Durante muitos anos ambicionei visitar o Parque Natural do
Montesinho, na fronteira nordeste do país, e temia que a minha
expectativa saísse gorada quando lá fosse.
Tal não aconteceu. O facto de não haver saídas
preferenciais para Espanha e França através do Parque faz com que
este se tenha quedado tranquilo e naturalmente protegido dos
atentados a que eventualmente outros parques têm estado sujeitos.
Não é difícil encontrar alojamento, quer na cidade de
Bragança, quer dentro do próprio parque sob a forma de turismo
rural ou nas casas dos Serviços Florestais.
É imprescindível munir-se de um mapa de escala adequada
e depois ir a todo o lado: desde logo visitar essa espantosa aldeia
que se chama Rio de Onor onde as populações portuguesa e espanhola
coabitam, paredes meias, na melhor harmonia. Parece que o tempo aí
parou, tanto é o cuidado em preservar não apenas os aspectos físicos
da paisagem mas também os próprios hábitos dos autóctones. É
verdade que a população está envelhecida e que os jovens tiveram
de partir para a cidade em busca de sustento mas enquanto houver
gente que goste do sossego e do equilíbrio que só a natureza pode
dar, então Rio de Onor permanecerá.
A alguns quilómetros dali temos Guadramil e aí o nosso
olhar fica desolado tal é o estado de abandono que se respira.
Guadramil era há cerca de 50 anos uma mina de ferro que constituía
praticamente o sustento da população já que, ao contrário de Rio
de Onor, a agricultura está ausente. A terra é pobre, reduz-se a
uma rua de casas pobres e a um cemitério modestíssimo. Temos a
sensação de estar no fim do mundo. Cruzamo-nos com uma mulher da
aldeia, simpática, a quem falamos destas terras e destes tempos.
Confirma as nossas piores suspeitas: dentro de anos, a aldeia não
terá uma pessoa viva como vimos nalgumas aldeias dos Pirinéus
espanhóis. Em compensação, a horas mortas, pelo nascer do dia, os
veados vêm até ao limite da povoação à procura de algum pasto.
Regressamos a Bragança e tomamos o caminho de Puebla de
Sanábria através da aldeia de França. Aqui, à beira da estrada há
um pequeno restaurante, acolhedor, cujo nome não recordamos mas
onde parámos para almoçar incentivados por um número
significativo de guardas florestais que se preparavam para fazer
mesmo. Ora, estes são gente conhecedora e quando assim acontece, eu
não hesito: sigo-lhes o exemplo. De facto comia-se bem, era um
local asseado e o preço era convidativo.
Já agora dê-se um passeio a Espanha para ver a bela
cidadezinha de Puebla de Sanábria com o seu castelo e rume-se a
Ribadelago onde o lago glaciar (a 1000m de altitude) cercado de
montanhas nos faz lembrar a Suíça não fora a presença de
carvalhos, árvore tipicamente mediterrânica. Subamos por essa bela
estrada até ao planalto (cerca de 1700m de altitude) de onde se tem
sempre uma vista espectacular sobre o lago.
De volta, não esquecer de percorrer todas as estradas do
parque que, sendo estreitas são, apesar de tudo, alcatroadas. Elas
levam-nos a Montesinho, a Cova da Lua, a Moimenta e a outras.
É uma região muito bonita e eu recomendaria a Primavera
ou o início do Outono para uma visita já que a sua cobertura arbórea
adquire em certas alturas do ano aspectos verdadeiramente invulgares
do ponto de vista cromático.
Nesta região nasceram dois homens notáveis: o abade de
Baçal a quem se deve o estudo de muitos testemunhos arqueológicos
e etnográficos da região encontrando-se muitos deles no Museu que
leva o seu nome, em Bragança, e o Professor Paulo Quintela,
prestigiado germanista que foi Professor da Faculdade de Letras da
Universidade de Coimbra e a quem se ficam a dever algumas traduções
de obras de autores alemães quais sejam, Nietzche, Goethe,
Holderlin, Rilke, Nelly Sachs e outros.
Naturalmente, ficaria de mal com a minha consciência, se
não lhe recomendasse uma prova dos enchidos da região, moderada já
se vê, (em Vinhais há uma feira célebre mas pode encontrá-los em
qualquer estabelecimento da especialidade).
É claro que se é a primeira vez que vai a Bragança, não
pode deixar de visitar a castelo com a sua bela Torre de Menagem e o
Domus Municipalis, ex-libris da cidade, e que terá sido construído
nos séculos XII ou XIII e que é único, no seu género, na Península
Ibérica; à saída para Vinhais não deixe de visitar o interessantíssimo
mosteiro românico de Castro de Avelãs (século XII), de que resta
uma parte da igreja, completamente revestida a tijolo, o que lhe
confere uma notável originalidade.
O regresso a casa pode fazê-lo por Miranda do Douro,
admirar aí a Sé mandada construir por D. João III (onde pode ver
o celebrado Menino Jesus da Cartolinha), deitar um olho ao
Douro internacional que constitui uma paisagem verdadeiramente
esmagadora e Freixo de Espada à Cinta com as suas janelas
manuelinas.
Se não é abusar do seu estômago delicado ainda lhe
deixo aqui uma última sugestão: comer a prestigiada posta
mirandesa em Carviçais (a meio caminho entre Freixo e Torre de
Moncorvo). Espero que aproveite. Estou certo que não ficará
desiludido.
Luís Serrano, Fev. 2002.
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