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        A casa da Beira interior, erguida numa 
        zona de afloramentos graníticos ou de xisto, participa em geral das 
        características das construções da metade norte do País. No estudo da 
        habitação, temos sempre aliás de extremar a que, fruto das 
        
        
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        exigências geológicas, nos dá uma fácies sóbria, por vezes severa, da 
        que se esteia na intervenção erudita, pela aclimação dos estilos 
        importados, e cabe mais frequentemente ao solar citadino ou rural. Fora 
        desta intervenção, nota-se uma flagrante diferenciação imposta pela 
        variedade das condições geológicas, climáticas e agrárias, desde os 
        palheiros do litoral e a casa de xisto, cosida à encosta da montanha e 
        parecendo brotar dela como um seu produto natural, as cabanas ou choças 
        primitivas de certas regiões da Beira Litoral e da Beira Alta, às rudes 
        casas pelásgicas, construídas na anfractuosidade dos rochedos, nas 
        ásperas regiões do granito. 
        
        
         A maior frequência típica da casa beiroa, 
        próxima parenta da trasmontana ou minhota, é aquela que se limita a um 
        só andar de pedra, aparelhada sem cimento, de polígonos irregulares, à 
        maneira proto-histórica, ou então de cutelo, constituindo perpianho, 
        que não é a pedra de travação, o bloco que atravessa toda a espessura 
        duma parede e é visível nas suas duas faces ou paramentos (como o 
        francês parpaing), mas o sistema da aparelhagem em que as pedras 
        são colocadas de cutelo, com uma espessura aproximada de 25 centímetros. 
        No rés-do-chão são os compartimentos para a alfaia agrícola, o celeiro, 
        o lagar com a casa da lenha, quando esta se não acumula no vasto pátio, 
        coberta por um alpendre. A escada é quase sempre exterior, dada a 
        facilidade de ocupação de terreno, e ora se encosta à fachada, ora cai 
        sobre ela perpendicularmente, frequentemente alpendrada no alto. A 
        varanda é um elemento característico das casas rurais, larga e 
        soalheira, com telhado assente sobre prumos de madeira 
        
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        terminados em cima por cachorros duplos, constituindo uma espécie de 
        capitel. Em casas mais ricas e onde a pedra abunda, a coluna dórica do 
        tipo popular português, de delicado fuste, alinha-se esbeltamente, 
        formando galeria, o que dá uma linda cor às fachadas. Todavia, o 
        alpendre, citado muitas vezes como a forma mais característica da casa 
        portuguesa, não é, evidentemente, um privilégio nacional: constituem, 
        por exemplo, formas bem típicas do alpendre as balconadas cubicatas 
        da região asturiana. 
        
        Nas Beiras, como no resto do Norte 
        português, é frequente o portão nobre de entrada para o vasto pátio ou 
        terreiro, quase sempre ao lado da frontaria, mas também precedendo-a com 
        nobre aspecto, umas vezes simples, coberto de um tejadilho de pedra, 
        onde no Outono se seca a fruta, outras com mais plena preocupação 
        arquitectónica, com cimalha saliente encimada por uma cruz ou um brasão 
        de armas flanqueado por dois vasos heráldicos. 
        
        O pátio, zagão, como lhe chamam em alguns 
        pontos da Beira (cfr. o zaguán espanhol) 
        (2) para onde dão 
        os estábulos, tem a um canto o forno, redondo e de tecto cónico, cruzado 
        por dois tijolos sobre a boca, postos para a protecção da fornada. A 
        larga varanda citada dá quase sempre para o pátio, e muitas vezes, nas 
        noites estivais, serve de leito para se fugir à canícula, e 
        porque é soalheira, serve também de sequeiro do milho ou madureiro de 
        fruta. A cobertura é frequentemente de telha-vã, quase sempre sem o 
        perfil das chaminés, que dão uma graça tão íntima às empenas das casas 
        algarvias.  
        
        
        (Continua pág. 33 após anexo com 4 
        imagens. 
        
        
        – ►►►) 
        
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        (1) 
        – Por JOÃO BARREIRA. 
        
        (2) 
        – O termo deriva, segundo o PROF. DAVID LOPES. do árabe peninsular 
        eçtenán que costuma escrever-se também istnán ou istinán 
        e que deu o nosso saguão.   |