VOLTANDO aos apontamentos
que nos forneceu o Sr. Dr. ANTÓNlO ZAGALO DOS SANTOS, de Ovar, vamos
indicar, muito sumariamente, as restantes agremiações musicais do nosso
Distrito, com a certeza de não ficarem
todas inventariadas:
Paredes do Bairro (Anadia)
− Fundada em 1888 e extinta
em 1898. Conhecem-se-lhe dois regentes: Rolhas, e Adriano da Silva
Carvalho, professor primário.
Palhaça (Oliveira do Bairro) − Fundada em 1879 por Sebastião Martins
Loureiro, tamanqueiro, e Manuel Marques,
lavrador. Regentes: Manuel José de Oliveira, Manuel Cristino
Mota, Manuel Marques, Manes Nogueira, Luís Pinto de Almeida
e Alfredo Cardoso Frederico.
Moita (Anadia) − Fundada em 1906 pelo P.e Serafim
Rodrigues, Manuel Rodrigues, António Almeida, Abel Simões,
etc. Regentes: Meliciano de Oliveira Gonçalves, Francisco
Esteves é Fausto Moreira Cancela.
Anadia («Música do Serra») − Fundada em 1874 pelo
Dr. José Paulo Cancela, Manuel Bonito e outros. Regentes:
Serra, José Guimarães e Teodomiro Argênteo. Terminou
em 1910 ou 1911.
Fermedo (Música de Cabeçais) (Arouca) − Fundada em 1886
por Domingos Correia dos Santos Lima e outros. Regentes:
Manuel Francisco de Paiva (o Venera), David de Sousa Heitor e António
Francisco da Rocha.
/
288 /
Canelas (Estarreja) − A «Banda Bingre Canelense», também conhecida por
«Sociedade Musical União Canelense», foi fundada em 1867 por João
Lourenço Domingos da Silva, proprietário; P.e Joaquim Domingos da Silva
e Manuel José Aguiar e Santos. Regentes: António Domingues de Sá e
Manuel Joaquim Ribeiro de Andrade, lavradores; Manuel Máximo da Cunha,
serralheiro; Manuel Pedro Calado, Delfim Emílio Matias e José Vaz
Redondo.
Luso (Mealhada) − «Filarmónica Lusitana», fundada em 1895 por José
Vieira de Melo Pimenta, José Fernandes Pimenta e Firmino dos Santos,
todos proprietários. Regentes: Adriano de Sousa Carvalho, professor;
Alfredo Rodrigues, sargento reformado; e Benjamim de Sousa Carvalho.
Terminou em 1923.
Mealhada − A «Sociedade Filarmónica Mealhadense» foi fundada em 1850,
não se sabe por quem. Regentes: Marcelo, Stofel, António Santos, Adriano
de Sousa Carvalho, e um tal Queirós, músico reformado. Acabou em 1926.
Pampilhosa (Mealhada) − A «Filarmónica Pampilhonense» foi fundada em
1898 por João Teixeira Lopes. Regentes: Alfredo Fernandes de Almeida,
Adriano de Sousa Carvalho e Joaquim Simões Pleno.
Murtosa − «Pelos anos de 1840 a 1855 − escreve o Dr. ZAGALO DOS SANTOS
−, foi estabelecer-se na Murtosa o boticário Francisco Leite, de Ovar,
que se chamava Francisco Leite de Sousa, filho de António Leite de
Sousa, também natural de Ovar, que registou sua carta em 15 de Dezembro
de 1836. Foi ele o fundador da filarmónica e seu primeiro regente.
Morto este, sucedeu-lhe seu filho, Agostinho António Leite, já falecido
em 1932. Apesar de transferido para Estarreja (1869), continuou na
regência.
Passou então a denominar-se «Música de Estarreja» e era constituída
por elementos da Murtosa, Avanca e Pardilhó. Os ensaios faziam-se na
freguesia de Veiros, por comodidade de todos.
Em 1870, o professor primário António Maria Pereira fundou a segunda
filarmónica, conhecida pela «Música do António Maria». A ela pertenceu
o músico Manuel Maria da Silva Portugal, que abandonara Agostinho
António Leite, quando este foi viver para Estarreja. Foi este Portugal
um exímio tocador de flauta e como tal constituiu um quarteto com o vareiro Dr. António da Cunha e Costa, médico, com o Dr. Elmano Cunha e
Costa, e outro.
Volvidos anos, vendo que o mestre lhe era inferior, emancipou-se dele e
em 1889 fundou a terceira música da Murtosa,
/
289 /
[Vol. VIII -
N.º 32 - 1942]
só com elementos criados por ele, com excepção de três músicos,
pertencentes à da Estarreja.
De 1889 a 1897, houve, pois, duas filarmónicas. Alípio da Silva Portugal
reuniu as duas filarmónicas e conseguiu granjear-lhe óptima reputação.
Apesar disso, terminou em 1922, em consequência da forte emigração para
a América.
Em 1932, fundou o professor Miguel Maria da Silva Portugal,
filho de Alípio da Silva Portugal, a − « Banda dos Escoteiros».
Cedrim (Sever do Vouga) − A «Filarmónica de Cedrim», foi fundada em
1910 por Artur Nunes Vidal e P.e Artur Tavares Dias, que foram
sucessivamente seus regentes. Acabou em 1916.
Silva Escura (Sever do Vouga)
− A «Filarmónica Silva-Escurense» foi
fundada em 1916 e extinguiu-se em 1928. Foram seus fundadores, além
doutros: Dr. Álvaro Amorim, médico; Adelino Cabral e Belarmino Martins
Pereira. Regentes: António Francisco Tavares, Vergílio Augusto de
Oliveira − ambos regentes da «Filarmónica Severense» − e Alfredo
Malinhas, músico do Porto.
Souto da Feira − A «Música do Souto» foi fundada em 1850 pelo P.e
Francisco Leite de Andrade, seu primeiro regente. Regentes posteriores:
Bento José Rodrigues, Manuel Pereira dos Reis, Jacinto Soares Calçada,
António Martins Leite e, pela segunda vez, Manuel Pereira dos Reis.
Desorganizou-se em 1931, mas voltou a tocar em festas e romarias, regida
pelo mestre de obras, de Ovar, Joaquim da Silva (o Raso), em 1933.
Podem ainda citar-se duas filarmónicas
− a de Bairros e a de Fornos (Castelo de Paiva), a primeira fundada em 1900 por Evaristo R. da Silva e
Augusto Gomes da Rocha, e a segunda em 1910 por António Moura Duarte. Em
1932, era regente desta última Felisberto de Moura Duarte.
*
Olhando no seu conjunto as sociedades musicais do distrito
de Aveiro, conclui-se que a mais antiga notícia, ascendendo à segunda
metade do século XVII, se refere à actividade musical de Aveiro.
Segue-se, imediatamente, Figueiredo do Burgo, de Arouca (1700 e tal).
Posteriormente, as mais antigas filarmónicas são as de Ovar, S. Tiago de
Riba Ul e Arrifana, fundadas entre 1800 e 1820. Note-se a proximidade
destas localidades.
Surgem, entre 1820 e 1830, as filarmónicas de Arouca, Vista Alegre e S.
João de Loure; e em 1830 e tal e 1840 e tal nascem, respectivamente, as
de Ílhavo (velha) e da Murtosa.
/ 390 /
Entre 1850 e 1860, aparecem as de Souto da Feira, Espinho, Estarreja,
Águeda, Mealhada, e outra na capital do Distrito; entre 1860 e 1870, as
de S. João da Madeira, Albergaria-a-Velha,
Fermentelos, Canelas, Vagos e Pessegueiro do Vouga; entre 1870
e 1880, as de Macieira de Cambra, Pardilhó, Palhaça e Anadia; entre 1880
e 1890, as de Fermedo (Arouca), Pinheiro da Bemposta, Ovar (Bombeiros),
Sever do Vouga e Paredes do Bairro; entre 1890 e 1900, as de Cucujães, Junqueira, Luso e
Pampilhosa; entre 1900 e 1910, as de Loureiro, Bairros (Arouca),
Moita, Ílhavo (Nova) e Aveiro («José Estêvão»); entre 1910 e 1920, as
de Troviscal, Mamarrosa e Barcouço (Mealhada), Fornos (Arouca) e Vale de
Cambra, Cedrim e Silva Escura; entre 1920 e 1930, as de Eixo, Salreu e
Pardilhó (Nova); e as últimas de que temos notícia são a de Paramos e a
mais nova de Aveiro, fundadas depois de 1930.
Algumas dessas agremiações ou sociedades musicais têm, como vimos,
raízes muito profundas, e não poucas conseguiram granjear notável fama.
São todas obra de indivíduos que podemos considerar como beneméritos. Na
fundação delas encontramos eclesiásticos, professores primários, músicos
reformados, músicos amadores, médicos, advogados, capitalistas,
proprietários, e até pessoas de profissões humildes, e por vezes quase
analfabetas.
Umas, depois de haverem atravessado fases de maior ou menor esplendor,
ainda existem; outras morreram, vítimas de dissídios ou da falta de
meios da vida; outras ressuscitaram,
impulsionadas por novos «carolas».
O povo precisa de música como de pão para a boca. Tem os seus orfeões, a
duas e três vozes, ouvidos principalmente nas espadeladas e esfolhadas;
tem as suas tunas e os seus
« ranchos»; mas as filarmónicas, que nas festas de igreja se
transformam em orquestras, provam o espontâneo valor artístico
do povo ou o seu natural gosto pela música. Escolas de bom
gosto e de educação musical, as filarmónicas afirmam o espírito
de coesão, disciplina e bairrismo dos seus componentes e de quantos,
vencendo por vezes enormes obstáculos, contribuem para ,a sua
sustentação.
É ver o orgulho com que elas se apresentam em público,
ostentando fardas e bandeiras, e o ardor com que se medem com outras nos
chamados «despiques» de arraial, capazes, só por si, de arrastar
multidões. Graças a elas, o povo, que de ordinário só costumava vibrar
com a execução de peças de acentuado cunho popular, como são as «rapsódias», já muitas
vezes vai ouvindo com prazer, preferindo-a aos descantes, a música
clássica, quer a de um Verdi, de um Mascagni ou de
um Puccini, quer a de um Wagner ou de um Tchaikowsky.
O escalracho do jazz, que infelizmente já invadiu cidades, vilas e
aldeias, não poderá, mercê da intuição artística e da
/ 291 /
inteligência dos regentes das bandas populares, abafar o gosto pela
música propriamente dita. O jazz passará!
O distrito de Aveiro deve ser dos mais bem dotados em filarmónicas
populares, constituídas por indivíduos que geralmente não vivem da
música. É prova disso o avultado número de bandas que deixámos
inventariadas nas páginas do Arquivo, algumas com mais de cem, outras
com mais de cinquenta anos de existência.
JOSÉ PEREIRA TAVARES |