Saindo
do Jardim Público para a Avenida de Artur Ravara, encontra-se a rua
de Miguel Bombarda e a rua da Princesa Santa Joana, que
conduzem ao Convento de Jesus e ao Museu Regional, à
esquerda da segunda dessas ruas. O edifício (monumento nacional;
PI. n.º 21) do Convento de Jesus, principiado a construir no séc. XV,
foi um recolhimento dominicano de freiras. Contra os desejos do pai e do
irmão, herdeiro presuntivo da coroa, a princesa-lnfanta Joana, filha do
rei D. Afonso V, nele ingressou (sem, todavia, ter professado) em 1472 e
ali morreu em 1490, tendo sido beatificada em 1693. Foi no convento de
Jesus que a princesa criou o filho de D. João II e a D. Ana de
Mendonça, D. Jorge, futuro duque de Coimbra e fundador da casa ducal de
Aveiro.
Foi fundado em 1458, como recolhimento particular, por D.
Brites Leitão, senhora de Ouca. A clausura reconhecidamente regular
(breve
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de Pio lI, de 1461), começou em 1463. Ao lançamento da primeira pedra da
igreja (em 15 de Janeiro de 1462) assistiu D. Afonso V. O convento
ganhou fama e riqueza a partir do ingresso da princesa-infanta Joana.
Esta, além de abundantes e óptimos benefícios que lhe prestou em vida,
legou-lhe os seus bens. No séc. XVIII lograva a renda de 11 000
cruzados; então nele se recolhiam 70 professoras e 100 educandas e
criadas. Foi nos séculos XVII e XVIII uma excelente escola de bordadeiras
(a par da do Convento das Chagas de Lamego), como provam muitas das
sumptuosas peças litúrgicas, guardadas no Museu. Acrescentos e
ampliações no decorrer dos tempos muito aumentaram o modesto edifício
inicial, quase tudo feito, porém, ao acaso, sem plano, com maus
materiais, destruindo elementos primitivos, dos quais só restam o corpo
e o coro da igreja (embora bastante modificados) e a sala capitular, no
claustro. No séc. XVIII, o aspecto exterior do convento era desagradável
e feio, devido à sua irregularidade. A construção da fachada actual não
só eliminou o mal como lhe imprimiu certo cunho de grandeza e unidade.
Em baixo, tem três bons portais com frontões quebrados (o do meio com o
brasão régio); no 1º andar, oito grandes janelas, também ornadas com
frontões. A galilé, à esquerda, mostra ser obra do século XVII, de tipo
barroco; formam-na três colunas compósitas, em altos pedestais;
pirâmides em remate, sobre o entablamento. De 1834 a 74 não teve obras
de conservação, pelo que multo se danificou; de 1874 a 1910 nele
funcionou o colégio de Santa Joana Princesa, de meninas, dirigido pelas
Irmãs Terceiras de S. Domingos, que realizaram obras muito defeituosas.
Em 1911 instalou-se aí o Museu. Em 1925 começaram as obras de
conservação e adaptação que continuam.
O interior da igreja é de bela sumptuosidade, pelo
conjunto dos seus admiráveis elementos decorativos. Nave com tecto
encurvado e apainelado, com pinturas, do séc. XVII; rodapés de azulejos;
no alto das paredes seis pinturas (só é apreciável a de S. João
Baptista), cingidas por talhas barrocas, que também guarnecem os
retábulos e o órgão. Púlpito com ornatos metálicos (boa obra de
torno). Um gracioso portal manuelino, de pedra de Ançã, de ombreiras
constituídas por dois troncos de sobro com folhas e frutos, dá passagem
para a capela de St.º Agostinho, onde se encontra o túmulo de D.
Gabriel de Lencastre, 7.º duque de Aveiro (morreu em 1745), obra
graciosa de tipo barroco. Assenta em dois leões, dentro dum nicho
emoldurado por um portal. É de pedra de Ançã e ornamentam-no o brasão
ducal e um troféu: espada e foice da Morte. Como assombrosa e perfeita
obra de alfarge (pág. 38), da melhor no País, avulta a
*
capela-mor. O conjunto das notáveis talhas doiradas,
do último quarto do séc. XVI, de primoroso acabamento, não só manifesta
a suma perícia dos artistas, como a grandeza da época. O brasão régio
fecha o arco triunfal, formado com talha, assim como as pilastras do seu
apoio. Em leve curvatura se dispõe o formoso tecto entalhado, cujo
desenho
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geométrico (combinação de rectas, curvas e círculos) lembra a decoração
mourisca. Entre ele e parte dos tectos da igreja de S. Francisco do
Porto há clara identidade. Dos cruzamentos pendem bocetes. Painéis de
bons azulejos e seis pinturas em tela, com passos da vida de Santa
Joana, guarnecem as paredes, entre as quais aparatosas cartelas
entalhadas. Retábulo sumptuoso de talha doirada. Uma legenda com
brasão dos Távoras memora o facto de Francisco de Távora e mulher
haverem reedificado a capela em 1592, ficando seus padroeiros.
Coro alto,
ampliado e reformado em 1731, com
* tecto de masseira
policromado (motivos orientais). Talhas doiradas emolduravam
pinturas em tela (inutilizadas).
Mas o mais notável é o coro baixo, onde se acha o
** túmulo de Santa Joana, em embutidos de
mármore. Entra-se por uma porta engradada e embrechada, graciosa e bela
obra de ensamblador (séc. XVII). Talhas doiradas no tecto apainelado e
policromado, de 1707. Magníficas portas doiradas, com apainelados e
florões de talha, fecham a grade coral. Paredes e pavimento forrados com
mármores. O túmulo, embora de simples desenho, é de grande esmero de
execução. Mandou-o fabricar D. Pedro lI, só por artistas portugueses,
com risco de João Antunes, arquitecto real. A obra começou em 1699 e
demorou dez anos, custando 12000 cruzados. Em 25 de Novembro de 1711
nele foram postas as cinzas da infanta. Nesta obra de mosaico (a melhor
do País, por certo), os mármores italianos, de várias cores, formam
desenhos geométricos e emblemas religiosos. Na tampa, em remate, pompeia
um duplo brasão régio. Aguentam a arca tumular quatro anjos e um bloco
ornamental, tudo de mármore. Paredes-meias com a igreja fica o belo
claustro, do século XV, no qual se abrem algumas capelas manuelinas
revestidas de azulejos azuis, brancos e polícromos. À esquerda a casa
do capítulo com portal gótico e revestimento de azulejos do século
XVI. É a parte mais antiga do convento. O refeitório com bancos e mesas
fixas, de pedra, é revestido, de alto a baixo, de azulejos. No edifício
do convento extinto está instalado o
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Museu Regional.
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