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Bem haja!

Com 6 ou 7 anos — muito mais «novo» do que aqueles que hoje se quedam na mesma idade!!! —, ali pelos primeiros Domingos depois do S. Miguel, soube, pela primeira vez, o significado de Bombeiro.

Uma sineta de som forte, em paralelo com o roncar cavernoso dum motor, nada apressados, em direcção a um pequeno largo abrigado por meia dúzia de casas de lavradores — os mais afastados do sítio.

Ali, um carro aberto, vermelho, despeja homens de azul e dourados na cabeça, de bornal na mão, logo se encaminhando para as portas de família que, na minha aldeia, aqui e além, definiam o burgo e a freguesia que o disciplinava.

Para mim, na novidade oferecida, alguma coisa de festa. Estes grupos que estendiam a sacola para que nela caíssem cereais ou moedas, sensibilizaram-me e, nas andanças com eles, calcorreando algumas ruelas, vivamente interessado nos resultados que iam ficando, de casa em casa, de pessoa para pessoa, também eu fui naquele dia. Foi nesse entusiasmo festivo, no desequilíbrio duma curiosidade branda e inocente, que minha mãe, com uma linguagem sonorizada de ternura, me foi dizendo quem são esses homens vestidos de azul, com «pendurezas» brancas sobre o peito e as cabeças cobertas por capacetes brilhando ao sol. Explica-me, então, no seu entendimento carinhoso, o que é um Bombeiro; fala-me do seu trabalho, dos perigos que cercam estes homens; durante algum tempo, com exemplos que multiplica para que melhor possa compreendê-los, dá-me naqueles 6 ou 7 anos, toda a dimensão da sua grandiosidade. Não sei quem eram nem donde vinham; uma sineta tocando sempre, um automóvel vermelho roncando e quedando-se de seguida; aqueles homens assim vestidos, de porta em porta recebendo migalhas que lhes eram entregues, ficaram, para sempre, os heróis da minha imaginação.

 

Aveiro está de Festa, o Distrito rejubila, os Homens que sentem, na solidariedade social, a razão primeira da sua existência, louvam e saúdam estes bravos e humildes que, tudo dando para nada exigirem, têm por direito próprio o seu Quartel. A «casa» onde vão encontrar, na ética que os informa, a resposta legítima a algumas das suas preocupações, recebe desta forma que o tempo gastou, a nobreza com que sempre soube robustecer, nas horas de boda e de tristeza, as acções que eles, bombeiros, logo esquecem quando esgotada a sua participação, desconhecendo ou para eles tendo insignificância, o risco, o sacrifício, o egoísmo, o interesse económico, sei lá que mais?!! Entram, na história desta nossa Aveiro, os Bombeiros Velhos (novos no sentimento e na lembrança das gentes destes lugares, desta região), página rica virada junto à ria, na brancura, ainda, do seu salgado ou nas faldas da serra, quando a mata arde e a chama / 6 / lambe velhacamente os que se erguem, opondo-se aos seus desejos ou desígnios.

Um Bombeiro não se submete à morte. Despreza-a, libertando-se dela, em cada instante que entrega à eternidade a sua obra, o seu amor fraterno simples e puro.

Saúdo esta Associação Humanitária e, nela, todos os Bombeiros deste Distrito com o muito respeito que tenho pelos Bombeiros portugueses. Bem-haja!

Sebastião Dias Marques
Governador Civil de Aveiro

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