J. M.
(4.º ano)
RODEADO
de livros, cabeça baixa mergulhada num estudo. Sem ardor... sem
alento. Estudo, porque tenho um exercício difícil a preparar. Enfim, tem de ser... As palavras
seguem-nas os olhos, mas o pensamento, esse voa em redor. Tanta canseira
porquê? E porquê estudar?
A música, na feira, animando os que têm a dita de não terem aquele
livro à frente, desespera-me. E, contudo, não o posso deixar. Não
pode ser. Não! Que aconteceria se o exercício corresse mal? Um
preguiçoso! Um inútil! Ou, talvez, um incapaz – diria o professor. E
os meus pais? E eu? Que diria a mim próprio? Ainda que a aprovação
dos meus pais e do professor, fosse, para mim, secundária, a minha
sê-lo-ia? E andar de carro eléctrico, agora! Ou jogar com os
colegas? Sim, porque, certamente, há inconscientes que não estão
agarrados ao
livro. E, então, eu não serei inconsciente se fizer o mesmo? E a
música atrai-me constantemente e vou sendo arrastado lentamente.
Deixo-me vencer. Levanto-me. O pai está a trabalhar, fora de casa. A
mãe? – Vou comprar uma sebenta. Depois? Foi na Avenida e estive com
uns colegas. Saio, mas, quando vou a fechar a porta, vacilo. E
porquê? Tantos fazem o mesmo e eu por que razão não o hei-de fazer?
Contudo, penso. Estou indeciso. A voz do dever chama-me.
Reflectindo torno a entrar em casa. Que vou fazer à feira?
Divertir-me? E o livro abandonado na secretária não importará mais?
O dever que tenho de dar boas provas nos meus estudos não é maior?
Tantos sacrifícios custam a meus pais os meus estudos! Tantas
canseiras e fadigas não suportarão, por vezes, aqueles que tudo
querem que eu seja e que para isso contribuem! E não terei eu de
lhes dar o testemunho da minha gratidão, fazendo a sua alegria,
compensando o seu esforço com o meu? Sim, tenho.
Volto, triunfantemente, cônscio das minhas obrigações. Estudarei
para ser alguém, não um inútil, um pobre inútil que faz dó à
sociedade.
E a feira? Essa, depois de cumprir.
Vitoriosamente, sento-me e estudo. Venci a tentação. Terei,
certamente, a paga dos esforços que faço agora e, qualquer que seja
o resultado, a minha consciência acompanhar-me-á. Ela poderá ficar
tranquila, terei a recompensa de Deus, se a não tiver no Liceu. O
que importa é que quem foi o herói, quem venceu, fui eu! |