As
seiras são colocadas numa superfície circular, existente debaixo da
vara, na zona compreendida entre as virgens e as agulheiras.
Com um diâmetro um pouco maior que o das seiras, esta superfície
apresenta formas e nomes diferentes de região para região.
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Figura 99:
Aspecto do alguerbe ou sertã onde são empilhadas as seiras para
prensagem (Ponte da Mata, conc. Penacova, dist. Coimbra). |
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Vejamos, em primeiro lugar, algumas das
formas por nós encontradas.
Num grande número de lagares, a área de empilhamento das
seiras é delimitada por uma coroa circular, escavada no próprio granito
de que é feita a plataforma destinada ao enseiramento, tal como se pode
observar na figura 99▲. Para um melhor escoamento do azeite, a superfície
interna pode ser ligeiramente convexa, apresentando ainda um rego em
toda a volta, entre a coroa e a área central. É por este rego que o óleo
escorre em direcção à bica
de saída e, através desta, para o interior das tarefas.
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Figura 100:
Aspecto da sertã do lagar de Canelas de Baixo, conc.
Arouca, dist. Aveiro. No chão, à direita, os
frades e a adufa; à esquerda, os potes ou tarefas. |
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No norte do País, e de uma maneira muito especial no
concelho de Arouca, no distrito de Aveiro, os
alguerbes ou sertãs – assim se
chamam estas zonas circulares, entre outros nomes que adiante veremos –
não são mais do que um recipiente granítico circular, de feitio muito
semelhante ao de uma sertã, donde possivelmente a origem do seu nome. No
lagar de Canelas de Baixo, P. 118, que encontra documentado na figura
100▲, as paredes da sertã apresentam mais de um palmo de altura, saindo o
azeite por uma bica de secção em U feita do mesmo
material. É de notar que todo o conjunto, segundo pudemos concluir
depois de atenta observação, é feito a partir de um bloco maciço de
pedra, que hábeis mãos de pedreiro foram desbastando até conseguirem
a
forma documentada pela figura.
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Figura 101:
Aspecto da sertã do lagar de Vila Viçosa, P. 116, freg. Espiunca,
conc. Arouca, dist. Aveiro. |
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No lagar de Vila Viçosa, P.
116, no mesmo concelho, a sertã apresenta pouco mais de um metro
de diâmetro. Feita também a partir de um bloco de pedra, as suas paredes
são relativamente baixas, como se pode verificar pela análise da figura
101▲. A saída da bica é tapada por tosco objecto de madeira sem nome
específico. À área formada por ampla laje de pedra, situada à direita da
sertã e sobre a qual colocam as seiras durante as caldas é dado o
nome invulgar e talvez inédito de sãofridoiro.
No país vizinho, o alguerbe
ou sertã, conhecido pela designação de encapazadero, é, segundo
informação de Klemm, relativamente à região estudada pelo Autor, «una
superficie circular formada por una o varias losas situada a 5 cm. sobre
el nivel del suelo, con un diámetro de 115 cm. (en Poyales), y está
circundada en la periferia», à semelhança do que se passa entre nós,
«por un canal circular plano de 10-15 cm. de ancho.(12)»
Apresentadas algumas das muitas formas que a zona de
empilhamento das seiras pode apresentar, resta-nos enumerar e
analisar os nomes por que é vulgarmente conhecida; são eles os
seguintes: albergue/alvergue,
algarbe, algrabe, algrebe, alguebre, alguel, alguer, alguerbe,
alguergue, alguermi, arguel, assento, enseiradouro, sartã, sertã, sertem.
Pertencentes à mesma
família semântica e provenientes do árabe alqirq(13) são
as formas albergue/alvergue, algarbe, algrabe, algrebe,
alguebre, alguel, alguer, alguerbe, alguergue, alguermi, arguel,
cuja distribuição poderemos fazer segundo o esquema:
Na primeira coluna estão indicadas as formas apocopadas.
Na do meio, aquelas que se encontram mais próximas da forma primitiva. A
terceira e última coluna apresenta-nos formas encontradas apenas numa
povoação e, como tal, um tanto susceptíveis de dúvida, apesar de
registadas por Cândido de Figueiredo(14).
Segundo este Autor, alvergue é um «tanque em que repoisa o
líquido escorrido dos bagaços da azeitona, nos lagares de azeite»,
donde um sentido muito diferente do apontado por nós e que encontrámos
em vários locais.
A forma mais antiga e mais próxima do étimo
– alguergue – surge-nos
documentada apenas nos dicionários, muito embora Maria Margarida Furtado
Martins(15) a indique como termo alentejano. Define-o a Autora
como «espécie de prato grande de pedra, onde se colocam as seiras
para serem espremidas (Alentejo)».
O dicionário de Bluteau(16)
define o mesmo vocábulo da seguinte maneira: «(...) Em lagar de
azeite, é uma laje redonda, sobre que descansam as seiras, quando dentro
delas a azeitona se está espremendo. Saxum, super quod olivae
calcantur».
Segundo o dicionário de Morais(17),
alguergue, do árabe alquerque, é um «jogo de rapazes
com arriozes, sobre tábua raiada, a modo de damas» e «pedra do
lagar, onde descansam as seiras da azeitona, que vai a espremer-se».
Os dicionários modernos citam, de um modo geral, o
vocábulo alguergue, que
definem como «pedra do lagar onde se colocam as seiras da azeitona(18)».
As restantes formas são consequência de múltiplas alterações fonéticas
ocorridas através dos tempos.
Albergue/alvergue,
por nós registado apenas no distrito de Coimbra, P. 261, encontra-se
documentado em mais do que um trabalho. Além do já citado dicionário de
Cândido de Figueiredo, Ferreira Lapa, segundo informações colhidas
através de Guilherme Felgueiras(19),
cita o termo, definindo-o como «o tanque de separação do azeite».
Segundo Tavares da Silva(20), o termo é próprio da Beira Alta,
designando «o prato da prensa que espreme o bagaço da azeitona».
O citado dicionário de Almeida Costa e Sampaio e Melo(21)
apresenta o vocábulo na acepção de «tanque de lagar onde se apara o
azeite que escorre do bagaço da azeitona».
Das restantes formas, a mais documentada
é sem dúvida
alguerbe, apresentada
pelo dicionário de Morais(22), que a considera provincianismo
beirão e define como «prato da prensa que espreme o bagaço da
azeitona, o mesmo que alvergue e alguergue», e por nós registada nos
distritos de Coimbra, P. 253, 255, 256, 258, 262, 286, 294, e Guarda, P.
206, 211.
Algarbe,
registado nos distritos de Braga, P. 31, e Coimbra, P. 297, com o
sentido de 'zona circular sob a vara, na qual são empilhadas as seiras
para serem espremidas', é apresentado por Pires de Lima(23)
com o sentido de alfurja, isto é, de «pio ou vaso grande de
pedra em forma de alguidar, dentro do qual se deita a azeitona, e onde
giram as rodas (galgas)». Este mesmo termo está registado na
"Revista Lusitana", vol. XIV, pág. 182, com sentido idêntico ao acabado
de transcrever.
Algrabe
e algrebe (Braga, P.
29) são apresentados pela "Revista Lusitana" também com o sentido de
alfurja.
Alguebre,
apresentado por Jaime Lopes Dias(24)
ao lado de sertã e alguer, tem um sentido idêntico ao por
nós registado. Segundo o Autor, consiste numa «grande pedra de
cantaria ou de xisto onde assentam as seiras».
Alguel
foi registado num inquérito do I.L.B. efectuado no distrito de Santarém,
P. 334.
Alguer
surge-nos em mais do que um trabalho. António Ladislau Piçarra(25)
dá-o como próprio do concelho de Serpa, distrito de Beja. Segundo este
Autor, «por baixo do couce, quer dizer, sob a parte posterior da vara
e firme no solo, há uma pedra circular, de superfície lisa, cujo
diâmetro mede mais de um metro». É a esta pedra «sobre a qual
assentam as seiras» que se dá o nome de alguergue e à qual
por apócope o povo chama alguer. «Na sua periferia acha-se
cavado um sulco – a regueira – por onde corre o azeite que
resulta da compressão das seiras».
Ao lado do
alguer, foram ainda registadas as formas alguermi e arguel,
respectivamente nos distritos de Beja (conc. de Alvito) e Braga, P. 8.
Neste último ponto, a palavra arguel foi registada com o sentido
de 'lugar onde no lagar é moída a azeitona para o fabrico do azeite'.
Os restantes vocábulos a que teremos de fazer referência
são assento, enseiradouro
e sartã, sertã ou sertem.
O primeiro, registado num inquérito do
I.L.B. efectuado no distrito de Castelo Branco, concelho da Covilhã,
apresenta-se-nos como caso único e esporádico.
Do segundo já nós falámos, quando do estudo do vocábulo
enseiramento, neste mesmo capítulo. Como então dissemos,
enseiradouro, pronunciado também
inseiradouro e enseradouro, aplica-se não só à zona circular
onde são empilhadas as seiras sob a prensa, mas também a toda a área à
volta desse círculo. Segundo o que nos diz António do Casal(26),
lagareiro da Casa Real, «o enseiradouro é uma mesa de folha de
Flandres sobre a qual estão todas as seiras vazias (...)».
As três últimas formas, das quais duas não são mais do
que o resultado da alteração fonética de
sertã, foram registadas nos distritos
de Aveiro, P. 116, 117, 118, Braga, P. 32, Porto, P. 51, 52, 54a, 54b,
56, 57. Provenientes do latim SARTAGINE, o nome de sertã
deve-se provavelmente à forma larga e baixa que a zona circular
apresenta, o que lhe confere um feitio que nos faz evocar as frigideiras
ou sertãs que vulgarmente encontramos nas nossas cozinhas.
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