Alberto Ribeiro Soares et alii, Hinos Patrióticos e Militares Portugueses, Estado-Maior do Exército e Maisimagem, Ldª, Lisboa, 2010, 354 págs., ISBN 978-989-97013-0-4.

Uma breve referência ao séc. XX

SÍNTESE HISTÓRICA

Na primeira década do Século a agitação agudizou-se, mas o advento da República não trouxe a paz interna que se preconizava. Em 5 de Outubro de 1910 a Monarquia, antiga de 800 anos, caiu em menos de 24 horas, sem braços nem baionetas que a defendessem.

O novo regime logo se institucionalizou e a assembleia constituinte escolheu também novo hino e bandeira nacionais, tudo em 1911. Mas, vítima das suas contradições, falta de quadros, perseguições e vinganças que logo encetou, hostilização da Igreja e falta de apoio interno, cedo entrou numa espiral de anarquia social e política. Os anos seguintes foram uma sucessão de calamidades que deixaram o país exangue, e que a entrada na Guerra Mundial, em quatro frentes, mais agudizou. A história dos 16 anos da I Republica foi marcada por oito chefes de Estado (só um concluiu o mandato), 52 governos, oito parlamentos (cinco deles violentamente dissolvidos) e 11 ditaduras, pelo que só em cinco anos se conseguiu cumprir a Constituição aprovada em 1911.

Apesar de tudo e arrostando com as maiores dificuldades, o Exército e a Armada (e também a diplomacia), foram conseguindo salvaguardar o património colonial e pacificar as populações. Puderam também organizar-se para imporem mais uma ditadura militar, a 28 de Maio de 1926, que levaria Carmona a Presidente da República em 1928. O impasse político criado e, sobretudo, uma crise financeira gravíssima, só começaram a ser ultrapassados em 1928, com a entrega a Salazar da pasta das Finanças. Nos quatro anos seguintes consolidou a sua influência o que, associado aos fenómenos políticos contraditórios que ocorriam na Europa e no Mundo, o levaram à Presidência do Conselho em 1932. Aprovada a Constituição de 1933 e o Estatuto do Trabalho, inicia-se o Estado Novo, que duraria mais de quatro décadas, atravessando períodos conturbados, como a guerra civil de Espanha, a Segunda Guerra Mundial, a adesão de Portugal à NATO (1949), a entrada na ONU (1955) e a independência de muitos países africanos, além de várias tentativas de derrube do regime. O início da guerra em Angola, seguida do episódio do Santa Maria, da revolta de Beja e da queda da Índia (com as suas trágicas sequelas) – tudo em 1961 – tinham posto a descoberto as fragilidades do regime. Com o alastramento da subversão à Guiné (1963) e a Moçambique (1964) e com a abertura da frente Leste em Angola (1966), a situação agrava-se mas a guerra continuaria até 1975.

O 25 de Abril de 1974 não teve origem num diferendo ideológico, ao contrário de levantamentos militares anteriores. O alcance do golpe não terá sido bem avaliado, perdendo-se o controle dos acontecimentos e os militares dividiram-se. O golpe de estado degenerou em revolução e o poder degradou-se. E, contrariando as tendências de outros movimentos militares do passado em Portugal, o Movimento dos Capitães institucionalizou-se como Movimento das Forças Armadas, procurando estabelecer uma estratégia para os objectivos definidos, fim da guerra, descolonização, democracia baseada em partidos políticos. E voltou a ser a Instituição Militar que conseguiu evitar a guerra civil, em 25 de Novembro de 1975.

Durante o Séc. XX as sucessivas perdas de território começaram em Julho de 1954 com a ocupação de Dadrá e Nagar-Aveli (distrito de Damão) pela União Indiana através do movimento dos "satyagrahis"; em Agosto de 1961, com a destruição e abandono de S. João Baptista de Ajudá (pequeno forte no interior do Daomé, antiga colónia francesa, hoje Benin); em Dezembro de 1961, com a queda do Estado Português da Índia; e com as independências da Guiné (em 1974), S. Tomé e Príncipe, Moçambique, Cabo Verde e Angola (em 1975). Timor declarou unilateralmente a independência em 29 de Novembro de 1975 e foi logo ocupado pela Indonésia, só se tornando independente em 2002; e a administração de Macau foi devolvida à China em 1999.

Em 1975 Portugal deixou de ter um império, ficou reduzido a 6% do território e a 35% da população que tinha antes e a situação social, política e económica levou cerca de 10 anos a estabilizar. O abandono do Ultramar conduziu naturalmente à aproximação à Europa, formalmente consagrada com a adesão à Comunidade Económica Europeia (em 1986), que entretanto evoluiu para Comunidade Europeia e mais tarde para União Europeia (UE). No final do século Portugal era um dos 19 estados membros da União Europeia.

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SÍNTESE MILITAR

No Séc. XX, Portugal não travou guerras no seu território continental europeu, onde os militares apenas estiveram envolvidos em levantamentos, revoluções e golpes de Estado de curta duração.

Em África continuaram as campanhas de pacificação iniciadas na última década de Oitocentos, até que, na Guerra Mundial de 1914-1918, estivemos envolvidos em quatro frentes, Angola, Moçambique, França e Atlântico. Em França combateu o CEP (Corpo Expedicionário Português), um Corpo de Exército a duas divisões e tropas de apoio, e também, pela primeira vez, a incipiente aviação portuguesa, que ali teve o seu baptismo de fogo. No norte de Moçambique e no sul de Angola, confinantes com territórios coloniais alemães, as acções militares foram de alguma envergadura; e no Atlântico foi importante a acção da Marinha, com perdas significativas. No total, foram empenhados nesta guerra 105.542 portugueses (incluindo as tropas coloniais), sendo mobilizados no Continente cerca de 82.000 homens. O número de baixas, em todas as frentes, ascendeu a 38.012, sendo 7.760 mortos, 16.607 feridos e incapazes, 13.645 prisioneiros e desaparecidos.

Portugal manteve a neutralidade na II Guerra Mundial (1939-1945), mas esteve envolvido com a cedência de bases nos Açores (aos Aliados) e viu ocupado Timor pelos australianos e, depois, invadido pelos japoneses. O Exército chegou a ter um efectivo de 130.00 homens (em 1943), com três divisões completas no Continente e efectivos mobilizados para os Açores (26.500), Madeira (3.400), Cabo Verde (6.700), Angola e Moçambique, cerca de 20.000; e, no final da guerra, um batalhão para a reocupação de Timor (1945) e outro para Macau (1946), face à guerra civil chinesa.

Com a independência e as consequentes reivindicações territoriais por parte da União Indiana, o Estado Português da índia foi reforçado, chegando a ter cerca de 12.500 homens em 1957. Mais tarde reduzido, o contingente pouco ultrapassava os 4.000 homens à data da invasão, em Dezembro de 1961, com forças navais exíguas e sem meios aéreos.

Entretanto começara em 1961 a guerra de África, que só terminaria em 1975, e durante a qual foram empenhados quase um milhão de portugueses. Nesse período foram mobilizadas (do Continente Açores e Madeira) para Angola, Moçambique e Guiné 2.473 unidades constituídas de escalão companhia ou superior e 1.131 de escalão inferior (totalizando 3.604), com comissões de dois anos e rendição colectiva (do Exército); meios navais e unidades de Fuzileiros (13 companhias e 15 destacamentos de Fuzileiros Especiais), que mantiveram a mesma constituição durante todo o período, sendo o pessoal rendido individualmente (Marinha); meios aéreos e unidades de Pára-quedistas (quatro batalhões e 12 companhias), também de constituição permanente e rendição individual (Força Aérea). Além das forças da guarnição normal desses territórios, guarnecidas por militares do recrutamento local e bem assim a construção e montagem das infra-estruturas e dos meios logísticos necessários ao apoio das tropas. Nestes teatros de guerra as nossas tropas sofreram 8.290 mortos (sendo 4.027 em combate) e cerca de 30.000 feridos.

No mesmo período foram enviadas pelos três Ramos tropas para reforço das guarnições Cabo Verde, S. Tomé e Príncipe, Macau e Timor, tendo o Exército mobilizado 80 unidades de escalão companhia ou superior e 94 de escalão inferior (totalizando 174), com comissões de dois anos e rendição colectiva.

Em 1974, as Forças Armadas chegaram a ter 217.000 homens, sendo 179.000 do Exército, 19.500 da Armada e 18.500 da Força Aérea.

Após um interregno de relações difíceis de quase duas décadas, iniciou-se a cooperação técnico-militar entre Portugal e os novos países de expressão portuguesa, designadamente na estruturação das novas forças armadas da Guiné-Bissau, Cabo Verde e Moçambique (em 1990), S. Tomé e Príncipe (1991) e Angola (1994).

Também no cumprimento de compromissos internacionais (ONU, NATO, União Europeia e outros), Portugal participou em variadas missões de paz ou de cooperação técnico-militar, quer com unidades constituídas, meios aéreos e navais, destacamentos ou simples observadores, sendo de destacar o empenhamento no Sara Ocidental (desde 1991), na ex-Jugoslávia (Bósnia-Herzegovina, Sérvia e Kosovo, desde 1992), Moçambique (desde 1993), Angola (desde 1994) e Timor-Leste (desde 1999) que continuaram na transição do século. E ainda em missões de ajuda humanitária em quatro continentes (excepto América).

Em termos estruturais, o Séc. XX foi marcado pelas grandes reformas de 1911 (que, entre outras, estabeleceu o serviço militar obrigatório e pessoal); de 1937 (chamada "de Santos Costa", cuja organização sustentou toda a guerra de África); e de 1993 que, em várias fases, pôs fim ao serviço militar obrigatório e criou o serviço militar feminino; pela criação da Força Aérea, nela se integrando a Arma de Aeronáutica (do Exército) e a Aviação Naval; e pela criação de forças especiais de Pára-quedistas (1955), Fuzileiros navais (1960) e Comandos (1962).

 
 

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