Alberto Ribeiro Soares et alii, Hinos Patrióticos e Militares Portugueses, Estado-Maior do Exército e Maisimagem, Ldª, Lisboa, 2010, 354 págs., ISBN 978-989-97013-0-4.

Introdução

As dimensões artísticas da actividade militar em Portugal encontram-se ainda, na sua generalidade, por estudar. Mas a música tem vindo a merecer maior atenção ao longo dos últimos anos.

Nas pesquisas que temos vindo a fazer em órgãos da Imprensa Militar (cujo acervo é superior a 1.500 títulos), desde há mais de 30 anos, encontrámos diversos Hinos de unidades do Ultramar (cerca de uma vintena) e também do Continente, alguns deles com partitura.
 

Recordámos depois os hinos nacionais (A Portuguesa, A Marselhesa, God Save the King); os hinos do Exército, da Marinha e da Força Aérea; da Artilharia, da Infantaria e da Engenharia; do Instituto de Odivelas, do Colégio Militar e dos Pupilos do Exército; da Escola Prática de Infantaria, do Regimento de Infantaria 13 e do Batalhão de Caçadores 5; e outros, muitos deles oportunamente inseridos no Almanaque do Exército, publicado em 1998. A pesquisa foi continuando e passou a Projecto, procurámos em variadas publicações (como o dicionário bibliográfico do General Martins de Carvalho) e fomos ao Arquivo Histórico Militar e à Biblioteca Nacional, onde mergulhámos a fundo na matéria.

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Dada a ligação pessoal ao Regimento de Artilharia Antiaérea 1, surgiu o contacto com a Banda do Exército e o seu Chefe titular da altura, o então Capitão Ferreira da Costa; e, naturalmente com o maior estudioso contemporâneo da música militar portuguesa, que terminara o Mestrado em História, o então Major Pedro Marquês de Sousa. E com o apoio do Professor Artur Anselmo – sempre disponível para tirar dúvidas, encontrar referências ou estabelecer os contactos que permitissem avançar – chegámos ao Professor João Soeiro de Carvalho que aceitou orientar-nos e fazer o Prefácio da obra.

Ao iniciarmos este Projecto, em 2006, pensámos desenvolver uma investigação sobre hinos e marchas militares portuguesas.

Mas logo constatámos que tal não seria exequível dada a existência, segundo uma primeira avaliação, de cerca de 200 hinos e largas centenas de marchas militares de autores portugueses.

Por isso, circunscrevemos o âmbito do trabalho aos hinos militares, assim considerando aqueles que se caracterizam por uma cadência marcial – e, portanto, serem aptos a uma função militar –, deixando para os estudiosos a discussão académica sobre as diferenças entre hino e marcha.

No desenvolvimento da pesquisa encontrámos, particularmente no Séc. XIX, vários hinos patrióticos que, não tendo cariz militar, entendemos enquadrarem-se no espírito que presidiu ao lançamento do Projecto. Daí o âmbito mais alargado e o título escolhido "Hinos Patrióticos e Militares Portugueses", com cerca de três centenas de obras.

Apenas encontrámos este tipo de hinos a partir do Séc. XIX, o primeiro dos quais com a melodia do Hino Inglês, cantado em Lisboa em 1809. Antes disso, em 1775, aquando da inauguração da estátua de D. José no Terreiro do Paço, foi cantado um hino de autor desconhecido, em cerimonial profusamente descrito em publicações da época, mas que apenas inserem a letra, sendo omissas quanto à partitura, lacuna já assinalada por investigadores dedicados à pesquisa nesta área.

Assim, esta Colectânea contém essencialmente hinos portugueses de Cariz marcial (nem sempre de âmbito estritamente militar) dos séculos XIX, XX, XXI. Mas nela se incluem algumas marchas que evoluíram para hinos e, nos casos em que a mesma entidade teve hino e marcha (como os Voluntários da Carta e os Sapadores de Caminhos de Ferro), decidimos publicar os dois.

Os hinos são em regra de autores (músicos e poetas) portugueses e escritos em língua portuguesa. Mas há excepções, que entendemos justificadas. Dois hinos (às rainhas D. Maria I e D. Maria II) são tocados "com a melodia do hino inglês "God Save the King", como era hábito fazer-se; outro (escolhido entre vários) tocado com a música do Hino de Riego, que foi hino nacional durante a república espanhola; outros compostos por músicos estrangeiros radicados ou que viveram em Portugal, quase todos italianos (Caril Daddi, Frondoni); e ainda outro, composto para ser cantado em Paris na inauguração do busto de Camões, em 1912, com música e letra de autores franceses.

Seleccionámos vários hinos que foram cantados mas cuja representação musical não conseguimos encontrar; e outros com partitura mas sem letra, nalguns casos também por não ter sido localizada. Na dúvida optámos por incluir todos os hinos tornados credíveis pela existência de partitura; e, naqueles em que não encontrámos a música, considerámos os que têm refrão, sinal de que era cantado.

Aqueles que, por razões diversas, entendemos não incluir com o destaque dos restantes, estão referenciados em capítulo próprio, podendo ser facilmente consultados nas bibliotecas e arquivos onde os localizámos. Estão neste caso algumas obras designadas como hinos, mas que não passam de odes ou elegias de carácter poético; e outros entre os muitos compostos no final do Séc. XIX e dedicados à família real, como o Rei D. Pedro V e a Rainha D. Maria Pia.

Tivemos grandes dificuldades (muitas não resolvidas) na datação das obras. O desaparecimento de editoras de referência (como a Casa Sassetti) provocou um vazio difícil ultrapassar e a própria Biblioteca Nacional chega a admitir intervalos de 20 anos. O mesmo se passa com o reconhecimento dos autores. Entre considerar "autor desconhecido" ou "anónimo", preferimos utilizar a norma genérica "sem autoria expressa".

Como forma de apresentação, não tendo encontrado outra mais lógica ou coerente, optámos pela ordem cronológica, pese embora a já referida dificuldade de datação. Nalguns destes casos, como os dedicados a D. Nuno Álvares Pereira, decidimos inseri-los todos juntos.

A apresentação foi complementada com a inclusão de índices – geral, onomástico, geográfico, cronológico e alfabético-musical. este pelo primeiro verso da letra e a correspondente frase da melodia.

As partituras foram transcritas através de um programa informático e, em regra, contêm apenas as partes cantadas. Foi um trabalho complexo, demorado, meticuloso e muito exigente, que importa destacar.

Todos os textos foram objecto de actualização ortográfica, utilizando-se a grafia anterior ao acordo de 2009; mas nalguns casos foi mantida a pontuação da época (nomeadamente vírgulas, negrito ou itálico), bem como a elisão de letras em certos versos, procurando manter o sentido enfático pretendido pelo autor.

Os hinos estão normalmente ligados ao contexto histórico da época em que foram compostos, pelo que inserimos um trabalho de síntese com essa interligação. "Os Hinos na História de Portugal", embora muito esquemático, permite já entender alguma da evolução verificada.

Em cada hino é indicado o título completo (em regra, no Séc. XIX, extenso e laudatório); indicações sobre a personalidade, evento, organismo ou unidade militar a que se refere; dados sobre os autores da música e letra; e cotas ou referências bibliográficas.

Nos casos em que tal se justifica, essas indicações remetem para um Anexo onde os dados (pessoais ou históricos) são complementados em breves sínteses biográficas ou relativas ao evento ou à entidade a que respeita.

A pesquisa incidiu particularmente na Biblioteca Nacional (BNP), muito rica em hinos do Séc. XIX e no Arquivo Histórico Militar (AHM), com especial incidência no Séc. XX. Mas também na Biblioteca Central de Marinha (BCM) e nas bibliotecas da Academia das Ciências de Lisboa (ACL), do Palácio Nacional da Ajuda (BPNA), do Palácio Nacional de Mafra, da Sociedade de Geografia de Lisboa (SGL), do Conservatório Nacional (CN), da Universidade Nova de Lisboa (UNL) e da Universidade Católica Portuguesa (UCP, Biblioteca João Paulo II), todas muito ricas em história e onde foi possível confirmar dados ou eliminar lacunas e mesmo, nalguns casos infelizmente raros, datar algumas obras. Não foi possível estender a pesquisa a bibliotecas fora de Lisboa, nem consultar os jornais da época (particularmente importante para o Séc. XIX).

No decorrer da pesquisa encontrámos diversas obras cujos autores tiveram a preocupação de reunir as peças de música de produção nacional, mas quase sempre limitadas à poesia, faltando a componente musical que permitisse elaborar uma Colectânea completa.

Dois Autores, todavia, marcam a diferença.

No Séc. XIX, o Padre César Augusto Pereira das Neves, com o "Cancioneiro de Músicas Populares", que reúne em três volumes (editados em 1893, 1895 e 1899) os 75 fascículos (com 622 melodias) que tinham sido publicados separadamente; e, no Séc. XX, o Capitão Manuel Ribeiro, com o "Cancioneiro Militar Histórico e Patriótico da Nação Portuguesa", continuado a partir da sua morte (em 1949) pelo Capitão Custódio Rodrigues Gouveia, com nove volumes manuscritos existente no Arquivo Histórico Militar e que se mantém inédito.

Talvez pelas enormes dificuldades a vencer, nunca terá sido possível concretizar a publicação de uma Colectânea como a que agora se apresenta.

Era algo que tinha de ser feito e uma obra que devia ser publicada. Daí o termos assumido este desafio mas, com todas estas condicionantes, é natural que haja lacunas, erros, omissões.

Humildemente nos penitenciamos e apelamos a quem tenha dados que permitam fazer correcções, que nos alertem.

E que alguém, a partir da nossa pesquisa, a aprofunde e leve por diante um trabalho mais completo.

ALBERTO RIBEIRO SOARES

 
 

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