Os meios de comunicação social
divulgaram, de um modo sensacionalista e pouco
esclarecedor, irregularidades no ingresso ao ensino
superior de alunos que concluíram o ensino secundário
recorrente. Esta situação criou no público, por
desconhecer este tipo de ensino, uma concepção errada
deste, pois foi transmitida uma imagem desvirtualizante
do ensino recorrente.
A L.B.S.E. defende que qualquer
cidadão tem direito à educação. A finalidade desta
é o desenvolvimento global e harmonioso do indivíduo,
necessário à formação de um cidadão integrado e
integrador numa sociedade em constante mudança.
O ensino recorrente por unidades
capitalizáveis (S.E.U.C.) é uma modalidade de
educação de adultos, que surge no âmbito de uma
política educativa de educação permanente, e
destina-se a indivíduos que já não se encontram na
idade normal de frequência dos ensinos básico e
secundário ou que não tiveram oportunidade de se
enquadrar na educação escolar na idade normal. Assim,
têm acesso os indivíduos a partir dos 15 anos, para o
ensino básico, e com 18 anos, para o ensino
secundário, podendo neste nível de ensino ingressar
com 16 anos, desde que estejam no mercado de trabalho.
Este tipo de ensino, a nível do secundário de
formação geral, dá a certificação do 12º ano e,
para ingresso no ensino superior só são exigidos
exames às disciplinas específicas. Surge como uma
segunda oportunidade de formação com vista a uma
integração numa sociedade cada vez mais exigente.
Há cerca de dois anos tem aumentado
a afluência de alunos provenientes do ensino regular.
Se é certo que o SEUC surge no âmbito de formação de
adultos, a legislação não impede a transferência de
alunos provenientes do ensino regular para aquela
modalidade de ensino, desde que obedeçam aos requisitos
de acesso. A transferência é um processo
irreversível, salvo decisão da DREC, e só a partir de
Maio transacto é que não pode ser feita no mesmo ano
escolar, caso o aluno se tenha matriculado no ensino
regular. Este fluxo de discentes do ensino regular é
reflexo de um insucesso, em especial à disciplina de
Matemática, a qual deixa de ser opção de um número
significativo de alunos que transitam para o SEUC. É de
referir que do processo de transferência faz parte um
plano de equivalências, que está regulamentado. A
legislação relativa às equivalências, que vigorou no
ano lectivo transacto até Fevereiro, beneficiou o aluno
que tinha concluído o Português, a Filosofia e a
Língua Estrangeira, até Fevereiro transacto, e até
houve casos de alunos que ficaram com o 12º ano,
habilitação não conferida no ensino regular. Uma
incongruência do Ministério da Educação! Que
interesses se pretendiam defender pelas estâncias
superiores?
A estrutura curricular do SEUC,
formação geral, é de carácter académico, com
disciplinas que abordam conteúdos idênticos, na
generalidade, aos do ensino regular. No processo ensino
aprendizagem utiliza-se uma pedagogia diferenciada,
tendo-se em consideração as diferentes unidades de
aprendizagem na sala de aula e as dificuldades na
progressão da aprendizagem. Estas estão condicionadas
pelas capacidades cognitivas, pelos conhecimentos
anteriores que são pré-requisitos para a aprendizagem
e ainda pela disponibilidade temporal para o estudo, que
é um factor limitativo para os adultos. A avaliação
consiste numa prova de exame, que poderá ser um
trabalho prático nas ciências experimentais; e no
Português e nas Línguas estrangeiras haverá sempre
uma avaliação oral. A reprovação implica a
utilização de medidas pedagógicas para colmatar as
lacunas na aprendizagem.
O ensino recorrente por unidades
capitalizáveis é o paraíso do sistema de ensino?!
Não é esta a ideia pretendida, mas sim a de esclarecer
que é um subsistema de ensino que tem diplomas que
regulamentam a sua organização e funcionamento.
Então como se justificam as
irregularidades denunciadas pelo Ministério da
Educação e que foram, durante algum tempo, assunto dos
meios de comunicação?
O sistema de ensino criou um processo
de ingresso no ensino superior baseado na
classificação obtida por uma aprendizagem livresca —
só interessa o saber, descurando-se outros saberes, o
que leva a questionar se será suficiente para definir
as competências para uma formação superior. Ora, esta
situação poderá levar a que, numa sociedade
competitiva, economicista/materialista, em que há uma
indefinição dos valores/princípios – estamos a
caminhar num terreno pantanoso! – haja tendência para
que, nalguns casos, se tente uma prática do ensino
recorrente por unidades capitalizáveis que seja
permissiva a ilegalidades e a uma desvirtualização da
filosofia que levou à criação deste tipo de ensino.
João Paulo C. Dias