Nova Aurora

 

Aguardamos o romper de uma aurora
a erguer-se do embaraço das brumas
e da solitude deste cálice de amargura
coberto com a escumalha da orfandade
farrapos de um tempo que de nós se foi
desfolhando todos os canteiros floridos
e roubando-lhes o viço e as fragrâncias
numa feroz teimosia em se ir alongando
para além dos horizontes da paciência
enquanto paradoxalmente vai encurtando
o retorno ao instante onde nos abandonou
sem dó, sem compaixão, e sem prazo certo
muito embora apenas ali cheguem memórias
diluídas, deturpadas, confusas, imprecisas
mas clarividentes no exigir do rápido dissipar
destas densas trevas que anuviam os dias
retardando o erguer daquele sol que alumia
uma nova e ansiada primavera de esperança
beijada pelo sopro amigo da brisa nos roseirais
entre o ressoar harmónico da harpa eólica
em melopeias de paz, de amor e de saudade
e o trino bucólico e balsâmico dos pássaros.

                          Janeiro de 2022

 

 

17-01-2022