Almeida Garrett e José Estêvão:
dois exemplos de cidadania
Todos os anos, os alunos do 11.º Ano estudam uma das
obras mais memoráveis de Almeida Garrett: Frei Luís de Sousa.
Considerado um clássico da literatura portuguesa, este drama, que é em
alguns aspetos um reflexo da vida do escritor, tem como marcas
românticas o nacionalismo, o patriotismo, a crença em presságios e
superstições, a liberdade de amar e o amor à liberdade.
Garrett
foi escritor e dramaturgo, ministro e secretário de estado honorário. A
sua intervenção política foi marcada pelo impulso dado ao teatro em
Portugal. Efetivamente, Passos Manuel, por portaria régia de 1836,
encarregou Almeida Garrett de apresentar «um plano para a fundação e
organização de um teatro nacional, o qual, sendo uma escola de bom
gosto, contribua para a civilização e aperfeiçoamento moral da nação
portuguesa». Por esse mesmo decreto, Almeida Garrett ficou responsável
por criar a Inspeção-Geral dos Teatros e Espetáculos Nacionais e o
Conservatório Geral de Arte Dramática, instituir prémios de dramaturgia,
regular direitos autorais e edificar um Teatro Nacional «em que
decentemente se pudessem representar os dramas nacionais». Para além
disso, participou ativamente na Revolução Liberal de 1820, sendo a
defesa da causa liberal uma luta partilhada com alguns dos seus
contemporâneos, de entre os quais se destaca José Estêvão Coelho de
Magalhães.
José
Estêvão nasceu a 26 de novembro de 1809, em Aveiro, vindo a falecer, em
1863, na cidade de Lisboa. Estudou Direito na Universidade de Coimbra,
tendo-se destacado mais tarde enquanto jornalista, deputado e orador.
Defensor da Revolução Liberal de 1820, durante o seu tempo de estudante
em Coimbra, alistou-se no Batalhão de Voluntários Académicos, à
semelhança de Almeida Garrett e Alexandre Herculano. Exilou-se em
Inglaterra em 1828, após o golpe de D. Miguel e, em 1829, embarcou com
as forças militares para os Açores, participando mais tarde na defesa do
Porto. Em 1834, a guerra civil terminou com a vitória liberal e José
Estêvão retomou os estudos em Coimbra. Em 1836, tornou-se um parlamentar
notável. Também na imprensa se destacou pelas suas intervenções
assertivas, tendo ajudado a fundar os jornais "O Tempo" (1838) e
"Revolução de Setembro" (1840). Foi ainda professor do ensino superior e
deputado, a partir de 1851, eleito por Aveiro. Com efeito, José Estêvão
demonstrou sempre um incontestável interesse pela sua região,
empreendendo, inovando e impulsionando melhorias através da dinamização
de várias obras, tais como: a construção de estradas, o telégrafo
elétrico, a edificação do liceu, obras na Praia da Barra e a passagem da
linha férrea do norte pela sua cidade natal.
Em 1856, José Estêvão casou com Rita de Miranda. Desta
união nasceram três filhos, tendo, no entanto, apenas sobrevivido Luís
de Magalhães, amigo pessoal de Eça de Queirós.
Mesmo envolvido na política, o seu compromisso com a
Maçonaria, a partir de 1858, concedeu-lhe o título de Grão-Mestre da
Confederação Maçónica Portuguesa apenas quatro anos depois. Faleceu
subitamente em 1862, gerando uma forte comoção: em Aveiro, onde era
muito querido, mas também nas duas câmaras do Parlamento, onde foi alvo
de sentidas homenagens. Apesar de ter sido sepultado no Cemitério dos
Prazeres, em Lisboa, por sua vontade acabou por ser trasladado dois anos
mais tarde para o cemitério de Aveiro, tendo seguido de comboio,
via-férrea por que tanto lutara e que tinha sido inaugurada um mês
antes.
A Escola Secundária José Estêvão tem a sua origem em
1851, dando cumprimento ao artigo promulgado por Costa Cabral que
defendia a existência de «um Liceu em cada uma das capitais dos
Distritos e Dioceses do Reino», tendo o atual edifício sido solenemente
inaugurado em 1952. O Liceu adotou José Estêvão como patrono em 1927,
sob proposta do então Reitor José Pereira Tavares.
José Estêvão ficará para sempre reconhecido como um
exímio orador. Dentre os seus discursos mais notáveis, encontra-se o que
foi proferido a favor da lei das incompatibilidades. Este problema foi
despoletado pelo deputado Francisco José da Costa Lobo, uma vez que as
suas atividades empresariais foram consideradas incompatíveis com as
funções de deputado. Não obstante, para José Estêvão, o problema não era
apenas legal, mas uma questão de princípio, uma vez que com esta lei,
não é «o direito eleitoral que se restringe, é a independência do
Parlamento que se quer sustentar». Esta é ainda uma questão relevante e
de extrema importância atualmente, já que continuam a existir
incompatibilidades entre a vida política e privada, apesar dos diversos
mecanismos legais que foram entretanto criados.
Em suma, José Estêvão foi um cidadão exemplar, um ilustre
parlamentar e político e um orador exímio que, através das palavras,
inspirou não só os seus contemporâneos, mas também as gerações que se
lhe seguiram. Mais do que a eloquência dos discursos, o que é
verdadeiramente importante são as ideias e os sentimentos que se
transmitem, pois como afirmou José Estêvão: «Não interessa os erros de
português, mas sim o que se pretende transmitir através da língua.
Quantas palavras bem escritas são tão feias!»
Inês Freire e Matilde Nogueira (11.º D)
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