Padre Miguel A. de Oliveira, Piratas argelinos na praia de Esmoriz há 200 anos, Vol. IV, pp. 139-140.

PIRATAS ARGELINOS NA PRAIA

DE ESMORIZ HÁ 200 ANOS

NAVEGANDO huma caravella de hum dos portos do «Reino de Galliza para Setubal, avistou no mar hum navio, que foi observando sem suspeita de ser inimigo por lhe não ver lançar lancha fóra, porém quando menos o imaginava, se vio cortada, e accommettida pela parte da terra, e do Sul por huma lancha com dezoito homens bem armados, e hum pedreiro na prôa. A caravella vendo-se entre a náo, e a lancha foi retrocedendo para o Norte, e se chegou tanto a terra, que encalhou, e receando-se os que nella vinhão (ainda depois de encalhados) do navio, e da lancha, que os vinhão accommettendo, se lançárão no bote, e se salvárão em terra na praia de Esmoriz da Villa da Feira no dia 10 de Julho [do ano de 1738]. Os Muuros entrárão logo á sua vista na caravella, de que tirárão algum fato, com que huns voltárão na lancha para o seu navio, ficando os mais na caravella para a porem em mareação, com ajuda do seu navio, porém neste tempo veio hum mar tão rijo, que lhes voltou a lancha, e como ainda estávão mui chegados á caravella, se afogou só hum, e se salvárão nella os outros, que logo começárão a atirar para a terra contra os caravelleiros, e algumas pessoas, que vierão correndo para a praia. Tocou-se logo a rebate na terra, soárão os sinos das Freguezias de Esmoriz, Paramoz, e Silvade, e concorreo muita gente á praia. Pascoal Pimenta Soares, Alcaide Mór de Barcellos, que se achava casualmente na casa do Abbade de Esmoriz seu irmão, montando logo a cavallo se chegou ao sitio da peleja, e deo calor ao povo, de modo que os Mouros vendo-se em secco, sem lancha, e que o seu navio se tinha feito ao mar, se rendêrão captivos em numero de dezesete, e forão levados para casa do dito Abbade, que os tratou caritativamente, provendo-os de sustento, e de roupa. Entre estes dezesete / 140 / havião oito Turcos, e tres que fallavão bastantemente a Lingua Portugueza, e a Castelhana. Confessárão que o navio era casco Inglez, que jogava vinte e quatro peças, que sahírão do porto de Argel, e que chegárão á altura das Ilhas Terceiras, e passárão depois áquelles mares, sem haverem feito preza alguma. Forão levados para a Cidade do Porto por hum destacamento de Soldados, commandados pelo Sargento Mór do Regimento, com hum Capitão de Granadeiros, e mais Officiaes subalternos, que marchárão toda a noite por ordem do seu Coronel, para virem acudir ao rebate de que o Castello de S. João deo aviso, pela noticia que teve da peleja por alguns pescadores. He para admirar a promptidão e zelo com que acudírão á defensa do Paiz, não só os homens, mas ainda as mulheres carregadas com cestos de pedras, por não as haver na praia, que he toda de area, e até entre ellas concorreo huma com a pá do seu forno para entrar com ella na peleja.»

(Gabinete Histórico de Fr. CLÁUDIO DA CONCEIÇÃO, tomo IX, págs. 132-135).

Pela cópia,

P.e MIGUEL A. DE OLIVEIRA

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