A
ASSOCIAÇÃO Comercial de Aveiro foi uma das instituições que mais
benefícios prestou a esta cidade.
Da sua fundação e
actividades vou dar uma breve
notícia como subsidio para a história económica de
Aveiro.
Foi Nicolau Anastácio de Bettencourt, governador civil do distrito de Aveiro, quem promoveu a fundação da referida colectividade no ano de
1858, com o seguinte convite que mandou imprimir e distribuir, e do qual
temos presente um exemplar:
«O Governador Civil do Distrito de Aveiro
aos Commerciantes desta
cidade
São geralmente reconhecidas as vantagens que resultam do
estabelecimento de Associações Commerciaes, tanto para o bem do Estado,
como para o interesse dos individuos que
compoem a classe mercantil.
Quando se manifestam tendencias tão pronunciadas para a organisação de
Sociedades, em que os esforços collectivos dos associados preenchem
fins de utilidade geral e especial, que não podem attingir as forças de
cada um d'elles isoladamente empregadas: − quando se observam os
frequentes serviços que prestam taes Sociedades e nomeadamente as
Associações Commerciaes nas praças do Continente do Reino e ilhas
adjacentes, aonde se acham instauradas: − não deixarão por certo os Commerciantes desta Cidade de considerar as conveniencias de uma
instituição de tal ordem, agora mais que nunca reclamada em Aveiro pelo
desenvolvimento do
Commércio.
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Demais: − não é só para promover o que convier a favor
deste importante ramo de riqueza nacional; − não é mesmo
unicamente para velar pelos direitos dos associados, e representar aos
Poderes Publicos tudo o que fôr conducente ao
desejado augmento e livre transmutação dos produtos do paiz, que se
torna necessario estabelecer aqui uma Associação
Commercial.
É tambem, para que os membros desta classe respeitavel
possam entrar sem perda de tempo na posse e fruicção das
attribuições que lhe confere a novissima legislação especial
para este Districto, nomeando d'entre si, logo que estejam
constituidos em associação, um dos vogaes que tem de formar a junta encarregada, de superintender nas interessantes
obras do melhoramento da barra desta Cidade.
Assim, pois, entendendo que haveria inconvenientes em
addiar a organisação de que se tracta e persuadido de que todos os Commerciantes d'Aveiro estão bem compenetrados
das rasões que aconselham a prompta fundação de um similhante estabelecimento; não hesito em convidal-os para se reunirem
n'este Governo Civil no dia 29 do corrente a fim
de se confeccionarem os estatutos pelos quaes se hade reger a Associação
Commercial, confirmados que sejam com a competente approvação do Governo de Sua Magestade.
Bem certo estou de que os mesmos Negociantes acceitarão de boamente este meu convite, attendendo ao pensamento do bem publico que o dictou, e aos sinceros desejos
da auctoridade a favor da classe a quem é dirigido.
Aveiro 18 de Setembro de
1858
NICOLAU ANASTACIO DE BETTENCOURT
Foi bem sucedido o Governador civil na sua iniciativa. De facto foi
elaborado o projecto dos estatutos da pretendida
associação, e por alvará de 25 de Novembro de 1858 foram aprovados,
tendo ficado assim criada a «Associação Commercial de Aveiro».
Esta satisfez plenamente os fins para que havia sido fundada.
Mais tarde, a indústria começou a desenvolver-se também
na cidade de Aveiro, e reconheceu-se a conveniência de associar os
industriais, com os comerciantes. Por isso, fizeram-se novos estatutos,
aprovados pela Assembleia Geral de 29 de Dezembro de 1904 e aprovados
por alvará de 4 de Fevereiro de 1905, em virtude dos quais a antiga
associação passou a
denominar-se Associação Comercial e Industrial de Aveiro.
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O artigo terceiro dos novos estatutos definia assim os
fins da associação:
«1.º Discutir, dentro dos limites das leis, todas as questões de interesse comercial e industrial, e particularmente
aquelas que digam respeito às classes que compõem esta
Associação;
2.º Representar aos poderes constituídos sobre todos os
assuntos que interessem às mesmas classes;
3.º Iniciar, desenvolver e elucidar quaisquer assuntos ou melhoramentos comerciais e industriais que interessem
directa ou indirectamente às classes de que se compõe esta Associação;
4.º Procurar colocação para os filhos que os sócios deixarem na orfandade, sem meios de subsistência, encaminhá-los na vida
comercial ou outra qualquer, auxiliando-os segundo
o seu comportamento e aptidão;
5.º Subsidiar dentro das forças do cofre, quando a
Assembleia Geral o determinar, quaisquer estabelecimentos
de instrução, onde principalmente sejam leccionadas as disciplinas que constituem a educação indispensável a um bom
empregado do Comércio;
6.º Subsidiar nas mesmas condições quaisquer serviços
públicos ou particulares que facilitem o movimento do comércio desta praça, nomeadamente a permanência dum rebocador
para auxilio da navegação da barra de Aveiro;
7.º Finalmente, promover o desenvolvimento do comércio e indústria desta cidade e distrito por todos os meios
legais.»
Oitenta e dois anos viveu a Associação Comercial de
Aveiro, sempre com prestígio e desempenhando cabalmente
as suas funções. Aveiro deve-lhe muitas iniciativas e melhoramentos e uma notável defesa dos seus interesses morais e
materiais.
Foi a actual organização corporativa que concorreu para
a extinção da Associação Comercial e Industrial de Aveiro.
Com efeito, o decreto-lei n.º 24:715 de 3 de Dezembro de 1934
criou os Grémios do Comércio; o decreto-lei n.º 29:232 de 8
de Dezembro de 1938 permitiu transformar as associações
comerciais em Grémios do Comércio.
A referida associação, por vários motivos resolve então
transformar-se em Grémio. Elaboram-se por isso os estatutos do Grémio do
Comércio do Concelho de Aveiro que
são aprovados por alvará de 12 de Dezembro de 1940.
Os artigos primeiro e segundo destes estatutos são do
seguinte teor:
Art. 1.º Em conformidade com o decreto-lei
n.º 29:232
de 8 de Dezembro de 1938, a Associação Comercial e Industrial
/
102 / de Aveiro transforma-se no Grémio do Comércio do concelho de Aveiro.
Art. 2.º O Grémio tem a sede em Aveiro e abrange o
concelho de Aveiro.
Por alvará de 12 de Julho de 1941 a área de acção do
Grémio foi alargada aos concelhos de Águeda, Albergaria-a-Velha, Anadia,
Estarreja, Ílhavo, Mealhada, Murtosa, Oliveira do Bairro, Sever do Vouga e Vagos.
Terminarei esta notícia acerca da Associação Comercial de Aveiro com
umas breves notas biográficas do seu promotor, que o foi também da Caixa
Económica de Aveiro, utilíssima instituição de crédito que só há poucos
anos foi extinta.
Nicolau Anastácio de Bettencourt nasceu na cidade do Funchal aos 14 dias
de Fevereiro de 1810. Era filho do Dr. Anastácio Moniz de Bettencourt e
de D. Ana Jacinta Bettencourt. Iniciou a sua brilhante carreira
administrativa em Abril de 1833, com o lugar de secretário geral da
prefeitura de Angra do Heroísmo, para o qual foi nomeado por D. Pedro IV.
Exerceu o cargo de Governador civil de Aveiro desde 29 de Agosto de 1857
até 14 de Novembro de 1859.
FRANCISCO FERREIRA NEVES |