Vim para o Canadá
em 1964.
Nessa altura trabalhava para o Banco Português do
Atlântico
em Aveiro.
Lia e conversava
muito sobre o Canadá com os emigrantes clientes do Banco,
entusiasmando-me com o que ouvia.
País novo, com
muitas oportunidades e aberto a receber quem pudesse contribuir para
o desenvolvimento, decidi tudo fazer para tentar ir. Assim,
dirigi-me ao Consulado e após várias entrevistas e exames médicos
recebi ordem para embarcar. Começou aí a luta com a família, pois
tendo um emprego estável e que na altura era o emprego com que todos
os jovens sonhavam fui apelidado de louco, pois ia sair de onde
muitos queriam entrar, sem contrapartidas, e ia à sorte e sem
emprego. Não me preocupou essa situação pois nunca tive medo de
arriscar. Não me arrependi. Embarquei e fui recebido por um amigo
chamado Joaquim Carreira, que ainda aí se encontra, após anos de
trabalho, nas Fábricas Ford em Oakville e o Cap. Valdemar Cruz
Aveiro, um dos heróis dos mares da Terranova e Halifax e que me
ajudaram nos primeiros dias.
Profissionalmente comecei na National Trust Co. (Bay
and Dundas);
seguidamente
Mclean Hunter and Chatelaine Publishing Co. (University Ave.) e
seguidamente enveredei pela actividade de agente imobiliário, na já
não existente Mann & Martel Real Estate (Bathust and Bloor).
Paralelamente, minha
mulher teve mais dificuldades, a par de ter emigrado contra vontade,
começando por exercer a sua actividade numa fábrica de bonecos,
seguindo-se uma fábrica de chocolates e, finalmente, uma companhia
de seguros de nome British & Western Co. (Bay and Front sts.).
Pouco tempo após a
minha chegada, aluguei um "room and kitchen" como era habitual
quando alguém chegava, na Grace and College strs. Sendo quase o
coração da comunidade portuguesa, comecei por me interessar por
conhecê-la. Verifiquei que era formada por gentes dos Açores,
trabalhavam na sua maioria na construção civil, fábricas e outras
actividades variadas.
As necessidades/dificuldades desses emigrantes,
pessoas humildes, eram muitas, dado que se tratava de pessoas que,
sem habilitações académicas, não conheciam o básico da língua
inglesa. Não havia médico português, mas apenas um médico espanhol
de nome Saez (conhecido por Dr. Saez), a quem os nossos compatriotas
recorriam pela facilidade de o entender. Mais tarde, finalmente,
apareceu uma médica goesa de nome Melba Costa (Dr.ª
Melba) que se tornou muito popular em Toronto entre a comunidade.
Assistiu à minha mulher na gravidez até ao nascimento do meu filho.
Dada a dificuldade
com a língua acompanhei muitos amigos e conhecidos para arranjarem
emprego e consequentemente a preencher as "aplicações" como lhe
chamavam.
Morando na Grace Street, junto à College, passei
acidentalmente por um edifício que tinha escrito no exterior
qualquer coisa e New Canadians. Entrei e dirigi-me à recepção.
Após
breves momentos a falar inglês com o recepcionista, indagando o que
era aquilo, eis que ele se trilha
na gaveta da secretária e, em
português vernáculo, começa a dar azo à sua ira. Claro que era
português! O
seu nome é
Pina Fernandes.
Licenciou-se
em Direito e acabou por regressar
a Portugal, passando
a trabalhar para emigrantes com situações várias por resolver no
nosso país. Enquanto permanecemos no
Canadá, fomos amigos.
Levei-o
para a Mann & Martel, enquanto estudava. Mais tarde colaborámos
ambos
no “Jornal
Português”.
Entretanto, cedera-me o lugar no New Canadians (part time) tendo-me
eu aí
mantido cerca de três anos. A
finalidade daquele clube era receber os emigrantes recém-chegados e
que não tinham família nem casa. Havia também aulas de inglês, tendo
eu feito um pouco de tudo:
ensinar,
ajudar a encontrar casa, a procurar trabalho, etc.
Quanto a jornais, o jornal que referi e ao qual dei a
minha colaboração juntamente com o Pina Fernandes, não foi o
primeiro. Honra seja feita ao primeiro e único que havia em Toronto,
cujo título
era "Correio Português", propriedade do Sr. Ribeiro e esposa, D.ª
Maria Alice Ribeiro. Depois surgiu o referido "Jornal Português", de
pouca dura, pois éramos amadores e o Jornal do Sr. Ribeiro e D.ª
Maria Alice (era assim que era conhecido o jornal) já tinha dimensão
e estrutura.
A criação de jornais portugueses foi bem recebida,
pois as pessoas
interessavam-se
pelas notícias da comunidade, de Portugal, e estavam também
interessadas
na publicidade, que era uma forma de lhes dar a conhecer os produtos
que começavam a aparecer. Lembro-me que havia um Sr. Sousa que era
um armazenista e importador de alto gabarito.
A minha actividade
empresarial não teve significado, pois a convite de um tal Sr.
Carvalho, que era importador de mármores e tinha uma loja no Hotel
Royal York, e de outros amigos, formámos uma associação comercial de
empresários portugueses, mas com pouco sucesso por não haver
aderentes e o leader, o Sr. Carvalho, se ter desinteressado.
Fui ainda e com muito orgulho nomeado representante
do Banco Português
do Atlântico junto da comunidade
portuguesa para a captação de poupanças para aquele Banco, dando
patrocínios a vários eventos, entre os quais a organização da 1.ª
eleição da representante de Toronto para miss Portugal. Ainda mais
interessantes foram as visitas que fiz no Natal a casa dos nossos
compatriotas. Munido de um
pequeno gravador, registava os desejos
de Boas Festas para as famílias em Portugal, que enviava para o
Banco para serem depois
transmitidas
pela
então Emissora Nacional, no programa Hora da Saudade.
Foi assim,
resumidamente, a minha passagem pelo Canadá.
Com os meus
cumprimentos
Henrique Neves
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(1) - Foram
suprimidos os endereços do e-mail. |