J. Vieira Resende, O morgadio de Vila da Feira, Vol. XI, pp. 114-122

O MORGADIA DE VILA DA FEIRA

COM finalidades diversas, já dissemos na Monografia da Gafanha (2.ª edição, pág. 79) e no Arquivo (voI. X, pág. 233) que o Morgadio da Vila da Feira veio a decair quase abruptamente da sua primitiva grandeza com o falecimento do seu primeiro Morgado.

Por falta de herdeiro certo e directo, foi a Casa deste Morgado rico transmitida, pelo testamento que adiante vai publicado, para um seu herdeiro incerto, para «aquelle, ou aquelles dos meus parentes que se acharem mais proximo ao tempo da minha morte e que forem da parte de minha mãe», dizia o testador.

Eram de longe, inúmeros e desconhecidos, os seus remotos parentes e, da determinação testamentária, imprecisa, sobreveio o mau sucesso, direi mesmo, o infortúnio do Morgadio.

Ainda que com risco de me repetir sobre alguns pontos já versados naquele livro e nesta 'publicação, mas no intuito de lhes dar mais amplitude, determinei-me agora a dar publicidade ao testamento do referido primeiro Morgado, rodeando-o de esclarecimentos e comentários que muito podem auxiliar os investigadores, e contribuir favoravelmente para a história de Aveiro, dos seus habitantes e desta ilustre e duradoura Casa.

Quem foi, pois, o primeiro Morgado da Vila da Feira?

Eis uma pergunta estranha que irá pôr em sobressalto a curiosidade daqueles que hoje pouco ou nada sabem acerca da personalidade daquele titular.

Nem admira, porque fundado o Morgadio em 1736 pelo seu avô, João Ferreira da Cruz, veio ele depois quase a desaparecer com a morte do seu primeiro representante. Fernando José Camelo de Miranda Pinto Pereira da Silva, primeiro Morgado de Vila da Feira.

A instituição dava-se em 1736 e a morte deste Morgado ocorria em 1792. Foram cinquenta e seis anos de fausto seguidos de cento e um anos de vida relativamente precária, vindo finalmente, depois de demorada dispersão, a terminar / 115 / em 1893 com a morte do 4.º e último Morgado, José Fernandes Teixeira.

Quando a abastada Casa daquele Moço Fidalgo da Casa Real, Fernando José, passava para o segundo Morgado e seu segundo primo, João Lopes Ferreira, não pôde este conservá-la íntegra, devido à pertinaz resistência dos ocupantes e intrusos que se opunham à justiça que, com pouco resultado, lhes era movida pelo legítimo Morgado.

A partir deste momento ficou sensivelmente desvalorizado o Morgadio nos seus bens e na sua fidalguia.

Que Fernando José Camelo tinha uma ascendência muito fidalga, entroncada na melhor nobreza de Aveiro, é o que agora passamos a ver por alto.

Era filho de Francisco António Camelo Falcão Pereira da Silva e de D. Luísa Caetana Camelo Falcão, e neto materno de João Ferreira da Cruz e de D. Francisca Luísa Teresa.

Desconheço a sua filiação paterna, opinando, contudo, que por este ramo genealógico devia estar ligado à antiga nobreza documentada por PINHO QUEIMADO e pelo P.e CARVALHO DA COSTA.

Do mesmo modo ignoro a data do seu nascimento, bem como a do seu casamento com D. Maria Eufrásia Soares de Albergaria.

Onde nasceu?

Em Aveiro? Em Vila da Feira?

Seus avós tinham a sua residência em Aveiro. Sabe-se, porém, que, quando ele tinha apenas poucos anos de idade, os seus pais residiam nas casas da Vila da Feira, ao mesmo tempo que seu avô instituiu em seu favor o vínculo de Morgado (ob. cit., págs. 268 e 269).

Podendo ter nascido em Aveiro, não excluímos a Feira de ter sido a terra da sua naturalidade. Os linhagistas que se dedicam aos trabalhos de investigação genealógica poderão encontrar nos registos paroquiais a freguesia onde teve lugar o seu nascimento e baptismo.

Residindo, enquanto criança, na Vila da Feira, é fora de dúvida que veio depois domiciliar-se, com poucas alternativas, em Aveiro, após o falecimento dos pais, e quando já administrava os seus bens.

Fixando-se ali, habitou as casas onde depois teve lugar o seu falecimento e onde hoje funciona o Seminário Diocesano.

Residindo habitualmente ali, ia, no entanto, passar temporadas durante certos períodos do ano às suas quintas e casas das Ribas de Cima do Castelo, da Feira, de Travanca de Sanfins, etc....

Estas razões habilitam-nos a contar entre os seus ascendentes as famílias mais nobres que viveram em Aveiro, quer já ali existissem desde tempos remotos, quer lá ingressassem / 116 / daquelas ou de outras terras por motivo de casamentos realizados, ou ainda por outros títulos ou razões de conveniência.

O Sr. Dr. FERREIRA NEVES publicou no Arquivo (voI. III, págs. 89 a 100) «Uma memoria sobre a vila de Aveiro» datada de 22 de Janeiro de 1687, da autoria do licenciado CRISTÓVÃO DE PINHO QUEIMADO, na qual vêm registados os nomes dos nobres que residiram e viveram em Aveiro desde épocas muito afastadas até àquela data de 1687.

Entre os muitos nomes que lá vêem publicados indescriminadamente e sem ordem cronológica contam-se os Soares, os Soares Albergarias, os Falcões, os Pereiras, os Saraivas, os Castelo Brancos, os Silvas, etc.

Pertenciam estes à gente nobre e fidalga de Aveiro.

De fora de Aveiro são mencionados na mesma Memória os Camelos, de Vilar do Paraíso; os Soares de Albergaria, de Fijó; os Pintos, de Paramos.

Estes agora são os nomes dos representantes de outras tantas famílias ou casas ilustres da Terra de Santa Maria, ou seja da Vila da Feira.

Como se pode verificar e é intuitivo, os sobrenomes de Fernando José Camelo e os de sua família encontram-se nos seus homónimos que PINHO QUEIMADO registou na sua Memória, com referência a Aveiro e à Terra de Santa Maria, ou Vila da Feira.

O P.e CARVALHO DA COSTA veio mais tarde a registar também esses nomes na sua Corografia Portuguesa, impressa em princípios do século XVIII.

Estas nossas observações vêm a propósito e são significativas. Naquelas épocas registadas pelos anotadores de Aveiro, já o Morgado, a sua família e os seus antepassados ali tiveram as suas casas, as suas quintas, as suas marinhas e por ali viveram.

 Associemos a estes dados históricos mais um outro documento de que é possuidor o Sr. Dr. FERREIRA NEVES.

É um manuscrito do Conselheiro JOSÉ FERREIRA DA CUNHA E SOUSA que foi transcrito no Arquivo (voI. VI, págs. 8; e segs.) e no qual se relata o que foi Aveiro antes de 1834.

Ali se faz referência a uma casa, à «única casa existente em frente ao Jardim de Santo António», diz o manuscrito, e da qual sabemos por tradição que foi pertença, com a sua veiga, de Fernando Camelo, que por ele foi habitada até à morte, deixando-a por último em testamento à sua mulher, D. Maria Eufrásia Soares de Albergaria.

A transcrição do manuscrito diz assim: «Esta casa pertencia a um morgado da serra, por apelido Soares de Albergaria, de quem se contavam muitas façanhas, como jogador de pau nas feiras e arraiais, que ele às vezes varria completamente; estava em parte desmoronada e / 117 / desabitada, mostrando assim pertencer a um morgado rico.

Foi afinal comprada pela viúva Barbosa que a reedificou e pertence hoje, se não me engano, ao Sr. Dr. António Emílio de Almeida Azevedo.»

Pois hoje, pertence à viuva deste.

Por associação e confrontação de datas e de nomes deve tratar-se, não de Fernando Camelo, mas antes de algum parente e herdeiro de D. Maria Eufrásia (Albergaria), que seria portador do seu nome, e a quem ela a tivesse por sua vez deixado, depois de a ter herdado do seu marido.

Tomando em linha de conta estas considerações, é mister presumir e quase afirmar que os Albergarias de que nos vimos ocupando neste genealógio, tiveram a sua ascendência originária nos Albergarias de Vilar do Paraíso (Vila da Feira) de que fala QUEIMADO, os quais JOSÉ FERREIRA DA CUNHA E SOUSA localiza na serra.

D. Maria Soares de Albergaria, nesta hipótese, seria, como a sua família, daqueles sítios.

Ou pertenceria aos Soares Albergarias, de Aveiro?

Como já por vezes temos escrito, e como se vê no testamento de João Ferreira da Cruz publicado na já citada Monografia, teve este, além das duas filhas professas no convento de Sá, a D. Luísa, mãe de Fernando Camelo, e uma outra filha, a D. Micaela, que foi casada com António José Saraiva de Castelo Branco para quem J. F. da Cruz também chegou a instituir outro vínculo de Morgado que eles não aceitaram nas condições propostas (Arquivo, voI. X, pág. 236).

Dentro desta mesma família, pois, e na pessoa de António Saraiva, vamos encontrar mais um ramo genealógico a ligar-se com os seus homónimos Saraivas e Castelo Brancos, de Aveiro.

Resumindo, concluamos que o primeiro Morgado de Vila da Feira foi um dos membros das famílias mais nobres de Aveiro e da Terra de Santa Maria, sendo aparentado também com os consanguíneos e afins da mesma nobreza.

Concluamos mais que, tendo falecido sem sucessão, e porque não teve também herdeiros nos seus tios António José Saraiva e sua esposa D. Micaela, ou descendentes seus, veio o Morgado a ter por legítimo sucessor um outro parente mais remoto, o seu segundo primo João Lopes Ferreira, como passamos a ver publicando o seu testamento, antecipando-o de algumas considerações.

João Ferreira da Cruz, natural do lugar de Casais, termo de Maçãs de D. Maria, vem residir para Aveiro em data que desconhecemos, e aqui estabelece, forma, e faz crescer a sua abastada casa, sendo casado com D. Francisca Luísa Teresa. Morre em 10 de Março de 1736 na sua casa da rua de S. Paulo e é enterrado no convento do Carmo. / 118 /

Em 25 de Fevereiro do mesmo ano faz testamento instituindo vínculo de Morgado a favor do seu neto Fernando José Camelo, na capela de N. Senhora de Monserrate da quinta das Ribas do Castelo, da Vila da Feira.

Diz assim o testamento:

«− quero e hé minha ultima vontade se obre o dito e referido para sosego e quietação de todos; e depois de satisfeittos os legados e o que fica dito, se satisfaça e pague na forma já referida e de todos os mais bens moveis e de rais e açoins que crecerem e restarem da minha terssa, seja feito vinculo de morgado regular, para nelles haver de suceder e ser deles admenistrador meu netto Fernando Joze, filho de minha filha Donna Luiza e de seu marido Francisco Antonio Camelo, mas isto no cazo somente de que a dita sua may e o dito seu pay não uzem da dita duação do dito seu tio, meu irmão, da dita quinta da Feira já relatada e fiquem com ela na forma que atras dego, porque no cazo que da dita duação uzem e queirão a deta quinta alem do dote que eu e sua may lhe fizemos, então quero e hé minha vontade e disponho, que em os ditos bens do dito vinculo, subseda e delles seja administrador meu neto Jozé Sarayva, e que instituia o dito vinculo com a obrigação e encargo de tres missas do Natal, ditas em cada anno na capella da Senhora do Monssarrate, da dita quinta da Feira, e dos des mil reis atras referidos e deixados a minhas filhas Relegiozas, e que dos ditos bens que asima vinculo em Morgado de moveis e açoins que tocarem á dita minha terssa se comprão bens de rais, livres e dezembargados [...] e no cazo que de meu netto que no dito Morgado suceder não haja desendentes nem parente algum de mim Instituidor que deva suceder em os bens do dito vinculo, então nelles suceda a Santa Casa da Misericordia desta villa, para destrebuir o rendimento em gastos dos pobres do Hospital [...] emquanto o dito meu neto não tiver a idade de vinte e sinco annos, ou não cazar, será admenistradora dos ditos bens minha mulher Donna Francisca [...]» (ob. cit., pág. 269).

Os pais de Fernando José Camelo cumprem a disposição testamentária. Saem da quinta da Feira que Manuel Fernandes, irmão de João Ferreira da Cruz, lhes havia doado, por entendimento mútuo dos dois, mas que Ferreira da Cruz tinha comprado com o seu dinheiro.

Estava, pois, Fernando Camelo investido no Morgadio quando era ainda menor, talvez de dois anos.

Sua avó foi administradora do vínculo até 1745, como 'consta do livro das respectivas contas, e os seus pais ainda administravam o mesmo vínculo em 1759, como também, consta de documentos inéditos. Pela documentação em meu poder, pouco mais sabe de que a vida do Morgado foi bastante / 119 / activa na administração da sua Casa, como também fora a do seu avô e pais. Nada sei acerca da data do seu casamento que realizou, ignoro aonde, com D. Maria Eufrásia de Albergaria.

Houve filhos?

O testamento que aqui está sendo posto em causa é claro dizendo que deles não houve sucessão.

Há, porém, uma tradição que, embora aqui posta de reserva, nos pode também manter em retraimento sobre a intenção que teria o testador ao empregar o vocábulo «sucessão».

Por amor a possíveis investigações genealógicas, e como base para a futura veracidade histórica, vamos relatar a tradição.

Diz ela que daquele casamento houve dois filhos que vieram a ser frequentadores em Lisboa da alta aristocracia e que, enamorando-se por lá de duas damas aparentadas com a família real, resultou dos seus devaneios amorosos, ou idílios aristocráticos, procedimento repreensível que chegou a ser escandaloso.

Fernando José Camelo, de sentimentos nobres e princípios rígidos, não pôde suportar que os seus pergaminhos de nobreza fossem enodoados com sucessos condenáveis, provenientes de cenas passionais em que ficava envolvida gente de sangue azul, quiçá de estirpe régia.

Desgostoso até ao âmago pelos galanteios desonestos dos filhos, toma uma resolução inabalável e executa-a imperturbavelmente.

Promove a deportação dos filhos que, pela justiça vindicativa paterna, são compelidos a expiar em desterro africano os seus desregramentos morais.

O homem probo e honrado tinha dado uma satisfação condigna à honra própria e alheia ofendidas, embora visse desfeitos todos os seus sonhos de fidalguia que se deveriam continuar no sangue das suas veias.

Parece romântica a tradição?

No entanto, ela existe.

Parece mesmo ter a sua confirmação no laconismo e no modo expressivo do testamento que vamos transcrever. São significativos os vocábulos na altura em que ele testador faz a transmissão dos bens para o seu herdeiro hipotético, para «aquelle, ou aquelles dos meus parentes que se acharem mais proximos ao tempo da minha morte, [...] por não termos sucessão», diz ele.

Porque não se diz: «sucessores», «herdeiros», «filhos», etc...?

Talvez o vocábulo ou a expressão não tivesse sentido intencional reservado, e é possível que a reserva só possa existir da nossa parte por motivo daquela tradição. / 120 /

Em qualquer das hipóteses, Fernando Camelo faz testamento determinando que o seu corpo, envolto no seu hábito de S. Francisco, seja enterrado em sepultura própria no convento de Santo António; que se lhe façam vários sufrágios, e outras disposições testamentárias, deixando alguns dos seus bens à sua esposa e ao herdeiro mais próximo o vínculo de Morgado.

Como habilitação para esta herança, aparece a herdeira mais próxima de outro ramo genealógico que era prima de sua mãe, Teresa Maria Ferreira de Lemos, que em outros documentos usa o nome de Teresa de Jesus Ferreira ou simplesmente de Teresa Maria. Era filha de Manuel de Lemos, irmão de João Ferreira da Cruz, prima de D. Luísa, que era mãe do testador.

Foi esta Teresa Maria Ferreira de Lemos que requereu a cópia do testamento, habilitando assim à herança o seu filho João Lopes Ferreira, segundo primo de Fernando Camelo.

João Lopes Ferreira, já habilitado à herança com a cópia do testamento a requerimento de sua mãe, e com o patrocínio de António da Costa Soares, bem compensado em virtude de um contrato feito (ob. cit., pág. 79), entra na posse da herança, e, em 1807, transfere o seu domicílio de Casais (Maçãs de D. Maria) para a quinta do Camelo, já sua, no Vale de ílhavo.

É ali que sempre tem residido toda a sua descendência, inclusive o avô do anotador destes apontamentos que foi o 4.º e último Morgado, José Fernandes Teixeira, falecido em 1893.

Era dali que eram demandados os ocupantes e intrusos que, na sua quase totalidade, ficaram subrepticiamente senhores de uma grande parte da Casa do Camelo.

Segue a cópia do testamento:

«Dis Thereza Maria Ferreira de Lemos acistente no lugar da Venda de Maria, termo da vllla de Masans de D. Maria que para requerimentos que tem lhe he necesario que o escrivam deste juizo lhe pase por sertidam o theor do testamento com que faleseo Fernando Joze Camello desta sidade de Aveiro, portanto

Passe em termos.
Carvalho
Pede a Vocemece seie
servido   mandar-lha
passar     na    forma
requerida  em  forma

E.         R.          M.ce

Em cumprimento do despacho retro do Doutor Gaspar Mendes de Carvalho Coutinho, e Vasconcellos, Juiz de fora com Alçada nesta cidade de Aveiro e seu termo por Sua Magestade Fideliscima que Deus guarde: João Antonio da Costa e Silva, escrivão de hum dos officios do publico judicial e notas nesta mesma cidade e seu termo por Provizão do tribunal do Dezembargo / 121 / do Paço, certefico em como por Donna Maria Eufrazia Soares de Alvergaria Pereira, viuva de Fernando Joze Camello de Miranda Pinto Pereira da Silva me foi aprezentado o testamento com que o mesmo seu marido falesceo, do qual o seu theor he o seguinte:

TESTAMENTO

Em nome de Deos amem: Eu Fernando Joze Camello de Miranda Pinto Pereira da Silva desta Cidade estando duente mas em meu prefeito Juizo peatendo fazer o meo Testamento como faço pela forma Seguinte:

Primeiro encomendo a minha [alma] a meu Senhor Jezus Christo para que me conceda o perdão de minhas Culpas, que lhe pesso pela Sua Infenitta Meziricordia, e pesso à Virgem Nossa Senhora, ao Anjo da minha Guarda, e a todos os Santos da minha devoção, que roguem ao mesmo Senhor por mim, na ora da minha morte == Sendo Deos Nosso Senhor servido levar-me para Si, quero que meu corpo seja amortalhado no meu Habito de San Francisco, e quero ser interrado na minha sepultura, que tenho no Convento de Santo Antonio desta cidade, que podendo ser se me faça Sem pompa hum Officio de Corpo prezente não podendo ser no mesmo dia do meu falescimento se me faça no dia Seguinte dezocupado, e que no dito se digão Miças gerais pela minha alma, por todos os saçardotes tanto Seculares como Regulares desta Cidade; o que tudo terminará minha mulher a Senhora Dona Maria Eufrazia, a quem nomeio por minha testamenteira, e lhe peço por merce o queira ser = Dispondo dos meus bens, e fazendo a rrespeito delles as declaracoens nesceçarias declaro, que a minha quinta de Travanca está obrigada, e hipotecada ao Dotte que trouce para a minha Caza a ditta minha mulher, e quero, que com efeito fique Sendo, para que em tempo algum ella não tenha falencia na selução e segurança delle. E como alem do Dote, que ella ade levantar por não termos Sucessão, eu lhe prometi, e me obriguei a dar-lhe de Arras quatro Centos mil reis cada anno emquanto ella for viva lhe nomejo em recompença dellas o meu Prazo de San Thiago de Piaens, de que Senhorio Direitto [é] o Mosteiro de Salzedas, o outro Prazo do Braçal, de que hé Senhorio Direito o Mosteiro de Lorvão, e os meus Prazos do Sobral da Freguesia de Ovar. Cujo nomeação lhe fasso Livres, e abselutamente na vida em que se acharem e de qualquer natureza, que Sejão para que ella os possua como Seus, e delles disponha como quizer não podendo jamais uzar das ditas Arras depois desta nomeação, e pesso aos Senhorios Direitos dos mesmos Prazos que asseitem a dita minha mulher por sua infiteuta, e lhe concedão as invisteduras, e titulos nessecarios = Deixo mais a ditta minha mulher estas Cazas em que vivo com todos os trastes e moveis que nellas estão asim como as bestas, Ceges, e Seus arreios, e quero tambem que ella fique con todos os Seus Vestidos, e joias in Solidum e tudo isto ainda em Reconpença e Remuneração das ditas Suas Arras = E no rresto dos meus bens Instituo por meu univerçal herdeiro aquelle, ou aquelles dos meus parentes que Se acharem mais proximos ao tempo da minha morte, e que forem da parte de minha Maj: E assim hej por concluhido e feito este meu testamento para o qual, e para mo escrever Roguei a Joze Pedro Leite desta Cidade que o escreveo, e comigo asinou, e declaro que neste Paragrafo leva na primeira Regra a palavra hej por Sima della no Reverço da folha antessedente, en quinta Regra leva por Sima a palavra não, e na outava Regra leva por Sima a palavra de Arras.

Aveiro quatorze de Majo de mil sette Centos noventa e dous. «Joze Pedro Leite» Fernando Joze Camello de Miranda Pinto Pereira da Silva.

APROVAÇÃO

Saibão quantos este publico lnstromento de aprovação ou qual em direito milhor lugar haja, e dizer Se possa virem que Sendo no anno do Nascimento de Nosso Senhor Jezus Christo de mil sette centos noventa e dous annos aos quatorze dias do mes de Maio do dito anno nesta Cidade / 122 / de Aveiro e Cazas de morada de Fernando Joze Camello de Miranda Pinto Pereira da Silva, Mosso Fidalgo da Caza Real onde eu Tabalião vim, e aqui se achava de cama de duença que Deos lhe deo, mas em Seu prefeito Juizo de que dou fé, e de Ser o proprio, e por elle prezentes as testemunhas no fim desta aprovação nomiadas, e aSinadas me foi entregue este papel dizendo-me que era o Seu Testamento que a Seu Rogo lhe havia escripto no dia de hoje o Bacharel Joze Pedro Leite, e pegando eu Tabalião neIle o corri com os olhos, e vejo estar escripto por letra do dito Bacharel Joze Pedro Leite Sem Burrão, entrelinha ou Couza que duvida faça em duas laudas e meia the onde prencepia esta aprovação e aSinado pelo dito Testador Cuja Letra e Sinal Reconheço por verdadeira de que dou fé, e as preguntas da lej que lhe fiz diante das mesmas testemunhas me Respondeo era o Seu testamento e ultima vontade e por elle deRogava outro algum que ouvesse feito, porque Só este queria tivesse validade, e pedia ás Justiças de Sua Magestade lhe fizessem dar inteiro Cumprimento. e eu Tabalião lho aprovo tanto quanto devo e posso em Razão do meu Officio, a que farão testemunhas Manoel do Nascimento, João Joze Baptista, João de Oliveira, Joze Francisco Ferreira, Luis de Loureiro Ferrão, Francisco de Almeida desta Cidade conhecidos de mim Tabalião que aqui aSinarão com o Testador depois desta aprovação lhe sser lida por mim João Antonio da Costa e Silva que o escrevi e aSenei». João Antonio da Costa e Sliva» Fernando Joze Camello de Miranda Pinto Pereira da Silva» Manuel do Nascimento» João Joze Baptista» Domingos dos Santos» João de Oliveira» Joze Francisco Ferreira» Luis do Loureiro Ferrão» Francisco de Almeida» Lugar do Sinal publico «em fé e testemunho de verdade» mil Sette centos noventa e dois» O Tabalião João Antonio da Costa e Silva» Não contem mais o dito Testamento e Aprovação delle que eu Escrivão aque passo na verdade por Certidão do proprio que tornei a entregar á ditta Dona Maria Eufrazia Soares de Albergaria Pereira que Recebendo aSinou depois desta Conferida e Conssertada por mim Escrivão e outro Official de Justiça comigo ao Consserto aSinado, em tudo e por tudo ao proprio testamento e sua aprovação na mão da ditta nos Reportamos em fé do que nos aSinamos nesta Cidade de Aveiro aos vente quatro dias do mez de Agosto de mil Sette centos noventa e dous annos. Eu João Antonio da Costa e Silva que a escrevj.

João Antonio da Costa e Silva
Cumigo (ininteligível)
Jozé Antonio Ferreira e Silva
Conssertada por mim Escrivam João Antonio da Costa e Silva
D. Maria Eufrazia Soares de Albergaria

Padre JOÃO VIEIRA RESENDE

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