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A Sever do Vouga (1)

O caminho de ferro do Vale do Vouga e a estrada que, partindo de Aveiro, liga com a fronteira espanhola em Vilar Formoso e passa por Viseu, atravessam o concelho de Sever, que, a par dos concelhos de Paiva, Arouca, Cambra e Águeda, ocupa a principal zona montanhosa do distrito. O concelho é servido pelas estações do poço de S. Tiago, Paradela e Cedrim, na linha férrea do Vale do Vouga, sendo Paradela a mais próxima da vila.

No Poço de S. Tiago, porto fluvial com grande saída de lenhas, madeiras e carqueja, um elegante e arrojado viaduto de pedra, obra da engenharia francesa (pág. 585), transfere a via férrea para a margem esquerda do rio que ali corre entre ribanças apertadas e sai da alcantilada mas pitoresca e verdejante região dos gneisses e granitos. Sobre o viaduto passa a mencionada estrada nacional que atravessa o rio, dois quilómetros mais acima, na Ponte do / 621 / Pessegueiro, onde se estabelece comunicação com a estação de Paradela e serra das Talhadas, à direita, e com a vila de Sever e serra do Arestal à esquerda.

Na Agrela, um pouco aquém da Ponte do Pessegueiro, a barragem e central eléctrica da fábrica de moagem, que se vê junto da estação. Instalação hidroeléctrica excelente, sendo majestoso o aspecto da cascata, principalmente de noite sob a luz colorida que incide sobre a cachoeira.

Da estação o panorama é grandioso, rivalizando com os mais belos trechos minhotos. Pessegueiro é como um grande presépio colocado em socalcos, na vasta aba da montanha que termina nos cimos do Arestal, a 820 metros de altitude.

Da estação pode subir-se à povoação de Talhada, na serra do mesmo nome, que tem picos, vistas e penedias do mais curioso do país (ver Beira Alta), São admiráveis os grandes blocos graníticos, designados por Irmãos Gémeos, ou Pedras Talhadas,  Penedo do Trigo, Penedo da Fazenda, Penedo dos Cucos e Gralheiro. Junto da povoação de Talhadas, na vertente oriental, ficam as Minas das Talhadas ou do Vale do Vouga, de cobre e galena, que comunicam com Águeda por uma estrada privativa.

Em Cedrim, um morro granítico, sobranceiro à encosta que dá para o Vouga, é o Castelo, um castro pré-histórico. / 622 /

Da ponte do Pessegueiro sobe-se (5 km) a Sever do Vouga, vila sede do concelho, aglomerado modesto (367 habitantes) mas delicioso de tranquilidade, ares puros, vistas soberbas, ninho branco no meio de uma verdura paradisíaca em que se misturam milheirais, matos e ervaçais, videiras de enforcado, carvalhos vetustos e pinhais sussurrantes entremeados de casas brancas e cabeços assomadiços.

– Pensões: José António Bastos, Tancredo Lobo; Iluminação Eléctrica de produção local muito deficiente; Água da serra. Mercado aos domingos; Posto Telefónico; Há automóveis de aluguer; Feriado municipal a 25 de Março; Descanso semanal 2.ª feira; Cafés: De Elísio de Figueiredo e Tancredo Lobo; Casa de espectáculos. Salão Recreativo Severense; Indústrias de papel, serrações, extracções mineiras, lacticínios.

No Arestal realiza-se uma feira de gado a 25 de cada mês e celebra-se em 25 de Julho a festa de São Tiago, com romaria, concurso bovino da raça arouquesa, etc. Nos Padrões, feira de gado bovino no 2.º domingo de cada mês.

Sever e o seu cenóbio encontram-se citados em documentos do século XI, no Portug. Monum. Histor., diplomata et chartae.

Dotada de condições excepcionais para estância de repouso, Sever do Vouga, a uns 300 metros de altitude e ao abrigo dos ventos mareiros, é procurada já por muitas famílias da planura para o seu veraneio. Belo cruzeiro de gosto barroco. Pelourinho transformado em chafariz. Uma estrada, à esquerda, conduz a Silva Escura, vale surpreendente, onde o Rio Mau, descido da serra do Arestal, se despenha numa cascata lindíssima, a * Cabreia. Abaixo da Cabreia, o Rio Mau (que nasce na serra do Arestal, a 800 metros de altitude, com o nome de Rio Bom) encontra as Minas do Braçal, já exploradas pelos romanos, de grande nomeada pela importância da sua extracção de galena e prata e pelos protestos e tumultos populares contra a sua exploração nos meados do século XIX.

O couto mineiro denominado Braçal, dos mais importantes da Península no século XIX, abrange a Mina da Malhada, 800 metros a montante dos estabelecimentos centrais do Braçal, a mina do Braçal propriamente, com as suas fundições, fornos, casas de direcção, etc., e a mina do Coval da Mó numa ravina da serra voltada a poente. Alguns dos poços de extracção atingem 400 metros de profundidade, sendo numerosos os poços de ventilação. As galerias, dispostas em vários andares, somam algumas dezenas de quilómetros. Tendo cessado a laboração depois da Primeira Grande Guerra, foi desmontada e vendida, em 1937, a sua aparelhagem antiquada. Em 1943, sob a administração de uma empresa nacional, retomaram a actividade pelo aproveitamento dos aterros plumbíferos e por trabalhos de limpeza e esgoto das galerias inundadas. As minas estão ligadas por caminhos vários à estrada, de Silva Escura a Ribeira de Fráguas (pág. 596) e Vale Maior, e de Sever ao lugar de Senhorinha. / 623 /

No Monte Redondo, a Oeste de Braçal, uma pirâmide de 7 metros de alto (bem como outra mais abaixo, no sítio da Boavista) é obra construída pelo eng.º Maudet em honra da família dos redescobridores e proprietários das minas. Essa pirâmide distingue-se perfeitamente da beira-mar nos dias claros, servindo de referência para localização do couto mineiro e povoados vizinhos quando das proximidades de Aveiro se olha para a vasta muralha montanhosa da Beira-Vouga em que assenta o concelho de Sever.

De Sever sobe-se (12 km) ao planalto do Arestal por uma boa estrada que passa em Vila Fria, povoação serrana muito pitoresca, e Rocas, em cuja igreja se admira uma magnífica cruz processional de prata, do século XVII, e donde se pode tomar o caminho do vetusto Couto de Esteves. Soberbo golpe de vista no sítio da Recovada, entre Vila Seca e Nespereira. À esquerda ficam o Castelo da Pena e o Castro de Rocas, redutos castrejos pré-romanos. Todo o percurso até ao cimo da serra é cheio de beleza, e do planalto avista-se a um lado a Beira, até Espanha, com o Vale do Vouga, Viseu, serras do Caramulo e da Estrela, e do outro a extensíssima e povoadíssima marinha, com a Ria de Aveiro e o mar, de Espinho até à costa de Lavos. De certos pontos, e em dias claros, divisam-se as manchas do casario do Porto, de Viseu, de Coimbra e de Aveiro. / 624 /

No limite dos concelhos de Vale de Cambra e Sever, a nascente, o dólmen da Cerqueira, única anta que resta das muitas que existiram na região.

Na vertente ocidental da serra, a caminho do Espinheiro, outro notável monumento pré-histórico: a pedra insculturada dos Fornos dos Moiros, com enigmáticas gravuras rupestres. Numerosas mamoas dispersas no planalto e nas chãs das encostas atestam o povoamento e o rito fúnebre dos tempos dolménicos (neolítico-bronze). A uns 5 km Noroeste do sitio de S. Tiago de Arestal o santuário da Senhora da Saúde do Giestoso, com grande romaria em 15 de Agosto, uma da mais altas (763 metros de altitude), concorridas e pitorescas romarias do distrito (pág. 611). Na vertente oriental, próximo da estrada que conduz ao cimo da serra, um majestoso abismo rochoso – o Poço do Inferno, formado por um salto do rio Gresso e próximo do Couto de Esteves e Lourizela, no leito da ribeira de Arões, a cascata de Mizarela de Agualva. Nas ribeiras é frequente a truta e são curiosíssimas as marmitas de gigantes. Notável folclore musical, expresso nos corais a três vozes. Famosos os lacticínios e as laranjas de Sever e Pessegueiro.

(Para a continuação da descrição da região vouguense, ver Beira-Alta – Vale de Lafões).

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(1) – Por ALBERTO SOUTO.

 

 

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