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Manuel J. G. Carvalho - Nação, nacionalismo e democracia em Jaime de Magalhães Lima - 1999

1. Os itinerários limianos

Quem vai na frente é o Santo, filósofo a seu modo, como os que são, e homem de acção por excelência, por isso que a sua acção ê toda no sentido do bem. *

Antero de Quental (1)

 

JAIME de Magalhães Lima foi daquelas personagens de multímoda mundividência que, pela extrema e variada riqueza interior, escapa a qualquer tentativa de arrumação em cacifo ideológico padronizado. Tocado por uma miríade de influências, cujas raízes mergulham no cristianismo do Poverello de Assis e num certo tolstoísmo, passando pelo movimento Arts and Crafts de William Morris e John Ruskin (2) e pela comunhão / 16 / de ideais com alguns dos grandes vultos das nossas gerações oitocentistas, não deixou por isso de construir o seu próprio caminho, calcetando-o com um apurado sentido crítico e, sobretudo, com muita lucidez e tolerância, milímodas cumplicidades e um incomensurável respeito pelo Outro.

Filho de Sebastião de Carvalho Lima e de D. Leocádia Rodrigues de Magalhães, nasceu a 15 de Outubro de 1859, no palacete que seu pai mandara construir sobre as ruínas do Convento do Carmo, adquiridas em 1856 a Manuel José Mendes Leite, o fiel e eterno companheiro de José Estêvão e autor da iniciativa legislativa que terminou com a pena de morte para os crimes políticos (1852), gesto pioneiro a nível europeu(3). Nesse mesmo ano, o seu irmão Sebastião de Magalhães Lima, cujo percurso intelectual e político seria bem diferente, saía de Aveiro para frequentar o colégio alemão Roeder. / 17 /

Nasceu em Aveiro, terra de fortes tradições e envolvimentos liberais(4), pouco antes de seu pai, recém-chegado da emigração brasileira, se ter filiado no Partido Histórico chefiado pelo duque de Loulé, facção política do liberalismo português surgida no início da Regeneração, resultante da cisão verificada nos primitivos progressistas, oriundos de um estranho amálgama de setembristas, ordeiros e cartistas reformistas, unidos pela oposição ao cabralismo. Iniciado o movimento regenerador, o grupo progressista cindiu-se em duas organizações políticas, uma moderada, o Partido Regenerador, e outra de esquerda, o Partido Histórico. Este grupo progressista, que agora se cinde, não deve ser confundida com o Partido Progressista de 1876, resultante do Pacto da Granja e da fusão dos partidos Histórico e Reformista(5).

A infância terá decorrido no ambiente familiar em que as questões políticas estariam quase sempre presentes, pois seu pai, para além de deputado, foi presidente da Câmara de / 18 / Aveiro e da Junta Geral do Distrito. A preparação para o ingresso nos estudos superiores levou-o para o Colégio de Lousada, tendo iniciado o curso de Direito, na Universidade de Coimbra, no ano em que sua mãe falecia na residência da Rua do Carmo. Tinha dezasseis anos.

Frequentando a Universidade entre 1875 e 1880, acabou por ser influenciado pelo pensamento de Karl Krause, filósofo do Direito e discípulo de Schelling e de Fichte, o que, como adiante veremos, se reflectirá nos seus escritos. O krausismo, cujos prosélitos conimbricenses foram sobretudo Costa Lobo, Rodrigues de Brito e Emídio Garcia, estará por detrás da concepção organicista da realidade, comungada por Jaime Lima e presente no seu modelo de representação. As ideias de Krause encontraram campo propício entre os críticos do individualismo liberal, homens também eles liberais, mas que viam com mágoa e inquietação a facilidade com que se destruíam os equilíbrios da sociedade tradicional e os seus esteios axiológicos, como acontecia com Costa Lobo que, já em 1864, na sua tese de doutoramento(6), avançava para soluções corporativistas, apresentando a sociedade «como verdadeiro organismo [...com] seus membros reciprocamente dependentes» (Catroga, 1981: 355-356). Ao longo da segunda metade de / 19 / Oitocentos o krausismo influenciará ainda muitos dos alunos da Faculdade de Direito de Coimbra, mercê dos magistérios de Rodrigues de Brito(7) e Emídio Garcia(8).

A profunda amizade que une Jaime de Magalhães Lima a Luís de Magalhães, filho de José Estêvão(9), seu condiscípulo em Coimbra e futuro cunhado, relaciona-o com importantes nomes da Geração de 70 e com outras personalidades do meio cultural nortenho. Luís de Magalhães residia na quinta do Mosteiro, em Moreira da Maia, numa época em que Oliveira Martins se fixara no Porto(10), às Águas Férreas. Não muito longe, em Vila do Conde, demorava Antero de Quental. Nas tertúlias do Porto, em Santo Ovídio(11), na casa de Oliveira / 20 / Martins, na Quinta do Mosteiro, que Eça de Queirós, que casara no Porto, visita, aquando das suas passagens por Portugal e que lhe teria servido de cenário para a quinta de Refaldes da Correspondência de Fradique(12), ou na tebaida de Vila do Conde, juntavam-se com frequência Luís de Magalhães, Jaime Lima, Antero de Quental, Oliveira Martins, Guerra Junqueiro, Ramalho Ortigão, Alberto Sampaio, António Feijó e tantos outros, residentes no Norte do país ou simplesmente por ali passando de visita (Sampaio, 1993: 481-522, passim). Ao contrário do que afirma Francisco Ferreira da Maia, Jaime Lima (1859-1936) não pode ter conhecido Oliveira Martins (18451894), Antero de Quental (1842-1891) e Ramalho Ortigão (1836-1915) quando frequentava a Universidade: o primeiro, porque nunca a frequentou; o segundo, porque terminou o curso em 1864 e abandonou Coimbra no ano seguinte; o último, porque se matriculou em 1851 e abandonou a cidade do Mondego muito antes de Antero ali ter chegado (Maia, 1957: 10).

Jaime Lima ficará indelevelmente ligado a muitos destes homens, com destaque para Antero, cujo idealismo e afinidades intelectuais propiciaram uma maior aproximação, por / 21 / demais evidente na correspondência trocada(13) e no tratamento familiar que adoptaram entre si, deixando «as excelências para aqueles com quem não temos outra comunhão senão a de pertencermos à mesma sociedade em geral – muito geral.»(14) Em Coimbra, o convívio e as leituras trazem-lhe as primeiras hesitações religiosas, que igualmente tocarão o seu amigo Luís de Magalhães (Magalhães, 1959: 170-171). Isso mesmo parece transparecer do poema publicado aos 64 anos, assomo de prestação de contas e prenunciação de uma partida que o destino marcou para cerca de treze anos depois:

[...]

Os anos de inocência e os da paixão;

os de orgulho sombrio e os da humildade; os da fé;

e também esses, funestos, tenebrosos, da Descrença e da Dúvida;

[...] (Lima. 1923a: 19)

 

O teor de uma carta de Antero de Quental, datada de finais de 1886, dá-nos conta da superação desta crise, correspondendo, / 22 / talvez, às primeiras aproximações de Magalhães Lima a S. Francisco de Assis e a Tolstoi:

«Tudo isto, meu caro Magalhães Lima, veio, não sei bem como, para lhe dizer uma causa muito simples, e é o que mais me alegrou na sua carta foi o dizer-me que começava a sentir, nestes últimos tempos, um renascimento dos antigos sentimentos religiosos, embora transformados, e uma invencível necessidade de idealismo.» (Quental, 1993: XXIII; Ramos, 1976a: 13-14)

Um ano antes, em 1885, tinha sido publicada a tradução francesa da Religião de Leão Tolstoi que, como o próprio Jaime Lima confessa ao autor, apenas leu depois da visita que lhe fez, mas a influência tolstoiana já se fazia sentir através da leitura de outras das suas obras:

«Li a sua «Religião» e voltarei a ler brevemente todas as suas obras traduzidas em francês. Ela (a «Religião») causou-me uma impressão tão profunda que resolvi dedicar-lhe um estudo que deverá ser publicado no próximo verão. [...] Não estamos de acordo em muitos pontos, mas devo confessar-lhe que, há já bastante tempo, muitas vezes com a ajuda dos seus livros, me sinto voltar à religião e à humildade. É possível que as vicissitudes da minha vida tenham contribuído muito para isso; sempre estou convencido de que a vida não tem outra finalidade senão a virtude, e cada dia sinto mais sincero e profundo arrependimento das minhas faltas e dou a maior parte dos meus pensamentos ao amor de Deus.»(15)

/ 23 / Por esta época, quando dobrava o quarto de século e a Europa estrebuchava de nacionalismos e imperialismos, com a Conferência Internacional de Berlim (1884) a traçar os primeiros contornos do novo domínio europeu em África, Jaime Lima inicia uma prolixa e profícua produção literária, através da qual procura intervir na sociedade portuguesa, ou simplesmente exercer um magistério democrático de divulgação das ideias que, colhidas no velho continente e na América(16), lhe parecem merecedoras de partilha. Esta ânsia de comunicar exprime-se em cerca de novecentos títulos, distribuídos por dezenas de jornais e revistas, trinta livros, quatro traduções-adaptações(17) e vinte opúsculos de outras tantas conferências.(18)

Uma parte importante da sua colaboração em publicações periódicas / 24 / terá o destino da produção literária de John Ruskin: a compilação posterior em pequenos volumes, porque,

«para serem companheiros do coração, os livros hão-de ocultar-se, como tudo o que é amado do coração; irão connosco, unidos ao corpo, sem que olhares profanos os insultem com escárnio ou indiferença. [...] Por isso, eu quero aos livros bons e pequeninos, como às violetas do meu jardim.» (Lima, 1902: 73).
 

A “Província”(19), órgão do Partido Progressista(20) fundado no Porto por Oliveira Martins, será o primeiro jornal a acolher colaboração continuada de Jaime Lima, que se estenderá por alguns anos. São artigos literários, sobre autores nacionais e estrangeiros, peças versando temas agrícolas, mas também aparecem os assuntos de cariz económico e social ou de política nacional e internacional, muitos deles a propósito de obras publicadas em diferentes países da Europa.

Em 1888, quase a completar os 29 anos, durante os meses de Setembro e Outubro, faz uma grande viagem pela Europa, regressando pelo norte de África e sul de Espanha. Nesta longa peregrinação, cujo diário(21) vai publicando no periódico de Oliveira Martins, visita, como atrás dissemos, Leão / 25 / Tolstoi na sua residência de Iasnaia Poliana, fortalecendo os vínculos que, desde há algum tempo, o prendiam ao pensamento do grande escritor russo(22). No regresso escreve a Tolstoi (Ramos, 1976b: 173-174) e carteia-se com Antero, comentando com o amigo as impressões recolhidas nas entrevistas que manteve com o autor de Guerra e Paz. Antero exprime, com a sua costumada clarividência, a incapacidade da família de Tolstoi compreender o intenso drama interior do seu patriarca, problemática que o autor dos Sonetos(23) sintetiza na fórmula «Helenismo coroado por um Budismo», significando que a vida natural só terá sentido quando impregnada de vida espiritual, de compreensão transcendente. Mas «a vida espiritual é só dada aos homens espirituais. Ora a maioria dos homens é e será sempre natural.»(24)

O cristianismo democrático e filantrópico de Tolstoi ajustava-se às preocupações sociais das elites intelectuais da / 26 / época, justificando o impacto deste «santo laico» em toda a Europa e particularmente em França, onde a influência do escritor russo foi ateada, quer pela visita que fez a Paris, quer pela sua adesão às doutrinas de Proudhon. Jaime Lima contactará a obra de Tolstoi precisamente a partir da França, através das leituras do livro Le roman russe, de Eugene-Melchior de Vogüé(25), e das traduções francesas que se multiplicam no último quartel de Oitocentos(26).

 

Esta longa deambulação pela Europa e a visita a Tolstoi parecem culminar uma fase importante da sua vida, à procura de um caminho e de decisões para o futuro. Regressado a Portugal anuncia a Antero de Quental o seu futuro casamento, que terá lugar em Condeixa, a 23 de Julho de 1889, com D. Maria do Cardal de Lemos Pereira de Lacerda, filha de / 27 / Francisco de Lemos Ramalho de Azeredo Coutinho, morgado da Casa de Condeixa, e irmã de D. Maria da Conceição de Lemos Pereira de Lacerda, casada desde Fevereiro de 1884 com Luís Coelho de Magalhães (Ramos, 1976b: 175, n.º 2; 177). Um pouco antes, em carta datada de 28 de Maio, Antero manifesta o seu regozijo:

«Já me tardava vê-lo casado - e posso dizer-lhe agora que mais de uma vez tinha pensado nisso, e sentido até a tentação de lhe dar esse conselho; mas achava a matéria tão delicada, tão absolutamente do foro íntimo, que nunca me atrevi. Veja pois com que prazer recebi a notícia, que me dá! O dia do seu casamento será para mim um de verdadeira alegria. Não lhe citarei o famoso «não é bom que o homem esteja só" da Bíblia, ainda que há uma grande verdade nesse conceito; mas, tomando a coisa por outro lado, dir-lhe-ei que só é verdadeiramente livre aquele que sabe limitar voluntariamente a sua liberdade [...] Entrou, meu caro amigo, num caminho em que todos os dias irá sentir o chão mais firme debaixo dos pés, mais lúcido o pensamento, mais serena a consciência. Vivendo cada vez mais para os outros, sentindo morrer em cada dia dentro de si mais uma parcela do eu egoísta que tanto nos ilude, tanto nos faz sofrer e errar, irá entrando gradualmente naquela região da impersonalidade que é a verdadeira beatitude.» (Quental, 1993: XXVIII-XXIX; Ramos, 1976a: 20-21).

 

Os acontecimentos de 1890, e a forma como Portugal respondeu ao Ultimato inglês, desencadearam, um pouco por todo o país, um coro de lamentos e atoardas, quando não ferozes manifestações de nacionalismo ofendido. Republicanos e / 28 / socialistas zurziram a instituição monárquica, enquanto a agressividade da imprensa, que nem a nova «lei da rolha» conseguia calar, e a denúncia da dependência económica e política de Portugal face à Inglaterra despertavam sentimentos anti-ingleses e faziam cair governo atrás de governo. Jaime de Magalhães Lima acabará por entrar na política activa, já depois da recusa ao grito desesperado de Antero, que o pretendia no Porto como secretário-geral da Liga Patriótica do Norte a que presidia:

«O Jaime é o homem, é o único. Há-de vir. O que se vai passar em Portugal é seriíssimo. Faça cada um o seu sacrifício no altar da Pátria. Eu sacrifico a minha saúde, que naufragará de todo no meio disto, e muito provavelmente o meu nome, que antes de 6 meses estará manchado. [...] O Jaime fará também à Pátria e ao Bem o seu sacrifício. Venha.»(27)

 

A Liga Patriótica do Norte, excogitada por diversas individualidades nortenhas, entre as quais pontificava Luís de Magalhães, fora entregue, a expensas da influência do filho de José Estêvão, à direcção de Antero de Quental. Dirigia-se contra os britânicos, como a francesa Liga dos Patriotas, fundada oito anos antes, se virava contra a Alemanha. A primeira nascia com o mapa cor-de-rosa e a gula desenfreada pelo domínio do / 29 / continente africano, a segunda com a memória da derrota na guerra franco-prussiana e a perda da Alsácia-Lorena. Uma e outra deram em nada! Quanto à portuguesa, Eça de Queirós traça-lhe o epitáfio, em linhas vigorosas e irónicas:

«E a Liga, que ainda mal nascera, já findava, decomposta. Tão decomposta que dentro dela não restava outro movimento senão o fervilhar dos vermes partidários, Regeneradores e Históricos. Quando se acabaram de elaborar os Estatutos, que eram o programa muito complexo da Nova Vida, a Liga já não existia, dispersa, sumida, toda fugida para os hábitos da Vida Velha. Os políticos tinham recolhido aos seus centros: – A Mocidade que fora arrancar Antero à Metafísica, regressara, cansada desse esforço, às banquetas e aos bocks dos cafés da Praça-Nova. Na sessão em que se leram os consideráveis Estatutos só havia, na vastidão dos bancos, quinze membros que bocejavam. E numa outra final, como ventava e chovia, só apareceram dois membros da Liga, o presidente que era Antero de Quental, e o secretário que era o conde de Resende. Ambos se olharam pensativamente, deram duas voltas à chave da casa para sempre inútil, e vieram, sob o vento e sob a chuva, acabar a sua noite em Santo Ovídio.» (ln Sampaio, 1993: 515).


O malogro da iniciativa, que tentava uma ampla frente, supra-partidária, capaz de salvar a Pátria da decadência e da crise permanente em que vivia, aplicando um vasto programa que recuava ao diagnóstico da «Geração Nova» e das Conferências democráticas do Casino Lisbonense, terá contribuído para o desânimo de Antero e para o agravamento da misantropia que o conduziria ao suicídio, em 11 de Setembro de 1891.
/ 30 / Jaime Lima, apesar de ter recusado o cargo de secretário-geral da Liga, lugar que, como vimos, foi preenchido pelo Conde de Resende, aderiu ao projecto e disso deu público testemunho na primeira página d'”A Província”(28).

Recém-casado, o escritor aveirense remete-se à vida familiar e ao estudo da obra de Tolstoi, reduzindo drasticamente, ao longo de alguns anos, a sua colaboração na imprensa. No entanto, é durante este período que o futuro «eremita» da quinta de S. Francisco se lança na política activa, começando por integrar, com Luís de Magalhães e Alberto Sampaio, o grupo dos chamados «governamentais», apoiantes do projecto «Vida Nova» corporalizado no pensamento e na pessoa de Oliveira Martins. O desiderato apontava para a salvação de Portugal e para a aplicação de um conjunto de medidas capazes de ultrapassar a bancarrota do Estado e a crise financeira, e estancar as falências que se sucediam em catadupa. Oliveira Martins conseguirá inverter esta tendência, durante os quatro meses em que sobraçou a pasta da Fazenda, mas o êxito não evitará a sua saída do governo e a consequente solidariedade dos amigos, que deixam de apoiar o Ministério de José Dias Ferreira.

A traição a Oliveira Martins custou a Dias Ferreira a chefia do governo, vingança cozinhada por alguns dos «governamentais» / 31 / e consumada no regresso de um governo partidário regenerador, com Hintze Ribeiro na presidência e João Franco na pasta do Reino. Mas o Partido Regenerador não fugia à profunda desordem que campeava nos velhos partidos monárquicos, ele próprio com várias facções a digladiarem-se e com uma direcção bicéfala, em que pontificavam Hintze Ribeiro e João Franco, nem aos vícios arranjistas alimentados pelas benesses distribuídas em função dos acordos de caciques e chefes políticos.

Em 1892 Jaime Lima é eleito presidente da Câmara de Aveiro e, no ano seguinte, deputado pelo Partido Regenerador, continuando, coerentemente, a defender as ideias de Oliveira Martins. Em 1894 perde mais este amigo e, dois anos depois, morre-lhe o pai. Novamente deputado por Aveiro, eleito em 1897, colabora na imprensa local e noutras publicações ligadas ao Partido Regenerador, apoiando, com Luís de Magalhães e Alberto Sampaio, as reformas franquistas da lei eleitoral, identificadas com os princípios do krausismo e da «representação orgânica» de Oliveira Martins, que ele próprio defendia desde há doze anos (Lima: 1888; 1890). Mas todas estas reformas foram caindo depois de 1896 e, no ano imediato, poucos meses depois da conquista do poder pelos progressistas de José Luciano de Castro, completava-se o desmantelamento de toda a estrutura eleitoral franquista. Luciano de Castro, que viria a marcar toda a vida política portuguesa nos vinte anos que antecederam a República, nasceu em Oliveirinha, concelho / 32 / de Aveiro. Aos 17 anos, com Manuel Firmino de Almeida Maia, fundou “O Campeão do Vouga”, o primeiro jornal aveirense, que começou a publicar-se em 14 de Fevereiro de 1852 e que, em 12 de Novembro de 1859, passou a intitular-se “Campeão das Províncias”. Foi seu primeiro redactor principal José Maria de Almeida Teixeira de Queirós, pai de Eça de Queirós(29).

Voltando a Jaime de Magalhães Lima, encontramo-lo, em 1901, ao lado de João Franco, na cisão do Partido Regenerador, passando a dirigir a estrutura aveirense do novo Partido Regenerador-Liberal. Contudo, por esta época, a organização local dos partidos continuava a ser quase inexistente, circunscrita a uma ou outra figura de projecção regional, o que lhe permitiu ler e escrever intensamente, apostando na divulgação de Ruskin, Channing, Wordsworth, Michelet ou S. Francisco de Assis, e multiplicando os artigos sobre o que foi uma das suas grandes paixões, a silvicultura teórica e experimental dos eucaliptos.

 

Com a queda do Franquismo, em 1908, afasta-se definitivamente da política e instala-se na Quinta do Vale do Suão, / 33 / em Eixo, nos arredores de Aveiro, rebaptizada de Quinta de S. Francisco. Nesta opção pelo contacto permanente com a natureza, levada ao extremo de não permitir cortinados nas janelas do seu gabinete de trabalho, para poder ver as árvores e as aves, seguia duas das suas referências intelectuais mais queridas: Alexandre Herculano, afastado de Lisboa e recolhido em Vale de Lobos, e John Ruskin retirado na pequena quinta de Brantwood, perto de Coniston Lake.

Afastado da ribalta tumultuosa da vida política e usufruindo avidamente a mãe Natureza, iniciava aqui o último período da sua vida, sempre atento ao mundo exterior, ao qual descia vezes sem conta por exigência dos que queriam ouvir a sua voz respeitada.(30) O refúgio de Eixo produz de imediato o seu primeiro S. Francisco de Assis(31), leitura heterodoxa do catolicismo oficial que mereceria alguns reparos de D. João Evangelista de Lima Vidal(32), seu primo e bispo de Aveiro. O livro é acusado de interpretar a vida do Poverello à luz do protestantismo do hagiógrafo Paul Sabatier(33) o que levará Jaime / 34 / Lima a escrever um outro, publicado já depois da sua morte, em 1956.

Seguem-se duas traduções de Tolstoi(34) e um estudo sobre Alexandre Herculano (Lima, 1910a), acompanhados por uma pertinaz colaboração na imprensa, por onde perpassam os problemas de Portugal, da Europa e do Mundo. Devorador de livros e jornais, aprendeu o inglês como autodidacta, o que lhe permitiu o contacto com o mundo anglo-saxónico, recorrendo a um vasto leque de periódicos britânicos, fossem eles londrinos ou da imprensa regional(35), mas também a um variado número de obras publicados em Inglaterra, que encomendava e recebia no eremitério de Eixo.

Acompanhando com especial atenção a vida política da Alemanha, e atento ao crescendo do nacionalismo prussiano, quase adivinhou o eclodir da 1.ª Guerra Mundial. Crítico aceso / 35 / do imperialismo alemão, acabará por rejeitar liminarmente o cesarismo bismarckiano e a política de alianças com a social democracia marxista, responsabilizados pela instabilidade política do velho continente: 

«Levou tempo a fazer e deu muito trabalho essa nova Alemanha. Para isso foi necessário arrasar, como alegremente se arrasou, até aos alicerces, aquela outra Alemanha gloriosa, dos tempos em que militarmente era vencida, a Alemanha de Kant, de Lessing, de Goethe e de Beethoven, do tempo em que, toda impregnada de idealismo, de sabedoria, arte, ingenuidade, simplicidade e anseios de liberdade, tinha menos ciência de laboratório e mais ciência do coração, e não sabia mentir, intrigar, corromper e oprimir.» (Lima, 1915a: 11)


Nos seus escritos sobre a guerra sobressai a admiração pela Grã-Bretanha e pelo seu papel civilizador, apresentados em contraponto da barbárie germânica e como paradigma das sociedades democráticas:

«Se vemos um estupendo império, como o da Grã-Bretanha, englobando sob a mesma bandeira, irmãmente querida e amada, as raças mais diversas e as mais diversas aspirações, é porque para esse milagre político, sem precedente na história, se criou um povo em cujo génio, por uma arte que é maravilha de espontânea perfeição, se conciliam praticamente as maiores e desusadas liberdades com a coincidência em uma unidade, para a qual provavelmente só se encontrará justificação na comunidade de amor à própria liberdade e no propósito íntimo de a manter e defender.» (Lima, 1915a: 20)

 

/ 36 / Denunciada a guerra e equacionados os problemas da Europa, Jaime Lima entrega-se de novo às grandes questões nacionais, procurando intervir na sociedade portuguesa com vista à sua transformação, à redescoberta dos seus valores e tradições... da sua alma. Perdidos os velhos amigos da Geração de 70, encontrará novas cumplicidades, sem no entanto chegar à íntima comunhão experimentada com Antero ou Oliveira Martins. Portugal estava mudado, o que era por demais visível no crescimento de Lisboa e de outros centros urbanos, na transformação da paisagem, com a proliferação das chaminés de fumo a romperem aqui e ali, bem como no aumento de uma classe média de funcionários e profissões liberais. Os tempos eram outros e os homens também. Os intelectuais portugueses do primeiro terço do século XX procuravam, em desespero de causa pela pequenez do meio, o arrimo das capelinhas, mais interessados em dar visibilidade a cada um dos «grupinhos literários», como lhes chamava Jaime Cortesão, que em produzir obra de fundo. As revistas literárias, que se multiplicavam em Lisboa e no Porto, duravam o tempo da sua agressividade e das polémicas que sustentavam o mercado.

As ideias que germinavam em França, nas vésperas do primeiro conflito mundial, ameaçavam invadir Portugal, cujas elites intelectuais eram, desde há muito, francófilas. E fizeram-no, com António Sardinha e outros corifeus do Integralismo Lusitano. Aquilino Ribeiro, desde Paris, bem podia clamar, nas / 37 / páginas d'”A Capital”, contra o perigo da importação do bergsonismo e do ideário da Action Française, e para a necessidade de descobrirmos um caminho português para a democracia portuguesa. O tradicionalismo acabará por constituir um elo de ligação entre pensamentos e movimentos diferenciados que, a partir de determinada altura, apostam no rejuvenescimento da alma nacional e na afirmação da individualidade portuguesa. Aqui se encontrarão os últimos românticos, os integralistas, os saudosistas, lusitanistas e criacionistas da Renascença Portuguesa, os modernistas da revista Orpheu, os seareiros, os sebastianistas e tantas outras seitas da cultura lusa dos inícios do século, «ismos» que, alimentados por dissidências e trânsfugas, cresciam de costas voltadas para o pensamento político dominante e para a Universidade(36).

/ 38 / Jaime de Magalhães Lima, espírito sempre aberto e tolerante, não recusou a entrada nesta procela babilónica, preso que estava à vocação e missão proféticas de defesa dos valores, tradições, língua e arte portuguesas, cujos objectivos se prendiam, mais além, com a felicidade e a harmonia para a Pátria portuguesa: 

«Pudessem os deuses ouvir as minhas obstinadas e roucas orações e pelos seus eleitos mandassem aos homens, senão a felicidade e a paz que não são muito de esperar entre os clamores da psicologia e da história, ao menos uma transitória remissão das inquietações, uma pausa no sofrimento pela qual debalde vamos suspirando entre o copioso saber, forças inauditas e vastíssimas riquezas que a nossa era ostenta e a nossa jactância apregoa!... Tivesse eu a felicidade de pressentir, de longe que fosse, as bênçãos de um novo reino!... Isso em consciência me absolveria da impertinência dos zumbidos com que procuro atormentar os ouvidos estranhos.» (Lima, 1986: 16)

 
Concorre com os seus escritos, nalguns casos esporadicamente, para revistas de diferentes tendências, sejam elas a “Atlântida”(37), “A Águia”, “Lusitânia”(38) , “A Ilustração Moderna”, “Portucale”,
/ 39 / “Ilustração” ou a “Seara Nova”. Em 1918 é um dos cofundadores da LAN – Liga de Acção Nacional (39), colaborando no respectivo órgão, a revista “Pela Grei” cujo subtítulo, “Revista para o Ressurgimento Nacional pela Formação e Intervenção de uma Opinião Pública Consciente”, exprimia claramente os objectivos da associação(40). Em 1923 integra o grupo de 40 fundadores da Revista dos Homens Livres(41), dinamizado pelos seareiros António Sérgio, Raul Proença e Jaime Cortesão, movidos pelo propósito de trazerem à sua causa(42) intelectuais que não se revissem no projecto da Seara Nova. António Sardinha, que havia atacado a experiência de 1918, alcunhando-a de / 40 / «anglo-saxonismo de importação», numa alusão às ideias de Reis Santos, adere agora a este grupo, com Pequito Rebelo, seu correligionário do Integralismo que o havia seguido na evolução anti-monárquica. A heterogeneidade do grupo estender-se-á igualmente a anarquistas, ex-franquistas, monárquicos conservadores e sebastianistas (Ramos, 1994: 548 e 552), mostrando quão forte era o mal-estar da intelectualidade portuguesa perante as realidades sociais e políticas do país. Jaime Lima desde há muito defendia esta unidade de acção, escrevendo. em 1905: 

«Que um punhado de crentes devotados guarde a tradição do povo e sua glória, – seu amor do trabalho, sua honradez, bondade resignada e paciência, desprendimento, austeridade, – e Portugal ressurgirá do aviltamento, como renascem a Irlanda, a Hungria, a Polónia e tantos outros povos oprimidos, ou pelos próprios erros e loucuras ou pela ambição cruel dos poderosos.

Nunca uma só batalha se perdeu, quando foi combatida por justiça e nobreza.» (Lima. 1905: 172-173)

 
Quase panteísta, atrever-nos-íamos a dizer «panteísta-cristão», no êxtase que experimenta na adoração da natureza, calcorreia montes e vales, preferindo sentir a aspereza dos caminhos a percorrê-los sobre quatro rodas, ele que possui um dos primeiros automóveis de Aveiro:
/ 41 /

«Já não há caminhos, há transportes, qualquer coisa que se move na estrada mas parece desconhecê-la. Pelo menos, não deixa que os sentidos a conheçam. Viajar, nesta sujeição, não é calcar a terra, é repudiá-la.» (Lima, 1986: 17-18)
 

Estes gritos de amor à terra, plasma em que mergulha todo o seu pensamento e vida interior, são brados de cabouqueiro ecológico(43), de quem acredita  

«na terra, no seu poder de transposição paradisíaca, na felicidade e bem-aventurança que ela concede a quem a ama e serve, fielmente, em louvor e culto e humildade.» (Lima, 1906: VII)
 

A religião é, em Jaime de Magalhães Lima, o culminar de todo o seu viver, a síntese que encerra, superiormente, o Criador e a Criatura, englobando, nesta, toda a humanidade, todos os seres vivos, todas as areias, fragas, campos e serras. De fora parece quedar-se a cidade moderna, antro de vaidades e riquezas, artefacto industrial gerador de misérias morais e sociais, lugar onde «todos nos desconhecemos, evitamos e isolamos, quando não nos atropelamos» (Lima, 1933a: 56).

Sem se afastar de Deus, antes procurando-o, a religião limiana aproxima-se assim do pampsiquismo anteriano, tão / 42 / bem descrito pelo poeta filósofo ao seu assumido discípulo(44), e não se alimenta de  

«certos bolores das sacristias, superstições carunchosas e hipocrisias parasitárias, I...nem da] boçalidade de sacerdotes muito mais dedicados à sordidez e à impostura do que a Cristo.» (Lima, 1933: 6)
 

Esta religião, cantada em tantos livros de Jaime Lima, mas sobretudo nas Rogações de Eremita (1910b) ou nos Salmos do Prisioneiro (1915b), bem mais belos que os de David, é uma religião de amor,  

«que por amor dá o exemplo e do exemplo vai à compaixão, e ao perdão e à redenção dos ignorantes e transviados. (Lima, 1957: 63) [...]
A religião é só isto; ténue e invisível fio prendendo-nos à vida espiritual imperecível. Que importa encontrá-la no amor da árvore, da flor, do velho, da criança, do mísero, do mar ou da montanha? Viver é senti-lo.» (Lima, 1902: 202-203)
 

Tudo o resto gira em torno deste sentir religioso, e todo o seu pensamento, incida ele sobre a democracia, o liberalismo ou a ideia de nação, inscreve-se nesta matriz idealista, de abnegação / 43 / e de renúncia no Outro. Como dizia numa carta a António Sérgio. 

«Entre o Santo e o filósofo, e, por maioria de razão, entre o Santo e o regedor, ainda que o regedor se chame Péric1es ou Napoleão, ficarei com o Santo. Porque o Santo é o mais fiel intérprete de Deus, e a ordem do Mundo, como a ordem da alma, só em Deus encontrará filiação assaz consistente para a manter.»(45)

 

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* Actualizámos a grafia de todas as citações.

(1)QUENTAL, Antero de – Carta a Jaime de Magalhães Lima, de Vila do Conde, datada de 14 de Novembro de 1886 (Sampaio, 1993: XXIII).

(2)O Movimento das Artes e Ofícios – Arts and Crafts Movement –, fundado em 1888 na Inglaterra, defendia a produção manual, valorizando a prática artesanal da Idade Média e rejeitando a produção em série da época industrial. William Morris (1834-1896) e John Ruskin (1819-1900) foram dois dos seus principais mentores. Ruskin, «um violento tory da velha escola», como ele próprio se definia na primeira página de Praeterita, a sua autobiografia, ou o «inovador retrógrado» na boca dos seus adversários, nem por isso deixou de inspirar os fundadores do Partido Trabalhista inglês (1906), com a mensagem política de duas das suas obras, Unto this Last e Sesame and Lilies, ou de contribuir para a formação do líder nacional indiano Mohandas Karamchand Gandhi. As características do reformismo social inglês, em que se integravam homens como Morris ou Ruskin, vestia capa evangélica e pretendia reconciliar-se com a lição social do cristianismo primitivo, aproximando-se, por isso, do franciscanismo. Ver Compagnon (1987).

(3)A proposta de Mendes Leite, para terminar com a pena de morte em Portugal, por crimes políticos, exprimiu-se na redacção do Artigo 16 do Acta Adicional de 1852 que, muito sinteticamente, estabelecia: «É abolida a pena de morte nos crimes políticos, os quais serão declarados por uma Lei. § único – fica deste modo ampliado o § 18.º do Art. 145 da Carta Constitucional.»

(4)Bastará lembrar os acontecimentos de 1828 e o papel desempenhado por homens como o conselheiro Joaquim José Queirós (avô de Eça de Queirós), José Estêvão Coelho de Magalhães, Manuel José Mendes Leite e José Luciano de Castro.

(5)Esta arrumação dos moderados e da esquerda liberal terá sido mais institucional que real, já que encontramos, entre os primeiros, Setembristas como José Estêvão, com o coração nos Históricos e a estratégia nos Regeneradores como, por mais de uma vez, é afirmado pelo grande tribuno nas suas intervenções parlamentares (Cr. – Discurso sobre o contrato do tabaco, in ESTÊVÃO, José – Discursos Parlamentares. Aveiro: Câmara Municipal, 1983. p. 171-172 e passim).

(6)LOBO, António de Sousa Silva Costa – O Estado e a Liberdade de Associação: Dissertação inaugural para o acto de conclusões magnas. Coimbra: Imprensa da Universidade, 1864.

(7)Joaquim Maria Rodrigues de Brito (1822-1873). Em 1869 publicava a Filosofia do Direito, obra que parece ter sido traduzida em alemão, e a Resposta às breves reflexões do ex.mo sr. dr. Vicente Ferrer sobre a «Filosofia do Direito», no âmbito de uma polémica com bastante impacto na época. Ver Catroga (1981: 356).

(8)Manuel Emídio Garcia (1838-1904), defensor de um organicismo biossociológico, regeu a cadeira de Direito Administrativo entre 1871 e 1881, abarcando, por isso, a passagem de Jaime de Magalhães Lima por Coimbra.

(9)Luís Coelho de Magalhães, o "Buono Luigi, para Antero, era filho de José Estêvão. Foi governador civil de Aveiro em 1892, a pedido de Oliveira Martins, e ministro dos Estrangeiros no governo de João Franco. Monárquico convicto, envolvido em 1919 na Monarquia do Norte, nem por isso deixou de dar protecção e guarida a muitos dos republicanos perseguidos na sequência dos acontecimentos de 1891. Ver Magalhães (1959: 171) e Rosa (1942).

(10)Oliveira Martins viveu no Porto de 1874 a 1888, numa época em que foi funcionário e depois administrador da Companhia de Caminho-de-Ferro do Porto à Póvoa do Varzim.

(11) – Palácio e quinta do conde de Resende, no Campo de Santo Ovídio, depois chamado Campo da Regeneração. Ver Sampaio (1993: 515, nota do editor).

(12)Ver CERQUEIRA. Eduardo – José Estêvão apreciado por seu filho: Dois discursos do Dr. Luís de Magalhães. “Arquivo do Distrito de Aveiro”. Aveiro,  voI. 28, n.º 112 (1962), p. 259.

(13)Ver QUENTAL, Antero de – Cartas a Jaime de Magalhães Lima (ln Sampaio, 1993: XXI-XXIX). Ver também Ramos (1976a).

Jaime Lima dedicou a Antero o seu livro As Doutrinas de Conde Leão Tolstoi, publicado no Porto em 1892 pela Livraria Internacional de Ernesto Chardron, com as seguintes palavras de homenagem: «À memória do meu querido Mestre Antero de Quental».

(14)Carta de Antero de Quental para Jaime de Magalhães Lima, datada de 13 de Outubro de 1886. (In Ramos, 1976a: 7).

(15)Esta carta, datada de 15 de Março de 1889, encontra-se no Museu de Tolstoi, em Moscovo. Está publicada in Ramos (1976b: 173-174).

(16)Por exemplo William Ellery Channing (1780-1842). reformador social e dirigente da Igreja Unitária norte-americana, cuja obra Magalhães Lima descobriu em 1900 ou início de 1901 através duma tradução francesa. Ver Lima (1902: 269); ver também: LIMA, Jaime de Magalhães – Leituras de Channing: Como a solidão se afugenta. Vitalidade. Aveiro (13 Jan. 1901) 1.

(17)Jaime de Magalhães Lima pretende ir além de uma mera tradução, já que, para ele, «não há traduções possíveis; as línguas são intraduzíveis, todas; as do cafre como as do grego. Será tão fácil a transposição de língua para língua como a tradução de Beethoven em Chopin, ou de Wagner em Verdi. Haverá, quanto muito, interpretações; e, se são bem feitas, não será coisa pouca a inspiração de quem as fez.» (Lima, 1923b: 52).

(18)Devemos o conhecimento da obra de Jaime Lima, na sua quase totalidade, ao trabalho de AZEVEDO, B. d' Almeida – Esboço bibliográfico de Jaime de Magalhães Lima, Costa do VaIado [Aveiro], 1986, 149 p. Obra inédita, dactilografada.

(19) O primeiro número deste jornal foi publicado em 25 de Maio de 1885.

(20)Partido resultante do Pacto da Granja e da fusão dos partidos Histórico e Reformista: ver supra, nota 5.

(21)Estes artigos serão depois reunidos no livro Cidades e Paisagens, Porto: Tip. de A. J. da Silva Teixeira, 1889.

(22)Sobre as relações de Jaime Lima com Tolstoi e a «recepção de temas tolstoianos na obra do escritor aveirense» veja-se Abreu (1988).

(23)Jaime Lima dá a conhecer Antero de Quental ao grande escritor russo e envia-lhe, conforme diz na carta que lhe remete em 15 de Março de 1889, a tradução alemã dos Sonetos. (Ramos, 1976b: 173)

O título da tradução alemã era o seguinte: Anthero de Quental – A us gewêihlte Sonette. Verdeutscht von Wilhelm Storck. Paderbom und Münster: Verlag von Ferdinand Schõningh, 1887.,A informação consta de uma carta de Antero para Jaime de Magalhães Lima, datada de Vila do Conde, de 2 de Fevereiro de 1889 (Ramos, 1976a: 20).

(24)Carta de Antero para Jaime Lima, datada de Vila do Conde, 2 de Fevereiro de 1889 (Ramos, 1976a: 20; separata: p. 22).

(25)Vd. Ramos (1976b: 162 e 172-173). Nestas duas últimas páginas, e nas que se seguem, Aníbal Ramos enuncia os diferentes artigos de Jaime Lima, publicados no jornal “A Província”, na “Revista de Portugal” e noutras publicações, que se referem à obra de Leão Tolstoi.

Esta obra do visconde Melchior de Vogüé (nascido em 1850) foi publicada em 1882 (Lanson, 1946: 1111).

(26) La Guerre et la Paix (1880 e 1885), Anna Karénine (1885), Ma réligion (1885), Les cossaques (1887), Souvenirs de Sébastopol (1887), La Puissance des ténébres (1887), Souvenirs (1887), La Sonate à Kreutzer (1890), Qu'est-ce que l'art? (1898), Réssurrection (1900) (Lanson, 1946: 1107).

(27)Carta de Antero datada de Vila do Conde, 9 de Fevereiro de 1890, (Ramos, 1976a: 23).

(28)LIMA, Jaime de Magalhães – Liga Patriótica do Norte: uma adesão. A Província. Porto (3 Março 1890) 1.

(29)NEVES, Francisco Ferreira – O centenário do «Campeão do Vouga»: Notas de recordação do primeiro jornal aveirense. “Arquivo do Distrito de Aveiro”, Aveiro, voI. 18, n.º 69 (1952), p. 25-47.

(30) Ao longo de todo este período sucedem-se as conferências e palestras sobre os mais variados assuntos e nos mais diversos locais.

(31)LIMA, Jaime de Magalhães – S. Francisco de Assis: Servo e menor, Coimbra: França Amado, 1908.

(32)Ver: [VIDAL], João Evangelista [de Lima] – Prefácio. In Lima, 1957: 79)

(33) Vd. MAGALHÃES, Margarida de – Evocação. In Lima, 1957: 111-113.

Paul Sabatier (1858-1928), teólogo e pastor protestante francês, é o autor de uma Vida de S. Francisco de Assis, escrita em resposta a uma missão intelectual quase imposta pelo seu mestre Ernesto Renan. A obra, publicada em França em 1893 e traduzida em várias línguas, é considerada uma das melhores biografias do Poverello e fruto de um trabalho árduo e sério de investigação, com base em documentos inéditos descobertos nos arquivos italianos. A importância e o impacto desta obra, bem como o currículo de Sabatier, professor de História Eclesiástica na Faculdade de Teologia da Universidade de Estrasburgo, cidadão honorário de Assis, membro da Academia Real de Roma, presidente honorário da Sociedade Internacional de Estudos Franciscanos e doutor «honoris causa» pelas Universidades de Oxford, Aberdeen e Edimburgo, não evitou a sua inclusão no Index.

(34)TOLSTOI, Leão – O ensino de Jesus. Tradução de Jaime de Magalhães Lima, Lisboa: A Editora, 1908. A partir da versão inglesa de L. e Aylmer Maude; TOLSTOI, Leão – A anexação da Bósnia e da Herzegovina pela Áustria. Tradução de Jaime de Magalhães Lima, Lisboa: A Editora. A partir da versão inglesa de Aylmer Maude, Aylmer Maude foi um biógrafo e tradutor de Leão Tolstoi.

(35) Alguns títulos de periódicos ingleses, respigados de citações na sua obra: The Christian Commonwealth. Daily Chronicle, Glasgow Herald, Hibbert Joumal. Manchester Guardian, Millgate Monthly, Spectator, Times.

(36)António Sardinha funda o movimento do Integralismo Lusitano em 1916, a partir da revista de filosofia política “Nação Portuguesa”, por ele criada dois anos antes. O ideário integralista evoluiu ao longo da sua existência, começando por ser arreigadamente monárquico para, a partir de 1922, início da 2.ª série da “Nação Portuguesa”, substituir a fé no rei pela fé em Portugal e dar os primeiros passos na ultrapassagem de um nacionalismo estreito. Ver SARDINHA. António – Ao princípio era o Verbo, Lisboa, 1923.

O saudosismo de Teixeira de Pascoaes e o criacionismo de Leonardo Coimbra abrigavam-se no Porto sob o manto da revista Águia, dirigida pelo primeiro e fundada em 1910 por Álvaro Pinto, passando, em 1912, a órgão da Renascença Portuguesa. O lusitanismo de Jaime Cortesão estanciava em Lisboa, a coberto da revista Vida Portuguesa por ele próprio dirigida e fundada em 1912.

O “Orpheu”, revista trimestral de literatura, apareceu em Lisboa em 1915, sob a direcção de Luís Montalvor. Virá a transformar-se na voz do modernismo e do futurismo português, apesar dos seus dois únicos números.

(37)“Atlântida”: Mensário Artístico. Literário e Social para Portugal e Brazil. Publicou-se entre 1915 e 1919, num total de 48 números. Para além de Jaime Lima, colaboraram nesta revista, entre outros. António Sérgio, Júlio Dantas, Teófilo Braga, Almada Negreiros, Leite de Vasconcelos, Aquilino Ribeiro e Columbano.

(38)“Lusitânia”: Revista de Estudos Portugueses. Publicou-se de Janeiro de 1924 a 1927, pretendendo «ser um órgão da nossa cultura, posto ao serviço da Reconstrução Nacional». Foi sua directora Carolina Michaëlis de Vasconcelos, No primeiro fascículo aparecia Câmara Reis como editor e redactor gerente e, como secretários da redacção, Mons. Lopes Vieira e Reinaldo dos Santos. Para além dos nomes indicados, e de Jaime de Magalhães Lima, colaboraram na revista nomes como António Sérgio, António Sardinha, Jaime Cortesão e José Leite de Vasconcelos.

(39)A Liga tinha por presidente o reitor da Universidade de Lisboa, Pedro José da Cunha, e por secretários-gerais Francisco Reis Santos e António Sérgio.

(40)Afirmava Sérgio, na “Pela Grei” de Janeiro de 1918: «O ideal da Democracia, em suma, é o governo da nação por elites naturais, criadoras da opinião pública e executantes da opinião pública; o governo da persuasão pelo escol da inteligência.» In SÉRGIO, António – Ensaios I, 3.ª ed. Lisboa, Livraria Sá da Costa, 1980, p. 232.

(41)Esta revista teve vida curta, pois apenas saíram dois números, em Dezembro de 1923.

(42)Sérgio explicava-a na nota de abertura do primeiro número: a procura duma ideia nacional, de uma finalidade portuguesa, anterior e superior às finalidades partidárias.»

(43) Sobre os problemas estéticos e ecológicos em Jaime de Magalhães Lima, ver Luís Machado de Abreu (1991).

(44)Carta de Antero de Quental a Jaime de Magalhães Lima, datada de Vila do Conde, 14 de Novembro de 1886. Ver: Quental (1993: XXIII) e Ramos (1976a: 12).

(45)LIMA, Jaime de Magalhães – Santos, filósofos e regedores, Lusitânia, Lisboa, VoI. 2 (1924), p. 122. Carta de Jaime Lima a António Sérgio.

 

 

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