nestas duas últimas páginas, e nas
que se seguem, Aníbal Ramos enuncia os diferentes artigos de Jaime Lima,
publicados no jornal “A Província”, na “Revista de Portugal” e noutras
publicações, que se referem à obra de Leão Tolstoi.
Esta obra do visconde Melchior de Vogüé (nascido em 1850)
foi publicada em 1882 (Lanson, 1946: 1111).
(26)
– La Guerre et la Paix (1880 e 1885), Anna Karénine
(1885), Ma réligion (1885), Les cossaques (1887),
Souvenirs de Sébastopol (1887), La Puissance des ténébres
(1887), Souvenirs (1887), La Sonate à Kreutzer (1890),
Qu'est-ce que l'art? (1898), Réssurrection (1900) (Lanson,
1946: 1107).
(27)
– Carta de Antero datada de Vila do Conde, 9 de Fevereiro de
1890, (Ramos, 1976a: 23).
(28)
– LIMA, Jaime de Magalhães – Liga Patriótica do Norte: uma
adesão. A Província. Porto (3 Março 1890) 1.
(29)
– NEVES, Francisco Ferreira – O centenário do «Campeão do Vouga»:
Notas de recordação do primeiro jornal aveirense. “Arquivo do
Distrito de Aveiro”, Aveiro, voI. 18, n.º 69 (1952), p. 25-47.
(30)
– Ao longo de todo este período sucedem-se as
conferências e palestras sobre os mais variados assuntos e nos mais
diversos locais.
(31)
– LIMA, Jaime de Magalhães – S. Francisco de Assis: Servo e menor,
Coimbra: França Amado, 1908.
(32)
– Ver: [VIDAL], João Evangelista [de Lima] – Prefácio. In Lima, 1957:
79)
(33)
– Vd. MAGALHÃES, Margarida de – Evocação. In Lima, 1957: 111-113.
Paul Sabatier (1858-1928), teólogo e pastor protestante
francês, é o autor de uma Vida de S. Francisco de Assis, escrita em
resposta a uma missão intelectual quase imposta pelo seu mestre Ernesto
Renan. A obra, publicada em França em 1893 e traduzida em várias
línguas, é considerada uma das melhores biografias do Poverello e
fruto de um trabalho árduo e sério de investigação, com base em
documentos inéditos descobertos nos arquivos italianos. A importância e
o impacto desta obra, bem como o currículo de Sabatier, professor de
História Eclesiástica na Faculdade de Teologia da Universidade de
Estrasburgo, cidadão honorário de Assis, membro da Academia Real de
Roma, presidente honorário da Sociedade Internacional de Estudos
Franciscanos e doutor «honoris causa» pelas Universidades de Oxford,
Aberdeen e Edimburgo, não evitou a sua inclusão no Index.
(34)
– TOLSTOI, Leão – O ensino de Jesus. Tradução de Jaime de
Magalhães Lima, Lisboa: A Editora, 1908. A partir da versão inglesa de
L. e Aylmer Maude; TOLSTOI, Leão – A anexação da Bósnia e da
Herzegovina pela Áustria. Tradução de Jaime de Magalhães Lima,
Lisboa: A Editora. A partir da versão inglesa de Aylmer Maude, Aylmer
Maude foi um biógrafo e tradutor de Leão Tolstoi.
(35)
–
Alguns títulos de periódicos ingleses, respigados de citações na sua
obra: The Christian Commonwealth.
Daily Chronicle, Glasgow Herald, Hibbert Joumal.
Manchester Guardian, Millgate Monthly, Spectator, Times.
(36)
– António Sardinha funda o movimento do Integralismo Lusitano em 1916, a
partir da revista de filosofia política “Nação Portuguesa”, por ele
criada dois anos antes. O ideário integralista evoluiu ao longo da sua
existência, começando por ser arreigadamente monárquico para, a partir
de 1922, início da 2.ª série da “Nação Portuguesa”, substituir a fé no
rei pela fé em Portugal e dar os primeiros passos na ultrapassagem de um
nacionalismo estreito. Ver SARDINHA. António – Ao princípio era o
Verbo, Lisboa, 1923.
O saudosismo de Teixeira de Pascoaes e o criacionismo de
Leonardo Coimbra abrigavam-se no Porto sob o manto da revista Águia,
dirigida pelo primeiro e fundada em 1910 por Álvaro Pinto, passando, em
1912, a órgão da Renascença Portuguesa. O lusitanismo de Jaime Cortesão
estanciava em Lisboa, a coberto da revista Vida Portuguesa por ele
próprio dirigida e fundada em 1912.
O “Orpheu”, revista trimestral de literatura, apareceu em
Lisboa em 1915, sob a direcção de Luís Montalvor. Virá a transformar-se
na voz do modernismo e do futurismo português, apesar dos seus dois
únicos números.
(37)
– “Atlântida”: Mensário Artístico. Literário e Social para Portugal e Brazil. Publicou-se entre 1915 e 1919, num total de 48 números. Para
além de Jaime Lima, colaboraram nesta revista, entre outros. António
Sérgio, Júlio Dantas, Teófilo Braga, Almada Negreiros, Leite de
Vasconcelos, Aquilino Ribeiro e Columbano.
(38)
– “Lusitânia”: Revista de Estudos Portugueses. Publicou-se de Janeiro de
1924 a 1927, pretendendo «ser um órgão da nossa cultura, posto ao
serviço da Reconstrução Nacional». Foi sua directora Carolina Michaëlis
de Vasconcelos, No primeiro fascículo aparecia Câmara Reis como editor e
redactor gerente e, como secretários da redacção, Mons. Lopes Vieira e
Reinaldo dos Santos. Para além dos nomes indicados, e de Jaime de
Magalhães Lima, colaboraram na revista nomes como António Sérgio,
António Sardinha, Jaime Cortesão e José Leite de Vasconcelos.
(39)
– A Liga tinha por presidente o reitor da Universidade de
Lisboa, Pedro José da Cunha, e por secretários-gerais Francisco Reis
Santos e António Sérgio.
(40)
– Afirmava Sérgio, na “Pela Grei” de Janeiro de 1918: «O ideal da
Democracia, em suma, é o governo da nação por elites naturais, criadoras
da opinião pública e executantes da opinião pública; o governo da
persuasão pelo escol da inteligência.» In SÉRGIO, António – Ensaios
I, 3.ª ed. Lisboa, Livraria Sá da Costa, 1980, p. 232.
(41)
– Esta revista teve vida curta, pois apenas saíram dois
números, em Dezembro de 1923.
(42)
– Sérgio explicava-a na nota de abertura do primeiro número: a
procura duma ideia nacional, de uma finalidade portuguesa, anterior e
superior às finalidades partidárias.»
(43)
– Sobre os problemas estéticos e ecológicos em
Jaime de Magalhães Lima, ver Luís Machado de Abreu (1991).
(44)
– Carta de Antero de Quental a Jaime de Magalhães Lima, datada de Vila
do Conde, 14 de Novembro de 1886. Ver: Quental (1993: XXIII) e Ramos
(1976a: 12).
(45)
– LIMA, Jaime de Magalhães – Santos, filósofos e regedores,
Lusitânia, Lisboa, VoI. 2 (1924), p. 122. Carta de Jaime Lima a António
Sérgio.
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