Acersso à hierarquia superior
 

Livro do 1.º Centenário do Liceu de Aveiro (1851-1951)

Discursos na Sessão Solene (1)

d) – Discurso do Dr. Alberto Souto:

Começou por se dirigir ao Sr. Governador Civil, tenente-coronel Dias Leite, a quem saudou por o ver no alto cargo que desempenha e como antigo contemporâneo no Liceu de Aveiro, velho aveirense e velho amigo, pedindo-lhe que fosse o intérprete junto do Governo dos sentimentos de gratidão dele e de todos os aveirenses pela realização de duas importantíssimas obras que estão em curso entre nós: as da Barra, fulcro de todo o desenvolvimento económico local e regional, e as do novo Liceu, que vai satisfazer tão perfeitamente as necessidades do ensino moderno como este edifício satisfez as do seu tempo.

Lamentou a ausência do Sr. Arcebispo-bispo de Aveiro, seu antigo professor no seminário de Coimbra, e dirigiu-lhe cumprimentos na pessoa do seu representante; cumprimentou o Sr. Presidente da Câmara e saudou o Reitor Sr. Dr. José Pereira Tavares, velho companheiro, camarada e amigo, cujo renome literário e pedagógico ecoa nos meios culturais do País e que é orgulho de todos nós.

Contudo, diz, há uma falha na sua folha de serviços de promotor desta comemoração centenária e de grande professor, escritor classicista e reitor deste Liceu – foi a ideia que teve de o incluir a ele, orador, como número do programa desta sessão solene, onde bastavam, para lhe dar brilho e altura, a presença e a palavra do sr. Professor Doutor Fernando Magano, autoridade abalizada na medicina e na cirurgia nacionais, vice-reitor da Universidade do Porto, glória da nossa terra.

Os estandartes, entre os quais os académicos de 1901 e 1930.

Alude à pressão que sobre ele exerceram os seus amigos Drs. José Tavares e José Vieira Gamelas para que saísse do seu mutismo e viesse falar a esta festa e diz que não pôde resistir às suas instâncias por se tratar, na verdade, de uma / 68 / solenidade que lhe tocava o coração e que tinha seu lugar nos fastos de Aveiro.

Retirado das actividades públicas, Aveiro continua a ser o grande amor da sua vida e não pôde resistir à tentação e ao dever de compartilhar da alegria do momento e de a servir com as suas modestas faculdades. E quando diz Aveiro, não designa apenas a cidade em que estamos, mas a região e o Distrito a que pertencemos e de que a cidade é capital, porque Aveiro e o anfiteatro geográfico que a cerca e que daqui se vê e se domina, têm uma alma comum na solidariedade indissolúvel da beleza da sua paisagem e na integração dos seus interesses e destinos.

Muito devem a cidade e o Distrito, assim compreendidos, ao Liceu de Aveiro, pelo ensino que dele tem dimanado, pela colaboração no progresso geral que aqui se tem conseguido, pela economia material que sempre resultou da presença de professores, estudantes, famílias e visitantes do serviço de exames no antigo burgo acanhadinho e pobre que era o Aveiro de antes do nosso tempo e do nosso tempo liceal e, sobretudo, pelo prestígio que esta casa sempre deu à comunidade aveirense.

Gostosamente, como quem cumpre um grande dever moral e satisfaz uma sincera devoção, aqui está o antigo aluno a prestar a sua homenagem de filho de Aveiro ao Liceu que tanto honra e tem honrado a sua terra.

Por isso, veio falar com a sua toga, porque entendeu tratar-se de pleitear aqui um verdadeiro processo, não cível, nem criminal, nem contencioso, mas gracioso e de mera declaração – o processo da saudade da nossa juventude de liceistas e da nossa gratidão para com a brilhante, digníssima e benemérita acção de preparação escolar, cultura geral, progresso local e nacional do Liceu de José Estêvão) através da centúria em que se conta a sua existência.

E envergando a sua toga na discussão deste processo de gratidão e saudade, quer ainda lembrar que, se um dia saiu dos Gerais de Coimbra e desceu os degraus da Via Latina e saiu a Porta-Férrea com o direito de ser advogado no Pretório) é porque a sua toga foi feita da capa com que subiu os degraus de granito deste Liceu em muito saudosos e proveitosos anos de seu estudante.

Viemos aqui, de manhã, em cortejo. Viemos em cortejo, acompanhados pelas músicas e representações locais, numa impressionante e consoladora romagem de saudade e gratidão pela casa e estabelecimento a quem tanto devemos da nossa / 69 / preparação para a vida e dos benefícios gerais para o meio local e para o progresso da Nação.

Foi o cortejo dos vivos que terminou com as nossas palavras e os nossos vivas no ádito do Liceu e dos Paços do Concelho, onde o Reitor e o Presidente do Município nos acolheram e saudaram.

Mas vem aí outro cortejo. Reparem, que ele está a chegar! Abram alas na imaginação e no evocativo respeito e deixem passar os vultos que o formam e a multidão que os acompanha. E' o cortejo do passado!

São os reitores, os professores e os alunos que já não existem e são os aveirenses que os viram e com eles conviveram nas grandes horas da instituição e nas alegrias e nos transes da vida aveirense e da vida de Portugal no século decorrido.

Vêm as bandas tocando, aclamam-se os heróis da Pátria, festejam-se e comemoram-se as grandes datas da Nacionalidade, e o corpo docente e a Academia ainda vibram do entusiasmo das manifestações.

O povo da cidade faz coro e companhia e compartilha do espírito cívico e patriótico que sempre animou a alma do Liceu de Aveiro.

Homens notáveis que chegam, Presidentes da República, Príncipes e Reis, Heróis da Grande Guerra e Expedicionários de África, D. Manuel e Mouzinho de Albuquerque, Capelo e Ivens, tunas espanholas, visitas das Academias portuguesas, funeral de José Estêvão, inauguração do seu retrato, acontecimentos, centenários, catástrofes, comemorações, solidariedade, civismo, patriotismo, aveirismo, portugalismo, tudo isso no intervalo das aulas e dos exames, dos estudos e trabalhos escolares, das ânsias e das cólicas, do estudo e do ímprobo labor do ensino, enche a história deste Liceu e figura no cortejo dos nossos mortos!

Curva-se a nossa alma perante o centenário. Recebemos do Passado, digno e glorioso, o facho do trabalho, do estudo e do dever, dever de homens, de cidadãos e de portugueses, que nos cumpre agora transmitir às novas gerações.

Que entre na apoteose a mocidade! É a sua altura, o seu lugar, a sua hora.

Aí tendes o facho. É sombrio o horizonte. Avolumam-se os perigos e as dificuldades de ordem mundial. Talvez seja a hora do sacrifício. Mas empunhai e defendei com alma e honra o facho da vida que depomos em vossas mãos – é o facho do Porvir!

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(1) Secretariaram a mesa o Reitor, o representante do Arcebispo-Bispo (P.e Manuel Fidalgo), o representante do Comando Militar (Major Barroso), o presidente da Câmara (Dr. Álvaro Sampaio), o Vigário-Geral da Diocese (Mons. Raul Mira), e Francisco Augusto da Silva Rocha.

Antes da inauguração dos retratos de sete reitores (1.º a 6.º, e 10.º), falou o reitor J. Tavares sobre o significado do acto, teve palavras de apreço e louvor para a acção do reitor Dr. Euclides de Araújo, e em seguida apresentou os oradores.

Os retratos do 1.º, 5.º, 5.º, 6.º e 10.º foram descerrados, respectivamente, pelas seguintes pessoas de sua família: trineta (Maria Virgínia Eça Soares), neto (Manuel Prat), sobrinho (Dinis Gomes), neta (D. Maria da Conceição Regala) e filha (Maria da Graça Araújo).
 

 

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