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"Patrimónios" – n.º 5, Julho 2005, Ano XXVI, 2ª série, 158 páginas.


CONFERÊNCIAS PEDAGÓGICAS DE AVEIRO

Aires Antunes Diniz   **

Todos parecem esquecer o passado quando querem comunicar que têm uma inovação para mostrar. Foi assim que algumas professoras (Fernandes et alia, 2001), falhas de conhecimento da História da Educação Pátria, aparecem a dizer terem descoberto a pólvora com a formação em círculo. Estavam muito falhas de conhecimentos de história pátria.

Mas, como vamos ver, de facto, era corrente no último quartel do século XIX que a formação anual dos professores fosse dada através das Conferências Pedagógicas que abrangiam à volta de uma semana numa cidade ou vila, sede de um Círculo de Professores, uma área geográfica que era composta por diversos concelhos. Aí, os inspectores e sub-inspectores, como líderes dos professores no estudo dos problemas, assemelham-se às modernas formas de liderança organização dos trabalhadores operacionais no reforço dos seus conhecimentos e empenho na procura de soluções para a qualidade do processo produtivo (Feigenbaum, 1991).

Também em França, após a derrota trágica ocorrida na guerra franco-prussiana de 1870-1871, as conferências pedagógicas apareceram como progressos a realizar dentro do regímen político resultante. Este queria ultrapassar o estado de desânimo propagando o desenvolvimento da instrução com a sua realização que estava associada a bibliotecas pedagógicas (Paroz, 1908; pág. 442).

 

1 - O Nascimento do Sistema Educativo Português

Em dois de Maio de 1878 como resultado da evolução do pensamento educativo há uma mudança educativa que vai tornar obrigatório o ensino primário, dividindo-o em elementar e complementar. Tem um carácter municipal no seu financiamento, em que o estado tem um papel regulador através dos inspectores e sub-inspectores, tendo na parte financeira um papel supletivo já que só financia o que as autarquias locais não conseguem suportar. O suporte legislativo é dado pela referida lei de 2 de Maio de 1878, complementada por uma outra de 11 de Julho de 1880, que se refere às questões financeiras, especificando os impostos e outros rendimentos que o sustentarão. Repare-se que nessa altura, o Estado Português tinha iniciado um processo de Reforma Fiscal com base num Income-Tax que não chega a ser concretizado porque quem tem que pagar os impostos vai boicotando o processo como explica Diniz (2003). Em 28 de Julho de 1881 é por isso publicado um regulamento que integra e explicita a legislação anterior para a tornar exequível.

Define-se aí que a par da formação inicial que é feita em escolas normais de 1º classe que formam professores do ensino elementar e complementar, que estão em Lisboa e Porto e em escolas normais de 2ª classe que se situarão noutros distritos não especificados, haverá uma formação permanente em Conferências Pedagógicas cujo “objecto será o aperfeiçoamento dos métodos, modos e processos de ensino; a organização material e disciplinar das escolas; a estatística e todos os assuntos que especial e directamente disserem respeito ao desenvolvimento da instrucção popular.” (art.º 236)

O seu programa na primeira realização será apresentado pelo sub-inspector de cada círculo, depois de ser aprovado pelo inspector da circunscrição, uma vez que de acordo com o regulamento o país estava dividido em circunscrições que se subdividiam em círculos. Os das Conferências seguintes eram elaborados pelos professores na última conferência com a supervisão do sub-inspector, mas só seriam publicados nos jornais e distribuídos a todos os professores de cada círculo, quando o inspector os achasse em condições de serem aprovados (art.º 237). Todos os professores públicos eram obrigados a assistir a elas (art.º 242), havendo multas por cada dia de falta, correspondendo a um dia de vencimento. Mas as professoras podiam não comparecer desde que apresentassem um relatório e o programa das suas escolas em relação aos pontos em análise na conferência, que devia ser enviado até ao dia imediatamente anterior ao do início das Conferências Pedagógicas (art.º 243).

Em Coimbra, numa primeira edição destas Conferências, em 1883, há uma Comunicação do inspector Francisco Augusto de Quintanilha e Mendonça que as explica. Este começa por falar da importância das conferências como a parte mais relevante das leis mais modernas da instrução primária que as criaram. Mostra que acredita que estas conferências permitem aquilatar do desenvolvimento da educação pública e promover a melhoria da competência didáctica do corpo docente do país. Explica o que pensa através de considerações várias em que conclui que para além de o estado criar escolas, de tornar o ensino obrigatório, de o dotar de museus e bibliotecas, de melhorar a condição salarial e a estabilidade dos professores, há que promover a melhoria dos métodos de ensino e a melhoria pessoal de cada um dos professores para estarem verdadeiramente à altura da sua missão.

Diz então que é para isso que servem as conferências.

Concluindo o raciocínio, considera que a instrução pública é a base essencial da vida política das nações e que só os professores verdadeiramente educados podem satisfazer estas necessidades públicas. Por isso, conclui que as Conferências Pedagógicas são um elemento preponderante da vitalidade das nações mais avançadas.

Faz remontar as conferências pedagógicas à Confederação do Reno que as admitiu como congregações. Recorda que foi Napoleão Bonaparte que as organizou em 1806, mas desapareceram em 1813 com a sua derrota.[1] Diz que mais tarde a Confederação Germânica lhes deu um notável incremento no primeiro quartel do século XIX, que com os seus filósofos profundos e irrequietos se tornou o protótipo da investigação científica. Foi o que levou os restantes países a imitá-los. Faz notar que estas conferências ou congressos têm tido um papel de quase plenitude na orientação da ciência didáctica na Suíça, Bélgica e Holanda, à família anglo-escandinava onde inclui a América do Norte. Acrescenta-lhe a Áustria e a França e a nossa vizinha Espanha. Não deixa de falar nos países eslavos, a que adiciona os sarmátas que deve corresponder ao sul da Rússia. Adiciona-lhes os otomanos[2].

Por fim, conclui que só os portugueses estão de fora destas boas práticas quando estes povos já tiraram deste esquema organizativo todas as vantagens dele. É o que considera ser ainda adequado à presente época, sendo possíveis ainda pequenas alterações em função das culturas nacionais.

Passa então a fazer a história das conferências pedagógicas em Lisboa, promovidas no liceu local, durante o ano lectivo 1867-1868 pelo comissário de estudos, Mariano Ghira, sendo realizadas assembleias com alguns professores, quase todos do distrito de Lisboa e alguns, poucos, dos restantes distritos.

Parte daí para realçar a importância das conferências pedagógicas como instrumento de melhoria radical do ensino primário, tirando-o do abatimento condenável em que está. Diz que estas não passavam de palestras com o presidente destas e dos seus oficiosos e dedicados protagonistas. Admite contudo que ali foram ventiladas as grandes questões pedagógicas em que assenta a educação dos povos, resultando um relatório feito por uma comissão de que D. António da Costa era o presidente. Chama-lhe elogiosamente o mestre dos mestres.

Fala que então da necessidade de fomentar a instrução primária, que ia só então começar. Deste primeiro movimento resulta a criação da Gazeta Pedagógica que é gerida e redigida por Mariano Ghira conjuntamente com D. António da Costa mais dois professores de Lisboa, José Maria Graça Affreixo e Francisco Augusto de Quintanilha e Mendonça. Afirma  então que os seus iniciadores tiveram completa aceitação por parte de outros editores de todas as nações da Europa e América, permutando com eles as suas publicações, comentando bastantes vezes os assuntos tratados na Gazeta Portuguesa[3].

Conta depois como a sua existência foi efémera por falta de dinheiro, mas que esteve na base de uma luta firme de todos os governantes que levou à criação da legislação então actual, onde D. António da Costa é um grande impulsionador deste progresso, tanto no governo de que fez parte, como dos outros. É contudo António Rodrigues Sampaio o seu concretizador em 2 de Maio de 1878, que associa ao então actual Director Geral da Instrução Pública António Maria de Amorim. Acrescenta-lhe ainda Luciano de Castro pela elaboração da lei 11 de Julho de 1880 que é suplementar à de 2 de Maio de Maio, já que define o seu modo de financiamento. Cita aqui em particular o artigo 3º.

É assim que introduz os professores no papel que lhes cabe na concretização do progresso pedagógico que é a Reforma da Instrução Primária, que está numa adolescência – diz – cheia de vicissitudes, mas que é a base necessária de uma administração eficaz e produtiva. Apesar deste objectivo nacional, acrescenta que a pátria tem desdenhado os serviços dos professores, fazendo divisa da seguinte ideia: Não existe heroe cuja remuneração seja verdadeiramente condigna! [4].

 

2 – As Conferências Pedagógicas de Aveiro

2.1 – 1883

Aveiro era a sede do quarto círculo da segunda circunscrição escolar e o livro de actas das sessões é aberto em 3 de Outubro de 1883.

As conferências realizaram-se na escola pública do ensino primário de sexo masculino: a Escola da freguesia de Vera Cruz. [5] Aí, as conferências acontecem com um carácter mais formal e menos detalhado, onde se cumpre o regulamento, citando passo a passo a legislação que os obriga. Parecem ser encaradas como uma imposição legal em que não se acredita como método de mudança das práticas educativas.

No dia 3 de Outubro, o presidente é o sub-inspector do círculo Dr. Luiz Clemente Carvalho Saavedra Donas Botto que abre a sessão às 10 horas, cumprindo as ordens do Inspector António Simões Lopes. Lê o seu discurso inaugural e as instruções que lhe tinham sido dadas pelo Inspector, fazendo as devidas reflexões sobre elas. Há eleição por unanimidade da mesa e das comissões que devem dar os pareceres sobre os seis quesitos das conferências. Marcam-se as presenças e as faltas. Não se esconde que há falta de dinheiro nas autarquias para financiarem as estadias dos seus professores e isso serve de justificação de faltas. No final, indica-se que no dia seguinte a 1ª comissão vai apresentar o seu parecer.

 No dia 4 de Outubro, a sessão abre às dez horas com a leitura e aprovação da acta do dia anterior. Passa-se à leitura do primeiro parecer que é aprovado por unanimidade, mas nada sabemos dele. Cumpre-se o regulamento que manda que o parecer faça parte do processo. Há elogios à Câmara de Oliveira do Bairro por ter pago salários e subsídios aos professores que vieram às conferências. Isso mostra como os professores fazem então lobbying a favor dos seus interesses profissionais. Marcam-se as faltas e fixa-se para o dia seguinte o parecer sobre o 2º quesito e encerra-se a sessão à 1 h 30.

No dia 5, tudo começa de novo às 10 horas, sendo a acta desta sessão a mera repetição da burocracia do dia anterior, com a diferença de que agora se agendam dois quesitos para o dia seguinte. Também se recebe um relatório de uma professora[6] e decide-se que a partir desse dia não lhe sejam marcadas faltas.

No dia 6, tudo se repete como no do dia anterior. Aprova-se a acta e os dois por unanimidade, agendam-se mais dois quesitos para o dia seguinte e marcam-se as faltas.

No dia 8, tudo começa de novo às 10 horas, após a leitura e aprovação da acta do dia anterior, há a novidade da notícia da recepção e resposta de ofício da assembleia das conferências de Évora. Recebe-se um atestado de doença de um professor e decide-se que as suas faltas estão justificadas.

Quando se lê o 5º parecer há finalmente uma rejeição deste e com a discussão subsequente sabemos que o assunto é o horário das aulas, que os professores rejeitam porque não querem aulas de manhã e de tarde. Faz-se uma nova proposta, ficando a haver um intervalo de meia hora entre uma e outra. O argumento invocado é a conveniência dos povos. A nova proposta é aprovada com 35 votos a favor e onze a favor no caso das escolas masculinas, mas nas escolas femininas há aulas de manhã e de tarde conforme a proposta feita que ganha por sete votos contra dois. Nota-se assim uma diferente interpretação das conveniências dos povos. Nota-se que há aqui um conflito com a Junta Escolar que no dia 18 de Julho de 1883 tinha definido um horário com aulas de manhã e de tarde, que variava ao longo do ano conforme as condições atmosféricos, expressas pelas diferentes estações do ano.[7] Parece que o carácter abúlico das juntas escolares e dos delegados paroquiais é uma característica do Interior (Diniz, 2003).

 

Edifício da antiga escola primária da Vera Cruz, actualmente sede da Junta de Freguesia. Clicar para ampliar.

 
 

Edifício da antiga escola primária da Vera Cruz, actualmente sede da Junta de Freguesia.

 

No 6º parecer volta a haver unanimidade.

Também há elogios e votos de louvor à Câmara de Vagos por pagar bem os salários e as gratificações devidas aos professores. Para o dia seguinte, marca-se o trabalho de analisar os pontos propostos para discussão no ano seguinte, sendo eleita uma comissão para este efeito. São ainda marcadas as faltas.

No último dia, marcam-se as faltas e aprova-se a acta do dia anterior para logo se passar à elaboração do programa das Conferências Pedagógicas do ano seguinte.[8]

O 1.º ponto é: Quais são os meios disciplinares que o professor deve empregar de preferência na sua escola? 2.º ponto – Importância das bibliotecas escolares. Quais são os meios que parecem mais eficazes para as obter? 3.º ponto – Ensino intuitivo. Qual a sua importância no desenvolvimento intelectual dos alunos? 4.º ponto – Importância das escolas nocturnas e dominicais para adultos. Serão necessárias entre nós? 5.º ponto - Quais os meios administrativos e pedagógicos a empregar para obter a regularidade da frequência escolar?; 6º ponto - Importância do ensino religioso nas escolas de instrução primária? Quais os limites que importa não exceder neste ensino?; 7º ponto - Que qualidades deve possuir um professor do ensino primário?; 8º ponto - Quais são os deveres do professor para com os seus alunos, para com os pais destes e para com as autoridades.

Há então propostas de outros pontos como são os de Rosa Ermelinda Mourão Gamelas que pergunta: Será conveniente que os professores de ensino oficial exerçam o magistério particular? No caso (de no ensino) oficial (isso) ser proibido deverá considerar-se como aula particular o tempo que o professor emprega no ensino além do que lhe é designado no respectivo horário? 2º ponto - Quais deverão ser os termos do processo a seguir quando, em virtude do mau procedimento de qualquer aluno, se torne altamente prejudicial na escola? No caso de ser despedido, poderá ele ser admitido noutra escola oficial do mesmo concelho durante o tempo que durar o castigo? Logo a seguir a professora Clementina Barreto apresentou os seguintes pontos: 1º Como deverá proceder para com as alunas cujos pais proíbam que se lhes dê educação literária? 2º Conviria representar aos poderes públicos para que se não admitam as aulas particulares a indivíduos que não estejam habilitados para exercer o magistério.

Diz-se que a assembleia os aprovou unanimemente. Embora de modo um pouco dúbio, verifica-se que há um cada vez maior orgulho profissional, tentando restringir o acesso de pessoas que estejam fora do sistema de certificação que deve funcionar com base nas escolas normais.

Há no fim os cumprimentos da praxe ao sub-inspector que até pede um louvor para si. Estranho. Mas, tudo corre bem porque os professores aceitam a ideia da sua união e auxílio mútuo e logo decidem dar começo a uma associação de professores, pedindo-lhe que seja o seu presidente. O que ele aceita. Para levar esta ideia por diante, os professores elegem um elemento de cada concelho para que juntos estudassem e organizassem os estatutos que irão reger esta associação. Logo a seguir encerram a sessão. Terminam assim as conferências do ano de 1883.

 

2.2 – 1884

No dia 3 de Outubro de 1884, reúnem-se os professores na escola do sexo masculino da freguesia de Vera Cruz. Aí são reeleitos os secretários do ano anterior por proposta o sub-inspector que é o mesmo. Faz então o seu discurso inaugural cujo teor não é revelado. Elegem-se a seguir os membros das sete comissões que vão tratar dos sete pontos das conferências. Por recomendação do presidente que é o sub-inspector estas devem instalar-se logo que termine a sessão e começar a trabalhar nos seus pareceres, em particular no primeiro com o fim de ser apresentado no dia seguinte. Nessa altura, alguns professores lembram-se de enviar um telegrama onde felicitam o poder representado pelo ministro do Reino e pelo director geral da Instrução Pública, aproveitando para pedir auxílio para a sua classe. Recebem-se justificações de falta e marca-se a ordem de trabalhos para o dia seguinte.

No dia 4 de Outubro, faz-se a chamada, aprova-se a acta do dia anterior, o parecer e quatro quesitos que a comissão lhes adicionou, mas nada sabemos do seu conteúdo porque nada é registado em acta. Apenas sabemos que receberam uma saudação dos conferentes de Vila da Feira e lisonjeados por isso, vão nomear mais uma comissão para lhes responder. Logo a seguir, encerram os trabalhos, agendando o segundo ponto para o dia seguinte.

No dia 5 de Outubro, reúnem-se, aprovam rapidamente a acta do dia anterior e decidem responder à saudação dos professores conferentes do círculo de Portalegre, frisando que estas conferências se fazem no nosso país pelo segundo ano. Aprovam o parecer sobre o primeiro ponto e dão um voto de louvor à comissão que o elaborou. Mas, nada nos dizem sobre ele. Fazem um voto de sentimento pela morte de dois colegas e dão logo a seguir por concluídos os trabalhos.

No dia 7, a acta é aprovada logo a seguir é feita a chamada. Nessa altura, e a propósito do ponto 3, logo que termina a leitura do parecer, intervém Graça Affreixo para discorrer com proficiência sobre o assunto, como informam as actas, terminando a sua intervenção com uma proposta: “o ensino da moral e da religião deve ser o primeiro que se dê às crianças por lições educativas, partindo do desenvolvimento dos afectos e da ideia de bom e de justo. Este ensino deve ter maior partilha de tempo e finalizar pelo hábito de orar.”[9] Esta proposta é aprovada conjuntamente com o quesito em questão. A seguir Graça Affreixo disserta sobre a importância das Conferências Pedagógicas, pedindo de seguida ao presidente que os conferentes se dividissem em grupo para discutirem este assunto. A ideia é aprovada e no fim ficam todos muito satisfeitos com os resultados obtidos. Encerra-se a sessão após a leitura de alguns atestados de professores que por motivo de doença não compareceram.

No dia 8, reúne-se a assembleia aprova-se a acta e faz-se a chamada dos professores. A comissão do quarto ponto apresenta o seu parecer . Nessa altura, Graça Affreixo toma a palavra e leva a que os primeiros dois pontos sejam aprovados. Nessa altura, aceita-se que os princípios disciplinares paternalmente empregados concorriam para a educação moral dos alunos, reprovou-se a expulsão dos alunos das escolas e considerou-se prejudicado o quarto ponto. A assembleia vai decidir sob a sua influência que desconhece a utilidade dos batalhões escolares, que pelo estudo teórico só são úteis para acostumar os alunos aos trabalhos que impliquem dedicação e para extinguir o horror pela milícia; terceiro, a conferência não se considera esclarecida sobre a utilidade das caixas escolares; 4º que considera que só são úteis quando os seus fundos resultam da privação de alguns caprichos dos depositantes e sejam aplicados na solução das faltas de meios de companheiros necessitados.[10]

Encerra-se a seguir a sessão.

Em aditamento vai ser ainda louvado Graça Affreixo pelas suas intervenções, dando-lhe cópia da acta em que tal fica registado para que este a use como aprouver. Há ainda uma referência a um ofício do congresso de Penafiel e a ele vai responder uma comissão nomeada para o efeito.

No dia 9, é lida e aprovada a acta para logo a seguir ser feita a chamada. Nessa altura sabe-se que o professor Padre José Tavares Camelo está em perigo de vida. Sabemos então que foi um elemento activo das Conferências de 1883, dando-nos só então uma informação que as actas não reflectiram. Desejam-lhe as melhoras numa moção aprovada pela assembleia.

Os pontos quinto e sexto são aprovados sem quaisquer entraves, havendo entre as suas leituras um intervalo de meia hora.

Há então a leitura de uma circular do congresso de Alenquer, que os felicita e lhes propõe que representem junto de sua majestade através dos deputados do círculo, para que sejam melhorados os vencimentos dos professores primários. É o que a assembleia aprova, resolvendo agradecer-lhes pela comissão competente.

Há uma outra circular do Congresso de Penafiel nos mesmos termos, que lhes propõe que representem perante a Rainha através da Condessa de Pangim. Nomeia-se para isso mais uma comissão.

Nessa altura, os professores são convidados a propor os seus quesitos para as conferências de 1885 e elegem uma comissão para os rever.

Encerra-se de seguida a sessão.

No dia 10, como de costume, é lida e aprovada a acta para logo a seguir ser feita a chamada. Aprova-se a seguir o parecer da comissão e listam-se os diversos temas a tratar nas próximas conferências.

“Primeiro – Educação Física – Higiene das escolas primárias; sua importância; principais preceitos e precauções higiénicas que importa observar nas escolas. Ginástica: sua importância: Principais exercícios e movimentos que devem fazer as crianças para desenvolver convenientemente as suas forças físicas. Instrumentos e aparelhos que para este fim deve haver em todas as escolas.

Segundo – Educação moral  Ensino religioso. sua importância e necessidade de se ministrar às crianças. Intensidade que se deve dar a este ensino nas escolas elementares, e quais os métodos e formas de ensino porque deve ser administrado.

Terceiro – Bibliotecas populares – Importância da sua criação em todas as escolas elementares e meios de que se deve lançar mão para o seu estabelecimento.

Escolas nocturnas: suas vantagens e inconvenientes e meios de os remover. Escolas dominicais: qual o seu fim, e em que localidades se devem estabelecer. Quem deverá custear as despesas da sua sustentação.

Quinto – Organização dos passeios escolares sem equipamento militar. Vantagens ou inconvenientes que dela resultam.

Sexto – Inconvenientes que resultam à instrucção primária quando o professor se intromete nas questões políticas e em quaisquer questões locais.

Modo como se deve comportar o professor quando se ventilam tais questões.

Sétimo – Qual é mais importante para a escola primária elementar, a instrução propriamente dita ou a educação das faculdades intelectuais.”[11]

Há ainda um voto de louvor ao sub-inspector e nomeiam uma comissão para o acompanhar a casa como prova de deferência. Ainda por proposta do sub-inspector, louva-se a assembleia e as comissões. Encerra-se de seguida a sessão.

 

2.3 – 1885

A conferência realiza-se no mesmo local do ano anterior e mantê-lo-á nos anos seguintes. Como é fim-de-semana, que se inicia no dia 3, começa muito lentamente, com o sub-inspector, que é o mesmo, a esperar até às onze horas por mais professores. Decide então adiar a hora do discurso inaugural para a segunda-feira seguinte. Toma então a decisão de eleger os secretários da mesa e respectivos suplentes, mas adia a eleição das comissões que vão dar os pareceres sobre as teses. Há só a leitura dos relatórios das professoras e dos atestados por doença. Segue-se alguma discussão sobre assuntos de interesse dos professores, dando-se notícia da participação empenhada de alguns mas sem se dizer o assunto.

A segunda sessão vai acontecer no dia 5, segunda-feira, começando pela chamada, leitura e aprovação da acta do dia anterior. Em seguida o presidente faz o discurso inaugural e passa-se à eleição dos membros das comissões e dos que ficam encarregados de uma segunda parte, que vai constar de um exercício de leitura, outro de aritmética e mais outro de gramática.

Segue-se a apresentação dos relatórios de alguns professores sobre vários pontos do programa que vão ser analisados pelas comissões respectivas.

E encerra-se a sessão.

Na terceira sessão, feita no dia 6 de Outubro, a acta continua a ser demasiado sucinta e por isso só sabemos que foi aprovada a acta do dia anterior após a chamada e marcação de faltas. Começa a ser discutido o primeiro ponto e só sabemos que o professor José Soares de Figueiredo e Castro, professor em Águeda tem profundos conhecimentos. Mas, como estão cansados adiam a continuação da discussão para o dia seguinte.

Na sessão do dia 7 de Outubro, começa às dez horas após comparência do presidente, mandando que os secretários tomassem os seus lugares. Faz-se a chamada e lê-se a acta que é aprovada. Lêem-se os relatórios dos professores sobre o primeiro ponto que ainda estavam por ler, após o que comissão deu o seu parecer sobre ele, especializando o relatório de José Soares de Figueiredo e Castro. Deu-se de seguida a palavra a Joaquim José da Trindade, professor em Vagos, que falou sobre metodologia e apresentou uma “nova nomenclatura sobre a subdivisão dos modos e processos de ensino, mais clara, fácil e metódica do que até hoje se tem seguido”. [12]

Interessada nesta sua ideia, a assembleia pede-lhe para a apresentar por escrito para que a possa apreciar devidamente.

Começam nessa altura a ser lidos os relatórios sobre Museu Escolares e encarrega-se a comissão eleita para apreciar este ponto de fazer o parecer para o dia seguinte. Deram de seguida a palavra a Joaquim José da Trindade que vai propor um voto de louvor a José Soares de Figueiredo e Castro pela “boa composição dos seus relatórios”, o que é unanimemente aprovado. [13]

Nessa altura, adia-se para o dia seguinte a continuação dos trabalhos.

No dia seguinte a sessão começa pela chamada e pela leitura e aprovação da acta do dia anterior. Contudo, não sabemos a hora de início porque tal não é dito.

Começam-se os trabalhos pela votação de dois votos de sentimento pela morte de dois professores. Aprova-se o parecer da Comissão sobre os Museus Escolares e passa-se à análise o quarto ponto sobre a educação da mulher dando a palavra aos diversos autores de relatórios sobre este tema. De novo, distinguiu-se entre eles José Soares de Figueiredo e Castro que apresentou um relatório bem elaborado sobre as vantagens da mulher educada, pelo qual foi aplaudido na sua leitura pela assembleia.

Nota-se que os pontos programados no ano anterior não foram tratados, havendo outros bem diferentes. Contudo, nomeia-se agora uma comissão que vai formular os pontos das próximas conferências. São nomeados e aprovados por unanimidade para esta tarefa José Soares de Figueiredo e Castro, Joaquim José da Trindade e António Maria dos Santos Freire.

Nessa altura procedeu-se às lições práticas sobre leitura e de aritmética.

No dia seguinte, 9 de Outubro, a sessão abre às dez horas e começa pela chamada e a leitura da acta que foi aprovada. Há ofícios de congratulação de Penafiel e Amarante, indigitando-se uma comissão para lhes responder que são os membros da mesa. Louvam-se os relatórios de José Soares de Figueiredo e Castro, não se esquecendo de louvar os trabalhos dos outros conferentes. Nessa altura, José Soares de Figueiredo e Castro agradece os elogios dados. Joaquim José da Trindade vai louvar a proposta do presidente que achava justa e conforme o que se passou no Porto.

Em seguida, deu a palavra à comissão que fez o parecer sobre o ponto do programa da educação da mulher que lido, sendo aplaudido o seu relator porque – diz-se na acta - foi brilhante. No fim, o parecer foi naturalmente aprovado por unanimidade.

Foram de seguida lidos diversos relatórios sobre o terceiro ponto que é sobre bibliotecas infantis, que teve alguma discussão sobre se as bibliotecas deviam ser para as crianças ou para o público em geral. Decidiu-se que deviam ser para o público em geral e não só para os alunos. Passa-se nessa altura a uma lição sobre gramática que é dada a seis alunos por dois professores.

Nessa altura, Joaquim José da Trindade apresenta o seu trabalho sobre métodos, processos e modos de ensino, tendo recebido vivos aplausos.

A sétima sessão realiza-se no dia 10 de Outubro e começa às dez horas. Faz-se a chamada e aprova-se a acta. Há a aprovação de um voto de louvor aos conferentes que apresentaram relatórios proposto por Sarabando da Rocha, professor em Nariz.

Discute-se a seguir a utilidade das bibliotecas infantis que suscitam sucessivas intervenções até que a assembleia deu esta matéria por discutida.

Há agora a proposta de um voto de louvor às comissões que fizeram os pareceres. Nessa altura há a apresentação dos pontos a discutir nas próximas conferências que são aprovados. O presidente está de partida e despede-se elogiando os professores deste círculo, afirmando que levava com ele as mais gratas recordações e que nunca mais os esqueceria no seu percurso profissional como inspector.

Nessa altura, a assembleia mostra-se contristada, louva o sub-inspector e nomeia uma comissão para pedir ao governo para que ele fique no círculo, mas nada acontece. A acta é encerrada, mas nota-se que há várias letras e/ou canetas na sua execução. Também há muitos espaços em branco no final, havendo no ano seguinte uma falsa abertura de acta.

 

2.4 – 1886

No ano de 1886, as conferências pedagógicas começam no dia 4 de Outubro e o sub-inspector e presidente por inerência é agora António Joaquim Vidal, que imprime um novo ritmo. Começa por fazer o discurso inaugural designado por discurso do estilo.

As faltas são marcadas e votadas as justificações destas que podem ser aceites ou não. São nomeadas as comissões que vão elaborar os pareceres.

É aprovado um voto de sentimento pelo interventivo professor José Soares de Figueiredo e Castro, sendo ainda aprovada a proposta de enviar cópia da acta que o aprova à família.

No fim, o presidente propõe ainda uma comissão para discutir os pontos das conferências do ano seguinte.

No dia 5, começa-se uma acta que se dá sem efeito. Recomeçando logo de seguida pela aprovação da acta do dia anterior, seguindo-se a chamada dos professores.

Existem desde logo efeitos positivos como resultado da mudança de sub-inspector já que os vai obrigar a ler por diversas vezes o parecer sobre o primeiro ponto, sendo este analisado nas suas diversas partes, tomando notas cada um dos conferentes para que possa discutir as teses. É assim que existe uma discussão acesa e aprovar no fim a primeira parte do parecer.

Nessa altura, um professor, Joaquim Rodrigues Leite vai questionar numa memória que apresenta, o ensino livre, realçando que entram aí muitos indivíduos sem qualquer habilitação. Reclama desta situação já que a considera uma porta aberta para a entrada de estúpidos e analfabetos que prejudicam não só a escola oficial, mas a instrução em geral. Acaba por dizer que estes não a podem dar porque “nemo dat quod non habet”[14]. E assim se conclui de forma assertiva[15].

Passa-se em seguida à leitura das outras partes do relatório que são aprovadas unanimemente por toda a assembleia. Como a assembleia ordena que as conclusões sejam transcritas na acta, ficamos a saber que: quanto à leitura se recomenda o uso da Cartilha Maternal, que na leitura o professor deve obrigar os alunos a terem em atenção o modo como falam, corrigindo-lhe os defeitos e fazer com que compreendam o que lêem. Na escrita deve começar pelos elementos, ou seja pela execução separada das letras a partir da sua derivação. Preocupa-se então com a passagem do bastardinho, cursivo, para o bastardo, letra corrida, ou seja com a caligrafia. Na aritmética e sistema métrico decimal começa pelo ensino do cálculo mental, da enunciação e formação dos números, das quatro operações sobre inteiros e respectivas provas, das fracções decimais conjuntamente com o sistema de pesos e medidas, problemas. Na gramática, começa-se pelo estudo das palavras pelas quais se exprimem as pessoas, as qualidades unidas aos objectos e as abstractas, estudo dos verbos e análise das orações, adjectivos determinativos, artigos, pronomes, particípios e preposições. Quanto à moral e doutrina cristã, começa-se por usar máximas e preceitos morais combinados da religião, havendo por catecismo o professor. [16] O desenho deve ser feito pelo método de calcar e imitar. E encerra-se a sessão.

A sessão do dia 6 começa sem indicação de hora de início pela leitura e aprovação da acta do dia anterior. Faz-se a chamada e em relação ao dia anterior só falta a professora das Aradas. Analisam-se os relatórios das professoras e as justificações de faltas de professores e quando são dez horas passa-se à ordem de trabalhos. O primeiro parecer trata das excursões escolares e são discutidas as proposições seguintes: 1º Serão ou não proveitosas as excursões pedagógicas? 2º No caso afirmativo, deverão elas ser postas em prática sem primeiro edificar casas para as escolas, arranjar mobílias para elas, pagar condignamente ao professor e pôr em prática o ensino obrigatório? 3º E quem deve custear as despesas com as excursões e com a instrução primária? [17]

Após a segunda leitura do parecer, há discussão muito participada com respostas às questões levantadas e explicações para as frases menos explícitas pelo relator e no fim as conclusões são aprovadas por unanimidade.

Passa-se nessa altura à discussão do ponto sobre exposições escolares e sendo dispensada a segunda leitura do parecer, passa-se a discutir as teses seguintes: “1º Que enquanto o governo não olhar a sério para os negócios da instrução popular, esta exposição pedagógica será muito morosa? 2º Que mereceu um voto de louvor o Ex.mo Senhor Doutor Francisco Marques de Moura, d’ Ílhavo e as câmaras municipais que nos seus orçamentos votaram verba para as despesas com as conferências. 3º Que os métodos, livros, cadernos e utensílios de que falam são muito precisos para a instrução das crianças.” [18]

Foram aprovadas só as primeiras e terceira parte das conclusões das teses, tendo a segunda sido rejeitada por ser estranha à ordem de trabalhos. Mas, logo a seguir é transformada em voto de louvor em que o Doutor Francisco Marques de Moura é considerado um benemérito da instrução e assaz dedicado à Escola Primária a quem prestou grandes serviços como presidente da Junta Escolar do concelho de Ílhavo. E encerra-se a sessão às três horas.

A sessão do dia 7 abre com a leitura e aprovação da acta do dia anterior e os trabalhos começam às dez horas com a leitura do parecer sobre a Instrução Nacional com as seguintes conclusões: “1º Será conveniente que para construções de casas d’aula, as juntas gerais contraiam um empréstimo de dois mil contos, digo de dois mil e quinhentos contos, e que as câmaras municipais sejam obrigadas a pagar o juro e amortização d’ um empréstimo? 2º A superfície das casas de aula deve variar segundo a população das localidades a que for destinada? 3º Deve o ordenado dos professores ser elevado nas aldeias, vilas e cidades? E quanto? 4º Deve-se tirar desde já as câmaras municipais toda a gerência na instrução primária, ficando o pagamento do ordenado dos professores a cargo do Governo? 5º Não se deve permitir o ensino livre a nenhum indivíduo que não tenha habilitação legal? 6º Devem ser suprimidos nas leis vigentes da instrução primária os cargos das juntas escolares e dos delegados paroquiais.” [19]

Há uma segunda leitura e a seguir a discussão aquece.

No fim, pede-se a substituição da expressão Juntas Gerais por governo, fala-se com uma gralha de ordenados a propósito de obstáculos ao ensino, acrescentando-se ao parecer “falta de casas próprias para escolas; os mesquinhos ordenados, supressão por inúteis das entidades - juntas escolares e delegados paroquiais, transferência para o Governo das atribuições das câmaras respeitantes somente à nomeação e pagamento de ordenados aos professores, falta de disposição legislativa que obrigue o professorado livre a uma habilitação legal, e com a restrição a quarta conclusão.” [20]

As conferências terminam com a sessão do dia oito que se inicia às 10 horas com a chamada. Informa-se agora só acerca dos professores que estão a mais ou a menos que no dia anterior.

Curiosamente, há em Aveiro, e talvez pela proximidade com o Porto, uma grande adesão à escrita sónica de José Barbosa Leão, pedindo-se por isso a sua Majestade que “por ordem superior fosse autorizada que nenhum aluno das escolas elementares que escrevesse, segundo os princípios da ortografia sónica, fosse reprovado.” [21]

Sendo aprovada a proposta por toda a assembleia, encarrega-se uma comissão de a elaborar e de remeter esta representação a sua Majestade.

Os pontos das próximas conferências são: Primeiro – Gramática – ortografia sónica, sua conveniência, seus defeitos e seu aperfeiçoamento. Segundo – Agricultura – sua relação com as indústrias do distrito. Como deverá fazer-se o ensino prático desta disciplina nas nossas escolas? Terceiro – educação da mulher – economia doméstica. Quarto – qual o melhor método de leitura seguido até agora? seu aperfeiçoamento e sua demonstração prática. Quinto – estatística – escrituração escolar, livros, mapas, etc. Quais as vantagens da boa, e quais os inconvenientes da má escrituração escolar? Sexto – Programas escolares – sua confecção desenvolvimento.

Há agora um pedido do presidente para que se louve José Barbosa Leão pela oferta de uma gramática sónica a todos os professores do círculo. Propõe ainda que se extraia uma cópia da acta para lhe ser enviada. Pedem-se ainda votos de louvor para os relatores da primeira, segunda e quarta tese. O que foi aprovado pela assembleia. Há votos de sentimento por um professor que faleceu. Há um voto de louvor ao presidente que se opõe e que perante a insistência desta assembleia sai para que esta o aprove. Durante o tempo da votação, é substituído por um professor e sendo esta aprovada entusiástica e calorosamente, regressa para agradecer e encerrar as conferências com algumas palavras com que pretende insuflar aos professores “ânimo e coragem para retomarem os trabalhos da sua árdua tarefa com zelo e dedicação por esse povinho infantil, que são a esperança da família e da pátria. [22]

 

2.5 – 1887

As conferências de 1887 começam no dia 3 às 10 horas com o esperado discurso do estilo, analisam-se os relatórios das professoras e as justificações de faltas de professores e ainda as escolas vagas. Nomeiam-se as comissões que vão analisar as teses aprovadas do ano anterior par este ano.

Nessa altura marcam-se para o dia seguinte a terceira tese sobre a Educação da mulher e se houver tempo tratarão ainda da quinta tese sobre a Estatística. E encerram a sessão à 1 hora e meia.

A sessão do dia 4 abre com a aprovação e leitura da acta do dia anterior e análise das justificações de faltas, marcando-se as faltas por comparação com as presenças do dia anterior. Elege-se uma nova comissão para analisar os programas escolares e outra para organizar as teses a discutir no próximo ano. Nessa altura passa à análise do parecer sobre a terceira tese que foi aprovado por unanimidade com entusiasmo. Quando se passa à análise da quinta tese há maior discussão e é aprovado após ser modificado com uma alteração referente aos inventários que, quanto às corporações que fornecerem mobília escolar, devem ser organizados por elas e que estas devem dar cópia autêntica aos professores e que estes devem assinar auto de responsabilidade. Marcam-se para o dia seguinte as teses sobre Agricultura e no caso de haver tempo a discussão da quarta tese sobre “Qual o melhor método de leitura seguido até agora.” [23]

No dia 5 aprova-se a acta do dia anterior, nota-se a presença de mais professores e há ainda mais algumas justificações de faltas e desculpas por não terem comparecido. Passa-se então ao ponto definido pela tese “Qual o melhor método de leitura seguido até agora” e depois de uma discussão prática pelo professor de Vera Cruz, a assembleia aprova que o melhor método até então é o de João de Deus. Só não vota o professor de Recardães que justifica a sua opção por não conhecer todos os métodos. Nessa altura, o parecer sobre a tese Agricultura é aprovado por unanimidade por força do merecimento do trabalho. Apresentaram ainda programas pedagógicos a convite do presidente alguns professores e a seguir o presidente marcou para ordem do dia seguinte a primeira e sexta tese, que é respectivamente sobre Gramática e Programas escolares. E como é meio-dia encerra-se a sessão.

A sessão do dia 6 é aberta às nove horas e marcam-se as presenças, com indicação dos que estão a mais e a menos e entra-se na discussão da Gramática com uma discussão participada. No fim diz-se que professor de Arcos provou que a escrita sónica é a melhor e por isso a conclusão da tese é rejeitada por força da forma em que está redigida e dá-se-lhe uma nova redacção em que se diz: “Na transição da ortografia usual ou etimológica, se fossem simplificando as palavras no sentido sónico tanto quanto seja possível.” Então, o relator vai concordar, dizendo que era o que pensava.

Já o parecer sobre os Programas Escolares é aprovado por unanimidade.

Escolhe-se a seguir o melhor programa escolar das professoras e o melhor programa dos professores. Parece que se quer impedir uma guerra de sexos.

Nessa altura dá-se para ordem de trabalhos do dia seguinte o programa das conferências pedagógicas de 1888. E à uma hora da tarde encerra-se a sessão.

No dia 7, começa-se antes das nove para aprovar a acta do dia anterior. Feita a chamada, há mais uma presença. Há uma mensagem de felicitações do Porto e encarregam o presidente de lhe responder.

A primeira tese para ser analisada em 1888 é - Educação moral - Ensino religioso, sua importância e necessidade de se ministrar às crianças. A segunda é Higiene das escolas primárias; sua importância. Principais preceitos e precauções higiénicas que importa observar nas escolas. A terceira é Escolas Nocturnas – Suas vantagens e inconvenientes, e meios de os remover. Escolas dominicais; qual o seu fim e em que localidades se devem estabelecer. A quarta é “Quais os meios de que o professor oficial pode dispor para tornar a sua escola o mais instructiva, amena, útil e convidativa?” A quinta é “Convém que em todas as escolas oficiais se adoptem os mesmos compêndios para o ensino das diversas disciplinas ou devem variar segundo a categoria da localidade? Porquê?” A sexta é “Será conveniente no estado actual das nossas escolas primárias a adopção do método legográfico? No caso afirmativo de que utensílios se deverá prover a escola?” [24]

Todas as teses propostas foram aprovadas por unanimidade.

Logo a seguir, a conferência delibera nomear uma comissão composta pelo presidente e outros professores para organizarem um programa pedagógico, impresso, pago e distribuído pelos professores. Há nessa altura votos de louvores a alguns professores e um voto de agradecimento ao sub-inspector pelo modo benévolo com que dignou tratar os professores. Finalmente, convidam-se todos a acompanhá-lo à sua residência como prova clara de gratidão. Tudo é aprovado mais uma vez por unanimidade e com calor, encerrando-se a sessão e as conferências às doze horas.

No ano seguinte, as conferências já não se realizam e a razão é com certeza a mesma que terminou prematuramente as da Covilhã.

 

3 – Algumas comparações regionais

Estudei e comparei numa comunicação apresentada em 2004 três experiências: Aveiro, Castelo Branco e Coimbra. Vi assim que os três círculos mostram a influência determinante da variedade e profundidade das teses estudadas na qualidade das aprendizagens dos professores e, consequentemente, estas dependem em muito das decisões de sub-inspectores e professores na sua escolha. As grandes lutas entre o jesuitismo e as ideias republicanas ainda estão muito embrionárias e também numa situação de trabalho oficial, estas não devem aparecer. Nota-se contudo o seu aflorar tímido. Também as Juntas Escolares, órgão autárquico para controlo do mapa dos horários de aulas, têm um papel diminuto. De facto, estas só aparecem de modo claro no combate ao oportunismo motivado pela falta de profissionalismo dos professores.

No Sabugal, detectou-se um papel desleixado deste órgão, que não pode ser conferido a nível superior por falta das actas da Circunscrição da Guarda (Diniz, 2003). É contudo, um aspecto que pode e deve vir a ser objecto de investigação em Coimbra e em Aveiro, onde existem. É o que não acontece na Covilhã, onde o seu papel não é exercido conforme as Actas das Conferências Pedagógicas.

No trabalho citado é evidente que os professores do Círculo da Covilhã, apesar do isolamento, conseguem debater e aprofundar os seus conhecimentos das modernas teorias, integrando-se bem nas grandes discussões pedagógicas.

Infelizmente, no círculo de Aveiro vemos um funcionamento quase sigiloso já que as actas pouco dizem. É onde se escondem algumas opções perversas dos professores e, ainda, a falta de conhecimentos que a fragilidade profissional dos sub-inspectores não consegue mover, aceitando tudo o que de mal acontece neste círculo. Nem sequer existe a continuidade da presença de José Maria Graça Affreixo, que não consegue exercer uma influência determinante. É talvez por causa disso que se muda para Coimbra. Infelizmente, outro professor, que tinha mostrado algum dinamismo, morre entretanto. Só a vinda dum sub-inspector mais dinâmico vai quebrar, mas, só em parte, esta situação.

Neste processo, Coimbra patenteia a sua pujança cultural nas discussões dos professores, potenciada por um inspector como Francisco Augusto de Quintanilha, que é um intelectual de grande e profunda erudição pedagógica. Há ainda muitos professores de excelente nível e que o mostram no decurso das conferências.

Por isso, em 1888, quando, por falta de financiamento, as conferências acabaram logo na primeira sessão na Covilhã e em Aveiro nem sequer se iniciaram, os professores de Coimbra mostraram ao poder que, mesmo sem apoios, eram capazes de as continuar.

Aires Antunes Diniz

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Referências:

Aires Antunes Diniz - A Exclusão dentro da Exclusão, Praça Velha, Revista Cultural, Ano VI, n.º 14, Novembro de 2003, págs. 150-178.

Aires Antunes Diniz - Os círculos de qualidade em educação, Comunicação ao V Congresso Luso-Brasileiro de História da Educação, 7 de Abril de 2004, Évora.

Armand V. Feigenbaum – Total Quality Control, terceira edição, revista, McGraw-Hill International Editions, 1991.

Preciosa Fernandes et alia – Uma  Formação em Círculo, Um sentido no Presente ... Um sentido no Futuro, Instituto de Inovação Educacional, 2001.

Manuel Barbosa Leão, editor – Cartas e Publicações relativas ao fallecido Dr. José Barbosa Leão, que, em memória de seu saudoso irmão, reuniu e mandou imprimir, Imprensa Commercial, 1889.

Jules Paroz – História Universal da Pedagogia, Livraria Civilização e Livraria Figueirinhas, 1908.

 


NOTAS

* * Economista, exerce a profissão de professor e foi docente da Universidade de Coimbra e da Universidade da Beira Interior. Na área da Educação, tem investigado e publicado na área da Economia da Educação. Participa na Redacção da Revista O Professor, tem publicado em revistas Brasileiras de Educação e é Consultor Internacional na revista Teoria e Prática da Educação de Maringá, Estado do Paraná. No âmbito da Pedagogia tem feito comunicações em todos os Congressos Luso-Brasileiros de História da Educação realizados em Lisboa (1996), S. Paulo (1998), Coimbra (2000), Porto Alegre (2002) e Évora (2004). Apresentou comunicações nos 1º, 2º e 3º Congresso Brasileiro de História da Educação, Rio de Janeiro (2000), Natal (2002) e Curitiba (2004). Fez ainda em 2004 uma comunicação ao International Standing Conference History of Education, em Genebra com o título Coimbra New School Ideals. email: adiniz@mail.telepac.pt. É colaborador do espaço comunitário na Internet «Aveiro e Cultura».

 

[1] In Enciclopédia Luso-Brasileira de Cultura, vol. 16º, col. 312.

[2]Actas das Conferências Pedagógicas do primeiro círculo da terceira circunscrição escolar, folha 3, frente e verso, que consultei no Fundo Local da Biblioteca Municipal  de Aveiro.

[3]Actas das Conferências Pedagógicas do primeiro círculo da terceira circunscrição escolar, folha 4, frente e verso.

[4]Actas das Conferências Pedagógicas do primeiro círculo da terceira circunscrição escolar, folha 5, frente.

[5]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 1, frente.

[6] As professoras estavam dispensadas de comparecer nas Conferências desde que apresentassem um relatório.

[7] Actas da Junta Escolar do concelho de Aveiro, pág. 15, frente e verso.

[8]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 9, verso folha dez, frente.

[9]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 14, verso.

[10]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 15, verso.

[11]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 17, verso e 18 frente.

[12]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 21, verso.

[13]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 21, frente e verso.

[14] Significa “ninguém dá o que não tem”.

[15]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 28, verso.

[16]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 29, frente.

[17]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 29, frente e verso.

[18]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 29, verso.

[19]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 30, frente.

[20]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 30, verso.

[21]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 31, frente.

[22]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 32, frente.

[23]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 34, frente.

[24]Actas das Conferências Pedagógicas do quarto círculo da segunda circunscrição escolar, folha 36 verso e 37 frente.


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