Acesso à hierarquia superior.

Henrique J. C. de Oliveira, Gramática da Comunicação, Col. Textos ISCIA, Aveiro, FEDRAVE, Vol. I, 1993, 311 pp., Vol. II, 1995, 328 pp.


III

Linguística
Linguagem, língua, fala e discurso
 

 

Conceito de linguística; linguagem; linguagem humana e linguagem animal; diferenças entre a linguagem humana e a linguagem animal; os factores da comunicação; as funções da linguagem; conceitos de língua, fala ou acto de  fala e discurso. Textos complementares e sugestões de trabalho.

 


FUNÇÕES DA LINGUAGEM


Figura 16: As funções da linguagem segundo Herculano de Carvalho.

Ligado a cada acto de comunicação anda associada uma determinada intenção por parte do sujeito falante. O sujeito emissor, quando fala, procura obter um determinado resultado, procura transmitir um conhecimento, uma ordem ou um desejo, ou, simplesmente, exteriorizar um estado de alma, uma emoção ou sentimento. Significa isto que, associado ao acto de comunicação, encontramos toda uma série de funções, que englobamos sob a designação de funções da linguagem.

Se consultarmos a obra Teoria da linguagem, de Herculano de Carvalho, verificaremos que o Autor nos apresenta dois grandes tipos de funções: a função interna e a função externa.

A função interna é aquela que o ser humano realiza em primeiro lugar, mantendo-se praticamente pela vida fora. De facto, e dado que a linguagem humana, como já vimos, não é hereditária,  a função interna começa a realizar-se desde o momento em que o ser humano nasce, pois é por ela que a criança adquire os conhecimentos e aprende a falar, mantendo-se depois ao longo de toda a sua vida. A função interna consiste, pois, na aquisição de conhecimentos, visto que, ao longo de toda a vida, cada sujeito falante vai adquirindo novas palavras e novos conhecimentos. Herculano de Carvalho considera mesmo que a função interna é a função primária da linguagem, uma vez que é através do conhecimento que cada indivíduo se realiza plenamente como ser humano, sendo este conhecimento que distingue o Homem dos outros animais. Entre a função interna e a externa há, segundo ele, uma relação de prioridade, na medida em que a função interna precede a exteriorização. E esta precedência não é de natureza cronológica: não há primeiro o conhecimento e depois uma exteriorização; ela é apenas de carácter ontológico, na medida em que é o conhecimento e não a acção o que constitui a verdadeira causa final da linguagem.

A função externa consiste na manifestação ou exteriorização de toda uma série de conteúdos. Segundo a relação Emissor/Receptor, H. de Carvalho considera a pura manifestação e a manifestação para outrem ou

comunicação, sendo a segunda, do ponto de vista das funções externas, o cerne ou função primária da linguagem. De facto, a comunicação é a função primária da linguagem e opõe-se à pura manifestação. Enquanto esta não permite a realização de comunidade, dado que se restringe ao próprio indivíduo, a manifestação para outrem ou comunicação dá lugar à permuta de conhecimentos, permitindo assim a existência de comunidade. A pura exteriorização restringe-se ao próprio indivíduo e constitui, na sua essência, aquilo que designamos por monólogo. Mas a pura exteriorização, na prática, não existe, dado que, numa situação de monólogo, o sujeito falante como que se desdobra, transformando-se simultaneamente num emissor e num receptor. Por isso, no fundo, um monólogo acaba por se transformar num diálogo, ainda que incompleto, visto que o receptor não é mais do que o desdobramento do próprio emissor. Pode-se por isso afirmar que a pura manifestação ou monólogo é um acto de linguagem que tende para o puro monólogo sem nunca o atingir.

H. de Carvalho reflecte também sobre o papel e diferentes aspectos assumidos pelo monólogo, considerando que, no monólogo expressivo, há também um monólogo apelativo e um monólogo informativo. O monólogo apelativo realiza-se quando, estando-se só e tendo de se tomar uma resolução, escolhendo um caminho a seguir dentre vários que se nos apresentam, na nossa mente se trava um «diálogo», no qual pesamos os prós e os contras das diferentes opções, antes de tomarmos a decisão. O monólogo informativo, no qual se realiza a função informativa, ocorre no pensamento  discursivo,  muito frequente  quando  estudamos,  em que as palavras se produzem quase sempre em silêncio, embora nos pareça que as estamos a ouvir na nossa mente.

Na manifestação para outrem, tendo em conta a natureza dos conteúdos manifestados, H. de Carvalho considera apenas três funções, indicadas na figura 16. Antes de analisarmos cada uma delas, dado que estas têm suscitado várias reflexões e que não são mais do que o desenvolvimento do esquema triádico de Bühler, vejamos de que modo as funções da linguagem têm sido encaradas por outros linguistas. KARL BÜHLER, na sua teoria da linguagem[13], apresenta essencialmente três funções. Diz-nos ele que «tripla é a função da linguagem humana: manifestação, repercussão e representação», preferindo, actualmente, os termos «expressão, apelo e representação».


Figura 17: Funções da linguagem e correspondentes factores da comunicação.

Roman JAKOBSON[14] considera a existência de seis funções da linguagem, em vez das três apontadas por Bühler, correspondentes aos seis factores da comunicação. A partir do modelo triádico de Bühler, que Jakobson retoma, chega o autor às restantes funções da linguagem, correspondentes aos seis factores e cujo esquema está representado no quadro da figura 17. Em letras maiúsculas encontram-se as funções da linguagem; em minúsculas, os factores da comunicação sobre os quais incidem as seis funções.

Embora, analisando o esquema, se possa pensar que cada função se verifica de modo independente, a verdade é que as funções da linguagem não se realizam com a linearidade que o esquema dá a entender. Numa mesma mensagem, podemos encontrar simultaneamente diversas funções, muito embora uma delas seja a predominante para dado tipo de mensagem. Tal como nos diz Jakobson, «embora distingamos seis aspectos básicos da linguagem, dificilmente lograríamos, contudo, encontrar mensagens verbais que preenchessem uma única função».  O que acontece é que, embora existindo mais do que uma função, há uma que é a predominante, de acordo com o tipo de mensagem produzido.

Vejamos agora cada uma das funções da linguagem em pormenor.


a)
   Expressão ou função emotiva ou expressiva

Esta função dá vazão  a conteúdos de natureza emotiva. Está centrada no sujeito emissor e caracteriza-se por ser uma expressão directa da atitude do emissor em relação àquilo de que fala.  Em textos escritos, percebem-se esses conteúdos de natureza emotiva pelo uso de interjeições, de exclamações e até mesmo pelo uso de adjectivos carregados de subjectividade e de certos diminutivos, etc.

 

b)    Apelo ou função apelativa, conativa, imperativa ou volitiva

 Embora se empregue mais correntemente a expressão «função apelativa», não podemos ignorar as outras designações menos frequentes para a mesma função da linguagem. Esta função está orientada para o destinatário ou sujeito receptor e nele centrada. Veicula conteúdos de natureza volitiva, que exigem ou procuram levar o sujeito receptor a reagir.  Procura, pois, actuar sobre ele, influenciando o seu modo de pensar, o seu comportamento, e levando-o à acção. Na linguagem é visível esta função através de diversas marcas, tais como o recurso ao imperativo, ao vocativo, ao apelo. É o que sucede, por exemplo, na linguagem publicitária, que procura, por mil e uma maneiras, por vezes até mesmo de modo bastante subtil, levar o receptor à aquisição dos produtos publicitados.

 

c)    Informação  ou função informativa, referencial, cognitiva ou  denotativa.

Esta função está centrada no contexto e ocorre sempre que o sujeito emissor procura veicular de maneira directa e objectiva conteúdos de natureza cognitiva. É esta a função dominante na maioria das mensagens. Encontramo-la em todos os textos de carácter científico, de carácter didáctico e nas notícias dos diferentes órgãos de informação, onde o acontecimento deve ser apresentado de maneira completa e em linguagem clara e objectiva.

 

d)    Função fática

A função fática tem por objectivo procurar   estabelecer,  manter ou interromper a comunicação.  Através dela os sujeitos falantes procuram verificar se o canal de comunicação está operacional ou, frequentemente, verificar até que ponto o interlocutor está interessado naquilo que lhe estamos a transmitir.  Está igualmente presente na mente do nosso interlocutor, quando, à medida que falamos, nos vai acenando com a cabeça ou procurando dar a entender que está a acompanhar e a compreender o que lhe estamos a dizer. Está perfeitamente patente quando a comunicação se realiza através de um meio de comunicação à distância, como, por exemplo, quando usamos o telefone.  Daí toda a série de expressões tais como «olhe lá», «está?», «está a ouvir-me?», «está bem?», «está a compreender?», «está a ver?», «sim... sim...», «pois... pois», «escute»,  «ouça lá», etc.

 

e)    Função metalinguística

Esta  função está centrada no código e   realiza-se quando os sujeitos falantes   emissor e/ou receptor   procuram ou necessitam de averiguar se ambos utilizam o mesmo código linguístico. Sempre que, ao longo de um texto, recorremos a expressões tais como «isto é», «ou seja», «quer isto dizer», «isto significa que», etc., ou quando reflectimos sobre o sentido de determinado vocábulo ou sobre qual o vocábulo mais adequado para  exprimirmos um determinado conceito, estamos a realizar a função metalinguística. Esta visa, portanto, uma correcta utilização do código e, consequentemente, uma comunicação isenta de ruído.

 

f) Função poética

Esta função está centrada na própria   mensagem, sendo dominante, mas não exclusiva, da linguagem literária, ao passo que noutras formas de actividade verbal o seu papel é secundário. Sempre que, num texto, recorremos às correspondências sonoras, ao ritmo, a certos recursos estilísticos, a determinadas imagens e metáforas, etc., temos presente a função poética da linguagem. Significa isto que tanto a podemos encontrar em textos em verso como em prosa.


Figura 18: Funções interna e externa da linguagem.

Comparando as funções anteriormente apresentadas de Herculano de Carvalho e de Jakobson , somos levados a concluir que os esquemas apresentados, sendo incompletos isoladamente, em conjunto dão-nos uma noção mais completa das funções da linguagem, permitindo-nos chegar ao esquema apresentado na figura 18. Observando o esquema proposto, encontramos representada à esquerda a função interna da linguagem e, à direita, a função externa ou comunicação. A função interna é a primeira a ser realizada por todos os sujeitos falantes a, b, c, ...n e permanece por toda a vida. E é pelo contacto com todos os sujeitos falantes que o rodeiam que cada ser humano vai adquirindo a competência linguística. Só depois de adquirida, ao fim de algum tempo, essa competência ele pode realizar de modo consciente a função comunicativa ou externa da linguagem. E dizemos de "modo consciente", porque comunicação existe desde o momento em que o ser humano nasce. O choro na criança de tenra idade é já uma forma de comunicação, na medida em que os pais reagem a esse sinal sonoro, interpretando-o como sinal de uma necessidade vital da criança. Há, pois, já uma forma de comunicação, embora primitiva, instintiva e não verbal. Só ao fim de alguns meses, pela observação do mundo que a rodeia, a criança vai adquirindo mecanismos conscientes para a comunicação, começando, a pouco e pouco, a adquirir o código linguístico dos pais e restantes elementos da comunidade linguística em que está inserida. E depois, ao longo de toda a sua vida, o ser humano vai realizando quer a função interna, quer a função externa, comunicando com os restantes elementos da sociedade em que vive e dela recebendo elementos de variada índole, que o vão enriquecendo culturalmente.  E o suporte linguístico será o meio por excelência para aceder a todas as formas de cultura, donde a necessidade de termos uma noção e domínio perfeitos da arte de nos exprimirmos, quer no domínio da oralidade, quer no domínio da escrita[15].

 

LÍNGUA, FALA E ACTO DE FALA

São muitas as definições que  poderemos encontrar para este conceito. Segundo Celso Cunha, por exemplo, a «língua é um sistema gramatical pertencente a um grupo de indivíduos. Expressão da consciência de uma colectividade, a língua é o meio por que ela concebe o mundo que a cerca e sobre ele age».[16]


Figura 19: O acto de fala produz um texto, o qual pode ser fixado.

Para Ferdinand de Saussure, língua não se confunde com linguagem, pois não é mais do que uma parte desta, ainda que essencial. A língua é simultaneamente «um produto social da faculdade da linguagem e um conjunto de convenções necessárias, adoptadas pelo corpo social para permitir o exercício desta faculdade entre os indivíduos».[17]

A língua é, portanto, o resultado da vida social da colectividade, é o sistema de linguagem por ela criado e, como tal, constitui como que um ser vivo em constante mutação, em permanente evolução.  Significa isto que, uma vez que é o produto da sociedade, sofre como ela uma permanente evolução, fazendo com que apresente variações não apenas de região para região, dentro do plano sincrónico, mas igualmente através dos tempos.

A linguagem verbal, isto é, falada, realiza-se através da língua, variável de país para país (português, no caso de Portugal e países de expressão portuguesa, francês, no caso da França, etc.) e exterioriza-se mediante actos de fala.

Cada acto de fala produz um texto, o qual pode ou não ser fixado, quer por meio de um registo escrito, quer por sistemas de registo sonoro.

Sempre que utilizamos uma dada língua, português, espanhol, francês, inglês, etc., estamos a produzir actos de fala. Significa isto que fala ou acto de fala é a realização individual da língua, fruto da necessidade de comunicação. Cada acto de fala depende do sujeito falante, depende daquele que o pratica, pelo que varia de acordo com os seus conhecimentos, situações, vontade, etc. A fala difere da língua pelo facto de que, enquanto esta é produto da colectividade, da sociedade, a fala é o produto de um acto individual, dependente da vontade, inteligência e conhecimentos de cada sujeito falante.

Discurso  Segundo certos autores,[18] discurso é a língua no acto de  fala, na execução individual, donde o podermos concluir que fala  ou discurso são dois termos que designam o mesmo: a realização individual da língua.

No entanto, embora discurso e fala sejam, no fundo, sinónimos, é de uso corrente empregar-se o vocábulo discurso para indicar os diferentes tipos de registo de fala ou, como também são designados, registos de língua. Assim, uma determinada pessoa pode empregar, na realização do acto de fala, um:

discurso de 1ª, 2ª ou 3ª pessoa;

discurso directo, indirecto ou indirecto-livre;

um determinado nível ou registo de língua: gíria, calão, familiar, corrente, etc.

 

Para conclusão desta matéria, nada melhor do que transcrevermos algumas palavras de Tatiana Slama-Casacu:[19]

«A língua é a criação, mas também o fundamento da linguagem que não poderia funcionar sem ela , é, simultaneamente, o instrumento e o resultado da actividade de comunicação.  Por outro lado, a linguagem não pode existir, manifestar-se e desenvolver-se a não ser pelo aprendizado e pela utilização de uma língua qualquer. A mais frequente forma da manifestação da linguagem constituída por uma complexidade de processos, de mecanismos, de meios expressivos é a linguagem falada, concretizada no discurso, ou seja, a realização verbal do processo de comunicação.  O discurso é um dos aspectos da linguagem o mais importante e, ao mesmo tempo (...), a forma concreta sob a qual se manifesta a língua.  O discurso define-se, pois, como o acto de utilização individual e concreto da língua no quadro do processo complexo da linguagem.  Os três termos estudados linguagem, língua, discurso designam no fundo três aspectos, diferentes mas estreitamente ligados, do mesmo processo unitário e complexo.»

 

Sugestão de trabalho 7

Leia os dez textos que a seguir lhe são apresentados e procure identificar as funções da linguagem neles presentes. Lembre-se que, embora predominando uma só função em certos textos, noutros poderá encontrar mais do que uma, podendo tornar-se difícil dizer qual a que predomina.  Nestes casos, procure identificar as funções presentes ao longo dos textos.

 

Texto 1:

Prédio de 9 andares ruiu copiosamente

Um edifício de nove andares, ainda em fase de acabamento, ruiu ontem de madrugada na Rua Capelo de Brito, em Matosinhos. O edifício, que se encontrava desabitado, ficou reduzido a um monte de entulho, não se tendo registado, todavia, quaisquer acidentes pessoais.

O aluimento do prédio deu-se pouco depois das três horas da manhã de ontem, e, embora bombeiros e autoridades estejam a investigar a ocorrência, ainda não foi encontrada qualquer explicação plausível para o sucedido.

Sabe-se apenas que o prédio é de construção bastante recente e que o primeiro inquilino a habitá-lo devia mudar-se para ali na próxima quarta-feira.

Em consequência do aluimento, uma grua que se encontrava nas imediações do prédio foi arrastada, tendo atingido outro edifício localizado numa zona contígua à sinistrada.

Um informador dos bombeiros referiu que tudo indica que o piso onde o edifício estava tenha cedido e, consequentemente, os alicerces do prédio não aguentaram e acabaram por ruir.

A Polícia de Segurança Pública de Matosinhos proibiu a circulação de automóveis na Rua Brito Capelo, enquanto operários da obra e populares procederam, durante toda a manhã de ontem, à remoção dos escombros do imóvel que ruiu.

Extraído de um jornal diário.

 

Texto 2

CONVERSA  TELEFÓNICA

(Ouve-se discar um número telefónico)

ELE - Está? ... Alô? ... Está? ...

ELA - Sim ... Quem fala?

ELE - Está?  És tu? És tu, Ana Luísa?

ELA - Sim, quem fala?

ELE - Daqui é o Carlos.

ELA - Ah!... És tu, amor?!

ELE - Sim!  Sou eu mesmo.  Ouve lá: chegaste bem a Lisboa? Não há novidade?

ELA - Como?  Se fui passear à cidade?

ELE - Não, não é isso. Pergunto se chegaste bem a Lisboa, se não há novidade.

ELA - Ah! Já ouvi. Cheguei, cheguei muito bem. A viagem foi óptima. Está. Estás a ouvir-me?

ELE - Sim. Continua. Ouve-se mal, mas dá ainda para perceber.

ELA - Pois!  A viagem foi óptima. Cheguei bem, embora um pouco cansada. Os meus tios estavam à espera.

ELE - Quem? O quê? Os teu fios?!

ELA - Não, disse que os meus tios estavam à minha espera. Estão bons.

ELE - Olha... Luísa? Estás a ouvir-me? Eu ouço muito mal. É melhor desligar. Às oito horas volto a ligar para aí. Está bem?

ELA - Certo! À hora esperarei o teu telefonema. Ciao! Até logo, querido.

ELE - Adeus, até logo.

 

Texto 3

NA FEIRA POPULAR

Hoje vamos todos sair disse o pai.

Que bom! ... Onde vamos?

Vamos à Feira Popular.

As crianças saltaram todas de alegria, perante a perspectiva de um dia diferente e bem passado.

Chegaram à feira. Viram um homem que engolia mechas a arder.

Que horror! Que impressão que aquilo me mete! disse a mãe dos miúdos, fazendo uma careta de aflição. Passada esta primeira emoção, chegaram ao comboio fantasma.

Paizinho, vamos andar, sim? pediram os miúdos em grande algazarra, onde se notava enorme excitação.

Andaram. Apanharam alguns sustos, mas gostaram. À saída:

Foi tão bom! Mas apanhei um grande susto, quando o macacão me atirou com o cacho das bananas à cara. Mas gostei tanto! disse o João, o filho mais novo, não escondendo a sua emoção.

Depois da feira e chegados a casa, as crianças não falavam de outra coisa: a feira, com todas as suas diversões e cores brilhantes dos reclames.

Texto adaptado de um trabalho apresentado por uma aluna da turma A do 8º Ano, em 1978/79.

 

Texto 4

CAMISOLA ORIGINAL

Fuja ao convencionalismo  das decorações uniformes, impessoais, e escolha uma estampa ou um texto ao seu gosto para a sua camisola.

Para os mais novos, há bonecos divertidíssimos, que poderá gravar juntamente com o nome do seu filho. Para si, que tem gostos mais requintados, pode escolher motivos florais ou mesmo desenhar, caso tenha habilidade, a sua própria gravura.  Vá, pois, à Feira Popular e aproveite a oportunidade, junto dos "standes" da especialidade, para oferecer a si mesmo uma camisola original.

 

Texto 5

BOLETIM METEOROLÓGICO

Tempo, hoje.  Situação do tempo.

Em Portugal continental, o céu estava geralmente muito nublado.  O vento era fraco ou moderado e predominava a Oeste.  Caíam aguaceiros em vários locais. Temperaturas extremas: Monte Estoril, máxima 16;  Penhas da Saúde, mínima 6.

Previsão geral até às vinte e quatro horas de amanhã: aguaceiros, alternando com abertas, possibilidade de trovoada, em especial nas regiões montanhosas, vento fraco ou moderado, predominando de noroeste.

Amanhã, o Sol nasce às oito horas e vinte e cinco minutos; o ocaso às dezanove e dezassete minutos.

De um jornal diário.

 

Texto 6

BOLETIM METEOROLÓGICO

  Tempo

  hoje. 

  Situação do tempo.

  Em Portugal

  continental

  o céu

  estava geralmente muito nublado.

  O vento

  era fraco ou moderado

  e predominava a Oeste.

  Caíam aguaceiros em vários locais.

  Temperaturas extremas:

  Monte Estoril, máxima 16;  Penhas da Saúde, mínima 6.

  Previsão geral

  até às vinte e quatro horas de amanhã:

  aguaceiros

  alternando com abertas, possibilidade

  de trovoada

  em

  especial nas regiões montanhosas

  vento fraco

  ou moderado

  predominando

  de noroeste.

  Amanhã

  o Sol

  nasce às oito

  e vinte e cinco

  minutos

  o ocaso

  às dezanove

  e dezassete

  minutos.

  De um jornal diário.

  Dito por Mário Viegas.

 

Texto 7

 

BEN - Anda. Vai acendê-la.

GUS - Acender o quê?

BEN - A chaleira.

GUS - O gás, queres tu dizer.

BEN - Quem é que quer dizer gás?

GUS - Tu.

BEN - Se  eu te  disse  para ires acender a chaleira, era porque queria que tu fosses acender a chaleira.

GUS - Como é que se pode acender uma chaleira?

BEN - É uma maneira de dizer!

GUS - Nunca ouvi.

BEN - Acender a chaleira?  É uma expressão usadíssima.

HAROLD PINTER, O monta-cargas. (Trad. de Luís de Sttau Monteiro).

 

 

Texto 8 

País, país...  uma feira no Sabugal

Uma equipa do nosso jornal televisivo deslocou-se esta semana à vila do Sabugal, a fim de aí registar algumas imagens da Feira Nova, que todos os anos se realiza nesta vila, no primeiro dia de Setembro.

Este ano a feira esteve excepcionalmente concorrida, para o que terá contribuído, entre outros factores, o excelente dia de sol. Efectivamente, registou-se, sem sombra de dúvida, uma elevada afluência de feirantes, quer de vendedores, vindos dos mais diversos locais e regiões do país, quer de compradores, provenientes não só do concelho, mas de toda a região limítrofe.

A feira estendeu-se por vasta área da vila, desde o largo dos bombeiros, até à alameda do cemitério e terrenos em redor. Neste local, concentraram-se essencialmente vendedores de sapatos, de fazendas e fatos feitos e de muitos outros produtos do artesanato regional.

No largo em frente à câmara e aos bombeiros, local do mercado semanal, predominaram essencialmente vendedores de frutas e legumes, de salgados e presuntos e, sobretudo, os vendedores de queijo, do apreciado queijo da serra. Afluíram ainda em elevado número emigrantes que, junto dos seus familiares e amigos, vieram passar o período de férias e matar saudades da terra.

  Extraído de um diaporama sobre o Sabugal.

 

 

Texto 9

Tocay é, para o meu gosto, um vinho muito doce. Embebeda-me sempre. Evel é leve de mais. Gatão, só com marisco. Cerveja? Nem penses nisso! Enjoa-me. E se bebêssemos um vinho espesso, com corpo e alma, como as cerejas?

Como as cerejas?

Sim, estúpido! Nunca viste ou comeste uma cereja grande, dura, com sumo?  Tem corpo e alma. Ou vamos beber apenas um vinho de areia? O melhor vinho para um pato como este, cheio de gordura e bem recheado com amoras... Ou pera? De que é o recheio?

O recheio?

Julgas que eu como pato sem ser recheado? Foi uma coisa que li nos livros de culinária. Pato, só com recheio. Leitão é que se pode comer a seco, para não saturar o sabor natural.

Leste um livro de culinária? Para quê?

Até li mais do que um. Já li muitos. E gosto de fazer bacalhau assado com grandes rodelas de batata e cebola. E azeite, a nadar em azeite pouco ácido. Com alho grande. Mas não lhe ponho salsa picada. Nunca pico salsa. Vamos beber um vinho de areia, talvez Visconde de Salreu? É uma marca de entendidos.

Quem era o Visconde de Salreu?

Era um visconde, estúpido! Tem um grande jazigo de família. Um visconde é um visconde. Este é de Salreu.

  JOÃO PALMA-FERREIRA, Primavera, in: "As Novelas"

 

 

Texto 10

AS PALAVRAS

  São como um cristal,

  as palavras.

  Algumas, um punhal,

  um incêndio.

  Outras,

  orvalho apenas.

 

  Secretas vêm, cheias de memória.

  Inseguras navegam:

  barcos ou beijos

  as águas estremecem.

 

  Desamparadas, inocentes,

  leves.

  Tecidas são de luz

  e são a noite.

  E mesmo pálidas

  verdes paraísos lembram ainda.

  Quem as escuta?  Quem

  as recolhe assim,

  cruéis, desfeitas,

  nas suas conchas puras?

  EUGÉNIO DE ANDRADE, Antologia Breve.

 

___________________________

 

[13] Karl BÜHLER, Teoria del lenguage, Madrid, 1950, pp. 40-45.

 

[14] Roman JAKOBSON, Linguistique et poétique, in: Essais de linguistique générale, Paris, 1963, pp. 213-221.  Nota:  Além do trabalho já citado de Herculano de Carvalho, aconselha-se a leitura destas páginas de Jakobson sobre as funções da linguagem.

 

[15] A parte final deste capítulo apresenta um bloco com sugestões de trabalho. Nele encontra uma sequência de diversos textos que deverá ler, identificando as funções da linguagem neles presentes.

 

[16] Celso CUNHA, Gramática do português contemporâneo, 5ª ed., Belo Horizonte, Editora Bernardo Álvares S. A., 1975, pp. 15-16.

 

Veja-se também Celso CUNHA e Lindley CINTRA, Nova gramática do português contemporâneo, Lisboa, Edições Sá da Costa, 1984, p. 1.

 

[17] Ferdinand de SAUSSURE, Cours de linguistique générale, Paris, 1964, pp. 23-31.

 

[18] Veja-se a definição apresentada por Celso Cunha na obra anteriormente citada.

 

[19] Tatiana SLAMA-CASACU, Langage et contexte, Haia, p. 20.

 

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