Cónego A. Ferreira Pinto, S. Pedro de Canedo no concelho da Feira, Vol. IV, pp. 161-178.

N.º 15 − Junho, 1938

ARQVIVO

DO DISTRITO DE AVEIRO

Directores e proprietários

ANTÓNIO GOMES DA ROCHA MADAHIL

FRANCISCO FERREIRA NEVES

JOSÉ PEREIRA TAVARES

Editor

FRANCISCO FERREIRA NEVES

Administração

Estrada de Esgueira − AVEIRO


Composto e impresso na Tipografia da Gráfica de Coimbra − Largo da Feira, 38 − COIMBRA


S. PEDRO DE CANÊDO

NO CONCELHO DA FEIRA

ACEDENDO aos desejos dos fundadores e directores do «Arquivo do Distrito de Aveiro», volto a associar-me ao seu pensamento de regionalistas dedicados, qual foi tornar conhecida a Terra em que eles nasceram.

E, porque eu tenho a mesma Pátria − o distrito de Aveiro −, quero trazer às páginas desta importante revista várias notas relativas à freguesia de Canêdo, que tem uma vasta e curiosa história, embora com algumas questões de solução difícil. É abundante a documentação que, directa ou indirectamente, se refere ao antigo Mosteiro, ao padroado e a outros assuntos dessa localidade, que dariam ao curioso investigador elementos para uma volumosa monografia, mas eu limitarei muito o meu trabalho, deixando citadas algumas fontes que outros, com engenho, arte e esforço, poderão estudar e desenvolver com óptimos resultados, No Censual, nos muitos volumes do Arquivo do Cabido do Porto e noutros documentos fundamentarei tudo o que escrever, ficando ainda abundante seara, que os apaixonados poderão cultivar. Longa, muito longa seria a jornada, se tentasse apresentar e desenvolver os diferentes aspectos paroquiais e rústicos que podem fornecer matéria para uma completa monografia.

Hei-de afastar-me de tudo, isso, deixarei a longa jornada, não entrarei no vasto campo e só penetrarei em estreito atalho, percorrendo pequena parcela de terreno literário e histórico.

 

Situação: A freguesia de Canêdo está situada ao norte-nascente, no extremo do concelho da Feira. Na estrada que parte de Ovar, passa à Feira e segue pela Corga de Lobão, atravessando / 162 / Canêdo até ao lugar de Carvoeiro, nas margens do Douro, há as seguintes distâncias quilométricas: Ovar a Canêdo − 27; Feira a Canêdo − 15; Corga a Canêdo − 3; e Canêdo a Carvoeiro − 7. Do Porto, por Lourosa, Fiães e Corga a Canêdo são 30 quilómetros. Da estrada nacional (Lourosa) a Canêdo são 9 quilómetros. Do Porto pelo Douro à praia de Carvoeiro o percurso regula por 24 quilómetros(1).

 

Mosteiro: Antes de entrar na história do Mosteiro de Canêdo e porque está relacionado com El-Rei D. Dinii, quero fazer algumas referências ao Monarca Lavrador, cuja vida não deve ser ignorada pelos habitantes da freguesia.

Há meses, os jornais noticiaram particularidades ou minúcias relativas ao cadáver de D. Dinis, que está sepultado no Convento de Odivelas, por Ele fundado e isto incitou-me também às breves considerações seguintes. Deixo os historiadores contemporâneos, porque julgo mais conveniente trazer para este lugar Camões, o imortal Épico, e príncipe dos historiadores.

Feitas as referências a D. Afonso III, diz o Poeta:

Eis depois vem Dinis...
......................................................
Com este o reino prospero florece
(Alcançada já a paz áurea divina),
Em constituições, leis e costumes
Na terra já tranquila claros numeS.
......................................................
Fez primeiro em Coimbra exercitar-se
O valeroso ofício de Minerva;
......................................................
Nobres vilas de novo edificou,
Fortalezas, castelos mui seguros;
E quase o reino todo reformou
Com edifícios grandes e altos muros.
                                 LUSíADAS III, 96-98.

/ 163 /

Foi com estes e outros versos que o nosso Épico referiu a actividade de D. Dinis na vida literária, agrícola, militar, política e diplomática. Constituições, leis, costumes, universidade de Coimbra, castelos e edifícios de toda a espécie, tal a acção construtora do Rei Lavrador.

Este, de comum acordo com sua mulher D. Isabel e o Infante D. Afonso, filho primeiro e herdeiro, doou a D. Geraldo, bispo do Porto, o Mosteiro de Canêdo, em Terra de S. Maria, com o direito de padroado e todas as honras, senhorios, maladias (pensões), casais, heranças e posses com todos os direitos espirituais existentes e futuros. Esta doação era pessoal a D. Geraldo, em atenção aos muitos serviços prestados a D. Dinis. Uma das cláusulas foi que, em todo o sempre, houvesse, no Mosteiro, uma missa diária e cantada em honra de Deus e da Virgem Santa Maria por alma dos ascendentes e descendentes do doador, abençoando os que auxiliassem o cumprimento da doação e amaldiçoando os que a impedissem. O documento de D. Dinis tem a data, em Lisboa, aos 28 de Março da Era de 1342, ou 1304 anos de Cristo. Foi assinado por magnates seculares e D. Martinho, arcebispo de Braga, D. João, bispo de Lisboa, D. Estêvão de Coimbra, D. Fernando de Évora e outros. Vê-se, pois, que foi uma doação muito solene(2).

Pertencia este Mosteiro à Ordem de S. Bento e atribui-se a sua fundação a Guterres, pelos anos de 950. Ninguém deve admirar-se desta antiguidade e de pertencer à Ordem de S. Bento de Nursia, porquanto a vida religiosa-monástica desenvolveu-se muito no Ocidente desde o século IV e atingiu a maior perfeição com os beneditinos.

S. Bento de Nursia viveu de 480 a 543, fundou o Convento para homens no Monte-Cassino, que ficou célebre na História e perto um outro para mulheres, cuja direcção confiou a sua irmã Santa Escolástica, também falecida em 543.

A expressão, muito conhecida, «paciência beneditina» provém do trabalho que as Ordens beneditinas prestaram à ciência, na difícil e paciente cópia de velhos manuscritos. Demais, o estudo das humanidades, as obras e instruções publicadas, os trabalhos artísticos e ascéticos, manuais, agrícolas e outros / 164 / tornaram bem conhecidas e apreciadas estas ordens, que, por isso mesmo, cedo vieram para Portugal. Pendorada (Alpendorada), Lorvão, Pedroso, Paço de Sousa, Guimarães, Cucujães, Ganfey, Tibães, S. Pedro de Canêdo e outros mosteiros atestaram e alguns dos mais modernos ainda atestam a prodigiosa actividade beneditina.

As Monjas Beneditinas tiveram as suas casas, talvez pelo princípio do século VII, em Arouca, Vairão, Semide, Lorvão, Rio Tinto, Salvador de Tuias, Tarouquela, Vila Cova de Sandim, próximo de Canêdo e outras.

Esta última casa de Vila Cova, S. Salvador ou S. Maria de Vila Cova, ou ainda Vila Cova das Donas, na Comarca da Feira (hoje Gaia) era já importante por 1180. Vê-se, pois, que as ordens beneditinas pontificaram nas Terras da Feira, que se estendiam do Douro ao Vouga. A de Vila Cova sustentou-se até se fundir com Rio Tinto, Tuias e Tarouquela dando origem ao convento ou mosteiro de S. Bento da Avé Maria, no Porto, para onde entraram as religiosas, em 6 de Janeiro de 1535.

No mesmo ano da doação de D. Dinis, isto é, em 1304, a 26 de Maio, é feita a cessão do Mosteiro de Canêdo com as suas rendas e direitos ao bispo do Porto. A comunidade reconheceu que, tanto no espiritual (a longis temporibus in spiritualibus defecisse) como no temporal, era necessária uma grande reforma. Já estavam alienados casais e bens, a parte religiosa não se cumpria e era urgente a restauração necessária, mas só a autoridade episcopal podia realizá-la(3).

Quais fossem os efeitos desta cessão ou cedência?

Que providências tomou o bispo do Porto para a restauração espiritual e material do Mosteiro? Nada sei dizer. Naturalmente tudo continuou no mesmo estado.

Em 8 de Fevereiro da Era de 1345 ou 1307 dos anos de Cristo, D. Geraldo Domingues deu e concedeu ao cabido do Porto todos os rendimentos, proventos e direitos do Mosteiro de Canêdo, que lhe tinham sido doados em razão da pessoa e não da Igreja Portuense, que seriam distribuídos entre os cónegos e porcionários, segundo as horas de assistência ao coro.

O Cabido ficava obrigado a conservar em Canêdo quatro irmãos ou monges, sendo um o Prior, cuja nomeação lhe pertencia e / 165 / aos bispos sucessores e um capelão, que tivesse a seu cargo a pastoreação dos fiéis (qui curam populi habeat), um pároco.

Haveria missas diárias com as seguintes aplicações: uma por D. Dinis, outra por D. Dinis e bispo e duas em louvor de Deus e de Nossa Senhora. Depois da morte de El-Rei e de D. Geraldo seriam celebradas duas missas de Requiem por todos os séculos (cunctis temporibus saeculorum)(4).

Em 31 de Agosto do ano de 1307, Diogo Soares, Cónego e Vigário Geral, como delegado do Cabido, a quem pertencia o padroado in solidum (totalmente), confirmou abade do Mosteiro de Canêdo e administrador do Convento, tanto no espiritual corno no temporal, Domingos Domingues, a quem todos deviam prestar obediência e reverência. O Mosteiro pagaria ao Cabido o censo anual de 200 maravedis velhos da moeda portuguesa(5).

Em 29 de Novembro do ano de 1311, o bispo do Porto D. Fr. Estêvão confirmou, por intermédio do seu Vigário Geral Pedro João, o capelão Vicente Domingues, de cuja idoneidade se tinha certificado.

A confirmação mostra que para a respectiva nomeação não houve simonia, prestou juramento de obediência e reverência a D. Estêvão e aos seus sucessores, prometeu observar os estatutos sinodais, assistir ao sínodo, se for chamado e não estiver impedido, fazendo residência pessoal, excepto se for dispensado.

Aos fiéis manda prestar obediência e reverência ao capelão(6).

Não obstante todos os esforços dos bispos D. Geraldo, D. Estêvão e do Cabido, continuou o estado decadente do Mosteiro e eram irreparáveis as ruínas espirituais e materiais. Era indispensável que mão hábil e forte tornasse conta do Mosteiro e empregasse todos os meios ao seu alcance para reparar e / 166 / restaurar a administração espiritual e material. Estava deão do Cabido do Porto um sacerdote de notável envergadura literária e por isso anexaram ao deado o Mosteiro de Canêdo, esperando que o Chefe remediasse os males existentes.

Vejamos o que se passou.

Em sessão capitular de 27 de Setembro da Era de 1350 ou 1312 dos anos de Jesus Cristo, a que presidiu o bispo D. Fr. Estêvão, foi resolvido anexar perpetuamente ao deado o Mosteiro de Canêdo, alegando que seria muito mais fácil e sobretudo porque presidia ao Cabido e era deão D. Gonçalo Pereira, cujo poder e habilidade seriam garantias de melhor administração: ...«si dignitati deconatus dictum Monasterium uniretur et specialiter per potentiam et industriam venerabilis vir domni Gondisalui pereyra nunc Decani», diz-se no Censual.

Nesta união, o Cabido reserva os 200 maravedis de censo anual, a que já fiz referência e receberia mais 100 libras de moeda portuguesa, logo que se realizasse a união. O prelado continuaria a receber as censorias de cera, bragais e o mais que era de costume. D. Estêvão tinha de se ausentar por  motivo justificado, não podia dar andamento ao processo de anexação e, para este efeito, delegou todos os poderes no Cónego D. Martim Vasques, que também era abade de S. Cristóvão de Refojos.

O executor da anexação diz que o Mosteiro ficará perpetuamente unido ao deado com todos os bens, exceptuando os que pertenciam ao Cabido, ao bispo e à Igreja, como já foram mencionados. Existiam no Mosteiro apenas dois religiosos, devendo um ser prior e outro capelão, vivendo juntos, celebrando os ofícios divinos e administrando os sacramentos. Se mudarem para outra casa da mesma ordem ou falecerem, o deão conserve em Canêdo três clérigos, que vivam no Mosteiro, se sustentem dos bens deste e um seja o cura, ou vigário perpétuo, recebendo a jurisdição do bispo(7).

Dada a sentença de união ou anexação do Mosteiro de Canêdo ao deão do Cabido do Porto, seguiu-se a posse. Esta realizou-se em 9 de Dezembro de 1312. Neste dia estava no Mosteiro de Canêdo D. Pedro João, Vigário Geral de D. Fr. Estêvão, que visitou toda a casa e no fim o Abade Martinho Domingues entregou a administração e direito que tinha. Em seguida, o Vigário Geral conferiu ao deão e à dignidade do deado a posse do Mosteiro ao venerável varão D. Gonçalo Pereira, que estava ali representado pelo procurador / 167 / João Estêvão e cuja fórmula se encontra no Censual, a pág. 329 e 330(8).

D. Gonçalo Pereira, com muito brilho e distinção, tinha concluído a sua formatura em SaIamanca, onde de relações com D. Tareija Pires Vilarinho houve um filho, que foi D. Álvaro Gonçalves Pereira e este foi o pai de D. Nuno Álvares Pereira, o grande condestável de Portugal e hoje o beato Nuno de Santa Maria. D. Gonçalo Pereira ordenou-se por 1288, foi prior de S. Nicolau da Feira e sucedeu no deado do Porto a seu primo Sancho Pires, quando este foi elevado ao episcopado por 1296. D. Gonçalo Pereira foi educado na corte de EI-Rei D. Dinis e seu testamenteiro. Por estes motivos, pela grande fidalguia, ilustração e patriotismo, teve uma grandíssima importância religiosa, social, política e mesmo militar. Por 1322 foi nomeado bispo de Lisboa, passando para arcebispo de Braga em 1326. Aqui ficam estes traços gerais duma das grandes figuras da História de Portugal, de cujo nome se devem orgulhar os Feirenses e muito mais os povos de Canêdo, porque foi o superior do Mosteiro durante cerca de 10 anos, de 1312 a 1322.

Que serviços prestou para reformar e melhorar a vida religiosa e administrativa do Mosteiro? Até onde chegou aquele poder e indústria que o Censual lhe atribuiu e que eu referi?(9)

D. Pedro Pires foi o sucessor de D. Gonçalo no deado e portanto na posse do Mosteiro de Canêdo desde 1323 a 1327.

A este sucedeu D. Domingos Martins Bugalho ou só D. Domingos Martins. Teve durante alguns anos o Mosteiro, mas, em 1336, renunciou-o no Cabido por motivos de consciência.

Do termo de renúncia consta que «o honrado baron dom Domingos Martins Dayon do Porto, estando em Cabido com os cónegos, disse que achara que o Bispo Dom Giraldo que foi do Porto anexara e dera o Mosteyro de Canêdo ao Cabido da dita sé do Porto para o haver para sempre e fazer dele e por êle como se contém em os privilégios. E dizia que como quer que êle o trouxesse com o dayado que entendia que o trazia contra direito e em perigo de sua alma. E que, porém, abria mão do dito Mosteiro de Canêdo com todas as suas pertenças ao dito / 168 / Cabido e que o tenha para todo o sempre sem embargo nenhum e faça dele como de coisa propria». Neste assunto foi procurador do Cabido o cónego Lourenço Peres. Esta renúncia realizou-se no dia 3 de Junho da era de 1374 ou anos de 1336 de Jesus Cristo(10).

Em 1452 era deão Antão Gonçalves e tinha ainda o Mosteiro de Canêdo. Como alegasse que este lhe rendia muito pouco, foi-lhe anexada, somente em vida, a igreja de S. João de Ovil(11).

Por Letras Apostólicas de Sixto V, de cuja execução foi encarregado D. João Galvão, bispo de Coimbra, sendo deão Álvaro Gonçalves, foi o Mosteiro de Canêdo desanexado do deado, no ano de 1473 e no ano seguinte foi anexado à igreja de Lobão(12).

No dia 13 de Dezembro de 15°5, sendo bispo D. Diogo da Costa, o Vigário Geral e Abade Comendatário do Mosteiro de Bustêlo, chamado Pedro Gonçalves, confirmou ou passou carta de colação a Fernão da Cunha para a igreja de Canêdo, como se lê no Catálogo dos Bispos do Porto, por D. RODRIGO DA CUNHA, na parte II, capítulo XXXIII.


Velha contenda: Do Arquivo do Cabido consta que houve, no tempo de D. Dinis, uma contenda importante com o abade do Mosteiro reverendo Martim Domingues, a quem foi dada posse no ano de 1302. Há outro documento ou «instrumento por onde consta ser privado de abade do Mosteiro de Canêdo Martim Domingues no ano de 1302». «Apelação que Martim Domingues, abade de Canêdo, interpôs para Braga contra o bispo D. Geraldo para ser conservado na posse do dito Mosteiro de Canêdo. Ano 1302»(13).

«Autos da contenda do Bispo e Cabido do Porto com o Abade de Canêdo Martim Domingues acerca do padroado da igreja − 1313(14).

 

Aposentadorias, comedorias, pousadias:(15) É bem certo o / 169 / rifão que «onde não há pão todos ralham e ninguém tem razão». Foi o que sucedeu no Mosteiro de Canêdo. Um dos grandes males que mais concorreu para o empobrecimento dos mosteiros e igrejas foi o direito que tinham os padroeiros de visitar as instituições que dependiam destes. Aproveitavam-se desse direito, visitavam, instalavam-se, demoravam-se e faziam grandes despesas que eram pagas pelos mosteiros e igrejas, não restando meios suficientes para o clero e pessoas encarregadas dos diferentes serviços. A Santa Sé empregou meios para combater os abusos e os reis de Portugal fizeram o mesmo.

D. Afonso III publicou normas no sentido de reduzir os encargos mencionados.

Já em nota mencionei a redução em pagamento de medidas, atendendo à falta de recursos do Mosteiro e agora acrescento que D. Dinis, em 1281, isentou, por 2 anos, os mosteiros e igrejas do Porto da aposentadoria com fundamento da pobreza dessas instituições.

Deviam ser grandes os abusos em Canêdo por isso que, em 1293, D. Dinis publicou uma carta para o tabelião da Feira notificar uns cavaleiros, donas e escudeiros e outros homens, para se absterem de ir pousar e comer no Mosteiro, fazendo assim grande mal ao mesmo. No ano de 1332, nova carta régia para o Cabido conservar o seu domínio no Mosteiro de Canêdo e seus casais livres de hospedagem e de outros encargos, como consta do já citado livro 84 das Sentenças ou 806 da numeração geral. Deste mesmo livro consta que no ano de 1296 houve intimação de censura ao abade Martim Domingues, já citado, para não administrar os bens do Mosteiro, sendo nomeado um ecónomo para a sua administração. Pode, pois, concluir-se que a questão económica foi a causa ou uma das causas que contribuíram para a queda do Mosteiro ou abandono por parte dos religiosos e do Cabido.

Em que época se completou a ruína? Em 1623 escreveu D. RODRIGO DA CUNHA:

«Então (refere-se a 1304) dos religiosos da Ordem de S. Bento e agora é Comenda da Ordem de Cristo»(16).

No relatório da visita a Canêdo, a que me referirei, diz-se: «O Conde de São Lourenço é o Comendador e obrigado a tudo o necessário não só para a capela mór e sacristia, mas também para a mesma igreja».

Já se não fala no Mosteiro. / 170 /

Canêdo no foral de D. Manuel I: Antes de qualquer consideração sobre o assunto proposto na epígrafe deste capítulo, convém saber que são os forais. Chamou-se foral a uma lei especial ou código destinado a alguma cidade, vila, concelho, julgado e até aos moradores ou caseiros de uma quinta ou herdade(17). Os reis de Portugal deram muitos forais e deles nasceram litígios e controvérsias variadíssimas. D. Manuel I governou de 1495 a 1521 e empregou esforços para a reforma dos forais. Encarregou Fernão de Pina de percorrer o Reino, estudar o assunto, examinar as leis antigas e circunstâncias do tempo e redigir novos forais. Pina foi o secretário duma comissão ou junta de letrados, que de 1513 a 1517 realizou o trabalho novo ou redigiu novos forais, que os críticos e historiadores classificam de imperfeitos, precipitados, sendo origem de novas questões, embora nas disposições relativas aos direitos reais sejam melhores, mais rigorosos. O foral da Feira e terras de Santa Maria é de 1514.

«D. Manuel, por graça, Rei de Portugal e dos Algarves....  a quantos esta carta de foral dada para sempre à Vila da Feira e terra de Santa Maria virem, fazemos saber que por bem das sentenças e determinações gerais e especiais que foram dadas e feitas por nós e com os do nosso conselho e letra dos acerca dos forais dos nossos Reinos e dos direitos Reais e tributos que se por eles desejam receber e pagar: e assim pelas inquirições que mandamos fazer em todos os lugares de nossos Reinos e senhorios, justificados primeiro com as pessoas que os ditos direitos Reais tinham, achamos vistas as inquirições da nossa Torre do Tombo, porque os tributos, foros e direitos Reais na dita Vila e Terra de Santa Maria se deve e hão de arrecadar e pagar daqui em diante na maneira e forma seguinte». . .

I − Refere-se à Vila, onde há terras Reguengas com outros direitos particulares e inquirições, indicando as propriedades, nomes, encargos, não esquecendo o castelo. Há terras na Vila e limite que de oito pagam um. / 171 /

Ocupa-se o foral das eiradégas(18) de pão e vinho e menciona as propriedades e as pessoas que as deviam pagar.

As pessoas com porta para a rua e que fizerem fogo (cozinharem), cada uma pagará uma galinha sem ovos. Há referências especiais à quinta de Rolães com os chãos Reguengos.

Pena de saque e de arma(19) são as contribuições para aqueles que, indo de fora, ferissem algum morador dentro das ruas ou espancassem embora não corresse sangue.

O direito das forças era devido somente depois do julgamento das cousas, em certas condições(20).

Os tabeliães que houvesse nas terras de S. Maria e na Feira pagariam anualmente mil e oito centos reais, que seriam repartidos por todos igualmente(21).

O gado do vento eram os animais que sem dono ou pastor vagueavam pelas diferentes pastagens ou se mudavam como o vento(22). No foral se diz quantos dias deviam passar ao vento para se julgar perdido.

As dízimas das sentenças foram proibidas, excepto nas sentenças que se tem de executar (23).

Os montados e maninhos para gados não existiriam, porque todos têm vizinhança uns com os outros. Se fizerem dano, pagarão a pena ou coima (multa) segundo as posturas do concelho(24).

As lutosas, luytosas, luctosas(25) eram os direitos que se pagavam pelas pessoas falecidas e D. Manuel determina as pessoas e freguesias que deviam pagá-las. A freguesia de Canêdo não está incluída na relação.

A lutosa devia ser a melhor jóia ou peça móvel que ficasse da pessoa falecida.

Outras determinações houve relativas a portagem(26) (portádigo e portático ou o direito de entrada em certos lugares como cidade, vilas, coutos que pagavam as fazendas e víveres), localidades para a entrega dos foros, saídas de madeiras; sardinha, / 172 / caçadores de rolas, preços dos géneros....... que o leitor mais tarde poderá conhecer bem neste Arquivo quando o foral for publicado.

Até aqui a Vila da Feira. Vejamos agora Canédo com as suas contribuições:


Canêdo em Lobel: Afonso Luís pelo casal de Pedro de Lobel pagará 2 alqueires de trigo, 8 de centeio, 8 de milho e uma galinha. E de linho 4 afusais e de vinho mole(27) 6 almudes.

Gonçalo de Lobel pelo casal e meio de João Gonçalves, 4 alqueires de trigo, 10 de centeio e 10 de milho. E de vinho mole 6 almudes pelo qual vinho paga por avença 150 reais em cada ano e do dinheiro que chamam das Vides 40 reais, 2 galinhas e 7 afusais de linho.

 

O Mosteiro de Canêdo: O Mosteiro de Canêdo há-de dar por si 9 quarteiros de centeio pela medida nova de 16 alqueires o quarteiro, que faz 144 alqueires e outros tantos de milho e mais 28 galinhas e em dinheiro duzentos e dezasseis reais, sem mais poderem crescer nem minguar as ditas cousas, por quanto antigamente foi assim taxada a dita paga do dito Mosteiro pelas cousas que trouxe da Coroa de nossos Reinos. E ficará resguardado do dito Mosteiro qualquer direito que tiver nas cousas por que assim nos paga o dito foro e .tributo.

João do Pomar pelo reguengo 540 reais em dinheiro e duas galinhas sem mais outra causa.

João Anes pelo casal de Afonso Domingues 180 reais em dinheiro sem mais outra cousa.

Martinho de Valecova por todos os foros e tributos do casal pagaria 832 reais.

Gonçalo de Matos pelos casais de Canêdo 121 reais.

Lourenço Anes de Várzea pelo casal de Arouca 90 reais.

Em Lousado há 5 casais com um de mestre Vasco e dão de centeio um moio pela medida velha. E isto fora o que paga o Mosteiro pela medida nova. E pagam-se ao castelo 43 / 173 / alqueires e meio pela medida nova pelo dito moio(28). E mais 11 galinhas por todos os casais de Lousado, afora o de João de Bairros que paga por si. E mais recebe o Castelo as galinhas e o dinheiro abaixo designado. E Aparício, pelo casal que foi de João de Lousado, 18 alqueires de centeio para esta paga dos 43 alqueires e meio e mais 5 galinhas. E paga-se o senhorio por estes e se falecerem há de recebê-los do Mosteiro para cumprimento do que falecer e as 11 galinhas se pagam pelos seguintes com outros foros do dinheiro. O João de Bairros pelo Lousado, afora o que paga o Mosteiro, 10 alqueires e meio de centeio e não entra também nesta outra paga do moio.

Afonso Martins de Lousado pelo casal de Vasco Anes 10 alqueires de centeio.

Gonçalo Anes pelas vinhas que trazia João do Cameiro 5 alqueires e meio de centeio e I galinha.

Luís Afonso pelo casal de Sozanil por si sem a paga do Mosteiro ao Castelo 3 galinhas e 15 reais.

Pedro Vaz pelo casal de João de Canêdo, afora o que paga o Mosteiro, 28,50 reais e 3 galinhas. O neto de João de Canêdo, afora o que paga o Mosteiro, 24,50 reais, e mais 3 galinhas e mais 6 galinhas.

E Pedro Vaz de cima paga as 12 galinhas dos casais de cima.

Martinho de Carneiro pelo casal Reguengo de João do Cameiro 4 alqueires de trigo, 6 de milho e de centeio 8 alqueires, de linho 6 afusais, de manteiga 6 quartilhos pela medida nova, de vinho mole 6 almudes e 14 reais.

Luís Afonso pelo casal de Sozanil 15 reais e 3 galinhas por si sem a paga do Mosteiro. Martim Aparício do casal reguengo 288 reais. João de Sante pelo casal da Inha 804 reais. Álvaro Vaz, de Canêdo 40 reais. A Quinta da mata com outros casais são do prestimo(29) de cadinha que andam com Fermedo com o Senhorio dos quais se fará a justificação destes e de outros que aqui tem.

Nada mais diz o foral sobre Canêdo.


Ainda tributos do foral Manuelino: Além do que fica escrito no texto e em notas sobre os tributos do foral manuelino, vou referir outros, ainda que rapidamente. / 174 /

Portagem: Pagava-se somente para as coisas vendidas ou compradas aos de fora para revender.

Pão, cal, sal, vinho, vinagre, fruta verde, hortaliça, pescado e marisco: Tudo pagava por carga. E havia carga maior (de cavalo ou muar), carga menor (de asno), costal (que um homem levava às costas) e outra nas mãos ou debaixo dos braços.

O carro ou carreta equivalia a duas cargas maiores.

Não pagavam portagem: pão cozido, queijadas, biscoitos, farelos, ovos, leite, prata lavrada, nem as coisas compradas na vila para o termo nem no termo ou vizinhança para a vila.

Casa mudada: Não pagava portagem, excepto quando levavam coisas para vender. Frutas dos bens próprios, tenças, estavam nas condições da casa mudada.

Gados e bestas, panos finos, coirama e calçadura, ora isentos, ora contribuídos, pagavam geralmente por carga maior.

Veja-se GAMA BARROS sobre exportação de gados, vol. IV, pág. 106 e seguintes.

Azeite, mel e semelhantes, pelitaria (toda a qualidade de peles para calçado, vestidos, forros, guarnições ou regalo), metais, ferro e obras deste, telha, tijolo e obras de barro, palma, esparto − tudo tinha o seu tributo ou estava dele dispensado conforme as circunstâncias especiais, e as entradas e saídas por terra tinham a sua regulamentação.

Não foram esquecidos os privilegiados que eram os eclesiásticos dos mosteiros, clérigos de ordens sacras, beneficiados de ordens menores, e as mulheres com votos, porque não pagariam portagem nos seus bens ou nos que comprassem para suas casas e familiares.

Isentava também algumas localidades que são mencionadas no foral.

Finalmente aparece a pena contra aqueles que levem mais direitos. Seriam degredados para fora da vila e termo, e pagariam cadeia. Tais são as disposições últimas do foral.

 

Demografia: Das Constituições Diocesanas de 1687 consta que a freguesia tinha o título de Reitoria. Constava de 408 fogos, 1091 pessoas maiores e 286 menores.

Do relatório feito pelo reitor José da Fonseca e Sousa, em 1758 e que se encontra na Torre do Tombo, conforme o rol das pessoas confessadas, Canêdo tinha 522 fogos, 1399 pessoas
maiores, 177 menores que ainda se não confessavam.

Por ordem do Vigário Capitular D. Nicolau Joaquim Thorel da Cunha Manuel, um visitador percorreu toda a comarca da Feira, organizou um relatório das freguesias, donde consta que
Canêdo tinha 488 fogos, 997 pessoas maiores, 133 menores e 149 ausentes. Isto em 1769. Era reitor José da Fonseca e Sousa, de 65 anos, «com disposição ágil, mas falta de ouvir». Não são boas as disposições relativas ao pároco e fregueses
/ 175 / dessa época e as confrarias não eram bem administradas. O padre Miguel Carlos de Oliveira, ordenado em 1764, por apresentação do reitor, desempenhava o cargo de cura. Havia 2 sacerdotes e 2 ordinandos. O Padre Domingos Pereira Pinto, ordenado, em 1731, de 64 anos, estava dispensado de confessar por despacho do Provisor Fr. Aurélio, por isso que se queixava de várias moléstias. O Padre Bartolomeu Bento de Azevedo era formado em Cânones, ordenado em 1749, tinha 45 anos, estava aprovado para confessar e pregar, era bom clérigo, mas sofria de hipocondria, habitualmente muito melancólico.

Sebastião, filho de Manuel da Silva Aranha, de 23 anos, lugar de Fagilde, tinha boa disposição, mas parece «que o procedimento não é dos mais claros» diz o relatório.

José Maria da Mota Reimão, formado, filho do Capitão Valentim da Costa, tinha 27 anos e boa disposição.

Do mesmo relatório se vê que a igreja só tinha bom o forro do tecto da capela-mor.

As casas da residência tinham cómodos, mas todos muito arruinados. «Desta mesma sorte participa o campanário sem poder sustentar um bom sino que está em uns paus.»

É curiosa esta nota, porquanto já, em 1296, os Vigários do bispo do Porto foram a Canêdo fazer umas inquirições a respeito dos sinos do Mosteiro que estavam postos num castanheiro e contra os quais protestou Martim Domingues, a quem já me referi. Pode verificar-se isto no livro 806 ou 84 das Sentenças no Arquivo do Cabido do Porto.

Dum Almanaque Eclesiástico do bispado do Porto para 1857, consta que era abade Francisco de Oliveira Maia, pregador, egresso da Ordem de S. Francisco da Província de Portugal (Convento da Conceição de Matosinhos) e que tinha sido colado em 11de Março de 1841. Era coadjutor José Gonçalves da Conceição e tinha dois presbíteros: António Ribeiro Barraca e José Francisco dos Santos. Francisco José da Silva Tavares era ordinando.

Embora não haja referência alguma a outro sacerdote, talvez por viver ausente de Canêdo, não posso omiti-lo neste artigo.

Bernardo José da Silva Tavares, filho do brigadeiro Bernardo José da Silva Tavares e de D. Gertrudes Xavier Pereira do Vale, doutorou-se em Teologia pela Universidade de Coimbra, em 3 de Outubro de 1830, sendo logo nomeado cónego magistral da Sé de Lamego. Por decreto de 21 de Agosto de 1856 foi nomeado cónego da Sé do Porto e passada a Carta Régia, em 7 de Outubro. O doutor Tavares não se conformou com os dizeres da Carta e representou ao Governo para lhe ser concedida a conezia de magistral, vaga pela morte do doutor Manuel Tomás dos Santos Viegas. Deferido o pedido, recebeu a instituição canónica em 2 de Abril de 1857 e tomou posse no dia 8. / 176 /

Prometeu e jurou guardar os Estatutos, cumprir as residências e todos os mais encargos, a que estavam sujeitos todos os cónegos, sem poder aproveitar-se de privilégio algum dos antigos magistrais. Foi apenas um magistral honorário. Esteve paralítico em Canêdo, durante alguns anos e faleceu, a 22 de Março de 1888, com 87 anos de idade. Vejamos as últimas informações.

«A população actual anda à volta de 900 fogos e 4500 almas», informou, em Julho último, o rev. pároco David Pereira Coelho.

Entre Canêdo e a freguesia de Santa Maria do Vale havia 3 lugares meeiros, que deviam influir nos fogos e população. Eram Sagufe, Serralva e Pessegueiro que, há já alguns anos, passaram definitivamente para Santa Maria do Vale, o que facilita o serviço paroquial.

A actual igreja tem 6 altares. Um é dedicado ao Sagrado Coração de Jesus e nele se venera também N. S. de Fátima. Os outros são antigos.

Há bastantes capelas e ermidas antigas: Senhora da Piedade, Santa Bárbara, Senhora do Amparo, Santa Luzia, S. Paio, S. Roque, S. Lourenço.

O cemitério paroquial foi construído em 1902, sendo pároco o Rev.º Agostinho José Pais Moreira, cuja actividade foi grande para esta obra.

Uma inscrição colocada pela Junta de 1913, à entrada do cemitério, diz o seguinte: «Tributo de gratidão da Junta de Paróquia de Canêdo prestada aos bem feitores Abade Agostinho José Pais Moreira e Augusto Barbosa Pinto pelo muito que concorreram para a construção deste cemitério». São informações de Julho de 1938.

Confrarias: Teve a freguesia de Canêdo importantes confrarias, como se deduz dum Estatuto de 1676, que diz: «Estatutos das Confrarias do Santíssimo Sacramento e do Santíssimo nome de Jesus − De Maria Santíssima, do Rosário, do Príncipe dos Apóstolos S. Pedro − Das Almas do Purgatório − Instituídas na Igreja de São Pedro de Canêdo, comarca da Feira, Bispado do Porto. Em 1854 houve uma tentativa de reforma de Estatutos, mas todos os esforços foram inúteis. A Confraria da Senhora da Boa Morte foi florentíssima.

Casas mais importantes: A Casa de Fagilde teve como chefe o brigadeiro Bernardo José da Silva Tavares. Os filhos varões foram: Cónego Bernardo José da Silva Tavares, Capitão-mor Hermenegildo José da Silva Tavares, Doutor em Leis Francisco de Assis da Silva Tavares e Coronel Vitorino José da Silva Tavares. Hoje a casa de Fagilde pertence a Carlos Alves de Sousa, residente e negociante no Porto.

A Casa do Mosteiro pertenceu ao Capitão-mor mencionado / 177 / [Vol. IV - N.º 15 - 1938] e hoje pertence a seu filho Hermenegildo José da Silva Tavares, capitão médico miliciano, residente em Lever.

A Casa de Valecova pertence ao Dr. Joaquim Alberto de Sousa Couto, médico aposentado.

A Casa de Lousado pertence a Augusto Barbosa Pinto, negociante, residente no Porto.

A Casa da Botica pertenceu ao farmacêutico Manuel José Pais Moreira e D. Emília da Silva Tavares. Deste matrimónio houve os seguintes filhos: Padre José Augusto Pais Moreira, Padre Agostinho José Pais Moreira, já referido, farmacêutico Vitorino Pais Moreira e D. Maria Pais Moreira, médica, residente no Porto.

Pertence actualmente a D. Emília Pais Moreira, casada com Alexandre de Figueiredo, pais do médico Alexandre Pais Moreira Figueiredo, que, em Canêdo e freguesias vizinhas, exerce clínica.

 

Arquivo paroquial: Não havendo arquivo distrital em Aveiro, foram para Coimbra os livros do registo paroquial de Canêdo. No dia 19 de Junho de 1937, estive no Arquivo de Coimbra e verifiquei que lá existem II volumes do registo paroquial de Canêdo e todos em bom estado de conservação. Tomei as notas seguintes, que poderão facilitar os investigadores de arquivos:

Livro de 1587-1622. Não está autenticado. Era reitor Francisco Neto. Em 28 de Junho de 1621 a freguesia foi visitada pelo bispo D. RODRIGO DA CUNHA, o autor do Catálogo dos bispos do Porto.

Livro de 1624-1659.

Livro dos baptizados, casados, defuntos e crismados da freguesia do Mosteiro de S. Pedro de Canêdo no ano de 1659. Tem o termo de abertura em 1654, sendo este feito pelo pároco de Miragaia, em virtude da comissão que lhe deu João Rodrigues de Araújo, em Setembro de 1654. Em 1672, no mês de Maio, houve crisma ministrado por D. Nicolau Monteiro. Era reitor Manuel Beça Leal(30) e coadjutor Manuel Cardoso.

Livro de 1682-1699 legalizado pelo pároco de S. Vicente de Louredo Manuel Cardoso, em virtude da comissão que lhe deu o abade de S. Nicolau do Porto, visitador da comarca da Feira.

Livro de 1700-1720 com a lista dos crismados em 1699 por D. Fr. José de Santa Maria.

Livro de 1721-1769 numerado pelo pároco de Lobão, Simão / 178 / de Sousa Leal, por despacho do Provisor Dr. Pedro Valente de Aguiar, em 1720.

Livro de 1721-1768 − Casamentos.

Livro de 1720-1754 − Baptizados.

Livro de 1754-1775 − Por comissão do Dr. Pedro Virgolino foi legalizado pelo notário apostólico Padre José Gonçalves da Cruz.

Livro de 1775-1786.

Livro de 1786-1804.

Livro de 1804-1820.

 

Outros livros no arquivo de Canêdo? Exceptuando os Estatutos referidos já, nada existe. Livro das visitações, pastorais, circulares, documentos antigos e outros, tudo desapareceu. Como? Que destino tiveram? Foram vendidos para alguma fábrica de papel de embrulhos? Queimados? Usados para buchas de espingardas? Dicant Paduani, isto é, nós não sabemos, nem queremos sabê-lo. (CÂNDIDO DE FIGUEIREDO, Os estrangeirismos, a pág. 188).

Empreguei esforços para descobrir, em Canêdo, fora do arquivo paroquial, alguns elementos para a história de Canêdo, mas tudo foi inútil. Desapareceu o cartório paroquial.


Tombo da Casa da Feira: Pela morte de D. Fernando Forjaz Pereira Pimentel de Menezes e Silva, 8.º Conde da Feira, em 15 de Janeiro de 1700, sem deixar sucessão legítima, a maior parte dos bens do Condado passou para a casa do Infantado. Fez-se o tombo que consta de 16 grossos volumes com as sentenças dos bens e rendas que passaram para o Infantado e estavam situados nas freguesias do concelho da Feira e vizinhos. No tomo quinto estão as sentenças relativas a diferentes casais de Canêdo e freguesias vizinhas. São notas interessantes relativas a vários casais. A nenhum me refiro, porque já me alonguei.

Conclusão: Aqui ficam estas notícias sobre a freguesia de Canêdo. Oxalá que os seus párocos organizem melhor arquivo para a história futura desta paróquia. Ficam indicadas muitas fontes, mas outras devem ser organizadas pelos pastores. A estes pertence arquivar, dia a dia, a vida paroquial. São estas as lições do Seminário de N. S. da Conceição do Porto.

CÓNEGO A. FERREIRA PINTO

_________________________________________

(1) − Nestas distâncias, a designação «Canêdo» indica a igreja paroquial, no lugar do Mosteiro. Está situada no extremo sul da paróquia. Na opinião do Sr. Doutor JOSÉ LEITE DE VASCONCELOS, «o étimo ou origem filológica está em Cannetum, que significa canavial. É um dos muitos substantivos em etum, significativo de bosque ou local onde crescem árvores ou arbustos.

O toponímico Canêdo está representado em Trás-os-Montes, Entre Douro e Minho, Beira e data da primeira época da língua portuguesa.» Faço uma referência especial ao Rei D. Dinis, porque está ligado à freguesia de Canêdo pelo Mosteiro e à Feira pelo Castelo, que foi um dos oferecidos em dote à rainha D. Isabel, que, mais tarde, foi elevada aos altares de Portugal. Haverá, neste artigo, algumas notas mais explicativas, porque farei uma separata destinada a Canêdo.

Veja-se a Etnografia Portuguesa do Sr. Dr. LEITE DE VASCONCELOS, voI. II, pág. 417 e seg.

(2) − Donatio Monasterii santi petri de Canedo... Censual, pág. 317 e 318. Arquivo do Cabido, livros n.os 806, 753 ou 31 das Sentenças. O Censual do Cabido da Sé do Porto é dos quatro mais notáveis cartulários de Portugal, coligido por João da Guarda, raçoeiro do Cabido. Data do século XIV ou XV e é chamado Censual por conter a relação das censorias que as igrejas e mosteiros pagavam à catedral. O mosteiro de Canêdo pagava 20 bragais, 2 libras de cera e o censo de 200 morabitinos velhos. Censual a pág. 543. As citações são todas referidas ao Censual publicado pela Câmara do Porto. 

(3) − Concessio Conventus Monasterii de Canêdo supra ordinatione vel anexatione. Censual, 318-320. Uma carta de D. Dinis de 1295 confirma outra de D. Afonso de 1212 pela qual determina que o abade de Canêdo só pague sete medidas, por justa medição, dos bens reguengos pertencentes ao Mosteiro. Livro 753, 31 das Sentenças, no Arquivo do Cabido do Porto. Era já a falta de recursos.

(4) − Donatio domini episcopi Geraldi facta capitulo de Monasterio de Canedo. Censual, pág. 320-321.

(5) − Confirmatio Monasterii de Canedo ad presentationem capituli por tugalensis. Censual, pág. 322.  

(6) − Capellano vestro obedientiam et reverientiam exibentes.

Confirmatio capellaniae Monasterii santi petri de Canedo. Censual, pág. 323

Do Corpus Codicum, vol. I, pág. 524, constam as notas seguintes sobre inquirições nos julgados de Fermedo e da Feira.

«...Sam Pedro de Canedo e de Sam Vicente que he sofreganha de sam pedro. E a freguesia da mata e sam vicente de Louredo e uila seca e toseiro e parada e louredo e o ualle pessegueyro e ferreiros e sam glufe e rreuordello e Mosteiroo Sam Jorgio. Sam mamedi de guisandy. Sancti isidro de rromariy Sam mamedi de vila mayor e A aldeya de Cedofeita. Santa maria de feaaes Santiago de lobom. Item o logar que chamam paaçoo. Item a aldeya que chamam bretal Sam Salvador de fornos Sam miguel de duas Egreias. Sancto andre de Joyam Sam Martinho de dragoncelhe».

(7) − Unio sive Anexatio Monasterii de Canedo decanatui portugalensi. Censual, pág. 324 a 328. Arquivo do Cabido, livro 806 e 84 das Sentenças.

(8) − Possessio Monasterii de Canedo pro Decano Portugalensi. Censual, pág. 329-330. 

(9) − Os Condes da Feira procedem de D. Rui Gonçalves Pereira, irmão consanguíneo de D. Gonçalo Pereira. D. Nuno ou Fr. Nuno de Santa Maria tem na frontaria da igreja paroquial de Guisande uma recordação da sua vida de guerreiro e Santo. Em artísticos azulejos lá estão representados os conventos da Batalha e do Carmo, as bandeiras de D. Nuno, com a presidência deste, vestido de donato carmelita. É a recordação duma época brilhantíssima da História de Portugal.  

(10) − Renunciaçon que fez Domingos martynz dayam ao Moesteiro de Canedo. Censual, pág. 331.

(11) − N.º 779 do Índice Roteiro, no Arquivo do Cabido.

(12) − Livro 806 ou 84 das Sentenças, no Arquivo do Cabido; é muito importante e quase todo contém documentos relativos ao Mosteiro de Canêdo.

Em 1457 houve ordem régia pela qual se examinou na Torre de Tombo quais eram os casais do Mosteiro de Canêdo que deviam pagar foro ao Castelo da Feira.

Índice-Roteiro, n.º 586 ou livro 86 das Sentenças.

(13)Índice-Roteiro, n.º 782 e 785 ou livro 84 das Sentenças.

(14) − Livro 806.

(15) − HENRIQUE DA GAMA BARROS na História da Ad. Pública em Portugal, nos séculos XII a XV, voI. I, pág. 342, 346-348, 396; II, 220, 224 e segs.; III, 64, 421 e noutras passagens.

DR. FORTUNATO em várias passagens da História da Igreja em Portugal.

(16) − Catálogo, vol. lI, capítulo XIV. D. Rodrigo da Cunha, referindo-se às igrejas da Comarca da Feira, por 1623, escreveu: «S. Pedro de Canedo tem o Santíssimo Sacramento: Ermidas, S. Luzia, outra na quinta de Várzea. Tem de Comunhão 681 pessoas, menores 164. É anexa de Lobão e com ela é arrendada Vigairaria.» Catálogo dos Bispos do Porto, II Parte, Capítulo XXXXIIII.  

(17) − VITERBO, no Elucidário, a palavra foral; História da Administração em Portugal, nos séculos XII a XV, por HENRIQUE DA GAMA BARROS, III, 528 e seg., cap, lII, sec. I, «Forais dados pelo rei».

Agradecimento e explicação: À Ex.ma Direcção do Arquivo do Distrito de Aveiro o meu agradecimento pelo empréstimo da cópia do foral para este 'meu trabalho; juntei notas e explicações que são indispensáveis para compreensão de muitas passagens. Cito muito o falecido escritor GAMA BARROS, porque a sua obra é importantíssima e fácil de consultar para quem tiver o Índice Analítico do Sr. Dr. AUGUSTO REIS MACHADO.

Sabemos que, a seu tempo, será aqui publicado o foral completo como outros do distrito com o português do tempo de D. Manuel. Aqui vai actualizado por causa duma separata.

(18) − Eiradégas não indica só o fruto seco e debulhado na eira, mas é uma medida bastante arbitrária, como se deduz de muitos forais. Como medida de cereal a eiradéga media 1, 3, 4, 6, 12 e até 24 alqueires. Variava muito. VITERBO, no Elucidário. GAMA BARROS, obra cit., III, 482, 6117. Reguengos e realengos eram as terras do património real ou que pagavam direitos à Coroa. GAMA BARROS, cit. III, 614 e noutros logares.   

(19) − Pena no Elucidário de VlTERBO.

(20) − GAMA BARROS, obra cit., III, 342 e seg 

(21) − GAMA BARROS, obra cit., III, pág. 721 e seg., e 781 (pensão dos tabeliães).  

(22) − VlTERBO, no Elucidário. GAMA BARROS, III e IV  

(23) − GAMA BARROS, obra cit., voI. III e IV.  

(24) −  GAMA BARROS, na obra citada sobre pastos comuns, pastagens e montados. IV, pág. 83 e seg., 99-105.   

(25) − VlTERBO no Elucidário e GAMA BARROS, III, 495 (texto e notas) e 617.  

(26) − VlTERBO e GAMA BARROS, II e III.   

(27) − Afusal ou efusal era um certo peso de linho que correspondia a 2 arráteis. Para outros o efusal constava de 12 estrigas de linha.

Vinho mole era o mosto, o vinho que não ferveu. Havia o vinho de cutelo que cada um colhia da sua lavra e o vinho podado ou de vinhas. GAMA BARROS, lV, pág. 42 e seg. sobre vinho, azeite e linho.

Quarteiro era uma medida que variava bastante. Neste caso do Mosteiro o quarteiro valia 16 alqueires. Alqueire, quarteiro e moia variavam nos forais e nas localidades. Veja-se VITERBO no Elucidário e GAMA BARROS, IV, pág. 296-355, no capítulo « Pesos e medidas».
Gorazil, corazil, cobrazil... que aparece no foral significa uma parte do porco, ou espádua do porco. Calaça é a costa ou banda do porco. Veja-se, o Elucidário. 

(28)Elucidário de VITERBO nas palavras moio e medida velha, onde se mostra que, tendo D. Manuel procurado uniformizar as medidas, há nos seus forais diversidades e apresenta exemplos.

Sobre medidas de capacidade, veja se GAMA BARROS, IV, pág. 311-339.

(29)Préstimo ou prestimónio significa porção de rendimentos de um benefício. Significou também pensão diária, anual, temporária ou vitalícia na Igreja e no século. Elucidário de VITERBO.

(30) − Manuel Beça Leal foi reitor mais de 50 anos. Formado em Cânones pela Universidade de Coimbra, erigiu a Congregação da Ordem Terceira e foi visitador diocesano. No fim da vida, retirou-se para a Congregação de Oliveira do Douro.

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