Orquídea Maria Gomes
de Castro
(2.º ano)
PODEREMOS
considerar duas modalidades de pesca do bacalhau para os Portugueses: uma
a pesca à linha; outra a do arrasto, bastante distintas entre si,
embora com a mesma finalidade.
Na pesca à linha os navios, todos brancos, e alguns usando ainda
velas, partem de Lisboa, depois de aparelharem. Esta aparelhagem
consiste em fornecer o navio de tudo o que irá precisar
durante a companha, tal como
sal, água, alimentos, gasóleo, isca e todos os apetrechos de pesca.
A partida é normalmente durante o mês de Abril e o regresso em Outubro.
Depois de saírem de Lisboa dirigem-se paro os bancos da Terra Nova
onde pescam durante
certo tempo, indo depois a uma
cidade canadiana, normalmente St. John's, para abastecer, seguindo
depois para a Gronelândia; há, no entanto, navios que fazem toda a
safra nos bancos da Terra Nova, mas a maioria vai para a
Gronelândia.
Na primeira modalidade de pesca, os navios, divididos em
grupos, fazem pesquisas pelos vários bancos existentes e fundeiam
naquele que tiver melhor aspecto; arreiam os dóris que
partem para a área determinada
pelo capitão e lançam as linhas cada um no seu sítio, recolhendo-as passado certo tempo com o pescado que provavelmente lá virá.
Depois de descarregado o
bacalhau dos dóris para uns compartimentos chamados «quêtes», um pescador faz-lhe o «trote». O
«trote» consiste em abrir o peixe desde o umbigo às guelras. Depois
esse peixe passa para o «partidor de cabeças» que é um homem que
lhe tira as vísceras, o fígado do qual se extrai o óleo de fígado
de bacalhau e tira-lhe a cabeça. Depois passa ao «escalador» que é
um pescador que com uma faca abre o peixe desde a badana até à
barbatana caudal. Depois de o abrir, corta-lhe metade da espinha
que
vai do umbigo até à cabeça. Feito isto é levado para uma tina de
madeira que está cheia de água para lavar o peixe. Sai de dentro de
essas tinas por meio de uns
garfos e vai para um escorredor. Daí vai para dentro de umas
mangueiras que o conduz ao porão. Aí estão homens salgadores com
uns garfos que o tiram de dentro de um tabuleiro e o põem para a «pana»,
onde os seus companheiros salgadores o estendem um a um e lhes põem
sal. Vida rude esta que exige dos homens um esforço titânico!
O tempo de permanência dos dóris fora do navio varia muito, de
acordo com as condições de tempo e outros factores, mas podemos
dizer que anda por volta
/
17 / de 12
horas, sendo a partida normalmente entre as 4 e 5 horas e a chegada entre as 16 e
as 17 horas.
O dia a dia decorre normalmente desta maneira, tendo como
intervalos algumas tempestades que aparecem, alturas essas em que o
navio não pesca, aproveitando a tripulação para descansar mais um
pouco do que o normal. Depois é aguardar que o navio esteja cheio,
para os mais afortunados ou que a época termine para os que tiverem
menos sorte, regressarem a Portugal, ansiosos por ver as famílias
de que estão já há tanto tempo separados.
Durante a viagem de regresso, fazem-se arrumações, limpezas, pinturas, etc., para que o navio
e a tripulação se apresente cá com o melhor aspecto possível.
No dia da chegada é festa para todos e não há trabalho a bordo; mas
nos seguintes já começa a descarga do peixe que é levado para as secas depois de
pesado. Na seca há várias lavagens, depois das quais o bacalhau é
estendido a secar, para depois ser enfardado para vender ao
armazenista.
Quanto à pesca do
arrasto, modernamente poderemos considerar que
não há épocas para esta modalidade de pesca. Os
navios partem em qualquer altura até que façam um carregamento que
possa chamar-se lucrativo para que regressem mandando-os de novo
logo que estejam prontos para nova viagem e assim sucessivamente
durante todo o ano.
Fazem-se normalmente duas viagens por
ano, mas tudo está
dependente das contingências da pesca. Os navios depois da
descarga e já com alguns apetrechos de pesca a bordo, partem para
Lisboa, onde usualmente armam.
Metem sal em Setúbal ou Lisboa, abastecem-se de mantimentos e
água,
atestam de combustível e partem para os bancos da Terra Nova, Labrador ou Gronelândia,
que são os que normalmente
usam, apesar de haver bacalhau em outros lados.
No arrasto a pesca é feita por redes que são rebocadas pelo navio.
Normalmente as redes usadas arrastam pelo fundo, mas modernamente
grande parte dos navios portugueses já estão equipados com redes que podem
pescar a meia-água, podendo a profundidade a que a rede vai
ser regulada de bordo. Usar-se-á uma ou outra rede conforme o peixe
andar junto ao fundo ou a meia-água. Para a detecção de cardumes são
os navios equipados com sondas que nos dão a profundidade a que
eles se encontram e, com certa aproximação, a quantidade de peixe provavelmente existente,
além da
configuração do fundo. Logo que um cardume é detectado, o navio
toma posição para largar a rede com os marinheiros nos seus postos
de trabalho.
Depois da rede estar na
água, o capitão do navio procurará fazer
com que ela passe nos locais onde o peixe se encontra e, passado
certo tempo, que vario muitíssimo de acordo com o
/ 18 / aspecto da pesca, manda recolher
a rede que dará o resultado do
trabalho. O tempo de arrasto varia de cerca de 15 ou 30 minutos até
cerca de 5 horas, mas normalmente anda por volta de 2 horas. Logo
que o pescado entra a bordo vai para uma parte do navio chamada
normalmente convés de trabalho onde é amanhado, descabeçado e
escalado, consistindo esta última operação em abrir o peixe de alto
a baixo para o apresentar com o aspecto com que nós cá o conhecemos
já seco. Depois daqueles operações o peixe é lavado e vai para os
porões onde é salgado.
Durante a companha, normalmente
os navios precisam de ir a terra, principalmente para abastecimento de gasóleo, sal e mantimentos
utilizando normalmente para esse fim a cidade de St. John's, no
Canadá.
Logo que o navio esteja carregado, ou quando o armador ordenar, inicia-se
a viagem de regresso, passando-se depois tudo como num
navio de linha, mas feito com muito mais rapidez para que possa
partir de novo, para mais uma companha para os mares do Noroeste
Atlântico. |