| Perante a elevada 
multiplicidade de
 tipos de textos 
existentes, torna-se extremamente difícil elaborar uma classificação tipológica 
das mensagens verbais. Por muito cuidado e minúcia que se tenha na elaboração de 
diferentes classificações segundo diversas perspectivas de análise, qualquer uma 
delas ficará sempre incompleta e susceptível de críticas por este ou por aquele 
aspecto. A sua elaboração leva-nos a correr riscos de falharmos por inexactidão 
ou por omissão de elementos; mas a sua não elaboração acarreta-nos igualmente 
grave prejuízo, na medida em que nos impossibilitará de ficarmos com uma visão 
de conjunto dos diferentes tipos de textos, dificultando-nos simultaneamente o 
estabelecimento de uma sequência a seguir no estudo de cada um. Entre estas duas 
posições 
─ fazer ou não fazer 
─, optamos pela 
primeira, com todos os riscos daí resultantes, mas certos de que alguma vantagem 
daí obteremos. Tendo em conta 
uma tipologia de discursos com base na reflexão de  Benveniste[1], poderemos 
elaborar um quadro de classificação com base nas pessoas intervenientes: 
discursos de primeira, de segunda, de terceira pessoa e híbridos. Daqui 
resultará um quadro de classificação idêntico ao apresentado na figura 73, 
quadro que seguramente estará incompleto, mas que nos permitirá ficar com uma 
ideia dos diferentes tipos de texto existentes, podendo ser posteriormente 
completado por qualquer um de nós. Convirá desde já frisar que, nesta 
classificação tipológica, não estão considerados os textos de carácter 
literário. Se o fizéssemos, teríamos de começar por considerar duas grandes 
classes de textos: os literários e os não literários. Interessa-nos agora 
considerar essencialmente o domínio do não literário, embora não nos possamos 
esquecer de que, por vezes, certos textos assumem uma posição intermédia entre o 
literário e o não literário, caracterizando-se por uma situação mista. Por 
exemplo, a  crónica 
jornalística situa-se 
frequentemente numa posição intermédia entre o literário e o não literário. E 
quem diz a crónica, diz outros tipos de texto, cuja posição é quase sempre 
ambígua. Como classificar, por exemplo, as crónicas de Fernão Lopes? Não estarão 
simultaneamente no domínio da História e da Literatura? E as Confissões 
de Rousseau? 
  
    |  | 
      
        | 
        TIPOS DE DISCURSO | 
        TEXTOS EXISTENTES |  
        | 1ª PESSOA | monólogo não literário diário auto-biografia |  
        | 2ª PESSOA | discurso publicitário |  
        | discurso argumentativo | 
        sermão 
        discurso |  
        | convite |  
        | requerimento |  
        | 3ª PESSOA | discurso de imprensa | notícia reportagem |  
        | discurso historiográfico biografia ensaio discurso «negotialis» |  
        | HÍBRIDOS | carta comercial crónica comunicado entrevista |  |  |  
    |  | 
    Figura 73: Classificação tipológica dos textos 
    tendo em conta as pessoas accionadas no discurso. |  |  Vejamos ainda 
outra classificação tipológica, esta tendo em conta o discurso de tipo 
negocial, as chamadas «mensagens negotiales», cujo tipo de discurso 
está já englobado no quadro da figura 74. Acontece que o  discurso «negotialis» 
apresenta uma grande variedade de textos, de acordo com as funções desempenhadas 
por cada um. Por «negotialis», 
do Latim NEGOTIU(M), entende-se um conjunto de mensagens que tratam assuntos 
objectivos, sem qualquer marca de subjectividade (ou pelo menos com esta 
reduzida ao mínimo), escritas numa linguagem concisa, clara e objectiva. Estes 
textos caracterizam-se por:  
► Considerarem 
aspectos concretos, tendo em conta as relações públicas e as actividades 
desenvolvidas no mundo dos negócios (actividades hoteleiras, turísticas, 
empresariais, etc.); 
► Serem 
destinados a um receptor específico, restrito e bem definido; 
► Exigirem grande 
cuidado e precisão na apresentação dos factos, obrigando à exactidão na 
terminologia e na descrição; 
► Exigirem 
obediência a um 
plano rigoroso na 
exposição dos factos; 
► Exigirem uma 
disposição específica (arranjo gráfico) para cada tipo de comunicação (cada tipo 
de mensagem tem as suas normas específicas); 
► Exigirem uma 
redacção cuidada, com frases lineares, correctamente estruturadas e claras, com 
vocabulário denotativo, lógico e técnico.   Apresentadas as 
características, no geral, dos
 textos de tipo 
negocial, vejamos como 
poderão ser classificados, tendo como ponto de partida reflexões efectuadas por 
outros autores[2] As mensagens ou 
textos «negotiales» podem ser divididos em duas grandes classes: os escritos 
científicos e técnicos; os escritos de 
acção, ligados a actividades ou sectores profissionais, tais como 
administrativos, comerciais, de actividades, empresariais, etc. A estas duas 
classes juntamos ainda aquele conjunto de textos de carácter burocrático, tais 
como pedidos de certidões, atestados, requerimentos, certificados, etc. Os 
escritos de acção subdividem-se ainda em várias espécies ou subclasses, tendo em 
conta os objectivos específicos das mensagens (veja-se o quadro da figura 73). 
  
    |  |  |  |  
    |  | 
  Figura 74: Uma das muitas propostas de classificação das mensagens negotiales. |  |  Observando os 
dois quadros das figuras 734 e 74, seguramente incompletos, verificaremos desde 
já que há uma grande quantidade de  tipos de texto. E 
dentro do tipo negocial, a variedade de produção textual é altamente elevada, 
indo desde a "simples" carta comercial
 
─ as cartas «negotiales» 
─ , com grande 
quantidade de variantes, até ao requerimento, à acta, ao relatório, ao 
«curriculum vitae», etc. Mas a 
classificação tipológica dos textos pode ser 
estabelecida tendo em conta outros critérios. 
  
    |  | 
      
        | TIPOS 
        TEXTUAIS | CASOS REAIS 
        EM QUE OCORREM |  
        | NARRATIVO | romance, novela, conto, 
        relato histórico, narrativas publicitárias, cinema banda desenhada, 
        episódios humorísticos, anedotas, relatos orais |  
        | DESCRITIVO | surge em várias situações: 
        integrada em textos narrativos, inventários, dicionários 
        (enciclopédicos), manuais de instruções, etc. |  
        | EXPLICATIVO | textos didácticos e 
        científicos |  
        | ARGUMENTATIVO | discurso oratório, discurso 
        publicitário, etc. |  
        | IMPERATIVO | manuais de instruções, 
        receitas culinárias, textos publicitários, etc. |  
        | PREDITIVO | profecias, horóscopos, 
        boletins meteorológicos, previsões eleitorais, etc. |  
        | CONVERSACIONAL | entrevista, situações de 
        diálogo |  
        | RETÓRICO | poema, prosa poética, canção, 
        slogan, provébios, ditados, máximas |  |  |  
    |  | Figura 75: Classificação 
    tipológica textual elaborada com base no artigo de Jean Michel Adam. |  |  Se consultarmos o 
trabalho de
 Jean Michel Adam[3], verificamos que 
ele nos apresenta cinco  tipos textuais 
clássicos de base
 
─ o tipo narrativo, o descritivo, 
o explicativo, o argumentativo e o imperativo 
─, aos quais se 
podem juntar ainda o tipo textual preditivo, um tipo textual conversacional e um 
tipo retórico, constituindo, no fundo, uma base tipológica com oito categorias. No  tipo narrativo, que se 
caracteriza pela apresentação de um ou vários factos inseridos num conjunto de 
parâmetros espaciais, temporais e causais[4], incluem-se 
diversos géneros, literários e não literários, tais como o romance, a novela, o 
conto, o relato histórico, a parábola, narrativas publicitárias, relatos 
políticos, a banda desenhada, o cinema, anedotas ou episódios humorísticos e 
relatos orais. No  tipo descritivo incluem-se 
aqueles textos ou sequências textuais cujo objectivo é o de apresentar as 
características inerentes a uma pessoa, a um espaço, a um objecto. Estes textos 
ou sequências textuais geralmente caracterizam-se por apresentarem a palavra ou 
tema gerador seguido da expansão ou definição desse elemento pela enumeração das 
suas características. Recorde-se o que se disse acerca da descrição no capítulo 
VII e leiam-se, a título exemplificativo, os diversos textos aí apresentados. O  tipo explicativo é um tipo de 
discurso que tem por objectivo levar à compreensão de determinado conceito ou de 
determinado facto. É o que encontramos nos chamados discurso didáctico e 
discurso científico. No  tipo 
argumentativo pretende-se 
convencer, persuadir, levar o receptor a reagir de determinada maneira. 
Encontramo-lo, por exemplo, nos textos publicitários e nos discursos políticos. 
É um tipo de texto que pode apresentar um raciocínio de acordo com a seguinte 
estrutura: 
  
    |  | 
      
        | 1º - TESE;  2º - PREMISSA;  3º - ARGUMENTOS;  4º - CONCLUSÃO
 
 |  |  |  No  tipo imperativo procura-se igualmente exercer influência no
receptor, levando-o a agir de determinada maneira. Encontramo-lo em
vários textos como, por exemplo, quando apresentamos o «modus operandi»
de um aparelho, uma receita culinária, uma informação oral a um pedido de
informação (por exemplo, como quando perguntamos onde fica determinado local e
nos são fornecidas as correspondentes informações, o interlocutor diz-nos:
«Siga por ali, vire à  esquerda no
primeiro cruzamento, ...), quando damos uma ordem, etc.   O  tipo
textual  preditivo encontramo-lo, por exemplo, num boletim
meteorológico ou num horóscopo. Nele procura-se efectuar uma previsão,
uma profecia. O  tipo
textual  conversacional corresponde às situações correntes de diálogo entre
dois ou mais interlocutores, estando pois documentado, por exemplo, na
entrevista. O  tipo retórico engloba vários tipos de texto: o poema, a prosa
poética, a canção, o «slogan», etc. Embora
a classificação anterior seja útil, temos, no entanto, de ter em conta que,
frequentemente, um mesmo texto pode apresentar características comuns a mais do
que um tipo. Daí que no quadro da figura 36, por nós elaborado com base no
artigo de  Jean Michel Adam, apresentemos por vezes os mesmos exemplos em mais do que um tipo. Mais
rigorosa nos parece a classificação tipológica proposta por  Maria Teresa Serafini[5] que, considerando apenas quatro  tipos básicos  
─ a  descrição, a narração, a  exposição e a  argumentação  
─, nos apresenta uma lista de géneros textuais. Estes encontram-se subdivididos em quatro grupos. Consulte-se
o quadro da figura 37, no qual se indica a presença frequente do tipo básico de
prosa, assinalado com um quadrado preto, e a presença rara do tipo básico,
assinalada com um quadrado branco. Para cada um dos quatro grupos, a autora
indica as capacidades básicas requeridas para a produção dos respectivos
textos. 
  
    |  |  |  |  
    |  | Figura 76: Tipos básicos de 
    prosa nos diversos géneros textuais, segundo M. Teresa Serafini (■ - 
    Presença frequente do tipo básico; □ - Presença rara do tipo básico) |  |  Os
quatro grupos, seguindo a ordem apresentada no quadro, são: I - grupo dos
escritos expressivos; II - grupo dos escritos informativo-referenciais; III - grupo dos escritos criativos; IV 
- grupo dos escritos
informativo-argumentativos. Para
cada um dos grupos são necessárias competências básicas por parte de quem
produz os textos, que passamos a indicar de maneira esquemática:
 Grupo I -  escritos expressivos Requerem
duas capacidades básicas: saber
exprimir-se, nomeando correctamente os objectos de que se fala e
empregando correctamente o código linguístico, e saber reproduzir
trechos do discurso oral tal como, por exemplo, os diálogos.
 Grupo II 
-  escritos informativo-referenciais São
mais difíceis
de realizar que os precedentes, na medida em que requerem não só capacidades de
tipo expressivo, mas também objectividade e imparcialidade. Requerem cinco
competências básicas: saber sequencializar, isto é, dar sequência lógica
aos factos tendo em conta os referentes espácio-temporais; saber
sintetizar; saber definir, apresentando os dados de modo rigoroso,
preciso e não susceptível de mais do que uma interpretação; saber explicar;
saber documentar-se, isto é, saber como obter a necessária
informação, ter conhecimento das diferentes fontes de informação e saber
organizar e utilizar uma bibliografia e uma base de dados.
 Grupo III -  escritos criativos Exigem
de quem os produz imaginação e capacidade
de expressão num estilo pessoal, original e inovador, aliado a uma adequada
competência linguística.
 Grupo IV -  escritos informativo-argumentativos São os
mais complexos
e difíceis de realizar. Exigem o domínio pleno de todas as
competências anteriormente referidas. Como competências específicas, exigem
de quem produz escritos deste tipo que saiba: 1 - defender uma
tese, conhecendo as técnicas da argumentação e da lógica, as técnicas da
persuasão e esquemas do raciocínio dedutivo e indutivo; 2 -
determinar relações de causa e efeito; 3 - confrontar e
classificar, isto é, apresentar não só as ideias próprias mas confrontá-las
com outras.   Por
tudo quanto foi dito, verificamos que é possível elaborar diversas
classificações tipológicas de texto, tendo em conta os mais diversos critérios.
Por outro lado, verificamos também que a variedade de géneros textuais é
elevada, tornando-se difícil decidir quais os géneros que deverão ser
privilegiados e por onde começar o seu estudo.  Maria Teresa Serafini, no trabalho citado, páginas 137 a 144, debruça-se sobre este
problema, num capítulo intitulado «Como construir um currículo de aprendizagem
da escrita». Depois de referir as diferentes capacidades requeridas para cada
tipo, a que já fizemos referência, apresenta um gráfico que permite traçar uma
sequência pedagógica e elaborar um currículo de aprendizagem. Segundo ela, o
currículo consistirá «em abordar por ordem os seguintes géneros textuais:
carta, diário, autobiografia, relatório, artigo de crónica, conto, anedota,
apontamentos-plano, telegrama, poesia, provérbio, resumo, definição, lei,
ensaio, editorial, comentário.» Dada a elevada quantidade de géneros
textuais, torna-se aqui praticamente impossível analisá-los todos.
No nosso caso pessoal e não menosprezando a sugestão anterior, e até porque há
aspectos já anteriormente por nós abordados em capítulos anteriores, seguiremos
um percurso diferente, tendo em conta um critério mais prático: a necessidade
de conhecimentos básicos de produção textual em diversas áreas da actividade
profissional. Começaremos a nossa reflexão pelo  discurso de tipo negocial e, dentro deste, pela  carta comercial. 
 [1] ─ Recorde-se a rubrica «O discurso segundo as
pessoas intervenientes na comunicação», no cap. VI.
 
 
[2]  
─ Acerca desta matéria, consulte-se a obra de JOÃO
DAVID PINTO CORREIA, Introdução às Técnicas de Comunicação e de Expressão,
Col. Biblioteca prática do professor, nº 3, Lisboa, Livraria Novidades
Pedagógicas, 1978, pp. 110-113. O quadro da figura 35, embora sugerido
pela leitura do citado trabalho, é da nossa autoria. Consideramos que a
informação jornalística é um domínio específico, cuja inclusão deverá ser
efectuada num sector específico. As notícias devem ser incluídas num sector
próprio  
─ o discurso de imprensa 
─, que engloba vários tipos de texto. Veja-se o
quadro da figura 73.
 
[3] ─ JEAN MICHEL ADAMS, "Quels types de texte?",
in Le Français dans le monde, nº 192, Abril 1985.
 
[4] ─ Leia-se o capítulo III deste volume, pp. 128-130
e 179 a
205, em que se analisa a narração bem como as diferentes categorias da
narrativa.
 
[5] ─ MARIA TERESA SERAFINI, Como se faz um trabalho
escolar. Da escolha de um tema à composição do texto. Col. Textos de Apoio,
nº 15, 2ª ed., Lisboa, Editorial Presença, 1991, pp. 126-136. |