Já velhinha, de cabelos cor de neve, rosto
repleto de rugas, sem parentes, sem ninguém que a sustentasse e
lhe dispensasse os carinhos necessários, viu-se obrigada a
estender a mão à caridade. Talvez tivesse ainda um netinho – o
Carlitos - que, ainda pequenino, desapareceu, ignorando-se o seu
paradeiro...
Sabendo que, nessa tarde de sol ardente, se
realizava um desafio de futebol, aproveitando esta oportunidade,
lá foi, curvada, trémula, sem forças, como pôde, até a um sítio
mais aprazível, a fim de pedir esmola a quem passasse.
Dezenas, centenas de pessoas passavam...
Passavam, sim, mas indiferentes à dor, sem sequer olharem para
aquela imagem de extrema bondade. Ninguém lhe dava esmola, nem
tampouco lhe dirigia palavras consoladoras...
Triste, caindo-lhe lágrimas pela face
enrugada, compadecida daqueles corações severos, a mendiga
enviava uma oração aos céus...
Entretanto, junto do povo que continuava a
passar, seguia um rapaz ainda, grande entusiasta do futebol. Mal
viu a pobrezinha, encheu-se de compaixão. Não lhe podia dar
esmola alguma, pois unicamente levava o dinheiro suficiente para
assistir ao desafio. Era pobre. Rápido, tomou uma resolução.
Dirigiu-se à indigente velhinha e, consolando-a com palavras
ternas, depositou-lhe nas trémulas mãos o dinheiro destinado ao
jogo que tanto gostaria de ver.
A velhinha, a custo, acreditava no que
acabava de ver e ouvir... Duas lágrimas rolaram pelo rosto do
rapaz.
De súbito, algo se passou no cérebro da pobre
velha: acabara de reconhecer o seu querido Carlitos naquele
rapaz que lhe dera esmola e que, por sua vez, acabava de nela
reconhecer a a avó que pensava perdida.
O povo, entusiasmado com o futebol,
continuava a passar, enquanto avó e neto querido se abraçavam
entre lágrimas de alegria...
ALVES DA COSTA
"Correio da Serra",
Jornal de Pampilhosa da Serra,
15-05-1964, pág. 1
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