De plano quadrangular e frente voltada sempre para a rua ou principal
via de comunicação, a casa «gafanhense» (ou gafanhoa) distingue-se de
todas as outras pela sua orientação característica.
Com um
único piso, a parte destinada à residência fica, invariavelmente,
voltada para norte, e com a porta da cozinha (elemento importante,
embora nos pareça insignificante), que dá para um amplo pátio interior,
para sul. No extremo oposto à álea de habitação, portanto para sul,
encontram-se os currais, bem como a casa ou casas para arrumação das
alfaias agrícolas e armazenamento dos cereais. A entrada para o pátio
faz-se mediante um largo portão, seguido de um archete (arco de volta
inteira) feito de «adobas». Entre o archete e o portão distam alguns
metros, existindo, de cada lado, um vão de dimensões consideráveis,
visto destinar-se a guardar o carro de bois.
Nas
traseiras da casa, que comunicam com os campos de lavradio por uma tosca
porta, fica, a curta distância, uma eira de grandes dimensões, um «cabanal»
e, por vezes, mais alguns cercados para a criação. Mas disto nos
ocuparemos na devida altura.
− Quais as divisões que podemos encontrar na parte destinada à
residência? Haverá diferenças sensíveis de casa para casa?
Antes de responder às duas perguntas, uma terceira se me apresenta: −
Haverá alguma razão especial para a orientação acima indicada?
− Sem dúvida que há! Essa explicação encontramo-la nas próprias
condições geográficas da região. Com efeito, sendo uma zona do litoral,
sem a mínima elevação de terreno, é bastante desprotegida e dada a
nortadas. Assim, é de toda a conveniência que a residência fique para
norte, a fim de proteger o pátio interior. Além disso, como, quer na
cozinha, quer na sala de jantar, existem portas de comunicação para o
pátio, quase sempre abertas, ficando a residência no lugar destinado aos
currais, estaria mais sujeita aos ventos e não aproveitaria o calor dos
raios solares.
Mas pode-se ainda perguntar: − E se a casa ficar no outro lado da estrada,
com a porta de entrada para o lado do mar?
Neste caso, os dados invertem-se; a parte destinada à residência passa
para o lado dos currais (inverta-se, para melhor seguir o raciocínio, a
planta da figura 25, de maneira que a eira fique voltada para nascente),
continuando a residência para norte e as portas da cozinha e sala de
jantar para sul.
Respondendo agora às duas primeiras perguntas anteriormente colocadas, devo dizer
que não existem diferenças sensíveis de umas casas para outras, pelo menos
naquelas que possuem pátio interior. Das várias que tive a curiosidade
de observar, algumas mesmo sem pátio, constatei que as divisões eram
sempre as mesmas. Deste modo, não admira que tivesse tomado como modelo
a casa do meu informador, sem dúvida superior às outras, o que mostra as
largas posses do seu dono, e que tive o cuidado de registar na planta da
figura 25
A primeira sala que se nos depara, quando entramos numa destas casas, é
a chamada «sala do Senhor», visto ser uma espécie de capela privada, com
o seu altar, um Cristo pregado na parede ou, mais habitualmente, mesmo
sobre esse altar. O Cristo caracteriza-se pelas suas grandes dimensões,
tendo de cada lado uma vela e também alguns santos. É nesta sala que
toda a família se reúne para elevar as suas preces ao Senhor e
agradecer-lhe os benefícios trazidos no dia-a-dia. Imediatamente ao lado
desta sala ficam os quartos de dormir. Ligando a sala de entrada à de
jantar, existe um pequeno corredor, como se pode ver na planta que
desenhámos. Na extremidade poente da habitação, no caso da que me serviu de
modelo, vemos a cozinha com um forno para cozer o pão e uma casa de
arrumação.
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