A BAGACEIRA
Depois de espremida a massa da azeitona mais do que uma vez, como vimos
no capítulo VII, ficam nas seiras os resíduos a que correntemente se dá
o nome de bagaço. Este
é um termo comum a todo o país e o mais habitual em livros técnicos e
frequentemente substituído por outros, de acordo com as regiões do País,
no registo oral.
Em
Espanha, a massa residual da azeitona é conhecida por
hueso, pelo menos na região de Ávila,
segundo informação de A. Klemm(11),
que acrescenta ser geralmente utilizada como alimento para os porcos.
Em
Itália, segundo informação obtida no trabalho de Luigi Heilmann(12),
«depois de desfeito o
kastèllo», termo que existe também entre nós para designar a
coluna de seiras colocadas com massa nas prensas, «extrai-se das
seiras a massa espremida», que é designada pelo vocábulo sansa
na região da Toscana. Este é um vocábulo comum a toda a Itália,
conforme
parece poder inferir-se da consulta da Enciclopedia Italiana de
Ciências, Letras e Artes(13).
Mas não é a única palavra para designar a massa da azeitona depois
espremida. De acordo com o trabalho de P. Scheurmeier(14),
o número de vocábulos existentes é significativo, tais como
sansa, sansina, pánsera, salza,
sarza, etc. Ainda segundo a enciclopédia atrás referida, a sansa
(o bagaço) foi durante algum tempo utilizada como combustível ou adubo,
mas actualmente é novamente reutilizada para extracção de óleos de
qualidade inferior para utilização industrial.
Em Portugal, registámos os seguintes
vocábulos para designar a matéria residual da azeitona após as
sucessivas prensagens:
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baga
– 16 |
baganho – 4 |
carabunha – 1 |
bagaço – 41 |
brolho – 4 |
carbunha – 1 |
baganha – 12 |
brulho – 4 |
grulho – 2 |
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Baga(15),
registado nos distritos de Aveiro, Braga, Bragança e Vila
Real parece ser um vocábulo essencialmente nortenho. Surge em Portugal a
partir da bacia do Douro para cima, abrangendo ainda a margem esquerda,
pois surge-nos no distrito de Aveiro, no concelho de Arouca, que confina
com o rio, que lhe serve de limite. É o vocábulo que registámos com
maior frequência depois de
bagaço.
Bagaço é o
vocábulo que encontrámos com maior frequência(16)
e que parece ser comum a todo o País. É um termo bastante antigo. Fernão
Lopes, no capítulo CXLVIII da
Crónica de D. João I, diz-nos que durante o cerco de Lisboa pelos
castelhanos, que durou quatro meses e vinte e sete dias, segundo o
próprio cronista, a fome era tanta que os sitiados se serviram de
bagaço da azeitona para fazer pão(17).
Baganha, também
com a forma masculina baganho, em algumas localidades, é, à
semelhança de bagaço, um vocábulo bastante antigo na língua portuguesa,
embora a sua frequência de utilização seja menor, o que poderá
significar ter já começado a cair em desuso. Encontrámo-lo ainda 12
vezes (das quais 7 ouvidas por nós mesmos) em algumas localidades e com
maior frequência no distrito de Coimbra(18).
A antiguidade do vocábulo é atestada por documentos diversos.
Encontramo-lo, por exemplo, no parágrafo 32 e 33 do
Regimento de Lagar de Azeite da cidade de
Coimbra(19),
que nos apresenta as datas de 21 de Maio de 1551 e, no parágrafo
seguinte, o registo semi-legível de 12 de … de 1792. Nele se estipula
quem deverá ficar com a
baganha, sendo-nos também indicadas as utilizações que lhe eram
dadas na época.
O
vocábulo baganha surge
também em trabalhos técnicos mais antigos. No já citado Dicionário
Universal da Vida Prática, encontramos a referência a dois tipos de
baganha – a preta e a branca – bem como aos chamados azeites de
repisa, que se obtêm a partir principalmente da baganha branca
e que são bons para saboaria(20).
Encontrámos também, na tese de licenciatura de Alice Pereira Branco(21),
o vocábulo baganha como
designando o casulo que envolve a semente do linho.
Ao
lado de baganha,
registámos quatro vezes a forma masculina baganho(22),
rigorosamente com o mesmo sentido, em quatro localidades apenas: duas
no distrito de Coimbra; duas no de Viseu.
Relacionado com os dois vocábulos anteriores está
baganheiro, que ouvimos na povoação
de Dianteiro (freg. Torres do Mondego, conc. Coimbra) para designar as
pessoas que andam pelos lagares a comprar a baganha.
Brolho, brulho e
grulho são três variantes do mesmo vocábulo que, à excepção de
brulho, nunca tivemos oportunidade de ouvir, mas que encontrámos em
inquéritos do I.L.B.
Brolho surge
registado em quatro inquéritos referentes a Santo Ivo (conc. Amares,
dist. Braga), Navió e Santa Maria de Arcozelo (conc. Ponte de Lima, dist.
Viana do Castelo) e Lovelhe (conc. Vila Nova de Cerveira, dist. Viana do
Castelo).
Brulho, por nós
ouvido uma vez na Quinta da Romeira (conc. Celorico da Beira, dist.
Guarda), aparece registado em três inquéritos do I.L.B., num realizado
em Bemposta (conc. Mogadouro, dist. Bragança) e em dois no concelho de
Figueira de Castelo Rodrigo, distrito da Guarda, em Escalhão e Mata de
Lobos. Este mesmo vocábulo está registado no trabalho de Tavares da
Silva(23),
que o indica como sendo um regionalismo minhoto que designa o bagaço da
azeitona e da uva. M. Margarida F. Martins(24)
apresenta-o como sendo próprio da Beira Alta, designando o bagaço da
azeitona.
Grulho, que não é
mais do que uma variante fonética, foi registado em dois inquéritos do
I.L.B. referentes a Ribeiros (conc. Fafe, dist. Braga) e Vila Chã da
Graciosa (conc. Miranda do Douro, dist. Bragança).
Carabunha e
carbunha, por nós registados em dois lagares de Bragança e Vila
Real, apresentam, segundo os informadores, sentidos diferentes. Em
Brunheda, P. 85 (conc. Carrazeda de Ansiães, dist. Bragança), o
informador disse-nos que era «o que fica depois de feito o azeite»
e que «a carbunha é aproveitada para estrume e para lume».
Equivale, portanto, a bagaço. Mas, em Fornos do Pinhal, P. 78 (conc.
Valpaços, dist. Vila Real), o informador disse-nos que as carabunhas
eram os caroços das azeitonas depois de esmagadas no moinho. Era
apalpando a massa que sabia se já estava apta a ir para o enseiramento e
prensagem. Se sentissem entre os dedos as carabunhas, precisaria
ainda de mais algumas voltas no moinho.
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Figs. 88.
e 89: Prensa de cincho em pleno funcionamento (Pedregal, P. 51, freg. Mesquinhata,
conc. Baião, dist. Porto). Terminado o aperto, o bagaço é retirado
do cincho em torrões. |
Terminada a prensagem da massa, quer nas seiras e capachos, quer nas
prensas de cinchos e alguns sistemas mais modernos, por exemplo,
no
Cachão, no moderno lagar cooperativo do Nordeste Transmontano(25),
a massa, quase completamente enxuta, constitui o que vulgarmente é
designado por torrões.
Tal como se pode observar num lagar com prensa de cinchos (fig. 88 e 89
▲) e na figura 158▼, estes torrões são blocos compactos, de
difícil desagregação. Nos lagares mais modernos, tal como no
representado nas figuras 158 e 159, existem máquinas próprias para
desfazerem esses torrões, a que é dado o nome de destorroadores,
sendo o trabalho realizado, na região de Mirandela,
por mulheres.
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Figura 158: A
massa da azeitona, após a prensagem, constitui compactos torrões de
difícil desagregação (Cachão, freg. Frechas, conc. Mirandela, dist.
Bragança. |
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Figura 159:
Máquina «destorroadora» para desfazer os torrões de bagaço saídos
das prensas (Cachão, freg. Frechas, conc. Mirandela, dist.
Bragança). |
É de recordar que, nas regiões mais
nortenhas, nos lagares mais modernos, em que as operações estão
mecanizadas e exigem um esforço menor, a maior parte do trabalho é feito
por elementos femininos. Vimos já isto no final do capítulo VII, quando
referimos os lagares de Covelo e de Valpaços, dos quais apresentámos
imagens comprovativas. Também no moderno lagar de Cachão, todas as
actividades eram praticamente realizadas por mulheres, cujo número
ultrapassa em muito o dos homens.
Noutros lagares mais antigos, onde não
existem máquinas para destorroar o bagaço, o trabalho é feito
manualmente com a ajuda de grossos paus roliços, de comprimento
idêntico ao do diâmetro das seiras e dos capachos.
Se se trata de seiras, o trabalho é um
pouco mais demorado, pois exige que os torrões de bagaço sejam
despegados do interior, não apenas da parte central, mas também da parte
inferior das abas. Depois de voltada para baixo a boca das seiras, estas
são energicamente batidas com um pau. Em seguida, retirada a maior parte
do bagaço do interior, as seiras são voltadas para cima e batidas as
abas, podendo eventualmente ser necessário passar a extremidade do pau
pelo interior, para ajudar a despegar
bocados mais agarrados.
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Fig. 160: Com um
pau, as mulheres batem as seiras e retiram o bagaço (Cerejais, P.
90, conc. Alfândega da Fé, dist. Bragança). |
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Fig. 161: Munidos
de um pau, os homens batem vigorosamente os capachos para os
libertar do bagaço da azeitona (Ponte de Arranca, P. 100, conc.
Vinhais, dist. Bragança). |
Se se
trata de capachos, o trabalho realiza-se com maior facilidade. Os discos
de esparto ou de nylon
vão sendo despegados um a um da coluna cilíndrica do que restou do
castelo, colocado no chão na zona de destorroamento, e batidos
energicamente com um pau, ficando, em breve, preparados para outras
operações de encapachamento e prensagem.
No
lagar de Ponte de Arranca, P. 100, ao trabalho de retirar o bagaço ou
baga dos capachos o informador deu-lhe a designação de
descapachar [descapacthar] que,
segundo ele, era «bater ali com uns paus, para tirar a baga».
O
bagaço vai sendo acumulado na zona de desenseiramento e é posteriormente
levado, segundo alguns informadores, para a
bagaceira. Este vocábulo foi por nós
registado apenas em quatro lagares: em Castelo Viegas, P. 288, e Quinta
do Esporão, P. 245b, no concelho e distrito de Coimbra, e em
Fornotelheiro, P. 212, e Ponte Nova, P. 209, no concelho de Celorico da
Beira, distrito da Guarda. Encontrámo-lo também em alguns livros
técnicos e trabalhos de carácter oleícola. Por exemplo, Octávio Solano e
Pedro Celestino(26)
dizem-nos que «o bagaço é
metido na bagaceira, que é, por assim dizer, um poço forrado de
tijolo; é calcado a maço, conservando-se assim muito tempo sem fermentar»,
sendo depois utilizado, segundo os mesmos, para alimentação dos porcos e
outros animais.
Não
vamos referir as características que, segundo os livros técnicos, a
bagaceira(27)
deverá ter. No entanto, teremos de acrescentar que, num inquérito do
I.L.B. realizado em Lapas, no concelho de Torres Novas (dist. de
Santarém), surge o vocábulo
covão para designar a «grande cavidade aberta na terra para
guardar o bagaço da azeitona».
Relativamente às
utilizações do bagaço,
registámos um elevado número de informações, não só nos inquéritos por
nós realizados, mas também em diversos textos consultados. Sobre este
assunto já alguma coisa dissemos nas páginas anteriores, mas iremos
agora elaborar uma síntese de tudo quanto recolhemos.
Vimos
que na década de 1940, em Espanha, o bagaço era geralmente utilizado
para alimentação dos porcos. Em Itália, servia de combustível e adubo e,
em épocas mais recentes, era reutilizado para extracção de óleos. E
constituiu, durante muito tempo, no dizer de Scheuermeier, «o
velho combustível nacional da Itália produtora de azeite» e o
combustível ideal para as braseiras.
Em
Portugal, desde épocas remotas até ao momento em que efectuámos os
inquéritos, o bagaço da azeitona conheceu diversas utilizações. Uma das
referências mais antigas, por nós já citada, diz respeito a Fernão
Lopes. Vimos que, por altura do cerco de Lisboa pelos castelhanos, na
segunda metade do século XIV, durante um dos muitos episódios que
marcaram o conturbado período de 1383 a 1385 e que culminou com a tomada
das rédeas da Nação por D. João I e a Batalha de Aljubarrota, o bagaço
serviu para fazer o pão que a população menos abastada comia. Com ele e
«outras pouco acostumadas coisas e contrárias à natureza», a
população lisboeta conseguiu enganar a fome e manter-se activa por mais
algum tempo.
Em
épocas posteriores, segundo informação do
Regimento de Lagar de Azeite de Coimbra,
também já citado e por nós parcialmente reproduzido, o bagaço constituiu
matéria de registo, tendo sido determinado em que condições podia ser
utilizado e a quem deveria pertencer. Assim, de acordo com o parágrafo
31 desse documento, para evitar que os donos dos lagares se
assenhoreassem de toda a baganha, impedindo os legítimos donos de
a levarem e dela fazerem o que quisessem, foi determinado – ou acordado,
para usarmos a mesma palavra do citado documento – que «os senhores
dos Lagares, ou aquelas pessoas, que os tiverem arrendados, possam
levar, e levem para si metade da baganha, e a outra metade leve seu dono
do azeite, por assim parecer coisa justa e sensata [no original
arrazoada] e por isso mandam que os senhorios dos lagares, e
quaisquer outras pessoas, que deles estejam encarregados, o cumpram
assim inteiramente, sob pena de, fazendo o contrário, terem de pagar
quinhentos reis por cada vez.»(28)
E relativamente à sua utilização, os donos dos lagares podiam-na usar
como combustível apenas para ajudar a acender as fornalhas, após o que
teriam de substituir a baganha por lenha, a fim de que a água pudesse
atingir uma temperatura mais elevada, indispensável para que os azeites
ficassem «bem escouçados, e
naquela perfeição que cumpre e sempre fez, por sempre as águas se
esquentarem com lenha, e não com baganha». (§ 33).
Em
épocas mais próximas de nós, o bagaço foi conhecendo diferentes
utilizações. Tal como nos outros países produtores de azeite, esta
utilização tem sido bastante diversificada. Com base nas respostas
fornecidas pelos vários informadores, elaborámos um quadro estatístico
de todas as utilizações indicadas. Em alguns casos, o mesmo informador
referiu mais do que uma utilização, o que significa que esta é muito
variável de zona para zona. O quadro da figura 169 reproduz
rigorosamente as informações registadas, depois de as termos agrupado
por categorias. Verificamos que há, no essencial, quatro formas bastante
generalizadas de utilização: como
combustível, como alimento para os animais, para extracção de óleos e
como adubo.
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Combustível |
Braseiras - 2
Fogões - 1
Fornalhas da caldeira - 17
Total - 20 |
Alimento para os animais |
Porcos - 8
Galinhas - 1
Gado - 10
Total - 19 |
Extracção de óleos |
Total - 16 |
Adubos |
Estrume - 3
Adubo - 8
Total - 11 |
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Figura 162:
Quadro com a distribuição por classes das utilizações dadas ao
bagaço, segundo as informações obtidas em inquéritos directos e no
I.L.B. |
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Mais significativas que as nossas
palavras e linguisticamente mais interessante serão talvez as breves
transcrições que passamos a fazer das informações obtidas relativamente
à utilização do bagaço.
«–
Para que serve a baga?
– Nós aqui num damos, o
labrador lebábum-na. Aqui era preciso, lebábum-na, porque diz que era
para dar òs cebados e essas coisas. Lebábum-na baga. Chegabam lá im
casa, amassabam aquilo de depois iam dando òs cebados. Ò mais… e o resto
nós queimamos aí alguma coisita, queimaba-se, botaba-se na fornalha.» (Espiunca,
P. 117, conc. Arouca, dist. Aveiro)
«–
O bagaço no fim é retirado do lagar em vagonêtas. Vai por uma linha
fora e cai numa espécie de recipiente amplo. É depois vendido. Há muitos
concorrentes. Este ano (1969) foi vendido para Soure. O ano passado foi
vendido para Arganil e Penacova. Querem o bagaço p’rà extracção d’óleos.
Extraem óleos ainda e por vezes até aqueles óleos ainda são refinados e
tiram azeite bom. O mais ordinário é aplicado p’rò sabão. Esta venda do
bagaço produz bom rendimento. Este ano a colheita foi muito fraca, inda
fizemos uns 40, 70 contos em bagaço. Portanto, o bagaço ajuda a cobrir
as despesas do lagar. Ele há anos qu’até paga as despesas todas.» (Ervedal,
P. 236, conc. Oliveira do Hospital, dist. Coimbra)
«–
E esse bagaço para que o querem?
– Isto é p’ra consumo
deles lá prós animais. Sim, qu’isto n vale nada. Mas há muita gente que
faz referência a estas coisas.
– Não costumam também
usar para queimar?
– Depois vende-se às
fábricas que isso é para exdestruírem ainda óleos disto.
– Mas não é utilizado
também para queimar em lareiras e braseiras?
– Aqui não. Aqui não,
não, não usam. Aqui nesta região é o seguinte: é o que o freguês leva,
faz dele o que quiser. E o que não leva nós vendemos à fábrica para
extracção d’óleo…» (Assafarge, P. 284, conc. e dist. de Coimbra)
«–
O resto d’àzeitona que fica nas seiras é o bagaço. Cada um leva pra
suas casas par’o que dão âos animais, pelo menos, com licença aos
porcos, não é? E outros vendem, porque andam aí muitos, uma grande
quantidade de gente, a comprar, porque o senhor vê, isto à vara, os que
vêm aqui comprar o bagaço ainda tiram muito azeite, porque a gente vai
espremer o bagaço, fica com as mãos untadas.» (Três Aldeias, P.
303, conc. Pampilhosa da Serra, dist. Coimbra)
«–
O bagaço serve para a alimentação do gado. Em algumas regiões é guardado
num compartimento da casa da habitação chamado loja. É metido numa
cuba ou tina, após ter sido amassado com água e sal. É dado
aos animais misturado na lavagem.» (Carvalhal Redondo, conc. Nelas, dist.
Viseu)
«–
Para que servia a baganha?
– Isso serbia pra… ora
mais tarde, e mesmo agora inda usam, pra lebar, remóiem e dá adubos,
sim, adubos pra gado, pra coiso, pois. Até que praticamente talvez seja
destas farinhas que dou, alimentação de gado, seja para isso.» (Carvalhosas,
P. 286, freg. Torres do Mondego, conc. e dist. Coimbra)
«–
É a baganha.
– Isso não serve para
nada?
– Não, serve pra óleos.
– ainda vendem?
– Quem quiser. E quem não
quiser é prós suínos.
– Então já não dá
mais nada?
– O que bai prós
suínos não. Agora, quem num quiser pa suínos, po’ izemplo, eu num tenho
suínos nenhuns im casa, suponhamos, ou o xenhor, não precisa dos seus
caroços, não precisa de baganha pa eles. Se não tiver quem compre, cá,
na terra, vendi pra estes baganheiros que…» (Dianteiro, P.
256, freg. Torres do Mondego, conc. e dist. Coimbra).
Se
bem que muitas outras explicações tenham sido por nós recolhidas, vamos
terminar a nossa referência à utilizações dadas ao bagaço com a
transcrição de um breve texto extraído do
Dicionário Universal da Vida Prática na
Cidade e no Campo(29).
Além de nos fornecer uma breve nota sociológica relativa ao carácter da
nossa população nos princípios do século XX, refere-nos já as modernas
utilizações do bagaço, antes de chegar à utilização última, como adubo
ou produção de rações para o gado:
«(…)
Estabeleceu-se, em tempos, uma fábrica que vivia só de comprar e
espremer os bagaços já
espremidos nas prensas ordinárias, e donde retirava muito azeite,
sujeitando-os a mais enérgica pressão. Esta fábrica lutou, porém, com
dificuldades doutro género: o não lhe quererem vender bagaços,
por se servirem deles na alimentação do gado suíno, apesar daquela venda
dever ser mais vantajosa.
(…) Os bagaços da azeitona empregam-se
geralmente na engorda dos porcos, ou como combustível, no mesmo lagar,
para aquecer as águas necessárias para as manipulações que descrevemos.
Hoje,
em alguns países, usam extrair aos
bagaços, por meio de sulfureto de
carbónio, o óleo que eles contêm. Por este processo químico extrai-se
até à última partícula do azeite existente. Este óleo não serve depois
para comida, mas pode ter muitos usos (a saboaria, etc.) e esta
extracção é vantajosa.»
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