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Secundária José Estêvão

Cintura de Lírios, Duarte Morgado, 1997/98


OFICINA DE EXPRESSÃO DRAMÁTICA

RAZÕES / O SISTEMA

Qualquer Sistema de Ensino tem os seus princípios de classificação. Os princípios políticos que definem a linha genérica ideológica, que pela sua razão histórica determina os valores dos conteúdos e seus modelos, os princípios morais e culturais que definem a linha comportamental nas atitudes a funcionar na aprendizagem, e os princípios intelectuais, que definem as consequentes competências cognitivas desses modelos.

Destes princípios de classificação irão surgir:

– o modelo administrativo

– a recorrência financeira

– a estrutura de organização

– os programas de estudos

– o perfil dos professores

Como a sociedade está em constante mutação nos seus valores, nas suas atitudes e nos seus conhecimentos, acontece que quando todas as estruturas começam a funcionar em engrenagem, as lógicas reformativas aparecem com as suas próprias "lógicas".

– O passado interfere directamente no presente e no futuro;

– A Educação não é uma actividade só e meramente intelectual;

– A Educação nunca está isolada de envolvimentos sociais e políticos, morais, culturais e geográficos;

– Para fundamentar o "saber" é necessária a "transmissão".

 

ONTEM E HOJE

Com a intenção de dar a conhecer o que, na Escola onde lecciono, se tem feito sobre "O Teatro na Educação", será deveras importante não só "jogar" verbalmente com todos os dados que irei apresentar, mas também lembrar que as preocupações de hoje também já foram as de ontem e que não é tão inovadoramente revolucionário todo este movimento de legitimar «O Teatro na Educação». / 5 /

De 1926 a 1973, esta Escola publicou a revista "LABOR" (inicialmente "revista de educação, ensino e extensão cultural" e depois "revista do ensino liceal"). A "LABOR" foi, sem dúvida, um espaço de intervenção dos docentes, um espaço de afirmação de cultura pedagógica e profissional, como se poderá verificar em consulta na Biblioteca da Escola Secundária José Estêvão. O seu reacordar em 1996 pela mão do Dr. Arsélio Martins deu espaço a que se verificassem estudos à "LABOR", nos quais se encontram inquietações actualizadíssimas na sua essência. A Dr.ª Alice Pinho fez um brilhante trabalho em que nos apresenta alguns pensamentos de "outros tempos?". Afinal, em 1952, ao mesmo tempo que a NATO reunia em Lisboa, em que os conservadores dominavam a política inglesa, em que houve algumas alterações de alguns aspectos no Estatuto do Ensino Liceal (Dec. 38.812 – Julho 1952), em que a Fundação Calouste Gulbenkian estava nos seus primeiros anos de Intervenção Cultural, discutia-se e reflectia-se sobre o valor social e pedagógico do Teatro no Ensino como nos escreve Maria do Céu Novais Faria, Professora do Liceu D. Manuel II em Janeiro de 1952 na "LABOR" n.º 118.

Em Fevereiro do mesmo ano, "LABOR" n.º 119, José Pereira Tavares deixa transparecer a marginalidade que o Teatro na Educação vivia, mas assumindo categoricamente a sua importância social, lembrando-nos o Teatro que se fazia desde 1920, ao mesmo tempo das ditaduras portuguesas com as suas censuras e confusões com extinções e reaberturas de Escolas Normais. É interessantíssimo como, novamente Maria do Céu Novais Faria na "LABOR" 120 – Março de 1952, nas entrelinhas do que escreveu, se percebe a grande preocupação no querer primeiro fazer o "Homem" depois o "Sábio", atribuições educacionais dadas exclusivamente ao Teatro. Também levanta questões sobre a grande importância dos Dramaturgos e Dramaturgistas, da existência de Técnicos Especializados nos assuntos do Teatro efectivados às Escolas, e do ridículo embaraço que era a separação dos sexos nas Escolas.

Há mais artigos de capital interesse na "LABOR" cuja consulta aconselho, para melhor se sentir o sabor das palavras de então.

Pretendo lutar pelo Teatro na Educação, como venho a fazer desde 1980, pelo seu lugar digno como lhe é merecido, de igual modo aos nossos colegas que desde 1920 o fazem (como é explícito nos artigos da "LABOR", mostrando-nos os anseios de ontem quase iguais aos de hoje). Nas minhas horas mais frágeis não sei o que pense deste marasmo político em relação ao Teatro na Educação. Ou os tempos não mudaram assim tanto, ou os conceitos não evoluíram, ou os tempos mudaram mesmo ao evoluírem conceitos...

 

TEMPOS E CONCEITOS

Depois de ter leccionado Movimento e Drama no Magistério Primário de Aveiro de 1980 a 1989, caio repentinamente, e por força de circunstâncias várias, na Escola Secundária José Estêvão, onde ainda hoje me encontro. Cheio de intenções de inovar uma postura docente, elaborei, propus, foi aceite e executei um Projecto em consonância com todos os organismos envolventes à docência, que consistia essencialmente em abrir a Escola à Comunidade e abrir na Escola um espaço dinamizador de contactos e conhecimentos com o Teatro.

Autor deste Projecto, tive apoio do respectivo Conselho Directivo e Pedagógico, / 6 / da Coordenação da Área Educativa de Aveiro, da Direcção Regional da Educação do Centro, do Instituto de Inovação Educacional (o Projecto foi aprovado e subsidiado), da Fundação Calouste Gulbenkian, da Secretaria de Estado da Cultura, integrado no projecto do Ministério da Educação "A Cultura Começa na Escola" e do “Projecto Vida" entre outros organismos ligados ao Teatro na Educação. Colocar um professor contratado ao abrigo do Decreto-Lei (178/89 de 27 de Maio) sem possuir (legal e formalmente) habilitações para o Ensino Secundário, para exercer funções docentes extra-curriculares com horário completo foi, no mínimo, corajoso. E o apoio que chegava de todos os lados não foi, no mínimo, estranho? Sem dúvida que colado à coragem de muita gente houve consciência da importância e pertinência pedagógica da área contemplada, até porque mais tarde (1992) se verificava a sua contemplação no Complemento de Formação Técnica do Ensino Secundário.

Devido à realidade que a posição do Professor de Oficina de Expressão Dramática vive (a própria disciplina e o conjunto de confusões à volta das habilitações para a leccionar), sou da opinião que a seguir exponho, quase a jeito de ofício, onde tento, no meu entender, clarificar a lógica da existência de Oficina de Expressão Dramática como Disciplina com estatuto próprio (neste momento pertence a um conjunto de Disciplinas designadas por Técnicas Especiais), a contemplação das habilitações já existentes como Próprias e a abertura de Grupo Disciplinar para a referida disciplina.

No sentido de clarificar a actual estrutura do Sistema Educativo, e evitar a tomada de medidas avulsas, incoerentes e contraditórias, e para proporcionar um quadro estável numa reforma global e articulada do Sistema educativo, sou do parecer que a Disciplina de Oficina de Expressão Dramática do Ensino Secundário deixe de pertencer ao quadro de Técnicas Especiais e que passe a ter o seu Grupo Disciplinar próprio. Para a sua leccionação deve ser respeitado o perfil do Professor que o Ministério da Educação atempadamente propôs quando foi criada a disciplina, perfil esse que esteja de acordo com o conjunto de pontos que cito de seguida. fundamentados na sua totalidade na legislação vigente, não aceitando que a sua leccionação seja transportada para qualquer grupo disciplinar que não possua Formação Específica e Competências Profissionais para uma Disciplina tão séria, rigorosa e exigente como qualquer outra. Devem ser contempladas as habilitações complementadas com os C.E.S.E.s em Criação Teatral na Educação como próprias e profissionalizantes, tornando-se lógico – havendo Disciplina – havendo Habilitações – tem de haver Grupo Disciplinar.

Esta decisão tem de ultrapassar qualquer subjugação a opções ideológicas. Trata-se de respeitar a recuperação de experiências das pessoas há muitos anos em actividade no terreno específico, com largas experiências pedagógicas no Sistema de Ensino, de respeitar a reformulação de habilitações que os mesmos estão a concluir, respeitar não a lógica da oferta para mercado mas a lógica da necessidade educativa, respeitar a força da disciplina como contribuinte forte para o aluno se tornar um bom cidadão – constata-se que as novas gerações são possuidoras de características predestinadas à necessidade desta formação como fundamental para a sua educação e desenvolvimento global. / 7 /

Para justificar/fundamentar a minha posição em relação a este assunto, passo a apresentar um conjunto expositivo de elementos legais e de definibilidade:

 

PONTO 1

Sem esquecer que a Lei de Bases do Sistema Educativo foi aprovada por todas as forças políticas do nosso país, as preocupações da referida Lei começam com o âmbito e a definição do Sistema Educativo no disposto do seu Artigo 1.º; os princípios gerais no Artigo 2.º, mais propriamente no ponto 3 em que é explícito o que deve ser a prática da Educação; no Artigo 3.º que nos diz como deve ser a Organização do Sistema; no Artigo 9.º em que são claros os objectivos no Ensino Secundário; no Artigo 30.º que define os princípios gerais na Formação de Professores; no Artigo 31.º que confere e define a Formação Inicial e Própria dos Professores do Ensino Secundário; no Artigo 33.º que define a Qualificação para Funções Educativas; no Artigo 36.º onde são claros os princípios gerais das Carreiras Docentes; no Artigo 47.º que define o contexto do Desenvolvimento Curricular;

A – Define preocupações que ultrapassam qualquer Subjugação a Opções Políticas;

B – Prevê a Leccionação de Disciplinas como a de Oficina de Expressão Dramática com toda a legitimidade;

C – Justifica a Categoria de Leccionação para a Docência e o direito à Progressão na Carreira Docente;

D – Justifica a criação da Disciplina como Disciplina com Grupo Próprio, a que se lhe confere a Leccionação só a Docentes com Habilitações Próprias.

 

PONTO 2

Dado que na Reforma Curricular-Decreto Lei n.º 286/89 de 29 de Agosto, afirma em conformidade com o Artigo n.º 5 da L.B.S.E. poder existir no Ensino Secundário a existência de Disciplinas Técnicas como a de Oficina de Expressão Dramática, para tal deverão existir Docentes Qualificados.

 

PONTO 3

O Decreto-Lei n.º 43/89 de 3 de Fevereiro dá às Escolas autonomia responsável em propostas e anseios próprios e locais sobre as suas actividades educativas. Para o exercício da autonomia, as Escolas foram interpeladas pelo ME sobre as estruturas de apoio educativo que possuíam para a abertura da Disciplina de Oficina de Expressão Dramática. O M.E. analisou as propostas de cada Escola, e dado que em algumas o M.E. achou exemplares todas as estruturas envolventes à disciplina, deu autorização para a sua abertura, respondendo em conformidade com o mesmo Decreto-Lei.

 

PONTO 4

Este conjunto de apoios legais corroboram a nossa posição em conformidade com a Comissão da Reforma do Sistema Educativo no campo do fomento da criatividade e da inovação ao delinear o modelo de Escola para a vida de qualidade cultural em termos de recursos humanos, acha necessário o Professor/Agente de Cultura, se for homem de cultura como o Professor Científico, Prático, Técnico, Artífice, Artista e Tecnológico – / 8 / condições sine qua non – Professor Agente Cultural/Professor Animador.

 

PONTO 5

Do Ministério da Educação, mais propriamente através do Gabinete de Educação Tecnológica, Artística e Profissional, definiu o Perfil do Professor de Oficina de Expressão Dramática (Organização Curricular) para os Cursos Secundários Predominantemente Orientados para o Prosseguimento dos Estudos / Componente de Formação Técnica, como o de um Professor com Formação de Nível Superior, para garantir um conjunto de competências mínimas gerais que procurem assegurar o rigor interpessoal do Processo Pedagógico, com prática Profissional reconhecida na Área Artística do Teatro e com Formação Pedagógica.

 

PONTO 6

Para responder às exigências claras do Ministério da Educação, foram recrutados alguns Professores tanto com experiência no terreno como na especialidade (sempre Professores Provisórios com contrato anual), e também Docentes que, devido à sua integração no Sistema Educativo não estar sujeita a qualquer concurso, e cujos critérios de selecção dependem exclusivamente da responsabilidade dos Conselhos Directivos das Escolas onde a Disciplina é ministrada, verifica-se que a Decência desta Disciplina tem sido sistematicamente atribuída a profissionais de Teatro e a Professores de outras Disciplinas que, embora simpatizantes das Actividades Teatrais na Escola, não possuem a devida Formação Pedagógica-Didáctica Curricular ou Formação Específica na Área Disciplinar em causa.

 

PONTO 7

A Expressão Dramática e Teatro na Educação no Ensino Secundário é, na opinião da Comissão da Reforma do Sistema Educativo, uma trave-mestra do processo curricular na promoção do sucesso escolar e educativo, tem sentido integrador da aquisição educativa, tem dimensão participativa nas actividades educativas e é formação ideal para a educação permanente. A sua selecção criterial de matéria curricular esteve desde o começo da sua leccionação de acordo com toda a legislação vigente, mas sem a adequada atenção aos Professores que leccionam a Disciplina, mesmo quando a referida comissão se pronuncia a favor do rigor na orientação e na formação de Docentes Especializados.

 

PONTO 8

Estão a ser formados Professores, uns já efectivos na Função Pública e inseridos na Carreira Docente com Licenciatura noutros campos e que frequentam C.E.S.E.s na área do Teatro na Educação para reformularem as suas habilitações com profissionalização em função da exigência da Disciplina, outros, Professores Bacharéis, titulares de um curso que formam um conjunto coerente para através do C.E.S.E. conduzirem à obtenção do grau de Licenciado com Profissionalização para efeitos Profissionais e Académicos (Parecer n.º 12/96 da Auditoria Jurídica do Ministério da Educação que foi aprovado e despachado), neste caso colocados sob contrato anual na rede do Sistema Educativo, alguns há mais de 17 anos sem interrupção de serviço (injusto e ilegal ), e que de todo merecem fazer carreira, / 9 / para a qual estão a preparar as suas habilitações, e ainda outros que com o grau de Bacharelato na área correspondente ao C.E.S.E., nunca estiveram integrados no Sistema Educativo, e que com o C.E.S.E. pretendem integrá-lo como o sistema exige.

Não há razão legal para que o Grupo Disciplinar de Oficina de Expressão Dramática no Ensino Secundário não se crie, porque se há Disciplina, se há Habilitações criadas e definidas para o devido efeito (como o diz o Despacho 243/ME/96 o qual contempla oficialmente o C.E.S.E. de Expressão Dramática e Criação Teatral na Educação da Escola Superior de Educação do Porto, com razão de ser e função válida) será lógico que se faça a abertura de novo Grupo Disciplinar, para que os Professores designados neste "parecer" possam digna e legalmente fazer a carreira a que tanto têm direito.
 

 

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